DEPARTAMENTO DE POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL - MJ
Ref.: Auto Infracional nº XXXXXXXXXXX
FULANO BELTRANO DE TAL, brasileiro, CPF nº XXX.XXX.XXX-XX, com endereço para notificações à Rua ------- ENDEREÇO ----------------- – CEP XX.XXX-XXX, vem à presença de Vossa Excelência apresentar recurso ao auto infracional nº XXXXXXXXXXX - multa por infração à legislação de trânsito que lhe imputa a prática de infração ocorrida no dia XX/XX/XXXX, às XXhXXmin, na Rodovia XXXXXXXXXXXXXXXX à altura do km XX, infração essa definida no artigo 193, XVIII, do Có-digo de Trânsito Brasileiro:
Art. 193. Transitar com o veículo em calçadas, passeios, passarelas, ciclovias, ciclofaixas, ilhas, refúgios, ajardinamentos, canteiros centrais e divisores de pista de rolamento, acostamentos, marcas de canalização, gramados e jardins públicos:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (três vezes).
Os procedimentos administrativos atinentes às infrações de trânsito, por óbvio, não estão imunes aos princípios constitucionais que norteiam e obrigam todo e qualquer procedimento do qual se extraiam conseqüências jurídicas. Assim, a imputação de uma infração de trânsito, como de resto a imputação de qualquer ato infracional, deve necessariamente revestir-se da absoluta caracterização da ocorrência do fato tido como infracional, além da individualização do condutor do veículo, já que a punição obrigatoriamente restringe-se à pessoa do infrator e deve assentar-se na comprovada materialidade infracional (dogmas constitucionais).
No mesmo passo, não se cogita da imposição de punição quando o fundamento legitimador da reprimenda deixa de existir. Na seara penal, como é de comezinha sabença, existe a figura da inexigibilidade de conduta diversa, o que elimina a culpabilidade da conduta e leva à falência da persecução instaurada, nulificando-se a pretensão punitiva ab ovo.
Por mais forte razão em cuidando de infração cuja estatura não a perfila sequer próxima dos ilícitos penais.
Pois bem.
O que legitima a restrição do uso das vias públicas no concerto dos imperativos de tráfego é a segurança dos cidadãos. De efeito, “O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito.” – artigo 1º, § 2º, da Lei 9503/97 – CTB.
Tanto assim, que “Os órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito respondem, no âmbito das respectivas competências, objetivamente, por danos causados aos cidadãos em virtude de ação, omissão ou erro na execução e manutenção de programas, projetos e serviços que garantam o exercício do direito do trânsito seguro.” – artigo 1º, § 3º, da Lei 9503/97 – CTB.
Portanto, naquilo que interessa no caso presente, a Administração deve ater-se ao EFETIVO interesse da coletividade quanto à vedação do tráfego pelo acostamento CONFORME A SITUAÇÃO DE FATO EXISTENTE NO MOMENTO DA FISCALIZAÇÃO, máxime em cuidando de uma Rodovia.
De efeito, o tráfego de veículos é um ente próprio que se desdobra ao dinamismo das condições verificadas instante a instante. As normas dão o tom do regramento cabendo aos agentes públicos a devida interpretação nos estritos limites das circunstâncias de fato, sendo de todo exigível que o Estado, por eles representado e atuante, se norteie sempre pelo bom-senso.
A fiscalização de trânsito, por outro lado, não se subsume à sanha tributária, capaz de infligir o ônus financeiro até mesmo diante de situações irregulares. Não há espaço, pois, para a imposição de multas tão-só pela aplicação de dispositivos legais como se de uma tabuada se estivesse cogitando.
Veja-se que a própria Administração, ano após ano, reconhece que o fluxo de veículos em suas vias de maior velocidade ultrapassa o que seria ideal. O Estado falha na disponibilização de estradas adequadas à quantidade de veículos que trafega. Tanto assim, que são comuns e notórias as operações de finais de ano, de carnaval, de feriados em geral, enfim, sob toda sorte de circunstâncias em que o tráfego se vê aumentado.
Ora, se a via de acesso à rodovia leva a um acúmulo de automóveis arrastando-se lentamente e muito próximos uns dos outros é óbvio que a entrada será prejudicada e estender-se-á por vários metros até o ensejo seguro de ingresso no leito carroçável.
No dia e local indicados no auto de infração havia um imenso acúmulo de automóveis e, diga-se, a própria viatura dos agentes policiais tinha diante de si o exato quadro que obrigou o recorrente a manter-se por algum tempo sobre o acostamento.
Pergunta-se:
T O recorrente deveria ter-se insinuado entre os veículos forçando passagem?
T Deveria obstar todo o tráfego atrás de si, emperrando ainda mais o afluxo pela via de acesso?
É o Código de Trânsito que responde a essas indagações:
Art. 29. O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:
[...]
II - o condutor deverá guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu e os demais veículos, bem como em relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a velocidade e as condições do local, da circulação, do veículo e as condições climáticas;
[...]
Não é outro o espírito da norma. Cabe, inclusive, invocar por analogia o quanto disposto no artigo 181, VII, do Código de Trânsito:
Art. 181. Estacionar o veículo:
[...]
VII - nos acostamentos, salvo motivo de força maior:
Infração - leve;
Penalidade - multa;
Medida administrativa - remoção do veículo;
Ora, sempre que há motivo de força maior, haverá a inexigibilidade de conduta diversa. Eis que a segurança dos cidadãos, fator que legitima a restrição do uso da via pública, reputa-se inatacada ante a situação de fato no momento da fiscalização.
Assim, a imputação em si vicia-se de fragilidade insuperável.
Com efeito, ninguém pode ser punido, seja a que título for, sofrendo con-seqüências danosas nos assentos de seu prontuário, enodoando-se o seu histórico perante as autoridades do Trânsito, com base em uma imputação cujo fundamento exceptua-se nos termos do próprio Código de Trânsito.
Diante de todo o exposto, requer-se a Vossa Excelência o cancelamento de todo e qualquer procedimento administrativo infracional que objetive o fato imputado ao recorrente como expresso no Auto Infracional nº XXXXXXXXXXX, porquanto, nas circunstâncias do presente caso, não há tipicidade infracional.
Como medida de Justiça,
P. e E. Deferimento.
SJCampos,
FULANO BELTRANO DE TAL