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O Cheque Caução no Direito Penal


Autoria:

Thiago Lauria


Mestre em Direito Processual Penal pela UFMG. Especialista em Ciências Penais pela UGF. Graduado em Direito pela UFMG.

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Texto enviado ao JurisWay em 13/11/2006.



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Já se tornou prática cotidiana no meio comercial a utilização do cheque como forma de garantia. Esse cheque, que recebe o nome de cheque caução, é frequentemente empregado quando os comerciantes desejam garantir que seus clientes se portarão de forma diligente com relação a um determinado bem que será colocado em sua guarda, seja por meio de um contrato de aluguel, de comodato ou de mútuo.
 
Esses cheques usualmente são emitidos em valores muito altos, justamente para coagir o cliente a se portar de forma diligente no cumprimento das obrigações firmadas no contrato.
 
Ocorre que, por vezes, essas obrigações contratuais acabam sendo descumpridas, de forma que o comerciante vem a apresentar ao banco o cheque dado como forma de garantia. Como os valores constantes desses títulos de crédito são, como dito, muito altos, o índice de devoluções de cheques dados em caução é absurdo. Diante do exposto, vale uma pergunta: comete crime o agente que emite um cheque caução sem provisão de fundos?
 
A princípio, a conduta do emitente de cheques caução sem provisão de fundos poderia ser considerada como crime. Afinal, o Código Penal prevê tal conduta como uma modalidade de estelionato. As penas podem variar de 1 (um) a 5 (cinco) anos de reclusão, além de imposição de multa ao infrator, senão vejamos:
 
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa
(...)
§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:
(...)
Fraude no pagamento por meio de cheque
VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento” (grifo nosso)
 
Para sabermos quais as verdadeiras conseqüências penais decorrentes da emissão de cheques caução sem fundos, faz-se necessário tecer alguns comentários acerca da natureza jurídica dos cheques.
 
O cheque é um título de crédito, ou seja, um documento que formaliza um direito de crédito. Uma das características essenciais do título de crédito é a possibilidade de realizar de pronto o valor que representa quando do vencimento. Para exemplificar o que foi dito, vamos imaginar o caso de uma nota promissória. Estando o documento devidamente preenchido, obedecendo aos requisitos legais, constitui o mesmo uma ordem de pagamento. Logo, havendo o vencimento, o devedor estará obrigado ao pagamento do valor constante da nota promissória assim que a mesma lhe for apresentada para pagamento.
 
Sendo também o cheque um título de crédito, as mesmas características relativas à nota promissória apresentadas acima também se lhe aplicam. Assim, o cheque é considerado como uma ordem de pagamento. Mas, de acordo com o disposto na Lei de Cheques, trata-se uma ordem de pagamento à vista. Ressalte-se que isso não significa que o comerciante seja obrigado a aceitar cheques. Todo título de crédito pressupõe uma relação de confiança, de forma que o vendedor tem o direito de se negar ao recebimento de um cheque.
 
De qualquer forma, o fato é que o cheque, de acordo com a definição legal, constitui uma ordem de pagamento à vista. Em virtude desse fato é que os Tribunais vêm entendendo que o cidadão que emite um cheque caução sem provisão de fundos não comete o crime de estelionato previsto no inciso VI do art. 171.
 
O Direito Penal lida com a possibilidade de restringir um dos bens jurídicos mais importantes do homem: a liberdade. Logo, a intervenção penal constitui uma exceção aos direitos e garantias fundamentais do cidadão previstos na Constituição Federal. Em razão disso, as normas incriminadoras, em regra, devem ser interpretadas de forma restritiva.
 
Ora, considerando que a interpretação da norma deve ser restritiva, e que o cheque caução não possui a característica essencial de ser uma ordem de pagamento à vista, tem-se que o cheque caução não é considerado cheque! Isso mesmo. A emissão de cheque caução tem por objetivo a garantia de uma dívida. Inclusive, a sua natureza é condicional, vez que apenas se determinadas condições contratualmente acertadas forem descumpridas é que o cheque será depositado.  Portanto, a cártula não representa um pagamento à vista, de forma que resta desnaturado o título de crédito, que se torna mera promessa de pagamento.
 
Em se tratando de mera promessa de pagamento, e não de um título de crédito propriamente dito, tem-se que a conduta do art. 17, VI não se perfaz, faltando o elemento “cheque” para a sua configuração.
 
Em suma, sendo a conduta atípica, não há crime quando o cidadão emite cheque caução sem provisão de fundos. Esse é o entendimento que impera atualmente na jurisprudência:
 
CHEQUE EMITIDO COMO CAUÇÃO PARA ATENDIMENTO MÉDICO DE EMERGÊNCIA. TÍTULO EMITIDO EM GARANTIA QUE NÃO É PASSÍVEL DE PROCEDIMENTO CRIMINAL. ATIPICIDADE. EXERCÍCIO ARBITRÁRIO DAS PRÓPRIAS RAZÕES. AÇÃO PENAL PRIVADA. AUSÊNCIA DE QUEIXA. DECADÊNCIA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. O cheque emitido como caução para atendimento médico de emergência, não constitui título hábil à instauração de procedimento criminal, sendo, portanto, atípica a conduta, correta a absolvição. Se a conduta da co-ré tipifica o crime de exercício arbitrário das próprias razões, e o mesmo se procede mediante queixa, ausente no caso, decretando-se extinta a punibilidade pela decadência.(TJMG. Relator: Herculano Rodrigues. Data do acórdão: 20/11/2003).
 
APELAÇÃO - EXTORSÃO INDIRETA - AUSÊNCIA DE CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS DO TIPO PENAL - ABSOLVIÇÃO MANTIDA - RECURSO MINISTERIAL IMPROVIDO. O crime de extorsão indireta configura-se quando presente na conduta do agente o dolo específico exigido pelo tipo penal, ou seja, a consciência de que, ao exigir um cheque pós-datado como garantia de dívida, poderá vir a dar causa a um procedimento criminal contra a vítima. Ausente esse elemento, não há que se falar em crime. Ademais, o cheque dado em garantia de dívida, pós-datado, quando ausente provisão de fundos, não gera ilícito criminal, e sim mero inadimplemento contratual”. (TJMG. Relator: Vieira de Brito. Data do acórdão: 23/11/2004)    
 
Ressalte-se que, todavia, nada impede que o cheque caução seja utilizado apenas como meio para a prática do crime de estelionato previsto no caput do art. 171. Esse é o posicionamento que vem sendo adotado pela jurisprudência:
 
 “RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HABEAS CORPUS DENEGADO. ESTELIONATO. TRANCAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO CONFIGURADA. Recurso interposto contra decisão que denegou ordem de habeas corpus impetrado contra ato do Delegado de Polícia da 2ª DP de Bagé, que determinou a instauração de inquérito policial para apuração do delito de estelionato, em que figura como investigado o ora recorrente. Em que pese sustentável a existência de indícios de que a conduta investigada possa redundar no arquivamento do inquérito deflagrado, em face de os cheques firmados pelo indiciado serem pós-datados, tendo sido, em princípio, emitidos em caução, como garantia de negócio realizado entre as partes, não restando suficientemente esclarecidas as particularidades dos acontecimentos, inviável o reconhecimento, de plano, quando ainda sequer ouvida a vítima, da atipicidade da conduta. A discussão sobre ser o cheque pré-datado só se torna relevante no caso do delito previsto no art. 171, § 2º, VI do CP e quando da emissão do próprio correntista, não afastando, contudo, a configuração do crime de estelionato, na sua forma fundamental. Irrelevância do fato de os cheques terem sido emitidos pelo recorrente, na condição de representante legal da empresa titular da conta, sobretudo nessa fase de summaria cognitio, quando ainda não demonstradas as circunstâncias em que efetuado o negócio, de modo a afirmar que não houve eventual ingerência de parte do recorrente. Caso que, ademais, o ingresso, pela vítima, de ação de cobrança no âmbito cível, não impede a persecução penal, por se tratarem de esferas de responsabilidade distintas. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO IMPROVIDO”. (TJRS. Recurso em Sentido Estrito Nº 70014875298. Relator: Fabianne Breton Baisch, Julgado em 17/05/2006) 
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Comentários e Opiniões

1) Everton Bh (25/07/2009 às 13:34:36) IP: 189.83.150.4
Muito Bom
2) Preta (11/08/2009 às 21:22:59) IP: 189.59.108.198
tenho imoveis mobiliados pra alugar cempre peguei tres meses de aluguel como calçao mas em dinheiro no final do contrato acertamos isto e errado
3) Le (09/09/2009 às 09:18:45) IP: 200.135.253.110
MUITO BOAS AS INFORMAÇÕES VAI ACRESCENTAR MUITO AO MEU TRABALHO, TIREI VÁRIAS INFORMAÇÕES IMPORTANTES.
4) João Batista (10/09/2009 às 12:30:40) IP: 189.18.229.200
Doutor: Como credor, firmei uma confissão de dívida de R$ 15.000,00 com devedor para recebimento em 10/08/09. Na confissão consta a obrigação do devedor em me entregar um cheque como garantia do recebimento. Ocorre que passou a data do recebimento e não recebi. De má fé, o devedor entregou-me um cheque pré-datado para ser cobrado somente em 05/11/2009. -Tenho eu o direito em executar a confissão para receber? O cheque está preenchido e datado para 05/11/2009. Obrigado de momento.
5) Alberto R. C. Costa (01/11/2009 às 07:34:27) IP: 200.181.83.18
muito bom
6) Alessandro (07/11/2009 às 12:56:46) IP: 189.25.129.53
amigo tenho uma duvida eu quero alugar uma roupa porem eles pedem cheque cauçao como garantia, eu sei que para hospitais esta pratica esta proibida, mas gostaria de saber se as lojas podem continuar pedindo cheque cauçao e gostaria qe vc me enviasse a ei que permite a pratica dese cheque por gentileza mande um email para mim alemagrj@gmail.com
7) Flavio Steigleder (04/12/2009 às 10:04:20) IP: 201.21.90.111
Sou corretor de imóveis em Porto Alegre, alugo imóveis também, na maioria das vezes com caução em dinheiro, contudo recebi em cheque o que deveria ser em dinheiro e o cheque estava sem fundos, como devo proceder? já que o contrato exige o pagamento em dinheiro, não só da caução como também dos alugueres, aguardo resposta.Obrigado desde já pela atenção.
8) Patricia (22/12/2009 às 02:23:31) IP: 189.54.178.111
Muito útil e claro,. Obrigado
9) O autor não se identificou (20/01/2010 às 10:12:13) IP: 189.12.123.106
DEIXEI UM CHEQUE EM UMA CONCESSIONÁRIA DE CARROS USADOS COMO GARANTIA PRÁ SEGURAR O CARRO,POIS É EXIGÊNCIA DA MESMA.mUDEI DE IDEIA EM RELAÇÃO AO NEGÓCIO E TENTEI RESGATA-LO MAS ME DISSERAM QUE NÃO E Q ESTÃO AMPARADOS PELA LEI(FORAM 24 HORAS DPOIS).PODEM ME ORIENTAR?oBRIGADA
10) Tamiris (tamy_5maciel@hotmail.com) (28/01/2010 às 09:28:29) IP: 189.125.228.15
Gostaria de saber se é legal o hospital pedir um cheque caução de R$3.000,00 sendo que o quarto é R$ 850,00 e eu disse que pagaria a divida a vista...E obvio que apos a saida eles vão me cobrar bem mais so para ficar com o cheque.
11) Agra (31/01/2010 às 14:29:11) IP: 200.146.43.120
fiz uma reserva de uma carro o gerente da loja me garantio que se eu nao ficasse com o carro ele me entregava o cheque cauçao ate mesmo o carro que encomendei so vou comprar se eu vender o meu . quanto a proposta de reserva de carro foi da agencia citroen JOINVILLE. SC ,SE RESPONSABILIZANDO NA DEVOLUÇAO DO CHUEQUE CAUÇAO.
12) Diego Da Rocha Cunha (18/03/2010 às 13:17:01) IP: 189.72.150.99
o artigo é excelente, pois sanou diversas dúvidas que possuia em relação ao cheuqe e ao ilícito penal relativo ao mesmo.
13) Jonas (12/05/2010 às 16:54:32) IP: 200.161.73.251
Muito bom sanou algumas dúvidas, bem exemplificativo, boa didática.
14) Bruno (20/06/2010 às 22:08:10) IP: 187.36.155.36
Bastante útil o artigo publicado.
15) Pompeu (08/08/2010 às 20:30:58) IP: 187.45.85.117
CLARO OBJETIVO E SINTÉTICO.
16) Gerusa (23/08/2010 às 23:29:50) IP: 189.99.33.40
Esclarecedor. Parabéns ao autor.
17) Jorge (06/12/2010 às 10:03:49) IP: 170.66.1.236
Texto muito elucidativo acerca do cheque.
18) Cristiane (22/08/2011 às 15:58:05) IP: 189.90.180.180
bom,gostei mesmo
19) Cristiane (22/08/2011 às 15:58:38) IP: 189.90.180.180
muito bom
20) Marco (13/08/2013 às 22:43:36) IP: 201.79.78.236
Explicativo e exemplificativo.
21) Marlei (28/08/2013 às 19:59:28) IP: 177.18.30.210
O professor afirma que a nota promissória é uma ordem de pagamento. Paira uma dúvida: trata-se de ordem de pagamento ou promessa de pagamento...
22) Marcus (29/01/2014 às 22:38:35) IP: 177.40.70.107
Texto muito interessante.
23) Fabiola (16/09/2014 às 09:23:19) IP: 177.41.81.52
Tudo foi conforme aprendi em sala de aula
24) Joao (28/12/2015 às 19:31:41) IP: 179.191.94.114
Uma explanação clara sobre a diferença de cheque como ordem de pagamento à vista e sobre o cheque caução.


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