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ADOLESCENTE E A MEDIDA SOCIOEDUCATIVA APLICADA PELA PRÁTICA DE ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO TRÁFICO DE DROGAS (Lei n° 11.343/06)


Autoria:

Thaísa Cristine Marques Calil


Sou Advogada, formada em Direito pela Faculdade Vianna Júnior e em Filosofia pela UFJF. Pós graduada em Direito Público e em Ciências Penais e Pós graduanda em Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça pela UFES.

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Resumo:

Realizou-se um estudo amplo da abrangência e diferença de quando há a prática de crime de tráfico de drogas e quando há a prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas por adolescentes.

Texto enviado ao JurisWay em 07/05/2012.



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ADOLESCENTE E A MEDIDA SOCIOEDUCATIVA APLICADA PELA PRÁTICA DE ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO TRÁFICO DE DROGAS (Lei n° 11.343/06)

 

                    Thaísa Cristine Marques Calil

 

“Por vezes sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água no oceano. Mas o oceano seria menor se lhe faltasse uma gota”. Madre Tereza de Calcutá.

 

RESUMO

 Pesquisou-se a aplicação da Lei do tráfico de drogas (11.343/06) quando praticada por adolescente (entre doze e dezoito anos). Verifica-se que o adolescente quando apreendido cumpre Medida Socioeducativa em estabelecimento próprio, diferente do adulto que é direcionado ao sistema prisional.  Realizou-se um estudo amplo da abrangência e diferença de quando há a prática de crime de tráfico de drogas e quando há a prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas por adolescente. Nota-se que a problemática ora abordada é de suma importância visto que atualmente diversos questionamentos são levantados, inclusive, acerca da redução da maioridade penal tendo em vista que o tráfico de drogas vem sido praticado principalmente por adolescentes que são “usados” pelos adultos, sabendo estes que o cumprimento da Medida Socioeducativa não pode ultrapassar a três anos.

                       

Palavras-chave: adolescente, tráfico de drogas, medida socioeducativa, proteção.

 

LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS

MSE – Medida SocioEducativa

ACL – Adolescente em Conflito com a Lei

UNIS – UNidade de Internação Socioeducativa

UNIP – UNidade de Internação Provisória

UNAI – UNidade de Atendimento Inicial

UFI – UNidade Feminina de Internação

CSE – Centro SocioEducativo

IASES – Instituto de Atendimento Socioeducativo do Estado do Espírito Santo

ECRIAD – Estatuto da CRIança e do Adolescente

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

TJ - Tribunal de Justiça

INTRODUÇÃO

 

  O adolescente e a medida socioeducativa aplicada pela prática de ato infracional análogo ao tráfico de drogas” foi um tema escolhido devido à crença em ser bastante relevante e extremamente interessante e pouco estudado no Estado do Espírito Santo e até mesmo no Brasil.

Atualmente alguns seminários têm sido realizados e temas são abordados para discussão e solução de alguns problemas graves nas Unidades Socioeducativas de Internação, entretanto ainda são em números ínfimos diante da enorme necessidade de investimento na área ora abordada.

Tal pesquisa pode ser considerada como de grande funcionalidade para que a aplicação das Medidas Socioeducativas quando impostas pelo cometimento de ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, possa ser reavaliada antes de sua aplicação e que assim, olhando do lado correto do telescópio, o sistema de justiça consiga resolver essa problemática de forma que a Medida socioeducativa atinja os objetivos que todos procuram, qual seja: a paz na sociedade e ressocialização desses adolescentes que serão o futuro de nosso país.

Considera-se ainda ser um tema bastante original, pois muitas pessoas conhecem o lado da criminalidade e querem muito que isso acabe e não conhecem o lado do cumprimento da Medida Socioeducativa de Internação que nos casos de delitos como o tráfico de drogas, não surtem os efeitos desejados.

O adolescente que cometeu um ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, por muitas vezes (em praticamente 90% dos casos) não sabe que realmente está cometendo um “crime” e com a convivência com outros adolescentes que realmente têm que se submeter ao cumprimento de uma Medida Socioeducativa, se “contaminam” e muitas vezes saem da Instituição de Internação piores do que entraram, além de realmente inseridos na “vida do crime”.

A pesquisa realizou-se de forma a estudar a Lei n° 11343/06 (Lei de drogas), alguns aspectos do Estatuto da Criança e do Adolescente e a diferenciação da aplicação dessa lei supramencionada para os adultos e para os adolescentes.

Sendo assim, será possível conhecer o outro lado da moeda, visando uma ressocialização de fato a esses adolescentes que cometeram tal tipo de ato infracional. Cabendo ainda diagnosticar o que poderá ser feito para melhorar o Estado em que vivemos.

Salienta-se que as contribuições serão, além das supracitadas, o esclarecimento da população, bem como a vontade de contribuir das mesmas em projetos para os adolescentes que conflitaram com a lei (ato infracional – tráfico de drogas), visto que são necessárias cooperações de diversas áreas da sociedade para que o futuro de nossas gerações seja diferente das expectativas que infelizmente temos hoje.

Ainda que muitos ainda não tenham ideia da dimensão do que se trata o tema, algumas pessoas possuem uma consciência de que alguma coisa tem que ser feita para ajudar esses jovens que ainda não chegaram a cometer ato infracional de natureza grave.

Ocorre que algumas pessoas apesar de saberem o que está acontecendo com a nossa sociedade e nossos adolescentes, não possuem discernimento em saber exatamente como colaborar, uma vez que não conhecem a fundo o trabalho desenvolvido com esses adolescentes e o porquê do seu envolvimento com o tráfico de drogas, não sabem que seu discernimento é diferenciado por estarem em condição peculiar de desenvolvimento e não possuindo, diferentemente de nós, a capacidade de saber o que o ato praticado possa ocasionar para seu futuro, aliás, muitos nem sabem o significado de futuro.

Acredita-se poder colaborar bastante com ideias e experiências devido ao exercício da profissão desta Advogada, autora da monografia, tendo em vista a atuação como Assessora Jurídica em uma Unidade de Internação, ou seja, nessa área tão fascinante que é a socioeducação.

 

1. DOS PRINCÍPIOS NORTEADORES E DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

 

Inicialmente cabe-nos pincelar alguns pontos importantes para a compreensão do que vem a ser a Medida Socioeducativa, quais os tipos, locais de cumprimentos e objetivos, para então aprofundarmos no tema principal do presente trabalho.

As Medidas Socioeducativas estão previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal n° 8069 de 13 de julho de 1990.

O Estatuto da Criança e do Adolescente - Ecriad é um importante instrumento utilizado na defesa e materialização dos direitos. As garantias legais desse grupo, bem como dos direitos trabalhistas, garantias sociais e os direitos fundamentais de acesso à educação e aos serviços de saúde são elencados no referido Estatuto sob a concepção da proteção integral.

Por proteção integral podemos entender que os direitos e interesses das crianças e adolescentes (entre doze e dezoito anos) devem sobrepor-se a qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado, levando em conta a destinação social da lei e o respeito à condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

Todos os direitos amparados pela proteção integral das crianças e adolescentes são extremamente necessários e importantes para o desenvolvimento psíquico, físico e mental destes.

“A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe com a ideia de que sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento” [1].

 

Até poucos anos atrás, o nosso país adotava o Código de Menores e a Teoria da Situação Irregular. Em 1998, com a nossa Carta Magna, a Constituição Federal Brasileira, houve uma inovação com relação a proteção das crianças e adolescentes, sendo os mesmos passados a ser tratados como pessoas em especial condição de desenvolvimento, merecedoras da proteção integral do Estado, da família e da sociedade em geral.

Sendo assim, podemos entender que essa mudança de concepção de “situação irregular” para “pessoa em desenvolvimento que necessita de cuidados protetivos” marca a passagem da doutrina da situação irregular para a doutrina da proteção integral.

Alguns documentos construídos pela Organização das Nações Unidas – ONU são de suma importância para ampliação do âmbito da proteção integral. São eles: Declaração Universal dos Direitos da Criança, Regras de Beijing e a Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança.

Direcionando o estudo e aprofundamento do tema, serão abordadas as espécies de Medidas Socioeducativas aplicadas aos adolescentes em conflito com a Lei.

Cumpre-nos salientar que adolescentes não cumprem pena e sim Medidas Socioeducativas, tendo em vista que não cometem crimes e sim atos infracionais análogos a crimes especificados no Código Penal Brasileiro.

Sendo assim, podemos entender que não há punição, não tendo a Medida Socioeducativa a natureza de pena. Natureza de pena é para as pessoas que possuem discernimento e compreensão da ilicitude do ato. Os adolescentes, estando em desenvolvimento, não são considerados aptos a aprender a ilicitude de uma conduta praticada ao abrigo de um tipo penal permissivo.

 

2. DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

 

No Ecriad estão elencadas as Medidas Socioeducativas, em seu art. 112:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.

§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.

§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições”.

 

2.1 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE ADVERTÊNCIA

 

A Medida Socioeducativa de Advertência prevista no inciso I do supramencionado Art. 112, deve ser aplicada aos casos de menor gravidade, cometidos sem violência contra a pessoa ou grave ameaça.

É de suma importância ressaltar que sempre se deve atentar aos vetores de proporcionalidade e razoabilidade, imanente à aplicação do Direito.

Com a advertência, o adolescente pode verificar que a conseqüência do seu ato foi negativa e se continuar a reiterar prática semelhares poderá cumprir uma Medida Socioeducativa mais gravosa.

 

2.2 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO

 

Tal modalidade de medida socioeducativa está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art. 116: “Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma compense o prejuízo da vítima”.

As características principais dessa modalidade de medida socioeducativa, segundo Luciano Alves Rossato[2] e outros, são:

- Prova da autoria e da materialidade da infração;

- Gerenciamento realizado pelo próprio Poder Judiciário e,

- Reparado o dano, extingue-se a medida.

 

2.3 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

 

Uma das Medidas mais eficazes é a prestação de serviços à comunidade já que se adéqua ao período em que o adolescente não se encontra na escola. O período máximo para cumprimento dessa modalidade de Medida Socioeducativa é de 08 (oito) horas semanais e pelo período máximo de 06 (seis) meses.

 

2.4 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA

 

A Medida Socioeducativa elencada no inciso IV do Art. 112 do ECRIAD, a Liberdade Assistida, é considerada uma Medida branda mas bastante eficaz quando o adolescente em conflito com a lei não é considerado perigoso.

No Estado do Espírito Santo, várias cidades possuem convênios com o Estado para cumprimento da Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida. Sendo assim, a execução dessa modalidade de Medida se dá através de um orientador que localiza-se na comarca de origem do adolescente e de preferência deve contar com colaboração de agentes com formação em assistência social e psicólogos.

As funções do orientador estão elencadas no Art. 119, incisos I, II, III e IV do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Ao contrário da Medida de prestação de serviços à comunidade, onde o prazo máximo para cumprimento é de 06 (seis) meses, no caso da Liberdade Assistida, o prazo mínimo de cumprimento é de 06 (seis) meses.

Segundo o doutrinador João Batista Saraiva: “Não há o que falar em Direito Penal Juvenil ou em modelo de responsabilidade juvenil, ou em efetividade do Estatuto da Criança e do Adolescente, se persistir a carência de programas especializados para atendimento de adolescentes em medidas socioeducativas em meio aberto”.[3]

 

2.5 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE SEMILIBERDADE

 

Outra modalidade de medida socioeducativa, prevista no Art. 120 do Ecriad, é a medida socioeducativa de semiliberdade: O regime semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como uma forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial”.

A semiliberdade é espécie de medida restritiva de liberdade, por meio da qual o adolescente estará “afastado do convívio familiar e da comunidade de origem, ao restringir sua liberdade, sem, no entanto privá-lo de seu direito de ir e vir.[4]

Nesta modalidade de medida socioeducativa, se faz necessária e obrigatória a escolarização, profissionalização, como previsto no §1° do artigo supramencionado.

A medida socioeducativa de semiliberdade não possui prazo determinado, sendo assim, o Juiz não pode terminar o tempo a ser cumprido, devendo reavaliar periodicamente para então expedir o Alvará de Liberação.

É importante ressaltar que como todas as outras medidas socioeducativas, a medida socioeducativa de semiliberdade deve se atentar aos princípios da brevidade, ou seja, deve durar o menor tempo possível, imprescindível para o processo de ressocialização.

A parte final do caput do Art. 120 do Estatuto da Criança e do Adolescente diz que é “possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial”. Acontece que o Superior Tribunal de Justiça, vem decidindo que “é permitido ao Juiz proceder a essa vedação, até como forma de controlar e fiscalizar a reinserção do adolescente no convívio comunitário”.[5]

No entanto, o Supremo Tribunal Federal não concorda com tal posicionamento, limitando tal hipótese em casos excepcionais, conforme julgado no Habeas Corpus conforme transcrição:

Habeas Corpus – Estatuto da Criança e do Adolescente – Medidas Socioeducativa de Semiliberdade – Limite máximo de duração – Restrição à realização de atividades externas e imposição de condições relativas ao bom comportamento do paciente para visitação à família – Impossibilidade – Artigo 227 da Constituição do Brasil. 1. Ressalvadas as hipóteses arroladas nos artigos 121, §3° e 122 §1°, o Estatuto da Criança e do Adolescente não estipula limite máximo de duração da medida socioeducativa de semiliberdade. Resulta daí que, por remissão à aplicação do dispositivo concernente à internação, o limite temporal da semiliberdade coincide com a data em que o menor infrator completar vinte e um anos [art. 120, §2°]. 2. O art. 120 da Lei 8.069/90 garante a realização de atividades externas independentemente de autorização judicial. 3. O Estado tem o dever de assegurar à criança e ao adolescente o direito à convivência familiar [art. 227, caput, da Constituição do Brasil]. O objetivo maior da Lei n. 8069/90 é a proteção integral à criança e ao adolescente, aí compreendida a participação na vida familiar e comunitária. 4. Restrições a essas garantias somente são possíveis em situações extremas, decretadas com cautela em decisões fundamentadas, o que no caso não se dá. Ordem parcialmente concedida para permitir ao paciente a realização de atividades externas e visitas à família sem imposição de qualquer condição pelo Juízo da Vara da Infância e Juventude (HC 98518, rel. Min. Eros Grau, 2ª T, j.25.05.2010, DJe 110)”. (grifo nosso).

 

Cabe-nos ressaltar que a medida socioeducativa de semiliberdade pode ser aplicada em dois momentos: 1° - como regime de transição – logo após a internação e 2° - como medida autônoma.

A execução da medida de semiliberdade em nosso Estado ainda está engatinhando, visto que só possuímos um estabelecimento destinado ao cumprimento da referida medida que é a Casa Marista de Semiliberdade que é parceira do Instituto de Atendimento Socioeducativo do Estado do Espírito Santo - IASES e atualmente possui 09 (nove) socioeducandos internados. Desses 09 (nove) socioeducandos, apenas 01 (um) socioeducando cumpre medida por atos infracionais análogos ao que preceituam os artigos 33 e 35 da Lei 11343/06. Com relação aos outros socioeducandos, 05 (cinco) cumprem medida socioeducativa por ato infracional análogo ao art. 157, 02 (dois) pela prática de ato infracional análogo ao que preceitua o art. 155 e 01 (um) socioeducando cumpre medida pela prática de ato infracional análogo ao que preceitua o art. 121, §2°, II e IV c/c art. 14, todos do Código Penal Brasileiro. A capacidade da Casa Marista de Semiliberdade é para 12 (doze) socioeducandos.

 

2.6 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê três modalidades de Internação, sendo elas:

 

- Internação provisória – decretada no processo de conhecimento, antes da sentença. O prazo para cumprimento de tal modalidade de internação é de no máximo 45 (quarenta e cinco) dias. A previsão para internação provisória está no art. 108 do Ecriad.

 

- Internação com tempo indeterminado – decretada no processo de conhecimento, em sentença. O prazo máximo é de 03 (três) anos. A previsão para tal tipo de internação está no art. 122, incisos I e II do Ecriad.

 

- Internação com prazo determinado – decretada no processo de execução em virtude do descumprimento de medida anteriormente imposta. Tal medida tem o tempo máximo de cumprimento que é de 90 (noventa) dias. A previsão para tal tipo de internação está no art. 122, inciso III do Ecriad.

 

É de suma importância ressaltar que em todas as modalidades acima descritas, há a necessidade de inserção do socioeducando em atividades pedagógicas.

A medida socioeducativa de internação está prevista no Art. 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente – Ecriad: “A internação constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”.

Os princípios supracitados decorrem de expressa disposição Constitucional, no art. 227, inciso V.

Nessa senda, o doutrinador Antônio Carlos Gomes da Costa[6], diz:

 

“Três são os princípios que condicionam a aplicação da medida privativa de liberdade: o princípio da brevidade, enquanto limite cronológico; o princípio da excepcionalidade, enquanto limite lógico no processo decisório acerca de sua aplicação; e o princípio do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, enquanto limite ontológico, a ser considerado na decisão e na implantação da medida”.

 

 

A modalidade de medida socioeducativa chamada de INTERNAÇÃO é considerada a menos recomendada só sendo mesmo imposta quando comprovada a necessidade e o não cabimento de imposição de outras medidas socioeducativas mais brandas.

Acontece que a medida de internação é uma mal, algumas vezes necessário, mas por diversas vezes desnecessário, visto que “a privação de liberdade traz em si um dano, dado o caráter de “contaminação” inevitavelmente presente em qualquer espaço de internação coletiva”, segundo o doutrinador João Batista Costa Saraiva[7].

A medida de internação só poderá ser aplicada em conformidade com o Art. 122 do Ecriad:

“Art. 122- A medida de internação só poderá ser aplicada quando:

I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;

II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves;

III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta”.

 

Como se observa, a medida é reservada para os casos mais graves. Há que se considerar que, como já referido, a ameaça simples e a violência leve contra a pessoa não estão abarcadas pelo inciso I. No inciso II, devemos atentar que não basta o cometimento de infrações reiteradamente, É preciso que sejam infrações graves (homicídio, extorsão mediante seqüestro, roubo, latrocínio, etc..). No caso do inciso III, não podemos extrair a ilação de que o descumprimento de uma medida branda, imposta por ato de pouca gravidade, possa levar, ipso facto, à internação. Os demais aspectos da medida serão tratados quando da tratativa da aplicação concreta.

A título de complemento das informações transcritas, ressaltamos que a medida socioeducativa não é condicionada à maioridade civil estabelecida pelo Código Civil Brasileiro, ou seja, o adolescente pode cumprir Medida Socioeducativa até que complete 21 (vinte e um) anos. Cabe-nos atentar acerca da idade com quem foi cometido o ato infracional, este sim deverá ter sido cometido antes que o mesmo tenha completado 18 (dezoito) anos.

Atualmente em nosso Estado, existem 04 (quatro) Unidades de Internação Socioeducativa e um Centro Socioeducativo (CSE), sendo:

 

- Unidade de Internação Socioeducativa (UNIS): destinada aos adolescentes entre 12 (doze) e 16 (dezesseis) anos, localizada em Cariacica sede, em Cariacica/ES. Os adolescentes internados nesta Unidade cumprem Medidas Socioeducativas de Internação e Internação Sanção. Cabe-nos salientar que para que os socioeducandos possam cumprir a Medida Socioeducativa é necessária a autorização expressa da Central de Execuções de Medidas Socioeducativas – CEMESE. Sem esta autorização o socioeducando deverá ficar aguardando sua transferência em uma das Unidades Provisórias.

 

- Unidade de Internação Socioeducativa Metropolitana (UNIMETRO): destinada ao acautelamento de adolescentes em conflito com a lei (sexo masculino) com idades entre 17 (dezessete) anos e 21 (vinte e um) anos, localizada em Xuri, Vila Velha/ES.

 

- Centro Socioeducativo (CSE): localizado em Tucum, Cariacica/ES. O Centro acautela socioeducandos entre 15 (quinze) e 21 (vinte e um) anos (sexo masculino). O Centro Socioeducativo possui uma parceria com o IASES e abriga até 60 (sessenta) socioeducandos para cumprimento da medida socioeducativa de internação.

 

Ressalta-se que os socioeducandos que se encontram em cumprimento de Medida nestas Unidades são os que possuem familiares na região da grande Vitória.

 

- Unidade de Internação do Sul do Estado (UNISUL): localizada em Cachoeiro de Itapemirim/ES.  Esta Unidade é destinada para o acautelamento de socioeducandos (sexo masculino) em cumprimento de Medida Socioeducativa de Internação provisória, Internação sanção e Internação com tempo indeterminado, oriundos do sul do Estado do Espírito Santo. Cabe salientar que esta Unidade possui internos com idades entre 12 (doze) e 21 (vinte e um) anos.

 

Unidade de Internação do Norte do Estado (UNINORTE): localizada em Linhares/ES. onde acautela socioeducandos entre 12 (doze) e 21 (vinte e um) anos (sexo masculino) oriundos do Norte do Estado do Espírito Santo.

 

A Unidade Feminina de Internação (UFI) localiza-se dentro do complexo da UNIS em Cariacica/ES. e acautela socioeducandas com idade entre 12 (doze) e 21 (vinte e um) anos. A UFI é uma Unidade destinada ao acautelamento das modalidades de internação, internação sanção e internação provisória.

 

No total, encontram-se internados em cumprimento de Medida de Internação por tempo indeterminado, Internação Sanção e Semiliberdade em torno de 350 (trezentos e cinquenta) adolescentes.

 

3. DA APLICABILIDADE DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO

 

 Conforme brevemente exposto no tópico acerca da Medida Socioeducativa de Internação, existem princípios condicionantes para aplicação da mesma, como o princípio da brevidade, da excepcionalidade e o princípio do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

Não se pode negar que a internação em alguns casos é inevitável, entretanto, em muitos outros a medida é aplicada totalmente em desconformidade com os princípios norteadores.

Segundo o autor João Batista Saraiva “Não se pode olvidar, em nenhuma circunstância, que a privação de liberdade traz em si um dano, dado o caráter de “contaminação” inevitavelmente presente em qualquer espaço de internação coletiva”.[8]

Segundo o mesmo autor da transcrição acima:

 

Se fosse possível estabelecer uma tabela de comprometimento da conduta de um adolescente em uma escala de um a dez, não seria exagerado afirmar que, a “melhor Unidade de Internação”, com a “melhor proposta pedagógica”, estará apta a devolver um adolescente ao convício social em um grau de comprometimento cinco, haja vista as inevitáveis seqüelas que resultam de um convívio com outros adolescentes autores de condutas infracionais graves e elevado índice de comprometimento. Logo, submeter um adolescente que esteja em um nível de comprometimento menor do que este suposto grau cinco seria, do ponto de vista da utilidade pedagógica da medida, uma alternativa negativa, pois na melhor hipótese estaria apto a sair da unidade de privação de liberdade neste grau cinco”.[9] 


Diante disso, entende-se que a Medida Socioeducativa de Internação deve ser aplicada com a máxima atenção pelos Juízes, para que não haja um prejuízo ao adolescente e não o seu retorno par a sociedade em pior estado de comprometimento do que o originou a sua entrada na Unidade de Internação.

O Art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECRIAD), diz que a Medida de Internação só poderá ser aplicada quando:

 

“A medida de internação só poderá ser aplicada quando:

 

I- tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;

 

II- por reiteração no cometimento de outras infrações graves;

III – por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

 

§ 1°. O prazo de internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser superior a 3 (três) meses.

 

§ 2°. Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outro medida adequada”.                                                       

O artigo em tela elenca as possibilidades para determinação judicial de cumprimento de Medida Socioeducativa de Internação. No inciso I, onde diz que a infração cometida com violência ou grave ameaça à pessoa é aquele em que deve ser levado em conta o próprio tipo penal, por exemplo: lesão corporal grave, estupro, roubo, etc.

Mesmo sendo atos cometidos com suposta violência ou grave ameaça à pessoa, o TJ do Ceará já decidiu de forma contrária, como no HC abaixo transcrito:

 

“Habeas Corpus – Estatuto da Criança e do Adolescente – Ato infracional equiparado ao delito de roubo qualificado- Estudo multidisciplinar do caso (art. 186 do ECA) – Possibilidade do magistrado indeferir sua realização – Medida Socioeducativa – Internação – Gravidade abstrata – Ausência de fundamentação concreta – Apelação – Efeito suspensivo – Revogação do inc. VI do art. 198 do ECA – Ordem concedida em parte, inclusive de ofício. (...) 4. A medida de internação foi imposta com base na gravidade abstrata do ato infracional e considerações genéricas sobre a possibilidade de a segregação contribuir para a recuperação do menor, revelando-se evidente o constrangimento a que está submetido o paciente. (...) 7. Habeas Corpus concedido em parte, inclusive de ofício, para anular a decisão de primeiro grau que aplicou ao paciente a medida de internação por prazo indeterminado e determinar que outra seja proferida, com aplicação de compatível medida socioeducativa, assegurando ao paciente o direito de aguardar a nova medida socioeducativa em liberdade assistida”. (HC 112.799/SP, 6ª T., j. 16.03.2010, rel. Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado pelo TJ/CE), DJe 05.04.2010).

 

 São considerados atos infracionais que não cabem a imposição de Medida de Internação, o furto, estelionato, tráfico ilícito de entorpecentes, dentre outros.

Com relação ao inciso II do artigo supramencionado, pode-se entender por “reiteração no cometimento de outras infrações graves” que não se pode confundir com reincidência.

A análise, segundo Luciano Alves Rossato[10] e outros, deve ser feita casuisticamente.

O item III do artigo em tela também é aplicado pelos Juízes, na maioria dos casos, de forma incorreta. O adolescente quando do descumprimento da Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida ou Prestação de serviços à comunidade, deixa de cumprir a Medida imposta por diversos fatores, inclusive, ameaças a sua integridade física por membros de “gangues” rivais que também cumprem tal medida no local determinado pelo órgão jurisdicional.

Sendo assim, por medo, deixam de comparecer ao local determinado para cumprimento da medida imposta e por falta de informação não cientificam o Juizado de origem o descumprimento JUSTIFICADO.

Entretanto, em vez de o Juiz intimar para que o adolescente compareça ao Juizado para esclarecer o porquê do descumprimento, determina que seja expedido MBA (Mandado de Busca e Apreensão) e o adolescente quando da captura é diretamente encaminhado para uma Unidade de Internação para cumprir a Medida Socioeducativa de Internação sanção.

 

“Se, porém, a entidade comunicar que o adolescente não vem cumprindo a medida, deverá o Juiz promover os meios necessários para que possa ouvi-lo sobre o alegado descumprimento e, se for o caso, modificar a medida por outra mais adequada, podendo até, se preenchidos os requisitos específicos, aplicar a medida de internação sanção (internação com prazo determinado” [11].

 

 

A oitiva de não foi realizada para que o adolescente possa justificar seu descumprimento. Nesse sentido:

 

Habeas Corpus. Penal. Estatuto da Criança e do Adolescente. Descumprimento das condições impostas. Reiteração na evasão. Regressão do menor para a medida socioeducativa de internação. Ausência de oitiva prévia. Nulidade não configurada, impossibilidade de localização do paciente. Endereço desatualizado. Ordem denegada. 1. A jurisprudência deste Tribunal é uníssona no sentido de que a regressão do adolescente, sem sua prévia oitiva, implica em violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 2. Conforme consignado pela Corte de origem, concedeu-se ao paciente a garantia processual de ser ouvido, não tendo sido, entretanto, efetivada em razão de alteração de seu endereço do distrito competente sem a devida comunicação ao Juízo Menorista. 3. Ademais, há informação nos autos de que o menor encontra-se evadido, em local incerto e não sabido. 4. Ordem denegada”. (HC 119.578/RJ, 5ª T., j. 04.02.2010, rel. Min. Jorge Mussi, DJe 15.03.2010. Grifo nosso.

 

 

 

Ademais, as entidades demoram muito para efetuar a comunicação de descumprimento das medidas socioeducativas e com isso os socioeducandos que ficam sem acompanhamento cometem novos atos infracionais que geralmente são mais gravosos do que os originários das primeiras medidas impostas.

Devido a não realização de audiência de justificação e demora na comunicação do não cumprimento da medida anteriormente imposta ao Juizado de origem, hoje, só a Unidade de Internação Socioeducativa - UNIS possui 50 % (cinquenta) por cento de seus internos em cumprimento de Medida Socioeducativa de Internação sanção.

 

3.1 DIREITOS E DEVERES DOS SOCIOEDUCANDOS EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO

 

Conforme preceitua o Art. 124 do Estatuto da Criança e do Adolescente, são direitos dos socioeducandos em cumprimento de Medida Socioeducativa – privados de liberdade:

Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes:

I - entrevistar-se pessoalmente com o representante do Ministério Público;

II - peticionar diretamente a qualquer autoridade;

III - avistar-se reservadamente com seu defensor;

IV - ser informado de sua situação processual, sempre que solicitada;

V - ser tratado com respeito e dignidade;

VI - permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável;

VII - receber visitas, ao menos, semanalmente;

VIII - corresponder-se com seus familiares e amigos;

IX - ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal;

X - habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade;

XI - receber escolarização e profissionalização;

obs.dji.grau.2: Art. 246, Infrações Administrativas - ECA

XII - realizar atividades culturais, esportivas e de lazer:

XIII - ter acesso aos meios de comunicação social;

XIV - receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde que assim o deseje;

XV - manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade;

XVI - receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade.

§ 1º Em nenhum caso haverá incomunicabilidade.

§ 2º A autoridade judiciária poderá suspender temporariamente a visita, inclusive de pais ou responsável, se existirem motivos sérios e fundados de sua prejudicialidade aos interesses do adolescente”.

Em cumprimento ao que preceitua o artigo em tela, a Instituição responsável pela execução das Medidas Socioeducativas em nosso Estado, o IASES, vem cumprindo com todos os seus deveres. Infelizmente, em alguns aspectos o Estado peca no cumprimento dos direitos dos socioeducandos, como o inciso III que não é cumprido pela Defensoria Pública do Estado. É fato que o número de Defensores Públicos é bastante inferior ao necessário, contudo, os direitos das crianças e adolescentes têm prioridade constitucionalmente constituída.

O atendimento jurídico aos socioeducandos é realizado por meio de Assessores Jurídicos das Unidades, que prestam todas as informações necessárias para que o socioeducando esteja ciente de toda sua situação processual.

Conforme pesquisa realizada na Unidade de Internação Socioeducativa – UNIS, dos 37 (trinta e sete) internos, apenas 09 (nove) sabem qual a função da Defensoria Pública e que existe um Defensor Público responsável pela defesa técnica dos mesmos.

No mês de agosto de 2011 foram realizados 50 (cinquenta) atendimentos aos 37 (trinta e sete) socioeducandos em cumprimento de Medida Socioeducativa na UNIS. Desses 37 (trinta e sete) socioeducandos nenhum deles foi atendido individualmente pelo Defensor Público Estadual para ciência de sua situação processual.

É de suma importância ressaltar que a defesa técnica é de responsabilidade da Defensoria Pública, quando da inexistência de advogado particular constituído, e somente este poderá ter acesso aos autos processuais. Sendo assim, muitas informações de grande valia para os socioeducandos não são repassadas para os Assessores Jurídicos das Unidades de Internação para que possam ser transmitidas aos adolescentes. Diante desse fato, além da previsão legal, a entrevista pessoal e reservada com o Defensor, é de suma importância para o processo socioeducativo que se encontra o adolescente privado de liberdade.

 

4. APLICAÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO DO COMETIMENTO DE ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS.

 

Conforme preceitua o Jurista Mário Luiz Ramidoff[12], “Não raro o Poder Público tem se utilizado abusiva e indevidamente de medidas punitivas, em vez de utilizar uma adequada e diferenciada política de informação, assistência ou de recurso a medidas de natureza distinta”.

Com essa citação, pode-se extrair a ideia de que a imposição de cumprimento de Medidas Socioeducativas que privam a liberdade vem sendo, em muitos casos, em desconformidade com a previsão legal.

A Medida Socioeducativa, em nenhuma hipótese, pode ser considerada como uma punição. Ela tem o caráter pedagógico e ressocializador e não punitivo.

A natureza jurídica educativo-pedagógica das Medidas socioeducativas é ressaltada pela confirmação normativa do art.104, do Estatuto da Criança e do Adolescente e da própria determinação constitucional assecuratória fundamental – art. 228.[13]

De acordo com o doutrinador João Batista Saraiva:

 

“As medidas privativas de liberdade (semiliberdade e internamento) são somente aplicáveis diante de circunstâncias efetivamente graves, enquanto mecanismos de defesa social, observando-se com rigor o estabelecido nos incs. I a III do art. 122, devendo reservar-se para os casos de ato infracional praticado com violência à pessoa ou grave ameaça ou reiteração de atos infracionais graves”. (SARAIVA, 2008, p. 172)

 

A deliberação pela modalidade de internação com privação de liberdade, mesmo que parcial, fora das hipóteses previstas no art. 122 do ECRIAD, viola a lei.

Nos casos em que exista violação, deve o ato ser anulado, como a anulação da sentença pela apelação ora transcrita e demais transcrições:

 

“ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Medida Socioeducativa de internação em estabelecimento educacional. Aplicação fora das hipóteses previstas pelo art. 122, incisos, da Lei 8069/90, e com prazo determinado. Inadmissibilidade. Sentença nula, por violação literal de disposição de lei. Apelação provida.” (Ap. 2767-7, TJPR, Conselho da Magistratura, Rel. Des. Carlos Hoffmann, vu 18/12/95).

 

“HABEAS CORPUS. INFRAÇÃO PRATICADA SEM VIOLÊNCIA À PESSOA. INTERNAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. ALEGAÇÃO DE IMPREVISÃOLEGAL. ART. 122 DO ECA. ORDEM CONCEDIDA. Diante da previsão taxativa do art.22, do Estatuto da Criança e do Adolescente, a aplicação de medida ali não constante afigura-se constrangimento ilegal a ser desde logo afastado, respondo o status libertatis do menor. Precedentes (STJ – HC4025/SP).

 

“MENOR – Ato infracional – Internação – Inadmissibilidade – Aplicação da Lei Federal n.8069/90 em seu artigo 122, I, II e III – Caso não abrangido pelas hipóteses taxativas para a aplicação de internação – Substituição pelo regime de semiliberdade – Recurso parcialmente provido. (TJSP – Relator: Dirceu de Mello – Apelação Cível n. 6.450-0 – Campinas – 17.03.94).

 

“MENOR – Medida socioeducativa – Internação – Conversão em medida mais branda – Admissibilidade – Ato infracional que não caracterizou por nenhuma circunstância do artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente – Aplicação da liberdade assistida como medida adequada – Recurso provido. (TJSP – Relator: Yussef Cahali – Apelação Cível n. 19.318-0 – Presidente Epitácio – 14.07.94).

 

É necessário ao aplicador da Lei a observância dos requisitos ensejadores da aplicação da Medida com privação de liberdade. Sendo assim, deve o tipo penal ser identificado como com a presença de grave ameaça ou violência à pessoa para a possibilidade de ser decretada a Medida Socioeducativa de Internação ou de Semiliberdade.

“Atos infracionais equiparados ao tráfico ilícito de sustância entorpecente e associação para o tráfico, não configuram violência ou grave ameaça à pessoa, estando ausente a hipótese do inciso I, artigo 122, da Lei 8069/90. A medida socioeducativa de internação

Segundo SARAIVA: “A violência ou a grave ameaça devem integrar o tipo penal enquanto elementar”.[14]

Diante disso, não há o que se falar em violência ou grave ameaça no tipo penal do tráfico de entorpecentes, cujo, embora crime hediondo, não contém em suas elementares essas características.

Com relação à violência à pessoa podemos dizer ser uma atitude do ser humano que causará dano a outra pessoa e com relação à grave ameaça pode-se extrair a ideia de uma promessa de causar um mal sério e verossímil.

O doutrinador João Batista Costa Saraiva, diz que:

 

“A imposição do adolescente de medida socioeducativa de internação em caso de tráfico, enquanto conduta isolada viola preceito expresso da norma e atenta contra as liberdades individuais nos termos do permissivo legal em vigor. Essa alternativa far-se-á somente possível mediante alteração legislativa. O Estatuto veda essa possibilidade”. (SARAIVA, 2008. p. 176).

 

Conforme alguns julgados, atos infracionais desse tipo, não configuram violência ou grave ameaça à pessoa:

 

“Atos infracionais equiparados ao tráfico ilícito de substância entorpecente e associação para tráfico, não configuram violência ou grave ameaça à pessoa, estando ausente a hipótese do inciso I, artigo 122, da Lei 8069/90. A medida socioeducativa de internação só pode ser aplicada quando presente uma das circunstâncias do rol (taxativo) do artigo 122 do ECA. O princípio da excepcionalidade, previsto na medida socioeducativa de internação, acentua a necessidade de aplicação de outras medidas mais brandas antes de serem aplicadas as mais gravosas.” STJ, HC-SP 051911, rel. Min. Paulo Medina, DJU 18.04.2006.

 

 

“É incabível medida de internação de adolescente para além das hipóteses elencadas, de modo taxativo, no art. 122 da Lei 8069/90. A prática do ato infracional equiparado a tráfico de entorpecentes não implica grave ameaça ou violência contra a pessoa e, portanto, é incapaz de ensejar internação. Writ concedido para cassar a decisão impugnada e determinar que o Juízo competente aplique ao adolescente medida outra que entender de direito”. HC n° 29.861/SP, 6ª Turma, rel. Min. Paulo Medina, j.16.09.03, v.u., DJU 06.10.03, p.332.

 

“CRIMINAL. HC. ECA. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DETERMINAÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. MEDIDA MAIS GRAVOSA FUNDAMENTADA NA GRAVIDADE DO DELITO E NA SEGURANÇA PESSOAL DO ADOLESCENTE. DECISÃO COM FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. AFRONTA AOS OBJETIVOS DO SISTEMA. PECULIARIDADES DO MENOR E DA INFRAÇÃO A SEREM CONSIDERADAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA. I. A medida extrema de internação só está autorizada nas hipóteses previstas taxativamente nos incisos do art. 122 do ECA,pois a segregação do menor é medida de exceção, devendo ser aplicada e mantida somente quando evidenciada sua necessidade, em observância ao espírito do r. Estatuto, que visa à reintegração do menor à sociedade. II. A simples alusão à gravidade do fato aplicada e ao argumento de que a segregação do menor tem por objetivo a sua segurança pessoal não é suficiente para motivar a privação total da sua liberdade, até mesmo pela própria excepcionalidade da medida, restando caracterizada a afronta aos objetivos do sistema. III. Ressalva quanto às peculiaridades da hipótese, que não podem ser desconsideradas: paciente de 14 anos, sem registro de antecedentes, que praticou ato infracional equiparado a porte de entorpecentes – cometida sem grave ameaça ou violência à pessoa, e que se encontra preso desde outubro de 2001.IV. Ordem concedida par anular a decisão de 1° grau, a fim de que outra seja proferida, com a devida fundamentação, permitindo-se que o paciente aguarde tal desfecho em liberdade assistida”. (STJ – HC 23796/SP).

 

“HABEAS CORPUS – ato infracional. Busca nulidade da sentença por meio de habeas corpus. Sustentação da não aplicação da medida de internação, tendo em vista que o tráfico de drogas não é crime de grave ameaça PI violência à pessoa. A internação é medida excepcional ao caso em tela, tendo em vista que o fato não se revestiu de violência ou grave ameaça à pessoa, afastando-se assim o artigo 122, I do ECA e o adolescente é primário não se inserindo assim no inciso II do mesmo artigo. Ordem concedida para anular a sentença no que diz respeito a medida de internação aplicada, devendo o Juiz de primeiro grau aplicar outra medida em meio aberto (HABEAS CORPUS TJ/SP N° 126.168-0/5-00,rel. Des. Eduardo Gouvêa, 23/01/2006).

 

“HABEAS CORPUS – Ao infracional. Sustentação de não aplicação da medida de internação por ser o jovem primário, o ato infracional de tráfico de entorpecentes não implicar em violência ou grave ameaça a pessoa e não se enquadrar nos casos de internação previstos no art. 122 do ECA. Ordem concedida para anular parcialmente a sentença no que diz respeito a medida aplicada, que deverá ser a de liberdade assistida pelo prazo necessário a ressocialização do jovem”. 9HABEAS CORPUS TJ/SP N° 129.570-0/1-00. Rel. Des. Eduardo Gouvêa,20/03/2007).

 

 

Diversos julgados nesse mesmo sentido podem ser citados, tais como: HC 62001/SP, rel. Min Arnaldo Esteves, j. 17.05.2007. HC 61226/SP, rel. Min. Laurita Vaz, j. 19.09.2006. HC 61034/SP, rel. Min Félix Fisher, j. 06.02.2007.

Cabe-nos salientar novamente que há diferença entre reincidência e reiteração, sendo aquela a realização de novo ato infracional após trânsito em julgado de decisão anterior. Com relação à reiteração pode-se extrair a ideia de suposição de prática de pelo menos três condutas.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende que “somente ocorre a reiteração de conduta infracional pelo adolescente, quando, no mínimo, são praticadas três ou mais condutas infracionais” (STJ, HC 27273/RJ, 5ª Turma. Relator: Ministra LAURITA VAZ. J. 10/06/2003. DJ 04/08/2003, p.347).

 

“O tema relativo ao adolescente envolvido em tráfico de entorpecente se constitui em matéria que reclama outro tratamento legislativo na medida em que o Estatuto não prevê essa conduta (do ponto de vista de sua objetividade, art. 122) como passível de internação, circunstância que, enquanto mecanismo de defesa social, presentes as condições subjetivas (art. 122, §2°), eventualmente deveria ser acionado, máxime enquanto se perceba que o crime organizado lançou definitivamente seus tentáculos utilizando-se de adolescentes no tráfico de entorpecentes”. (SARAIVA, 2008, p.245).

 

 

A medida socioeducativa de internação deve ser aplicada somente em caso excepcionais, ou seja, como última alternativa, não devendo ser aplicada nos casos de cometimento de atos infracionais análogos ao que preceituam os artigos 33 e 35 do Código Penal Brasileiro.

Tal princípio da excepcionalidade da privação da liberdade se constitui em um fundamento do ECRIAD, que combate a anterior cultura “menorista”, pródiga em internatos e carentes programas socioeducativos de meio aberto.

Para muitos, o não cabimento da Medida Socioeducativa de Internação para adolescentes que cometeram ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, significa uma verdadeira impunidade.

Tais pensamentos são infundados visto que primeiramente ao há punição para adolescentes que cometem atos infracionais e sim responsabilização e tal responsabilização não precisa ser somente aplicada via Medida de Internação. Existem outras Medidas mais cabíveis e principalmente verificar a necessidade de direcionamento de políticas públicas voltadas para a classe social que mais se envolve no tráfico de drogas, que é a classe baixa. Com

A privação de liberdade é um mal. Mal que até poderá ser necessário diante da incapacidade humana de desenvolver outra alternativa[15].

 

STJ – HC 9262 – “Constituindo a medida de internação verdadeira restrição ao status libertatis do adolescente, deve sujeitar-se aos princípios da brevidade e da excepcionalidade, só sendo recomendável em casos de comprovada necessidade e quando desaconselhadas medidas menos gravosas”.

 

Em uma pesquisa realizada na Unidade de Internação Socioeducativa – UNIS, 95% (noventa e cinco) por cento das famílias dos adolescentes internados, possuem média salarial de 01 (um) salário mínimo.

A adolescência é marcada por várias características, estilos de comportamentos e posicionamentos perante fatos cotidianos[16]:

“O adolescente nesta etapa vive no seu mundo interior. Para conhecer a própria personalidade, as suas ideias e ideais, compara-se com o mundo dos outros.

1.2. Dá impressão de apatia devido a preocupação repousada e reflexiva pelos próprios estados anímicos.

1.3. Esta interiorização abarca também as esferas intelectuais, filosóficas e estéticas, enchendo a sua vida com estas teorias.

1.4. As características mais próprias deste período, são:

a) Crescente consciência e conhecimento do “eu”.

b) Nascimento da independência.

c) Adaptação progressiva aos núcleos sociais da família, escola e comunidade em geral.

1.5. O espirito de independência cresce rapidamente, mas é imaturo ainda e manifesta-se com brusquidão e agressividade.

1.6. Independência e liberdade são a sua constante exigência.

1.7. Opõe-se, portanto, a que o tenham sujeito ou lhe perguntem sobre os seus assuntos, projectos, amigos com quem anda, ou a que se imiscuam na sua vida privada.

1.8. É capaz de albergar sentimentos de rancor, vingança e violência, embora de modo esporádico e sejam pouco duradouros.

1.9. Manifesta uma grande preocupação por pormenores e gestos que observa na pessoa a quem imita e idealiza.

1.10. Interessa-lhe e procura conhecer a própria personalidade, mas é mais observador em relação à dos outros, tanto dentro como fora do núcleo familiar.

1.11. Aos 16 anos, o adolescente é já um pré-adulto, possui uma mente mais segura, porque está melhor ordenada e controlada.

1.12. Manifesta uma maior confiança em si mesmo e uma autonomia mais arraigada.

1.13. Em geral, domina perfeitamente as próprias emoções, possuindo um maior equilíbrio.

1.14. Valoriza mais os motivos pessoais dos outros, sejam colegas ou adultos, e pensa mais neles, pois apercebe-se de que o segredo da sua própria felicidade se encontra relacionada com a vida dos outros.

1.15. Sente-se mais livre e independente do que aos 15 anos, por isso já não o preocupa tanto esta exigência.

2. Conduta social em relação com a vida escolar

2.1. Aos 15 anos, em geral, manifestam uma atitude hostil para com a escola, vão contra as exigências e normas rígidas.

2.2. Revoltam-se às vezes contra a autoridade, em geral, não individualmente mas em grupo.

2.3. Entre os 15 e os 16 anos, começam-se a interessar novamente pelo estudo sempre que for interessante e vital para a sua experiência o conteúdo instrutivo, como por exemplo a Religião, as Ciências Sociais, etc.

2.4. Integram-se na comunidade escolar, participando nas atividades que a escola oferece.

2.5. Às vezes a vida escolar converte-se em válvula de escape, em meio para afrouxar as ataduras familiares.

2.6. No âmbito escolar, põem-se de manifesto certas diferenças individuais, acadêmicas e sociais, relacionadas com a capacidade de liderança, o talento e as atitudes intelectuais.

3. Atitudes das pessoas implicadas na sua educação

3.1. É necessária uma atitude de abertura e de conhecimento das fases desta idade, para evitar atitudes inadequadas para com os filhos, o endurecimento da autoridade e o não reconhecer ao adolescente qualquer tipo do direito. Isto, unido à conduta do próprio adolescente, provoca choques violentos.

3.2. Deve-se aceitar a emancipação progressiva dos filhos, e incluso favorecê-la, para os ajudar a serem livres e a manifestarem-se como tais.

3.3. A existência da crise tem a sua origem num problema afectivo, por isso temos de favorecer no adolescente a criação de vínculos familiares, ambientais, … (amor a Deus, à Pátria …).

3.4. Devem sentir-se realizados numa atividade ou numa coisa, aspirando sempre a algo, isto é, devem ter um ideal, fé. Também é importante o relacionarem-se com a família, o grupo, etc…

3.5. Convém saber que estas crises passam com o tempo e que tudo volta a normalizar-se, o que não significa que se deixe de atuar e não se procure orientar positivamente o desenvolvimento dessas crises de modo a que não deixem conflitos na personalidade do jovem.

3.6. É muito inseguro, procura a orientação e o conselho de pessoas alheias à sua vida familiar; assim, os educadores encontram um campo propício para uma ação de formação mais profunda.

3.7. Precisam de uma mão compreensiva para os ajudar no esforço de esclarecer e definir os seus pensamentos e estados anímicos, coisa que é difícil para ele e o faz cair em estados depressivos.

3.8. Às vezes convém tratá-lo com a mesma frieza ou indiferença com que se comporta, para que repare na sua própria atitude.

3.9. As formas mais extremas de desafio exigem um guia habilidoso, bem como prudência nas medidas de controle mais estritas que se pretendam utilizar.

3.10. Temos de passar a ser “observadores participantes” na vida dos adolescentes.

3.11. Devemos ajudá-los a encontrar a forma de se expressarem nas diversas atividades, e procurar que o ensino seja estimulante e interessante, senão podem cair no desleixo e na apatia perante o estudo.

3.12. Recordando as tensões e inquietações da nossa própria adolescência, estaremos em condições de ajudar os jovens e de sermos mais compreensivos para com eles.

3.13. Devemos inculcar-lhes o respeito pelos pontos de vista alheios e o sentido da realidade”. (Grifo nosso).

 

 

O psicanalista Erik Erikson acredita que “a maior tarefa da adolescência seria o desenvolvimento da identidade e denominou a maior crise da adolescência como sendo a crise da identidade, ocorrendo nesta fase da vida para que o jovem pudesse estabelecer a diretriz que nortearia seus passos na vida adulta”. (ATKINSON, 2002) [17].

Nessa senda podemos entender que nessa etapa da vida, os adolescentes tendem ao uso indevido e abusivo de diversos tipos de drogas, desde o álcool até de drogas consideradas “mais pesadas”.

O uso abusivo de álcool, cigarro (drogas lícitas), maconha, cocaína, crack, ecstasy e outros são problemas graves de saúde pública que trazem conseqüências pessoais e sociais, como exemplo: o envolvimento com o tráfico de drogas.

Na fase da adolescência é mais dificultoso para o indivíduo aceitar orientações, visto que está experimentando a possibilidade de ser adulto.

 

“A adolescência é um momento de diferenciação em que "naturalmente" afasta-se da família e adere ao seu grupo de iguais. Se esse grupo estiver experimentalmente usando drogas, o pressiona a usar também. Ao entrar em contato com drogas nesse período de maior vulnerabilidade, expõe-se também a muitos riscos. O encontro do adolescente com a droga é um fenômeno muito mais freqüente do que se pensa e, por sua complexidade, difícil de ser abordado”.[18]

 

  Normalmente o adolescente começa a se envolver com a venda de entorpecentes para poder manter seu vício. Está aí mais um motivo para a não determinação de Medida Socioeducativa de Internação no caso de ato infracional análogo ao tráfico de drogas visto que o problema é mais com a falta de políticas públicas direcionadas à prevenção do uso indevido de drogas do que com uma “ameaça do adolescente à sociedade”.

Dos adolescentes em cumprimento de Medida Socioeducativa de Internação na Unidade de Internação Socioeducativa – UNIS pela conduta análoga ao que preceitua o art. 33 da lei 11.343/06 (tráfico de drogas), 100% (cem) por cento praticaram o referido ato para sustento do vício e para ter condições de comprar roupas “de marca”.

Um dos adolescentes interno da UNIS relatou que “cheguei até a roubar, mas não me “pegaram”, para poder comprar meu pó. Eu vi minha irmã morrer e meu pai morrer. Ninguém me ajudou, não teve nenhuma “Assistente” para perguntar pra minha mãe se a gente tinha o que comer. E não tínhamos. Era melhor enfiar a cara no pó que eu ficava doidão e esquecia dos problemas. Minha mãe bebe todo dia”.

Outro adolescente disse que “comecei a traficar para poder ajudar minha família que passava fome e ficava dependendo das esmolas dos outros. Aí passei a usar os produtos para poder ficar acordado direto e faturar mais”.

É de suma importância ressaltar que as Unidades de Internação não possuem meios para tratar a dependência química em si, por mais que existam atendimentos técnicos multidisciplinares, entretanto a maioria dos casos desse tipo de dependência é necessário que seja realizada a internação ambulatorial e intervenções sistemáticas direcionadas a cura desse mal.

Outro dado importante que deveria ser alvo das políticas públicas é acerca da evasão escolar. Se a cada evasão houvesse a investigação devida, poderiam ser direcionados focos de atendimentos para solução desse grave problema.

90% (noventa por cento) dos adolescentes em cumprimento de Medida Socioeducativa de Internação encontravam-se evadidos da escola e a maioria cursava no máximo a 5ª série.

O adolescente sem escolaridade, com renda familiar precária, o mesmo vê no tráfico a oportunidade de “crescer” na vida.

 

“Os baixos níveis de escolaridade e desempenho acadêmico da população infanto-juvenil, então, associados aos altos índices de miserabilidade dos núcleos familiares em que se encontra inserido considerável número de crianças e adolescentes, no Brasil, aumentam consideravelmente as possibilidades de vitimização dessas pessoas que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento, principalmente, quando desenvolvem comportamentos relacionados à “atividade sexual, violência, uso ilegal de drogas e desemprego”. (RAMIDOFF, 2008, p. 83 – CUNNINGHAM, Wendy (Coord.). Op. Cit.).

 

“É importante ressaltar que os aspectos econômicos políticos e sociais não são estanques e muito menos puros. Ou seja, não podem ser considerados isolados ou mesmo destacadamente um dos outros, pois, na verdade, imbricam-se num verdadeiro mix conceitual para que se possa efetivamente contemplar as complexas condições elementares da existência humana, quais sejam: a infância e a juventude. Por mais grave que seja a falta ou a carência econômico-financeira pessoal e familiar desses seres humanos que se encontram na condição peculiar de desenvolvimento, é cero que continuam a sustentar a titularidade de direitos fundamentais pertinentes à condição jurídica de “sujeitos de direito”. (RAMIDOFF, 2008, p. 83).

 

 

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Diante de toda exposição, acredita-se que os pincelamentos acerca do tema em tela serviu de norte para operadores do direito no sentido de ampliar o leque na observância dos fatos em si para então aplicar e manter a Medida Socioeducativa cabível ao caso.

As Medidas Socioeducativas têm que ser aplicadas após um estudo de caso conciso, além de serem direcionadas para que realmente atinjam o objetivo maior, que é a ressocialização.

Como se pôde verificar no decorrer deste trabalho, não é necessário que o adolescente fique privado de sua liberdade para poder conviver em sociedade em paz, sem se envolver em conflitos.

O que são necessários são investimentos nas políticas públicas para que a pobreza, carência na educação, saneamento básico e outros déficits não sejam pontos facilitadores para a introdução do adolescente no tráfico de drogas.

Além disso, a prevenção ao uso indevido de drogas deve ser o “carro chefe” na luta que se atravessa hoje no que tange à violência instaurada.

Os adolescentes são mais facilmente manipulados devido a serem pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, sendo presas fáceis para traficantes desumanos.

A Medida Socioeducativa de Internação deve ser breve e em casos excepcionais e aplicadas em conformidade com os preceitos do art. 122 do ECRIAD para que não façam com que os adolescentes saiam das Unidades de Internação piores do que entraram.

É necessário que todos os operadores do direito se conscientizem da problemática em que vivemos e da necessidade emergencial de união para salvar a juventude do nosso país.

 

6. REFERÊNCIAS

 

 

ATKINSON, Rita L.; trad. Daniel Bueno. – 13 ed. – Porto Alegre: Artmed, 2002.

 

BALLONE. GJ - Depressão na Adolescência - in. PsiqWeb Psiquiatria Geral, Internet,              2001 - disponível em < http://sites.uol.com.br/gballone/infantil/adoelesc2.html> revisto em 2003. Acessado em 31/08/2011 às 15:20.

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. RT Legislação.

 

BRASIL, Maria Geysa. Os desafios da intervenção psicológica na promoção de     uma nova cultura de atendimento do adolescente em conflito com a lei. IN: Temas de Psicologia Jurídica. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1999. 

 

CUNNINGHAM, Wendy (Coord.). Jovens em situação de risco no Brasil. Brasília: Unidade de Gerenciamento do Brasil, do Banco Mundial, 2007. V. I. (Achados relevantes para as políticas públicas – Policy Briefing). V. II (Relatório Técnico).

 

CURY; Garrido; Marçura. Estatuto da Criança e do Adolescente anotado. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002.

 

CURY, M.; Amaral e Silva, A.; Mendez, E.G. (coords.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, Comentários jurídicos e Sociais. 2ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1996.

 

HUTZ, Cláudio Simon. Situações de risco e vulnerabilidade na infância e na adolescência: aspectos teóricos e estratégias de intervenção. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002.

 

http://educacao.aaldeia.net/psicologia-adolescencia/. Acesso em 08/09/2011 às 14:34.

 

http://artigos.psicologado.com/psicologia-geral/desenvolvimento-humano/ uso- de-drogas-e-violenciainfancia-na-adolescencia. Acesso em 03/09/2011 às 19:45.

 

Institute of Medicine. Treating drug problems: a study of the evolution, effectiveness, and financing of public and private drug treatment systems. Report prepared by the Institute of Medicine, Committee for the Substance Abuse Coverage Study, Division of Health Care Services. Washington (DC): National Academy Press; 1990.

 

RAMIDOFF. Mário Luiz. Lições de Direito da Criança e do Adolescente. 2. ed. rev. e atual. Curitiba: Ed. Juruá, 2008, p. 105.

 

ROSSATO, Luciano Alves e outros. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011.

 

SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011.

 

SARAIVA, João Batista Costa. “Adolescente em conflito com a Lei: da indiferença à proteção integral. Uma abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil”. 3ªed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.  

 

SHECAIRA, Sergio Salomão. Sistemas e Garantias e Direito Penal Juvenil. São Paulo: RT, 2008.

 

SPOSATO, Karyna Batista, op. Cit., p.127.

 

ANEXOS

 

Conflitos da Adolescência[19]

 

Hoje em dia é comum pais se orgulharem ao ver seu filhinho/a lidando perfeitamente bem com o computador, com o vídeo cassete, com aparelho de DVD e outras parafernálias da tecnologia, muitas vezes quando eles próprios não sabem fazê-lo ou fazê-lo tão bem.

Essa admiração pela versatilidade tecnológica das crianças é, às vezes, acompanhada de hipóteses familiares (notadamente de avós orgulhosos) sobre "as crianças de hoje serem mais inteligentes e espertas que antes". Na realidade, o que tem acontecido é que as crianças de hoje deixam de ser subordinadas na medida em que detém mais saber ou experiência, deixam de submeter-se à supervisão dos mais velhos, como foi durante muitas eras.

O conflito surge quando a criança se percebe frente a posições contraditórias. Ela é, ao mesmo tempo, aquela que não sabe por não ser adulta ainda, portanto, tendo que obedecer ao protocolo cultural de freqüentar a escola, cursos cada vez mais sofisticados e esportes que deixaram há muito o aspecto apenas lúdico e, por outro lado, ela já não pode portar-se puerilmente. Não pode ser criança por saber mais que os próprios pais a lidar, portanto por ter responsabilidades, com os apetrechos da vida moderna tecnológica.

Assim sendo, os adolescentes se encontram imersos num mundo de ambigüidades e contradições. Entre as pulsões para "abraçar o mundo", passando por cima de tudo e de todos, e momentos de depressão e frustração, o adolescente se ressente da falta de liberdade e autonomia dos adultos e, ao mesmo tempo, não pode usufruir da irresponsabilidade da infância.

Durante a puberdade, geralmente, a fase inicial das mudanças no aspecto físico é contrária aos modelos de estética ideais. A garota gostaria de já se ver com seios fartos, ancas roliças, etc., e o menino desejaria ter a musculatura desejável, barba, etc. Essa distonia entre o corpo e a aspiração pode desencadear sérias dificuldades de adaptação, uma baixa auto-estima, uma falta de aceitação pessoal, resultando em problemas depressivos, anoréticos, obsessivo-compulsivos.

As novas relações sociais do adolescente, notadamente com os pais e com o grupo de iguais também podem ser e forte fonte de ansiedade, confusão e sentir que ninguém o entende. Paralelamente, sobrevém a angústia de estar só e de ser incapaz de decidir corretamente seu futuro.

Os conflitos tendem a agravar-se muitíssimo mais se este jovem estiver inserido numa família que também está em crise, seja por separação dos pais, por violência doméstica, alcoolismo de um dos pais, sérias dificuldades econômicas, doença física ou morte.

Os conflitos tendem a agravar-se muitíssimo mais se este jovem estiver inserido numa família que também está em crise, seja por separação dos pais, por violência doméstica, alcoolismo de um dos pais, sérias dificuldades econômicas, doença física ou morte.

 

Por que os adolescentes usam drogas[20]?

 

Vários são as hipóteses para este questionamento, não há um motivo isolado, determinante. Alguns estudos apontam que esse período em que o jovem começa a definir amizades acaba tornando-se mais facilmente manipulável, pelos grupos ou pela mídia e então, há forte risco de contato com substâncias químicas, drogas lícitas ou ilícitas; os grupos costumam pressionar o jovem para aceitar iniciar o consumo no intuito de que “seja um dos seus”. Muitos crêem erroneamente que seu uso oferecerá algum tipo de status no meio de convivência.

A mídia fortalece bem esta idéia ao apresentar de forma glamorosa as campanhas publicitárias explícitas ou subliminares sobre o consumo destas substâncias. O acesso fácil, aliado à curiosidade são algumas das explicações para esse fato.

Mas o ponto mais importante seria a ausência da estrutura familiar. Se a criança cresce num ambiente emocionalmente estruturado, mesmo que ocorram os conflitos característicos da fase de transição, as amizades não oferecerão tantos riscos. Ao contrário, na inexistência de vínculo afetivo, ambiente familiar problemático onde a falta de interesse por parte dos pais é explicitamente sentida pelo jovem, aí então, fragilizado, este corre grande risco de se envolver com drogas para aplacar o sentimento de inferioridade, de desamor, de descuido.

O uso de drogas é para muitos, uma forma de denunciar o abandono, a necessidade de mudanças. É a válvula de escape para suas frustrações.
Atualmente torna-se cada vez mais fácil a obtenção de drogas em qualquer idade. Maconha, cigarro e álcool são as mais utilizadas, embora o crack também esteja agora também fazendo parte deste contexto, sendo inclusive, misturado à maconha para que a dependência ocorra mais rapidamente.

As drogas modificam as funções cerebrais, atenuando o sofrimento psíquico e proporcionando certo prazer e são essas sensações que os usuários buscam a cada novo contato. Mas os resultados destas “viagens” vão mais além do perceptível; o consumo constante prejudica o funcionamento neuronal, modificando o desempenho das funções cerebrais e aos poucos os sinais do desgaste provocado deliberadamente passam a ser percebidos de forma mais evidentes.

Portanto, no intuito de atenuar problemas específicos como insegurança, stress, baixa auto estima, sentimentos de rejeição e outras dificuldades, o jovem percorre este difícil caminho para o vício.



[1] CURY; Garrido; Marçura. Estatuto da Criança e do Adolescente anotado. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002, p. 21.

 

 

[2]  ROSSATO, Luciano Alves e outros. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 335.

[3] SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 340.

[4] SPOSATO, Karyna Batista,op. Cit., p.127.

[5] ROSSATO, Luciano Alves e outros. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 340.

 

[6] Cury, M.; Amaral e Silva, A.; Mendez, E.G. (coords.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, Comentários jurídicos e Sociais, 2ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1996.

[7] SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 340.

 

[8] SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 172.

[9] SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 172.

[10] ROSSATO, Luciano Alves e outros. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 344.

[11] ROSSATO, Luciano Alves e outros. Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 337.

 

 

[12] RAMIDOFF. Mário Luiz. Lições de Direito da Criança e do Adolescente. 2. ed. rev. e atual. Curitiba: Ed. Juruá, 2008, p. 105.

[13] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05.10.1998.31. Ed. São Paulo: Saraiva, 2003. (Coleção Saraiva de legislação).

[14] SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 176.

 

[15] SARAIVA. João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal Juvenil. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 173.

 

[17] ATKINSON, Rita L.; trad. Daniel Bueno. – 13 ed. – Porto Alegre: Artmed, 2002.

[18] Institute of Medicine. Treating drug problems: a study of the evolution, effectiveness, and financing of public and private drug treatment systems. Report prepared by the Institute of Medicine, Committee for the Substance Abuse Coverage Study, Division of Health Care Services. Washington (DC): National Academy Press; 1990.

[19] Ballone GJ - Depressão na Adolescência - in. PsiqWeb Psiquiatria Geral, Internet, 2001 - disponível em                 < http://sites.uol.com.br/gballone/infantil/adoelesc2.html> revisto em 2003. Acessado em 31/08/2011 às 15:20.

 

 

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