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Dos legados


Autoria:

Mariana Silveira Chaves


Estudante de Direito na Universidade Estadual de Montes Claros Estagiária na Delegacia especializada de Atendimento à Mulher em 2015 Estagiária na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em 2017

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Resumo:

O presente trabalho tem por objetivo apresentar uma breve explanação sobre o tema dos legados no ordenamento jurídico brasileiro, explicitando alguns conceitos, características, espécies, a forma de pagamento, seus efeitos e sua caducidade.

Texto enviado ao JurisWay em 22/02/2018.

Última edição/atualização em 26/02/2018.



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INTRODUÇÃO

O legado tem resquícios da Lei das XII Tábuas, no qual era possível testar de forma quase ilimitada, de maneira que seu patrimônio poderia ser disposto de forma integral por meio de legados (CRETELLA, 2000). Era próprio do Direito Romano a divisão de quatro espécies de legatum: per praeceptionem, per damnationem, per vindicationem e sinendi modo, que foram unificadas, com objetivo de limitar a possibilidade de testar, e com várias adaptações e alterações, chegaram em um patamar objetivo e limitado.

A Roma Clássica trouxe consigo o entendimento que o legado era uma espécie de doação deixada pelo de cujus, sendo facultado ao testador destinar um ou mais bens do seu patrimônio a alguém, sendo ele herdeiro ou não.

Neste contexto, legado é a disposição testamentária a título singular, pela qual o testador deixa a pessoa estranha, ou não, à sucessão legítima, um ou mais bens individualizados (DINIZ, 2012). Portanto, tem-se por legado uma deixa testamentária determinada dentro do acervo transmitido pelo de cujus, tendo como exemplo determinado automóvel, imóvel específico, referida joia, etc. Assemelha-se com a doação, no entanto, esta advém de um ato bilateral e ocorre entre vivos, e aquele só produz efeitos com o evento morte.

Já herança compreende a sucessão legal ou testamentária, do patrimônio do de cujus, incidindo na totalidade ou numa quota parte deles, sucedendo, os herdeiros, em seus direitos, obrigações e até mesmo em seus débitos, desde que não sejam superiores às forças da herança (DINIZ, 2012).

O Código Civil (CC) regula a parte dos legados em seus arts. 1.912 a 1.940, em um só capítulo, dividido em três seções: “Disposições gerais”, “Dos efeitos dos legados e do seu pagamento” e “Da caducidade dos legados”.

CARACTERÍSTICAS

Carlos Roberto Gonçalves (2012, p. 263), aduz que o legado é o meio pelo qual o de cujus cumpri seus deveres sociais premiando os amigos e parentes pelo carinho e afeto recebido, contribuindo para instituições de caridade, recompensando serviços, contribuindo para educação do povo, impedindo que jovens dignos da sua estima tomem na vida caminho errado e distribuindo esmolas, para qualquer pessoa, seja ela parente ou não, natural ou jurídica, simples ou empresária.

Para Maria Helena Diniz (2012) o legado requer a presença de três pessoas: a) o legante, que é o testador, quem outorga o legado; b) o legatário, que adquire o direito ao legado, no entanto o beneficiário não precisa, necessariamente, ser pessoa diversa do herdeiro, mas se a mesma pessoa for constituída legatário e herdeiro será denominada de prelegatário ou legatário precípuo, recebendo o prelegado além dos bens que constituem sua herança; c) o onerado é sobre quem recai o ônus do legado ou a quem compete prestar o legado. Segundo Diniz (2012), seria qualquer pessoa que suceda a título universal o autor da herança, em contrapartida para Gonçalves (2012) o ônus poderá recair sobre o herdeiro ou sobre o legatário.

Importante ressaltar que o legatário deve estar expresso no testamento, caso contrário não considerará constituído.

O herdeiro representa o defunto para efeitos patrimoniais, mas o legatário não, exceto quando a herança for insolvável, ou distribuída, por inteiro, em legados válidos, ou quando a obrigação de atender ao passivo lhe é imposta pelo testador explicitamente (GONÇALVES, 2012, p. 263).

Se houver mais de um beneficiário sobre o mesmo objeto, eles se denominam colegatários. Se a um legatário é imposta a entrega de outro legado, de sua propriedade, a este se denomina sublegado, e sublegatário, à pessoa a que o bem se destina.

      OBJETO

O testador tem ampla liberdade para testar, devendo ser respeitada sua autonomia da vontade, podendo testar todo o seu patrimônio caso não haja nenhum herdeiro.

Pode ser objeto do legado coisa móvel e imóvel, bens corpóreos (imóveis, móveis, semoventes) e incorpóreos (ações, direitos de crédito, ao usufruto), os fungíveis e infungíveis, existentes e futuros, e até mesmo os frutos, abranger ou não acessórios, pertencente ou não ao testador ou herdeiro, podendo ainda, incidir em prestações de fazer ou de não fazer algo, desde que observado os requisitos existentes no Código Civil vigente (art. 104), sendo o objeto lícito, possível, economicamente apreciável, determinado ou determinável e suscetível de alienação (DINIZ, 2012, p. 349).

Ao contrário do herdeiro, o legatário não segue o princípio da saisine (CC, art. 1784), pois o ingresso na posse do objeto ocorre com a abertura da sucessão, devendo reclamar a coisa legada ao herdeiro.

MODO DE INSTITUIÇÃO

O legado pode ser puro e simples, condicional, a termo, modal ou subcausa. Quando for puro e simples, produzirá seus efeitos independentemente de qualquer fato. O condicional tem seus efeitos subordinados a evento futuro e incerto, desde que não seja captatório, caso em que será nulo o legado (art. 1900, I e 1923).

Será a termo, quando sua eficácia estiver limitada no tempo, a um evento futuro e certo, aperfeiçoando-se ou extinguindo-se com o advento do prazo fixado pelo testador (art.1921). O modal ocorre quando o testador gravar o legado com encargo ou obrigação do legatário, podendo este aceitar ou não, mas aceitando o bem, aceita também o encargo, rejeitando o encargo, rejeita o bem. Por último, há o subcausa ou por certa causa, quando houver algum motivo no passado que motivou o testador a instituí-lo, e ele o justifica (DINIZ, 2012).

ESPÉCIES QUANTO AO OBJETO

1-      Legado de Coisa Alheia

O Código Civil em seu artigo 1.912 aduz:

Art. 1912. É ineficaz o legado de coisa certa que não pertença ao testador no momento da abertura da sucessão.

No entanto, há quatro possibilidades de ressalvas. A primeira exceção é quando a coisa certa legada, embora não fosse de propriedade do testador no momento do testamento, é adquirida antes do evento morte, “retroagindo” a data do testamento, compondo os bens da herança ao tempo do falecimento, proporcionando ao legado eficácia, respeitando o supracitado artigo, pois o bem pertencerá ao testador no momento da abertura da sucessão (GONÇALVES, 2012).

A segunda exceção é quando o disponente, expressamente, determinar que a coisa alheia seja adquirida pelo herdeiro para ser entregue ao legatário, sendo um exemplo de disposição modal, impondo ao herdeiro o ônus de adquirir o bem (DINIZ, 2012).

A terceira ressalva está prevista no art. 1.913, ocorrendo quando o testador ordenar que o herdeiro, ou legatário, entregue coisa (sublegado) de sua propriedade a outrem (sublegatário), não cumprindo, entender-se-á que houve renuncia à herança ou ao legado. O herdeiro ou legatário que cumprir a disposição testamentária, entregando coisa de sua propriedade a outrem, terá direito de “regresso contra os coerdeiros, pela quota de cada um, salvo se o contrário expressamente dispôs o testador” (CC, art. 1.935). Deve-se ressaltar que o testador não pode impor encargo ou obrigação, previsto no art. 1.913, a herdeiro necessário quanto a legítima deste, pois a quota do herdeiro reservatório é inatingível.

A quarta e última exceção ocorre quando o legado for de coisa genérica ou que se determine pelo gênero, o qual será cumprido, ainda que tal coisa não exista entre os bens deixados, pois o testamenteiro se torna responsável por adquiri-lo até o limite do espólio, podendo este escolher, não precisando ser o melhor, nem o pior.

2- Legado de Coisa Comum

Se a coisa legada for comum, pertencendo em parte ao testador, ao herdeiro ou ao legatário, só quanto a essa parte valerá o legado, conforme explicitado no art. 1.914 (CC). A parte que não for do disponente, nulo será o mesmo, por versar sobre bem alheio. A parte que versar sobre coisa alheia poderá contar com as exceções citadas acima, para que torne válido o legado.

Maria Helena Diniz (2012, p. 352) expõe sobre a validade de legado de coisa certa, feito por cônjuge casado pelo regime da comunhão universal de bens, utilizando-se do entendimento de Agostinho Alvim, o qual conclui que:

(...) a) se a coisa legada, na partilha, vier a ser atribuída ao consorte sobrevivente, a pedido dele, como é de seu direito, o legado terá versado sobre bem alheio, impondo-se-lhe, assim, a nulidade; b) se o cônjuge supérstite não reclamar que seja imputada na sua meação a coisa legada, válida será a disposição testamentária, devendo, então, ser cumprida (DINIZ, 2012).

3- Legado de Coisa Singularizada

Outra espécie de legado, quanto ao seu objeto, é o legado de coisa singularizada, pelo qual, o testador determinará o gênero, a espécie e o próprio bem ou coisa legada.

O testador deverá indicar as suas características, singularizando-a, individualizando-a dentre todas as coisas que existam no mesmo gênero, só terá efeito e eficácia, se o bem for encontrado ou pertencer ao de cujus (DINIZ, 2012).

 Só valerá o legado se a coisa singularizada for encontrada e pertencer ao testador ao tempo da abertura da sucessão.  Salienta-se também que, se a coisa legada existir entre os bens do testador em quantidade inferior à do legado, este será eficaz apenas quanto à parte existente do bem (CC, art. 1.916). No entanto, se ela não mais existir no patrimônio, por perecimento ou alienação, será atribuída ineficácia ao legado. (DINIZ, 2012)

 

4- Legado de Universalidade

É o chamado de Legado de Universalidade quando o testador lega uma espécie inteira de bens existentes em seu acervo hereditário.

 No entendimento de Diniz (2012), se o bem legado for pertinente a uma espécie por inteiro, abarcará todas as peças encontradas entre os pertences do sucedido, como por exemplo, os livros existentes em sua biblioteca.

5- Legado de Coisa Localizada

Outra espécie de legado, no que concerne ao objeto, é o de coisa localizada. Ocorre quando, ao invés do testador indicar o bem, menciona, em sua cédula testamentária, o lugar no qual os bens se encontram.

Após a morte do testador para que o legado tenha eficácia, como preceitua o artigo 1.917 do Código Civil, o bem deve ser encontrado no lugar determinado onde o testador deixou expresso, salvo se, o bem foi removido transitoriamente.

 Se a remoção foi de caráter definitivo o legado será ineficaz.  No entanto, se retirado por outrem ou por terceiro a título transitório, mesmo após a morte do testador, será eficaz os seus efeitos (DINIZ, 2012).

6- Legado de Crédito

O legado que tem por objeto um título de crédito é transferido pelo testador ao legatário (CC, art. 1.918, §1º), que alcançará a quantia do crédito existente na abertura da sucessão, mais os juros vencidos desde a morte do testador, a menos que haja declaração em contrário neste sentido.

Trata-se de um título de crédito possuído pelo testador o qual terceira pessoa lhe deve, que será transferido ao legatário. Não há necessidade de o devedor concordar com a transferência da titularidade do credor, porque, o que lhe compete, é adimplir a obrigação que assumiu com o ato jurídico. O espólio não responderá pela exigibilidade do crédito ou mesmo pela solvência ou insolvência do devedor.

O legado de crédito tem por objeto um título de crédito do qual é devedor terceira pessoa, que é transferido pelo testador ao legatário, e que, entretanto, somente valerá até a concorrente quantia do crédito ao tempo da abertura da sucessão (DINIZ, 2012).

O crédito poderá ser representado por um título executivo, como nota promissória ou cheque, deverá o herdeiro entregá-lo ao legatário, como modo de cumprimento da cédula testamentária. Com a entrega do título, o legatário efetuará a cobrança do crédito.

Não obstante, em tal modalidade de legado, o legatário terá direito aos juros vencidos desde a morte do testador, ressalvados a possibilidade do testamento conter disposição em sentido contrário.

Sendo legado o crédito, estarão abrangidos todos os seus acessórios, tais como juros, multa e garantias, incidindo a regra pela qual o acessório segue o principal (TARTUCE, 2010).

7- Legado de Quitação de Dívida

Outra espécie de legado, no que concerne ao objeto, é o de quitação de dívida (legatum liberationis), previsto no artigo 1.918 do Código Civil. O devedor é o legatário e seu credor é o testador, que perdoa a dívida por intermédio de seu testamento, que funciona como instrumento de exoneração.

Observa-se quando o testador, na condição de credor do legatário, deixa-lhe como legado, em cédula testamentária, a quitação de suas dívidas. Opera-se então, como se o testador recebesse o pagamento, no entanto, não abrange dívidas posteriores a feitura do testamento. Se ao tempo da abertura do testamento o legatário nada dever, caduca-se o legado, tornando-o ineficaz quanto aos seus efeitos (VENOSA, 2010).

8- Legado de Alimento

A definição legal de legado de alimentos é encontrada no capítulo do direito das sucessões, no artigo 1.920 do Código Civil, o qual preceitua: “O legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor”.

É um legado de prestações periódicas. A prevalência deve ser da vontade do testador que, interpretada, pode ensejar que o legado de alimentos seja amplo ou restrito do que o expresso no artigo supramencionado.

 Não havendo tal distinção, poderá o testador instituir em favor do legatário o denominado legado de alimentos, isto é, valores considerados como indispensáveis à subsistência do legatário.

Além da vontade do testador, devem-se levar em conta as forças da herança para a fixação do valor do legado de alimentos, inclusive, se o testador não dispôs sobre o quantum. A periodicidade, o termo e a condição, dependerão da vontade do autor da herança. O legado de alimentos constituirá ônus real se for expressamente vinculado a um imóvel, podendo o juiz, no silêncio do testador, apontar um imóvel para produzir os alimentos.

Respectivamente, vale salientar segundo entendimento de Diniz (2012), que os alimentos:

(...) poderão ser legados in natura, determinando o autor da herança que se forneça ao legatário hospedagem, ou que lhe sejam entregues gêneros necessários à sua subsistência, ou em dinheiro, cuja prestação deverá ser realizada em determinados períodos (DINIZ, 2012).

Por ter caráter de subsistência, o legado de alimentos insere-se entre os bens impenhoráveis sendo, no entanto, penhoráveis se o testador fixar um rendimento ou um pagamento periódico ao legatário, rotulando-o de alimentos, mas o beneficiário tiver plenas condições de subsistência. Conclui-se que não é concebível o pagamento de alimentos sem a necessidade destes. 

Os alimentos são irrenunciáveis e intransferíveis, conforme a natureza das prestações alimentícias em geral (DINIZ, 2012).

9- Legado de Usufruto

A disposição sobre o legado de usufruto que traz o Código Civil encontra-se no artigo 1.921: “O legado de usufruto, sem fixação de tempo, entende-se deixado ao legatário por toda a sua vida”. 

Não obstante, vale ressaltar que usufruto é o direito real conferido a determinada pessoa de retirar, em caráter temporário, de coisa alheia, os frutos e utilidades que ela produz, sem alterar-lhe a substância. Assim, constata-se que o usufruto não se configura como espécie de limitação ao direito de propriedade, mas sim à posse direta, que é concedida a outrem, que poderá desfrutar do bem alheio, dele retirando os frutos e utilidades.

Vale assinalar que, em se tratando de usufruto, o proprietário da coisa perde o jus utendi e jus fruendi, que são poderes intrínsecos ao domínio. Todavia, prima-se que o proprietário não perde a substância, o conteúdo de seu direito, que permanece em sua propriedade (VENOZA, 2010).

Vale salientar, que o legado de usufruto admite duas espécies distintas, uma a termo e a outra a condição. No entanto, se a cédula testamentária não se manifestar quanto o prazo de duração do legado, presumir-se-á que será vitalício para o legatário, se não houve outra fixação de prazo, extinguindo-se com a morte do usufrutuário, não podendo este transmitir o direito real. Porém, não se aplica o mesmo quanto às pessoas jurídicas, conforme entendimento de Tartuce (2010) que aduz: “Se o legado de usufruto for a favor de pessoa jurídica, estará limitado ao prazo máximo de 30 anos, por aplicação analógica ao que dispõe o art. 1.410, III, do Código Civil”.

 O legado de usufruto pode recair sobre bens determinados (coisa singular) e sobre a universalidade (disposição sobre fração do acervo), sendo a conservação do bem de exclusiva responsabilidade do legatário (DINIZ, 2012).

10- Legado de Imóvel

O legado de bem imóvel, como dispõe o artigo 1.922 do Código Civil, preceitua: “Se aquele que legar um imóvel lhe ajuntar depois novas aquisições, estas, ainda que contíguas, não se compreendem no legado, salvo declaração em contrário do testador”.   

Considerando que os imóveis acrescidos depois do testamento são aquisições posteriores, não incluídas na manifestação de vontade do testador, o legatário não pode cogitar a inclusão em seu legado de propriedade formalizada pelo testador depois da sua facção testamentária.

Após o testamento, se houver acréscimo nessa propriedade, tal não se compreende no imóvel legado, mesmo que contíguos, o legado não compreende as novas aquisições (TARTUCE, 2010).

Como preceitua o parágrafo único do artigo 1.922 do Código Civil, não se aplica o caput desse dispositivo às benfeitorias, pois elas tornam-se acessórias aos imóveis, como parte integrante do imóvel legado, não importando se as benfeitorias executadas pelo testador foram necessárias, úteis ou voluptuárias (CC, art. 96), desde que existentes no tempo da abertura da sucessão. Entretanto, se posteriores a isso, forem realizadas pelos sucessores, assistirá a estes o direito de reembolso dos valores despendidos (RODRIGUES, 2003).

Ao lado disso, valorando o princípio que o acessório segue o principal, pode-se anotar que as benfeitorias necessárias, voluptuárias e úteis no bem legado, estas pertencerão ao legatário (DINIZ, 2012).

EFEITOS DO LEGADO

O primeiro efeito que o legado produz é quanto à transmissão da propriedade e da posse, pois o herdeiro legítimo adquire a posse e o domínio da herança no momento do falecimento do defunto, de acordo com o princípio da saisine. Já o legatário só receberá a propriedade do bem legado com a abertura da sucessão, desde que o legado seja puro e simples, e se tratar de coisa certa (DINIZ, 2012). Quanto à posse, a abertura da sucessão confere ao legatário somente o direito de pedi-la aos herdeiros instituídos. Devido a aparente contradição do Art. 1.923 e seu §1º, Silvio Rodrigues (2003) expõe:

(...)faz-se preciso recorrer à distinção entre posse direta e indireta. O legatário, no momento da morte do testador, adquire o domínio da coisa certa legada, bem como a posse indireta dela (CC, art. 1.923). A posse direta, entretanto, só será por ele adquirida no momento em que o herdeiro lhe entregar o objeto do legado (CC, art. 1.923, § 1º). Até esse momento, cabe-lhe o direito de reclamar a entrega daquilo que se tornou seu por força do testamento, e cuja propriedade resultou da morte do testador (RODRIGUES, 2003).

O segundo efeito ocorre quanto ao direito de pedir o legado, já que o legatário não entra na posse por autoridade própria, caso o testador não deixe tal situação explícita lhe permitindo. O direito de pedir é transmissível aos herdeiros do legatário, se este vier a óbito após a abertura da sucessão, no entanto, se o legatário falecer antes do testador nenhum direito será transmitido a seus herdeiros.

O art. 1.924 do Código Civil aduz:

O direito de pedir o legado não se exercerá, enquanto se litigue sobre a validade do testamento, e, nos legados condicionais, ou a prazo, enquanto esteja pendente a condição ou o prazo não se vença (CC, art.1924).

Ficará suspenso o direito de pedir nestas três possibilidades expostas: enquanto se litigue sobre a validade do testamento, pois enquanto houver ação de anulação do testamento, não se entrega o legado, devendo aquela ação ser transitada em julgado para a entrega da deixa; na pendência da condição suspensiva, nos legados condicionais, pois por ser condicional, a aquisição do bem só se dá com o implemento da condição imposta pelo disponente, de maneira que a capacidade para suceder, é a do tempo da verificação da condição e não a do momento da abertura da sucessão, mas se o legatário falecer antes do implemento da condição, nenhum direito se transmitirá a seus sucessores (DINIZ, 2012); nos legados a prazo , enquanto o termo não se vencer, entendendo que terá o direito de pedir o legado apenas por ocasião do vencimento, neste caso se o legatário vier a falecer depois do testador, porém antes do advento do termo, o domínio do legado transmitir-se-á aos seus sucessores.

O legado poderá ser requisitado ao testamenteiro ou inventariante, se estiverem com a posse dos bens, a certos herdeiros, se o testador assim determinar ou a todos os herdeiros conjuntamente (TARTUCE, 2010).

Após falar sobre os efeitos ocorridos com relação à aquisição do bem, o Código Civil explicita também, os efeitos quanto algumas modalidades de legados. O art. 1.923, §2º, aduz sobre os frutos do legado de coisa certa, desde a morte do testador, exceto se dependente de condição suspensiva, ou de termo inicial, excluídos os colhidos anteriormente (GONÇALVES, 2012). O herdeiro entregar-lhe-á o bem do legado no estado em que estiver na data da abertura da sucessão com todos os seus acessórios, respondendo pelos prejuízos que causou culposamente.

No entanto, há algumas exceções, onde o referido artigo não será aplicado: a) se o legado estiver sob condição suspensiva, após o implemento da condição o legatário receberá o bem, e então receberá também os frutos; b) se o legado for a termo, o qual os frutos pertencerão ao legatário no vencimento do prazo; c) se o legado for em dinheiro, pois só vencerão os juros no dia em que se constituir em mora a pessoa obrigada a prestá-lo (DINIZ, 2012).

Carlos Roberto Gonçalves (2012), trás ainda mais uma exceção:

Excluem-se os frutos desde a morte do testador no legado de coisa incerta ou não encontrada entre os bens por ele deixados. Injusto seria onerar o herdeiro com pagamento de frutos, uma vez que tais bens, enquanto não localizados, não são exigíveis (GONÇALVES, 2012).

Quanto ao legado de renda ou prestação periódica, o qual o herdeiro deverá pagar ao legatário determinado valor após a morte do testador, em frutos ou em dinheiro, o testador poderá fixar o termo inicial da prestação, e caso não fixe esse prazo, começará a contar do dia da morte do de cujus. O pagamento poderá ser feito por dinheiro ou através de imóvel, podendo ser estipulado mensalmente, trimestralmente, semestralmente ou anualmente. As prestações periódicas são devidas integralmente desde o início do período sucessivo, podendo ser perceptível até mesmo após a sua morte, a seus sucessores, conforme exemplifica Carvalho Santos (1920):

O testador ordena ao herdeiro que dê a José R$ 500,00 todos os meses e morre no dia 10 de fevereiro. Neste mesmo dia José adquire o direito de haver a primeira prestação de R$ 500,00; em 10 de março, e todos os meses sucessivamente, em igual data, adquire o direito a igual quantia. Mas, se o legatário morre, por exemplo, em 9 de outubro, a mesada que devia ser paga a 10 deste mês não é devida aos herdeiros de José, precisamente porque tendo morrido antes de iniciado o período, o legado desta mesada, assim como das sucessivas, se extinguiu definitivamente (SANTOS, 1920).

As prestações só podem ser exigidas no final de cada período, conforme estabelece o art. 1.928, mas seu parágrafo único traz uma única exceção, quando se tratar de prestação a título de alimentos, hipótese em que serão exigidas no início de cada período, devido a sua natureza alimentícia.

Quando se tratar de coisa incerta, mas determinada no gênero e espécie, será válido o legado, podendo o devedor escolher o bem, utilizando de meio-termo entre os congêneres da melhor e da pior qualidade (CC, art. 1.929). A mesma regra é aplicada em caso de o testador deixar ao arbítrio de um terceiro, ou de um juiz, se aquele não quiser ou não puder escolher.  Se a escolha couber ao legatário, poderá este escolher, dentre as coisas do mesmo gênero, o melhor que existir na herança.

O legado alternativo é aquele que tem por objeto duas ou mais coisas, mas que dentre elas somente uma deverá ser entregue ao legatário. O poder de escolha da coisa que vai ser entregue cabe ao herdeiro, sendo ele o devedor, porém o testador pode dispor de forma diversa, transferindo o poder de escolha para um terceiro ou para o próprio legatário (OLIVEIRA, 1987). Caberá aos herdeiros o poder de escolha, caso o herdeiro ou legatário a quem couber esse poder vier a falecer antes de exercê-lo. Caducará o legado se o legatário falecer antes do testador, depois de ser feita a escolha, esta não poderá ser revogada, entretanto poderá ser anulada, caso tenha sido feita fora dos padrões estabelecidos.

RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO LEGADO

A priori, quem tem o dever de pagar o legado é o herdeiro. Ele deve tirar do seu acervo hereditário os bens que são objetos de legado. O testador pode nomear herdeiros que ficarão encarregados de cumprir o legado e eles serão chamados de onerados. Os demais herdeiros ficarão livres dessa responsabilidade, porém havendo um único herdeiro, este será o responsável.

Se a coisa legada pertencer ao herdeiro ou legatário, somente eles poderão repassar a coisa ao sublegatário e terá direito de regresso contra os demais coerdeiros. (MONTEIRO, 2006).

Todas as despesas, como o recolhimento do imposto de transmissão causa mortis, depósito, transportes, bem como os riscos da entrega do legado, “correm à conta do legatário” ou gratificado, senão dispuser diversamente o testador (CC, art. 1.936) (GONÇALVES, 2012).

Segundo o artigo 1.937 do Código Civil “(...) entregar-se-á, com seus acessórios, no lugar e estado em que se achava ao falecer o testador, passando ao legatário com todos os encargos que a onerarem”.

Complementa Itabaiana de Oliveira (1987) que por acessório:

Entende-se tudo aquilo que, sem ser a própria coisa, tem com ela tal ligação, que se não deve separar, mas, antes, deve segui-la. Assim, devem ser entregues, com a coisa legada e por serem acessórios dela, os títulos e as chaves dos prédios legados, os animais necessários à exploração de uma propriedade agrícola, os utensílios de uma fábrica, o jardim dependente de uma casa legada, etc. (ITABAIANA DE OLIVEIRA, 1987, pag. 182-183).

DA CADUCIDADE DOS LEGADOS

A caducidade do legado é a sua ineficácia em razão de causas posteriores à sua instituição, que mesmo sendo feito de forma válida, perderá a razão de existir. Não se confunde com nulidade, caso em que o testamento nasce inválido.

O legado quando válido poderá caducar por causas supervenientes de ordem subjetiva, quando faltar beneficiário, ou por ordem objetiva, quando faltar o objeto do legado. Nesses casos, verificado a caducidade o legado volta à massa do espólio (MONTEIRO, 2006).

O Código Civil apresenta as causas de perda do legado, enumeradas pelo artigo 1.939:

 Art. 1.939. Caducará o legado:

I - se, depois do testamento, o testador modificar a coisa legada, ao ponto de já não ter a forma nem lhe caber a denominação que possuía;

II - se o testador, por qualquer título, alienar no todo ou em parte a coisa legada; nesse caso, caducará até onde ela deixou de pertencer ao testador;

III - se a coisa perecer ou for evicta, vivo ou morto o testador, sem culpa do herdeiro ou legatário incumbido do seu cumprimento;

IV - se o legatário for excluído da sucessão, nos termos do art. 1.815;

V - se o legatário falecer antes do testador.

1-      Modificação substancial da coisa legada

Segundo Washington de Barros Monteiro (2006): “com o transformar a coisa legada, o testador deixa evidenciada a mudança de sua vontade primitiva, manifestada no ato de última vontade, inutilizando-se o legado”. Ou seja, se o testador, ou algum terceiro deixado por ele, transformar a coisa legada ao ponto de mudar sua forma, isso demonstra que existe vontade do testador em revogar o legado.

São dois os requisitos para haver a caducidade: ser feita pelo testador, ou a seu pedido; e a modificação da coisa legada ser substancial, de modo que não seja reconhecida mais pela forma ou nome.

2-      Alienação da coisa legada

Se após feito o testamento, o testador dispor da coisa legada por doação, permuta, por título gratuito ou oneroso, partilha, dação em pagamento, sub-rogação feita à terceiros, no todo ou em parte, haverá a caducidade. Desse modo o testador demostra sua mudança de vontade, e que não deseja mais fazer a liberalidade, ou seja, essa presunção é juris et de jure, não admitindo prova em contrário. Conforme Washington de Barros Monteiro (2006): “a promessa de venda com caráter irrevogável, acarreta a caducidade do legado por aplicação do princípio da mudança da vontade do testador”.

Se a alienação for anulada, revigorado estará o legado, desde que verificado que essa invalidação se deu de forma involuntária, em razão de algo que afetou diretamente a vontade do alienante.

Verificado na abertura de sucessão que o bem não pertence mais ao autor da herança, o legado caducará por ser vedada a alienação de coisa alheia (MONTEIRO, 2006).

3-      Perecimento ou evicção da coisa legada

Havendo a evicção ou perecimento do objeto, o legado caducará, pois faltará o principal, o objeto do legado, vivo ou morto o testador, o legado deixará de existir.

Quando o perecimento ocorrer por culpa comprovada do herdeiro ou legatário, o beneficiário estará autorizado a postular o direito a ressarcimento, respondendo este por perdas e danos. Porém se o perecimento ocorrer por culpa de terceiro, o legatário não poderá acioná-lo no intuito de receber o valor da coisa legada, pois esta ação compete somente aos herdeiros e o testador. E no caso em que o objeto da coisa legada deixa de existir por destruição, perda, incêndio, inutilização, resolve-se o legado, havendo a caducidade da liberalidade, assim o legatário não terá o direito de reclamar o pagamento do valor da coisa, pois se desaparece o objeto, caduca o legado por falta deste (GONÇALVES, 2012).

Ocorre a caducidade se quando da evicção de sentença judicial, a coisa for declarada do reivindicante, desta forma a coisa legada não será do testador e sim do reivindicante, sendo assim ineficaz o legado de coisa alheia.

Se o perecimento ou evicção for parcial, permanece o legado no tocante a parte remanescente.

4-      Indignidade do legatário

Presume-se que o testador não queria deixar a coisa legada para uma pessoa que se mostrasse indigna, atentando assim contra sua honra, liberdade, integridade. Torna-se ineficaz cláusula que beneficia o legatário, desde que prove, por um dos interessados que, depois de feito o testamento, praticou um dos atos referidos no artigo 1.814 do Código Civil, tal indignidade deve ser declarada por sentença que declarará a exclusão do legatário.

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

5-      Premoriência do legatário

Se o legatário vier a falecer antes da sucessão do testador, haverá a caducidade, pois desaparece o sujeito da liberalidade. O legado não pode subsistir por ser intuito personae, ou seja, a intenção do testador era de beneficiar o legatário e não seus eventuais sucessores, assim sendo, os descendentes do legatário não podem reclamar o legado (GONÇALVES, 2012).

Caducado o legado pela morte antecipada do legatário, a coisa legada permanece no acervo hereditário, passando assim para os herdeiros legítimos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fica exposto assim, a diferença notável entre o instituto do legado e da herança, que não mais se confundem. Esta se dar pela sucessão legal ou testamentária e a título universal.

O legado se mostra um assunto breve, que ocorre a título singular, somente por meio de testamento, mas complexo quanto a sua aplicação, pois há variedades de espécies referentes ao seu objeto, podendo ser abarcado coisa alheia, prestação alimentícia, imóvel, acessórios, frutos, usufruto, relatando a diversidade de bens disponíveis para testar.

Quanto ao legatário, este traz um efeito negativo perante o herdeiro, pois mesmo não sendo necessariamente um destes, tira um quinhão da universalidade para si, respeitando a vontade do testador, mas contrariando muitas vezes a vontade dos herdeiros que subsistem.

Por fim, vale salientar que seus efeitos relatam a eficácia do legado, no entanto se não observados seus requisitos, este caducará ou será nulo, não podendo dizer que não foi respeitada a vontade do de cujus, mas que a sua ineficácia adveio de vícios ocorridos na sua instituição ou no decorrer dela.

 

 

REFERÊNCIAS

 

BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. 11 jan. 2002. Disponível em: . Acesso em 10 de novembro 2017.

 

CARVALHO SANTOS, J. M. de. Código Civil brasileiro interpretado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1960. v. 23, 24 e 25.

 

CASTRO, Alexandre. Legado: conceito, objeto e espécies. Disponível em: . Acesso em 14 de novembro 2017.

 

CRETELLA JUNIOR, J. Institutas do Imperador Justiniano. Tradução. São Paulo: RT, 2000. 348p.

 

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 6: direito das sucessões – 26. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012

 

DOMINGUES, Lucas, PINHEIRO, Fuster.  Espécies de Legado Quanto ao Objeto. Disponível em: . Acesso em 14 de novembro 2017.

 

GONÇALVES, Carlos Roberto Direito civil brasileiro, volume 7 : direito das sucessões — 6. ed. — São Paulo : Saraiva, 2012.

 

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 35. Ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

 

OLIVEIRA, Arthur Vasco Itabaiana de, Tratado de Direito das Sucessões, volume II,  Ed. Max Limond., 1987

 

OLIVEIRA, Euclides de; AMORIM, Sebastião. Inventários e partilhas. 16ª ed. São Paulo: 2003.

 

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil v.7: Direito das Sucessões. 26ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

 

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil: Direito das Sucessões, vol. 06. 3ª ed., rev. e atual. São Paulo: Editora Método, 2010.

 

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, v.7: Direito das Sucessões. 6ª Ed. São Paulo: Atlas, 2010.

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