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Hermenêutica jurídica: contradição entre teoria e prática.


Autoria:

Sérgio Ricardo De Freitas Cruz


Bacharel em Direito pelo UniCeub(Centro Universitário de Brasília)(2014), monografia publicada, mestre em Direito e Políticas Públicas no UniCeub(2017).Doutorando em Direito. Especialista em "Criminologia" e Filosofia do Direito, curso de MEDIAÇÃO na CAMED- CÂMARA DE MEDIAÇÃO do UNICEUB com estágio no Fórum Desembargador José Júlio Leal Fagundes-TJDFT, Estagiário Docente em Filosofia do Direito e Teoria dos Direitos Fundamentais.Cursos vários em especial: "História das Constituições brasileiras" ministrado extensivamente pelo Dr Carlos Bastide Horbach , "Seminário avançado sobre o novo CPC ", ministrado por S. Exa. Ministro Luiz Fux entre setembro e dezembro de 2014 (UniCeub).Participante do Seminário avançado: "Sistemas Jurídicos na visão dos jusfilósofos: Herbert Hart, Hans Kelsen, Carl Schmitt, Tércio Sampaio Ferraz Jr. e Alf Ross" ministrado pelo professor Drº. João Carlos Medeiros de Aragão. O doutorando é membro do IBCCrim e IBDFAM. CV: http://lattes.cnpq.br/2851178104693524

Resumo:

Considerações sobre a compreensão do Direito à luz da hermenêutica e da filosofia jurídica, aspectos contraditórios entre teoria e prática.

Texto enviado ao JurisWay em 17/07/2015.



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Considerações sobre a compreensão do Direito à luz da hermenêutica e da filosofia jurídica, aspectos contraditórios entre teoria e prática.

 

 

 

 

UniCEUB (Mestrado)

2015

RESUMO

 

O presente artigo pretende abordar a concepção de dogma jurídico e suas raízes nos dogmas da igreja Católica romana. O direito moderno possui em muito de si, características de séculos passados, construídos a partir da Escolástica e dos fundamentos de Santo Agostinho e Tomás de Aquino. O artigo versará sobre pontos filosóficos e jurídicos e não pretende exaurir o tema. Citações de grandes pensadores serão necessárias em um primeiro momento . O presente artigo será o primeiro de alguns outros nos quais o scholar apresentará suas idéias de forma mais precisa sobre a filosofia jurídica.

PALAVRAS-CHAVES:Dogma, Filosofia, Lei, Maquiavel.

 

 

ABSTRACT:

 

This article aims to address the design of legal dogma and rooted in the dogmas of the Roman Catholic church. Modern law has much of themselves, characteristics of past centuries, built from Scholastic and grounds of St. Augustine and Thomas of Aquinas. The article will focus on philosophical and legal points and does not intend to exhaust the subject. Quotes from great thinkers will be necessary at first. This article is the first of a few others in which the scholar will present their ideas more accurately on legal philosophy.

KEYWORDS:Dogma, Philosophy, Law, Machiavelli

 

 

 

 

“ Se queremos que tudo fique como está, é preciso que tudo mude. Fui claro ?”

Lampedusa[1]


Introdução

 

         O Direito como instituição subjetiva de garantia dos fundamentos básicos de proteção dos direitos e garantias do indivíduo, podemos considerar, desde a publicação emblemática da Lei das  XII Tábuas em Roma, por volta de 451 a.C , que se torna útil às elites e não é facilmente acessível ao cidadão comum e ao populum de maneira geral.

            Sófocles (497-406 a.C), dramaturgo grego, dizia: “ E não creio que tu, homem mortal , possas transgredir as leis não escritas e imutáveis dos deuses. Não são de hoje nem de ontem; não morrem e ninguém sabe donde saíram”[2]. Infere-se já em um primeiro momento, que as leis são inquestionáveis e imutáveis, desde longo tempo. A questão do sentido de lei, quando se percebe que em algumas sociedades milenares, caso dos judeus, a lei assume um papel duplo, político e espiritual, especialmente quanto aos judeus que se mantiveram vivos como nação, mesmo dispersos, pelo apego à Torá e aos seus preceitos, entendemos que o Direito é intimamente ligado ao aspecto axiológico de bem e mal. A interpretação desses conceitos validar-se-á pelos conhecedores e revestidos de legitimidade e legalidade para dizer esse direito.

            Hans Kelsen, citado por A.L Machado Neto ao falar do racionalismo dogmático nos diz:

“ Dando-se o qualificativo de teoria “pura”, ela indica que entende constituir uma ciência tendo o direito por único objeto e ignorando tudo o que não responda estritamente à sua definição. O princípio fundamental de seu método é pois o de eliminar da ciência do direito todos os elementos que lhe são estranhos”.[3]

            Ora, percebe-se que o Direito caminha sobre o gelo fino da interpretação no dizer do sábio austríaco e longe fica o questionamento natural e religioso e mesmo antropológico não só dos gregos, quanto dos judeus e mesmo dos aborígenes estudados por Émile Durkhein. O Direito como ciência é dogmático, longe muito distante passa o homem comum que não o conhece em sua liturgia e seus códigos.

            Ao começarmos esse trabalho despretensioso de analisarmos o Direito em seu ponto mais nevrálgico, em seu rito, apresentar-se-ão críticas a modelos descontextualizados e distantes da realidade do homem comum. Ressaltamos que cabe a análise de Ferdinad Lassale em seu discurso de 1863, dirigindo-se a um grêmio de trabalhadores em que falava sobre a “ Essência da Constituição”. O prussiano ressaltava que a Constituição de um país deve ser flexível quanto à evolução e modificações da sociedade, não um amontoado de artigos inexoráveis e guardados a ferro e fogo por homens únicos e dotados da investidura de “guardiões constitucionais”. Lassale preconizava que se tal fenômeno ocorresse, a rigidez e a imutabilidade e mesmo a dogmática de uma constituição, teríamos ao invés de um instrumento do povo e para o povo, “ein stück papier”.

       O filósofo Friedrich Nietzsche em uma espécie de resposta antecipada a Hans Kelsen dizia:

“   Novamente a “ pequena razão” é questionada. Se a fenomenologia tenta superar a dicotomia realismo-idealismo, não se dá conta do perspectivismo e faz uma hermenêutica reducionista, levantando suspeitas de sua relação dual que se pretende uma. Como ver no objeto mesmo aquilo que ele é, sendo que tudo está amparado na razão e não se foi longe numa experiência com o pensar ? A própria contribuição ao método científico deixa a desejar.”[4]

            O Direito como ciência, carece do ferramental para que se constitua ciência: método, teleologia, hermenêutica e meios de tornar sua instrumentalização mais acessível ao homem, objeto de sua existência , seja no campo social seja no campo das  idéias.

 

 

1.   Prolegômenos

O jusnaturalismo e o juspositivismo abarcam discussões frívolas que nada concluem  e para nada contribuem, senão o acirramento intelectual entre seus defensores. O homem é o centro do Direito e as normas de convivência, sejam leis ou condutas normativas são, pois o homem é o centro da questão. Marco Antônio Casanova nos conduz , melhor, nos leva a certo entendimento quando diz:

“ De acordo com um velho princípio hermenêutico, interpretar implica incessantemente ver mais do que aquilo que se acha expresso no texto e mesmo do que aquilo que o próprio autor estava em condições de formular com as suas intenções específicas” [5]

            A interpretação consiste na análise do texto sob a luz do humano, não sob uma análise fria e desconexa da condição do homem. Vejamos a posição do teólogo William de Ockham[6] (séculoXIV): "Se em tudo o mais forem idênticas as várias explicações de um fenômeno, a mais simples é a melhor". A simplificação não passa pela dogmática do Direito, mesmo que William de Ockham seja um excelente intérprete de São Tomás de Aquino, o maior doutrinador do Direito Canônico.

            Estabelece-se aqui um pensamento que permite uma melhor compreensão. Basicamente, o Direito foi conduzido pela igreja oficial até a ruptura que eclodiu com as 95 Teses de Martinho Lutero fixadas na porta da igreja de Wittenberg em 31 de outubro de 1517. A presença da igreja é marcante, cabe refletir que somente após a República em novembro de 1889, tivemos através do decreto 181 de 24 de janeiro de 1890, a positivação do casamento civil, antes primazia do catolicismo romano.

            Mesmo com avanços, o Brasil seguiu a passos lentos para uma humanização do Direito, uma vez mais, cabe registrar que o anteprojeto para o 1º Código Civil brasileiro foi apresentado em 1899 e só foi concretizado em 1916, permeado com normas morais e religiosas com a fragrância religiosa da igreja. A celeridade para inovar no Direito é controversa. Quando da necessidade social para um  novo Código Civil, o jurista Miguel Reale apresentou ao Congresso Nacional  a mensagem nº 160 em 10 de junho de 1975 , entretanto, o nosso 2º Código Civil veio à luz 27 anos depois- em 2002, ainda e mais ainda, necessitado de reformas.

A postura dogmática no Brasil se confunde com a dominação católica que sofremos. Max Weber bem explicita isso em sua obra, “ A ética protestante e o espírito do capitalismo” , obra escrita entre 1904 e 1905 que faz um estudo profundo sobre a ideologia do capitalismo sustentado pelo protestantismo, sucesso nas 13 Colônias da América do Norte.

            Aqui cabe perfeitamente uma ressalva. Nosso momento de reflexão não nos permite afirmar levianamente que Weber sequer mencionou o Brasil em sua obra em epígrafe. Fez o alemão uma análise a partir do fenômeno do renascimento e da colonização do norte da América, profundamente diferenciado do extrativismo colonial da América do Sul e Central pelos espanhóis e portugueses sob os auspícios da igreja oficial.

            A Constituição brasileira de 1891 é quase uma cópia da Constituição americana. Importante ressaltar ainda, que esse processo de formação republicana pelos norte-americanos , deu-se em boa parte, à correta interpretação de Alexander Hamilton e seus companheiros , John Jay e James  Madison , no livro “O Federalista” de 1789 ainda das teses de Montesquieu e dos “iluministas”.

Na repartição dos poderes , Hamilton entendeu melhor que os franceses jacobinos e o Barão de Secondat “Montesquieu” e conferiu ao judiciário a responsabilidade de manter a ideologia democrática, a saber, um Estado pautado no liberalismo e no ideal constitucional como regra, situação que dava ao entes federativos certa autonomia , todavia, não em última instância. Nova Yorke foi o último estado das treze Colônias a ser convencido pelo astuto Hamilton.Os Jacobinos na França ? Esses se afogaram no sangue que derramaram por não compreenderem Montesquieu. 

            Após as observações preliminares que sustentam nosso ponto de vista que o Direito é mantido pelas elites econômicas e intelectuais, cabe refletir sobre dois pontos. Herdamos o princípio da GrundNorm que Hans Kelsen defendeu e que falaremos mais abaixo, todavia, encontramos no Artigo 102 da Constituição Federal de 1988 que o “ Guardião Maior” dessa Constituição é o Supremo Tribunal Federal. No Código de Processo Civil em seus artigos 480 a 482 , ao falar do “Princípio de Inconstitucionalidade” nos diz o excelente Alexandre Freitas Câmara:

“ Regula o Código de Processo Civil, em seus arts. 480 a 482, como dito, o incidente de inconstitucionalidade, o qual se instaurará toda vez que, perante órgão fracionário de um tribunal(salvo o órgão especial), se questionar a constitucionalidade de leis e atos normativos do poder público. Este incidente é regulado no CPC porque apenas o tribunal pleno(ou órgão especial) pode reconhecer a inconstitucionalidade de leis e atos(art. 97 da Constituição da República). Tal afirmativa, porém, é válida apenas para tribunais, já que os juízos de primeira instância, ao contrário, podem considerar inconstitucional uma norma jurídica, e deixar de atuá-la”.[7]

 

            O que diz a Lei no CPC[8]:

DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE

        Art. 480.  Argüida a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público, o relator, ouvido o Ministério Público, submeterá a questão à turma ou câmara, a que tocar o conhecimento do processo.

        Art. 481.  Se a alegação for rejeitada, prosseguirá o julgamento; se for acolhida, será lavrado o acórdão, a fim de ser submetida a questão ao tribunal pleno.

        Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 1998).

        Art. 482.  Remetida a cópia do acórdão a todos os juízes, o presidente do tribunal designará a sessão de julgamento.

        § 1o O Ministério Público e as pessoas jurídicas de direito público responsáveis pela edição do ato questionado, se assim o requererem, poderão manifestar-se no incidente de inconstitucionalidade, observados os prazos e condições fixados no Regimento Interno do Tribunal. (Incluído pela Lei nº 9.868, de 1999)

        § 2o Os titulares do direito de propositura referidos no art. 103 da Constituição poderão manifestar-se, por escrito, sobre a questão constitucional objeto de apreciação pelo órgão especial ou pelo Pleno do Tribunal, no prazo fixado em Regimento, sendo-lhes assegurado o direito de apresentar memoriais ou de pedir a juntada de documentos. (Incluído pela Lei nº 9.868, de 1999)

        § 3o O relator, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes, poderá admitir, por despacho irrecorrível, a manifestação de outros órgãos ou entidades. (Incluído pela Lei nº 9.868, de 1999).”

            Dar-nos-emos por satisfeitos frente a explicação do emérito J.J Canotilho quanto “A Declaração de  Inconstitucionalidade por Via de Defesa ou Exceção”, lembrando-nos sempre da Constituição brasileira em seu artigo 102,I, “a”. Leiamos:

“O processo de fiscalização concreta de normas jurídicas, designado também por processo incidental ou ação judicial de inconstitucionalidade (Richterklage) traduz a consagração do direito de fiscalização dos juízes (judicial review) relativamente a normas a aplicar a um caso concretoUma norma em desconformidade material, formal ou procedimental com a constituição é nula, devendo o juiz, antes de decidir qualquer caso concreto de acordo com esta norma, examinar (“direito de exame”, “direito de fiscalização”) se ela viola normas e princípios da constituição. Desta forma, os juízes têm “acesso direto à Constituição”, aplicando ou desaplicando normas cuja inconstitucionalidade foi impugnada.” [9]

No sistema jurídico brasileiro, o controle difuso da constitucionalidade está implicitamente previsto no art. 102, III, “b”, CF/88, na referência ao cabimento de recurso extraordinário quando a decisão recorrida declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal. Esta previsão constitucional, decorrência da função precípua do Supremo Tribunal Federal de “guarda da Constituição” (art. 102, caput, CF/88), estabelece ser passível de apreciação em definitivo pelo STF, em sede de recurso extraordinário, a alegação de inconstitucionalidade levantada em qualquer processo ou instância.

Arguida a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo em caso concreto, a matéria poderá ou não chegar ao STF, pois depende de cadeia recursal, que se pronunciará em definitivo sobre o tema. Esta decisão da Corte produz duas conseqüências. Em primeiro plano, atinge apenas as partes litigantes, retroagindo à data da relação jurídica fundada na lei inconstitucional, isto é, a eficácia da norma continua plena em relação às demais situações jurídicas. Num segundo momento, após comunicação ao Senado Federal, sendo por este editada resolução que suspende a execução da norma no todo ou em parte (art. 52, X, CF/88), a declaração de inconstitucionalidade passa a produzir efeitos erga omnes, mas apenas a partir da data da resolução, operando, neste caso, ex nunc, portanto.

            Complexo é para o scholar entender que o texto disciplinador do CPC é uma lei de 1998, para uma Constituição de 1988 de um Código de 1973. A Carta Política de 1988 é vibrante com relação às inovações do famoso artigo 5º que trata dos direitos e garantias individuais, todavia, o Código de Processo Civil em lei de 2006, precisamente de  7 de fevereiro de 2006, prestigia , sob a égide da celeridade e economia processual, a agressão ao devido processo legal, ampla defesa e ao contraditório, no tocante ao artigo 285-A.

            Ao voltarmos à apreciação dos artigos 480 ao 482 do CPC , percebemos que os juízes e tribunais apreciarão a validade das leis e regulamentos e deixarão de aplicar aos casos ocorrentes as leis manifestamente inconstitucionais e os regulamentos manifestamente incompatíveis com as leis ou com a Constituição.

O Código de Processo Civil, artigos 480 a 482, contempla a declaração de inconstitucionalidade, dispondo, todavia, apenas sobre o procedimento da arguição no âmbito dos tribunais:

“Art. 480. Argüida a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público, o relator, ouvido o Ministério Público, submeterá a questão à turma ou câmara, a que tocar o conhecimento do processo.”

Nestes casos, sendo rejeitada a arguição, prossegue normalmente o julgamento do recurso. Entendendo a Câmara que procede a alegação, remete a questão ao Tribunal Pleno, que é o órgão competente para declarar a inconstitucionalidade incidenter tantum (artigos 481 e 482 CPC).

O Brasil, aqui voltamos à tese do domínio católico e de sua liturgia religiosa que fomentou a criação de valores arraigados na cultura brasileira, o dogma jurídico, confunde-se em muito com o dogma religioso. O sábio Tércio Sampaio Ferraz Jr. Nos diz:

 “ Dogma significa algo que não se coloca em dúvida.Se o conteúdo do dogma é verdadeiro, ou não, isso é uma questão secundária. A função do dogma é pacificar uma questão, dar estabilidade a um sistema de pensamento, de crença, a fim de viabilizar certos comportamentos e conceitos. Existem, assim, vários tipos de dogmas: dogmas religiosos, científicos, políticos, familiares, sociais, jurídicos, econômicos e outros.Dogma, etimologicamente, tem sua raiz no grego dokéo, "julgar, aparentar", e do latim docere, ensinar, significando "ponto fundamental e indiscutível de uma doutrina religiosa, e por extensão de qualquer doutrina ou sistema" (cf. Antonio Geraldo da Cunha, no Dicionário, Etimológico, Nova Fronteira). Ou seja, dogma é algo que não mais se questiona, que está aceito como verdadeiro.A Dogmática Jurídica é justamente a parte do Direito que lida com as certezas, com os pressupostos e premissas inquestionáveis colocados pelas normas jurídicas positivadas. Exemplos bem simples e corriqueiros são os prazos processuais (10,15 dias... de prazo para recorrer, para contestar) e o prazo de prescrição das ações. Se a lei estabelece não se questiona. O que poderia ser questionado é se o prazo é razoável ou não e aí mudar-se-ia à lei. Mas, enquanto o prazo for aquele da lei, sua obediência é dogma. Outro dogma é a validade da sentença transitada em julgado, que é sempre tida como verdadeira.A Dogmática Jurídica é um modo de viabilizar decisões, simplificando a complexidade, diminuindo o questionamento social e estabilizando a sociedade. O princípio da maioria, por exemplo, quando estabelecido por lei acaba com a discussão: o que a maioria decide é válido, isto é um dogma. A decisão neutraliza o dissenso, ou seja, os que têm opinião contrária devem se conformar com a decisão da maioria. Só que esse dogma da maioria é expressão de uma racionalidade formal que não convence a minoria, que vai contra os desejos da minoria, e a maioria, por si só, não tem força de eliminar o ressentimento dos dissidentes. A racionalidade do dogma cria insatisfações nos contrários, pois não respeita as diferenças de cada um, impõe soluções coletivas a contragosto, contrafaticamente. Produz é certo, o efeito de estabilização do sistema, mas à custa do artifício da solução racional.Quando há muito descontentamento são feitas novas leis, são estabelecidos novos dogmas, sem os quais não há possibilidade do sistema operar. Assim: "O Direito positivo institucionaliza a mudança, que passa a ser entendida como superior à permanência, e as penadas do legislador começam a produzir códigos e regulamentos que, posteriormente, serão revogados e de novo restabelecidos, num processo sem fim". [10](Eu grifei)

Ao buscarmos amparo na filosofia encontramos em Marilena Chauí a seguinte concepção:

"O inatismo afirma que nascemos trazendo em nossa inteligência não só os princípios racionais, mas também algumas idéias verdadeiras, que, por isso, são idéias inatas. O empirismo, ao contrário, afirma que a razão, com seus princípios, seus procedimentos e suas idéias, é adquirida por nós através da experiência"[11]

A.L Machado Neto afirma:

"Durante o século XIX, século das filosofias naturalistas, do positivismo, do evolucionismo, do materialismo, houve um longo eclipse que ameaçou, mesmo com a definitiva expulsão do mapa das idéias jurídicas, a teoria do direito natural"[12]

O século XX nasce com o Direito atrelado às velhas concepções teológicas que tanto celebraram Santo Agostinho e Tomás de Aquino. Falar em um Direito livre do rito litúrgico é fugir do plano de existência da máquina judiciária. Laís Vieira Cardoso em bom artigo nos faz refletir:

"Este pequeno avanço do historicismo jurídico é radicalizado no sociologismo jurídico que considera os fatos sociais na formulação das decisões judiciais e foge da aplicação mecânica da vontade do legislador. É um grande passo para o início da Escola do Direito livre que nasce na Alemanha com Euggen Ehrlic, em 1.903. Herman Kantorwicz, em 1.906 apresenta o manifesto por um Movimento do Direito Livre defendendo a idéia de que o Direito, que denomina de natural, nascido espontaneamente dos grupos e movimentos sociais, sobrepõe-se ao direito estatal em uma atividade criadora do Direito. Em 1.885, Oscar Bülow já difundia a idéia de que a lei não cria o Direito, somente realiza uma ordem jurídica produzida pelos membros da sociedade, podendo estar desatualizada por não acompanhar as transformações sociais e ainda possuir lacunas por serem ora incompletas, ora inadequadas e, em determinados casos, contraditórias quando confrontadas com a grande variedade de fatos sociais que surgem"[13]

Com a vertiginosa aceleração nos processos de veiculação de informações, as transformações sociais ocorrem em compassos que o Direito sequer cogitou enfrentar em algum momento. O povo quer o Direito, o povo quer seu direito e as demandas crescem na medida proporcional à violação desses direitos. A igreja vive dos seus dogmas e credos, o Direito viverá até quando ? Fala-se “em direito achado na rua”, acha-se o Direito ou luta-se por ele, no dizer último de Rudolph Von Ihering. Popularizar o Direito ao ponto de achá-lo ao contrário de pleiteá-lo são dois abismos. Aqui não se trata de uma crítica ao pensamento do excelente Roberto Lyra Filho, ao contrário, a crítica é quanto à idéia errada que fazem do seu pensamento. Vinculam os defensores do “Direito achado na rua” a Antonio Gramsci, assim como Jacques Le Goff disse que o pensador militante é um pensador gramsciano. Discordo.

Pensar assim é rotular tudo a Gramsci que foi marxista convicto, provavelmente o que melhor percebeu a essência do pensamento de Marx. Perelman nos leva a mais uma reflexão:

"Concebendo o direito, nem como a expressão da justiça e da razão, nem como a expressão da vontade do legislador, e sim como a expressão de um consenso político e social sobre uma solução razoável numa sociedade em rápida evolução, afirmamos que essa solução resulta, o mais das vezes, de um compromisso difícil entre valores incompatíveis e cuja coexistência importa organizar. O direito, assim concebido, só ganha forma através dos conflitos e das controvérsias em todos os níveis, e já não pode fornecer a imagem tranqüilizadora de uma ordem estável, garantida por um poder imparcial"[14]

 

 

2.   HISTÓRIA

 

Vejamos a presença do dogma eclesiástico nas leis do Brasil:

      Constituição Política do Império do Brazil ( 25 de março de 1824)

      Art. 5. A Religião Catholica Apostolica Romana continuará a ser a Religião do Imperio. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto domestico, ou particular em casas para isso destinadas, sem fórma alguma exterior do Templo.”

Art. 95. Todos os que podem ser Eleitores, abeis para serem nomeados Deputados. Exceptuam-se

        I. Os que não tiverem quatrocentos mil réis de renda liquida, na fórma dos Arts. 92 e 94.

        II. Os Estrangeiros naturalisados.

III. Os que não professarem a Religião do Estado.(Eu grifei)

 

Art. 103. 0 Imperador antes do ser acclamado prestará nas mãos do Presidente do Senado, reunidas as duas Camaras, o seguinte Juramento - Juro manter a Religião Catholica Apostolica Romana, a integridade, e indivisibilidade do Imperio; observar, e fazer observar a Constituição Politica da Nação Brazileira, e mais Leis do Imperio, e prover ao bem geral do Brazil, quanto em mim couber.(Eu grifei)

Art. 106.0 Herdeiro presumptivo, em completando quatorze annos de idade, prestará nas mãos do Presidente do Senado, reunidas as duas Camaras, o seguinte Juramento - Juro manter a Religião Catholica Apostolica Romana, observar a Constituição Politica da Nação Brazileira, e ser obediente ás Leis, e ao Imperador.(Eu grifei)

Art. 141. Os Conselheiros de Estado, antes de tomarem posse, prestarão juramento nas mãos do Imperador de - manter a Religião Catholica Apostolica Romana; observar a Constituição, e às Leis; ser fieis ao Imperador; aconselhal-o segundo suas consciencias, attendendo sómente ao bem da Nação.

 

 

DECRETO N. 181 - DE 24 DE JANEIRO DE 1890

Promulga a lei sobre o casamento civil.

O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, tendo ouvido o Conselho de Ministros, resolve decretar a lei seguinte:

CAPITULO I

DAS FORMALIDADES PRELIMINARES DO CASAMENTO

Art. 1º As pessoas, que pretenderem casar-se, devem habilitar-se perante o official do registro civil, exhibindo os seguintes documentos em fórma, que lhes deem fé publica:

§ 1º A certidão da idade de cada um dos contrahentes, ou prova que a suppra.

§ 2º A declaração do estado e da residencia de cada um delles, assim como a do estado e residencia de seus paes, ou do logar em que morreram, si forem fallecidos, ou a declaração do motivo por que não são conhecidos os mesmos paes, ou o seu estado e residencia, ou o logar do seu fallecimento.

§ 3º A autorização das pessoas, de cujo consentimento dependerem os contrahentes para casar-se, si forem menores ou interdictos.

§ 4º A declaração de duas testemunhas, maiores, parentes ou estranhos, que attestem conhecer ambos os contrahentes, e que não são parentes em gráo prohibido nem teem outro impedimento, conhecido, que os inhiba de casar-se um com o outro.

§ 5º A certidão de obito do conjuge fallecido, ou da annullação do anterior casamento, si algum dos nubentes o houver contrahido.

Art. 2º A' vista dos documentos exigidos no artigo antecedente, exhibidos pelos contrahentes, ou por seus procuradores, ou representantes legaes, o official do registro redigirá um acto resumido em fórma de edital, que será por elle publicado duas vezes, com o intervallo de sete dias de uma á outra, e affixado em logar ostensivo no edificio da repartição do registro, desde a primeira publicação até ao quinto dia depois da segunda.

Art. 3º Si, decorrido este prazo, não tiver apparecido quem se opponha ao casamento dos contrahentes e não lhe constar algum dos impedimentos que elle pode declarar ex-officio, o official do registro certificará ás partes que estão habilitadas para casar-se dentro dos dous mezes seguintes áquelle prazo.

Art. 4º Si os contrahentes residirem em diversas circumscripções do registro civil, uma cópia do edital será remettida ao official do outro districto, que deverá publical-a e affixal-a na fórma do art. 2º, e, findo o prazo, certificar si foi ou não posto impedimento.

Art. 5º Si algum dos contrahentes houver residido a mór parte do ultimo anno em outro Estado, deverá provar que sahiu delle sem impedimento para casar-se ou, si tinha impedimento, que este já cessou.

Art. 6º Os editaes dos proclamas serão registrados no cartorio do official, que os tiver publicado e que deverá dar certidão delles a quem lh'a pedir.

CAPITULO II

DOS IMPEDIMENTOS DO CASAMENTO

Art. 7º São prohibidos de casar-se:

§ 1º Os ascendentes com os descendentes, por parentesco legitimo, civil ou natural ou por affinidade, e os parentes collateraes, paternos ou maternos, dentro do segundo gráo civil.

A affinidade illicita só se póde provar por confissão espontanea nos termos do artigo seguinte, e a filiação natural paterna tambem póde provar-se ou por confissão espontanea, ou pelo reconhecimento do filho, feito em escriptura de notas, ou no acto do nascimento, ou em outro documento authentico, offerecido pelo pae.

§ 2º As pessoas que estiverem ligadas por outro casamento, ainda não dissolvido.

§ 3º O conjuge adultero com o seu co-réo condemnado como tal.

§ 4º O conjuge condemnado como autor, ou cumplice de homicidio, ou tentativa de homicidio contra o seu consorte, com a pessoa, que tenha perpetrado o crime ou directamente concorrido para elle.

§ 5º As pessoas que, por qualquer motivo, se acharem coactas, ou não forem capazes de dar o seu consentimento, ou não puderem manifestal-o por palavras, ou por escripto de modo inequivoco.

§ 6º O raptor com a raptada, emquanto esta não estiver em logar seguro e fóra do poder delle.

§ 7º As pessoas que estiverem sob o poder, ou sob a administração de outrem, emquanto não obtiverem o consentimento, ou o supprimento do consentimento daquellas, sob cujo poder ou administração estiverem.

§ 8º As mulheres menores de 14 annos e os homens menores de 16.

§ 9º O viuvo ou a viuva, que tem filho do conjuge fallecido, emquanto não fizer inventario dos bens do casal.

§ 10. A mulher viuva, ou separada do marido por nullidade ou annullação do casamento, até 10 mezes depois da viuvez ou separação judicial dos corpos, salvo si depois desta, ou daquella, e antes do referido prazo, tiver algum filho.

§ 11. O tutor ou o curador e seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados, ou sobrinhos com a pessoa tutelada, ou curatelada, emquanto não cessar a tutela, ou curadoria, e não estiverem soldadas as respectivas contas, salvo permissão deixada em testamento, ou outro instrumento publico, pelo fallecido pae ou mãe do menor tutelado, ou curatelado.

§ 12. O juiz, ou o escrivão e seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados, ou sobrinhos, com orphão ou viuva da circumscripção territorial, onde um ou outro tiver exercicio, salvo licença especial do presidente da Relação do respectivo districto.

Art. 8º A confissão, de que trata o § 1º do artigo antecedente, só poderá ser feita por algum ascendente da pessoa impedida e, quando elle não quizer dar-lhe outro effeito, poderá fazel-o em segredo de justiça, por termo lavrado pelo official do registro perante duas testemunhas e em presença do juiz, que no caso de recurso procederá de accordo com o § 5º da lei de 6 de outubro de 1784, na parte que lhe for applicavel.

Paragrapho unico. O parentesco civil prova-se pela carta de adopção, e o legitimo, quando não for notorio ou confessado, pelo acto do nascimento dos contrahentes, ou pelo do casamento dos seus ascendentes.

CAPITULO III

DAS PESSOAS QUE PODEM OPPOR IMPEDIMENTOS, DO TEMPO E DO MODO DE OPPOL-OS, E DOS MEIOS DE SOLVEL-OS

 

Art. 9º Cada um dos impedimentos dos §§ 1º a 8º do art. 7º póde ser opposto ex-officio pelo official do registro civil, ou pela autoridade que presidir ao casamento, ou por qualquer pessoa, que o declarar sob sua assignatura, devidamente reconhecida, com as provas do facto, que allegar, ou indicação precisa do logar onde existam, ou a nomeação de duas testemunhas, residentes no logar, que o saibam de sciencia propria.

Art. 10. Si o impedimento for opposto ex-officio, o official do registro dará aos nubentes ou aos seus procuradores uma declaração do motivo e das provas do mesmo impedimento, escripta e assignada por elle.

Art. 11. Si o impedimento for opposto por outras pessoas, o official dará aos nubentes ou aos seus procuradores uma declaração do motivo, dos nomes e das residencias do impedimento e das suas testemunhas, e conhecimento de quaesquer outras provas offerecidas.

Art. 12. Os impedimentos dos §§ 1º a 6º podem ser oppostos pela autoridade que presidir ao casamento, no proprio acto da celebração delle.

Art. 13. No mesmo acto, antes de proferida a fórmula do casamento pelos contrahentes, a mesma autoridade póde receber qualquer impedimento legal, cumpridamente provado e opposto por pessoa competente.

Art. 14. O impedimento do § 7º tambem poderá ser opposto pela pessoa de cujo consentimento depender um dos contrahentes, ainda que ella tenha anteriormente consentido, mas o seu consentimento póde ser supprido na fórma da legislação anterior.

Art. 15. Os outros impedimentos só poderão ser oppostos pelos ascendentes, ou descendentes, pelos parentes ou affins dentro do segundo gráo civil de um dos contrahentes.

Art. 16. Exceptuados os impedimentos, cuja prova especial estiver declarada nesta lei, todos os mais serão provados na fórma do processo civil.

Art. 17. A menor de 14 annos ou o menor de 16 só poderão casar-se para evitar a imposição, ou o cumprimento de pena criminal, e o juiz de orphãos poderá ordenar a separação dos corpos, emquanto o nubente menor não completar a idade exigida para o casamento, conforme o respectivo sexo.

Paragrapho unico. A prova da necessidade de evitar a imposição de pena criminal deve ser a confissão do crime, feita por um dos contrahentes em segredo de justiça, na fórma do art. 8º, mas ouvida a outra parte, ou, não sendo possivel, os seus representantes legitimos.

Art. 18. O maior de 16 annos ou a maior de 14, menores de 21 annos, são obrigados a obter antes do casamento o consentimento de ambos os paes, si forem casados, ou, no caso de divergencia entre elles, ao menos o do pae. Si, porém, elles não forem casados, e o contrahente não tiver sido reconhecido pelo pae, na fórma do § 1º do art. 8º, bastará o consentimento da mãe.

Art. 19. Em qualquer dos casos de impedimento legal opportunamente opposto por pessoa competente, o official entregará a declaração dos arts. 10 ou 11 aos contrahentes, ou aos seus procuradores, que poderão promover no fôro commum a prova contraria, a do impediente, á revelia deste, si não for encontrado na residencia indicada na mesma declaração, assim como a sua responsabilidade criminal, si houver logar para ella, e a civil pelos damnos, que tiverem soffrido resultantes da opposição.

Art. 20. Os paes, tutores ou curadores dos menores ou interdictos poderão exigir do noivo ou da noiva de seu filho, pupillo ou curatelado, antes de consentir no casamento, certidão de vaccina e exame medico, attestando que não tem lesão, que ponha em perigo proximo a sua vida, nem soffre molestia incuravel, ou transmissivel por contagio, ou herança.

Art. 21. As mesmas pessoas tambem poderão exigir do noivo da filha, pupilla, ou curatelada:

§ 1º Folha corrida no seu domicilio actual e naquelle, em que tiver passado a mór parte dos ultimos dous annos, si mudou-se delle depois de pubere.

§ 2º Certidão de isenção de serviço publico, que o sujeite a domicilio necessario incerto e por tempo indeterminado.

No caso, porém, deste § 2º, é permittido o recurso de supprimento do consentimento das pessoas, que podem recusal-o.

Art. 22. A autoridade que presidir ao casamento póde dispensar a publicação de novos proclamas, si a prescripção dos primeiros, nos termos do art. 3º, se houver consummado dentro dos ultimos doze mezes.

CAPITULO IV

DA CELEBRAÇÃO DO CASAMENTO

Art. 23. Habilitados os contrahentes, e com a certidão do art. 3º, pedirão á autoridade, que tiver de presidir ao casamento, a designação do dia, hora e logar da celebração do mesmo.

Art. 24. Na falta de designação de outro logar, o casamento se fará na casa das audiencias, durante o dia e a portas abertas, na presença, pelo menos, de duas testemunhas, que podem ser parentes dos contrahentes, ou em outra casa publica ou particular, a aprazimento das partes, si uma dellas não puder sahir da sua, ou não parecer inconveniente aquella autoridade a designação do logar desejado pelos contrahentes.

Art. 25. Quando o casamento for feito em casa particular, esta deverá conservar as portas abertas, durante o acto, e as testemunhas serão tres ou quatro, si um ou ambos os contrahentes não souberem escrever.

Art. 26. No dia, hora e logar designados, presentes as partes, as testemunhas e o official do registro civil, o presidente do acto lerá em voz clara e intelligivel o art. 7º e depois de perguntar a cada um dos contrahentes, começando da mulher, si não tem algum dos impedimentos do mesmo artigo, si quer casar-se com o outro por sua livre e espontanea vontade, e ter de ambos resposta affirmativa, convidal-os-ha a repetirem na mesma ordem, e cada um de per si, a formula legal do casamento.

Art. 27. A formula é a seguinte para a mulher: «Eu F. recebo a vós F. por meu legitimo marido, emquanto vivermos.» E para o homem: «Eu F. recebo a vós F. por minha legitima mulher, emquanto vivermos.»

Art. 28. Repetida a formula pelo segundo contrahente, o presidente dirá de pé: «E eu F., como juiz (tal ou tal), vos reconheço e declaro legitimamente casados, desde este momento.»

Art. 29. Em seguida o official do registro lançará no respectivo livro o acto do casamento nos termos seguintes, com as modificações que o caso exigir: «Aos...de...de...ás  horas daem casa das audiencias do juiz (ou onde for), presentes o mesmo juiz commigo official effectivo (ou ad hoc) e as tertemunhas F. e F. (tantas quantas forem exigidas conforme o caso), receberam-se em matrimonio F. (exposto, filho de F., ou de F. e F. si for legitimo ou reconhecido), com  annos de idade, natural de residente em  e F. (com as mesmas declarações, conforme a filiação), com    annos de idade, natural de residente em... os quaes no mesmo acto declararam (si este caso se der) que tinham tido antes do casamento os seguintes filhos: F. com     annos de idade, F. com annos de idade, etc. (ou um filho ou filha de nome F. com annos de idade) e que são parentes (si o forem) no 3º gráo (ou no 4º gráo duplicado) da linha collateral. Em firmeza do que eu F. lavrei este acto, que vae por todos assignados (ou pelas testemunhas F. e F. a rogo dos contrahentes, que não sabem ler nem escrever)

Paragrapho unico. Nesse acto as datas e os numeros serão escriptos por extenso e as testemunhas declararão aos assignar-se a idade e a profissão e a residencia, cada uma de per si.

Art. 30. Si um dos contrahentes tiver manifestado o seu consentimento por escripto, o termo tambem mencionará esta circumnstancia e a razão della.

Art. 31. Tambem se mencionará nesse termo o regimen do casamento, com declaração da data e do cartorio, em cujas notas foi passada a escriptura ante-nupcial, quando o regimen não for o commum, ou o legal estabelecido nesta lei para certos conjuges.

Art. 32. Si no acto do casamento algum dos contrahentes recusar repetir a formula legal, ou declarar que não se casa por sua vontade espontanea, ou que está arrependido, o presidente do acto suspendel-o-ha immediatamente, e não admittirá retractação naquelle dia.

Art. 33. Si o contrahente recusante ou arrependido for mulher e menor de 21 annos, não será recebida a casar com outro contrahente, sem que este prove que ella está depositada em logar seguro e fóra da companhia da pessoa, sob cujo poder ou administração se achava na data da recusa ou arrependimento.

Art. 34. No caso de molestia grave de um dos contrahentes, o presidente do acto será obrigado a ir assistil-o em casa do impedido, e mesmo á noite, comtando que, neste caso, além das duas testemunhas exigidas no art. 24, assistam mais duas que saibam ler e escrever e sejam maiores de 18 annos.

Art. 35. No referido caso a falta, ou o impedimento da autoridade competente para presidir ao casamento, será supprida por qualquer dos seus substitutos legaes, e a do official do registro civil por outro ad hoc, nomeado pelo presidente, e o termo avulso lavrado por aqulle será lançado no livro competente no prazo mais breve possivel.

Art. 36. Quando algum dos contrahentes estiver em imminente risco de vida, ou for obrigado a ausentar-se precipitadamente em serviço publico, obrigatorio e notorio, o official do registro, precedente despacho do presidente, poderá, á vista dos documentos exigidos no art. 1º e independente dos proclamas, dar a certidão de que trata o art. 3º

Art. 37. No primeiro dos casos do artigo antecedente, si os contrahentes não puderem obter a presença da autoridade competente para presidir ao casamento, nem de algum dos seus substitutos, poderão celebrar o seu em presença de seis testemunhas, maiores de 18 annos, que não sejam parentes em gráo prohibido do enfermo, ou que não o sejam mais delle do que do outro contrahente.

Art. 38. Essas testemunhas, dentro de 48 horas depois do acto deverão ir apresentar-se á autoridade judiciaria mais proxima para pedir-lhe que faça tomar por termo as suas declarações.

Art. 39. Estas declarações devem affirmar:

§ 1º Que as testemunhas foram convocadas da parte do enfermo.

§ 2º Que este parecia em perigo de vida, mas em seu juizo.

§ 3º Que tinha filho do outro contrahente, ou vivia concubinado com elle, ou que o homem havia raptado, ou deflorado a mulher.

§ 4º Que na presença dellas repetiram os dous as formulas do casamento, cada qual por sua vez.

Art. 40. Autoado o pedido e tomados os depoimentos, o juiz procederá ás diligencias necessarias para verificar si os contrahentes podiam ter-se habilitado nos termos do art. 1º para casar-se na fórma ordinaria, ouvindo os interessados pró e contra, que lhe requererem, dentro de 15 dias.

Art. 41. Terminadas as diligencias e verificadas a idoneidade dos contrahentes para casar-se um com o outro, assim o decidirá, si for magistrado, ou remetterá ao juiz competente para decidir, e das decisões deste poderão as partes aggravar de petição ou instrumento.

Art. 42. Si da decisão não houver recurso, ou logo que ella passe em julgado, apezar dos recursos que lhe forem oppostos, o juiz mandará registrar a sua decisão no livro do registro dos casamentos.

Art. 43. Este registro fará retrotrahir os effeitos do casamento, em relação ao estado dos conjunges á data da celebração, e em relação aos filhos communs á data do nascimento, si nascerem viaveis.

Paragrapho unico. Serão dispensadas as formalidades dos arts. 38 a 42, si o enfermo convalescer e puder ratificar o casamento em presença do juiz e do official do registro civil.

Art. 44. Em caso urgente e de força maior, em que um dos contrahentes não possa transportar-se ao logar da residencia do outro, nem demorar o casamento, poderá o noivo impedido fazer-se representar no acto por um procurador bastante e especial para receber em seu nome o outro contrahente, cuja designação certa deverá ser feita no instrumento da procuração.

Art. 45. O estrangeiro, residente fóra do Brazil, não poderá casar-se nelle com brazileira por procuração, sem provar que a sua lei nacional admitte a validade do casamento feito por este meio.

Art. 46. Quando os contrahentes forem parentes dentro do 3º gráo civil, ou do 4º gráo duplicado, o seu parentesco será declarado no registro de que trata o art. 29, e nos attestados das testemunhas, a que se refere o § 4º do art. 1º.

CAPITULO V

DO CASAMENTO DOS BRAZILEIROS NO ESTRANGEIRO E DOS ESTRANGEIROS NO BRAZIL

Art. 47. O casamento dos brazileiros no estrangeiro deve ser feito de accordo com as disposições seguintes:

§ 1º Si ambos ou um só dos contrahentes é brazileiro, o casamento póde ser feito na fórma usada no paiz onde for celebrado.

§ 2º Si ambos os contrahentes forem brazileiros, podem tambem casar-se, na fórma da lei nacional, perante o agente diplomatico, ou consular do Brazil.

§ 3º Os casamentos de que trata o paragrapho antecedente estão sujeitos ás formalidades e aos impedimentos previstos nesta lei, os quaes serão devolvidos ao conhecimento do poder judicial do Brazil, e só depois de solvidos por elle se considerarão levantados onde foram oppostos.

§ 4º Os mesmos casamentos devem ser registrados no Brazil á vista dos documentos de que trata o art. 1º, tres mezes depois de celebrados, ou um mez depois que os conjuges ou, ao menos, um delles voltar ao paiz.

Art. 48. As disposições desta lei relativas as causas de impedimento e ás formalidades preliminares são applicaveis aos casamentos de estrangeiros celebrados no Brazil.

 

CAPITULO VI

DAS PROVAS DO CASAMENTO

Art. 49. A celebração do casamento contrahido no Brazil, depois do estabelecimento do registro civil, deve ser provada por certidão extrahida do mesmo registro; mas, provando-se a perda deste, é admissivel qualquer outra especie de prova.

Art. 50. Os casamentos contrahidos antes do estabelecimento daquelle registro devem ser provados por certidão extrahida dos livros parochiaes respectivos, ou na falta destes, por qualquer outra especie de prova.

Art. 51. Ninguem póde, porém, contestar o casamento de pessoas fallecidas na posse desse estado, em prejuizo dos filhos das mesmas pessoas, salvo provando, por certidão extrahida do registro civil ou dos livros parochiaes, que alguma dellas era casada com outra pessoa.

Art. 52. O casamento contrahido em paiz estrangeiro poderá provar-se por qualquer dos meios legaes, admittidos no mesmo paiz, salvo o caso do § 2º do art. 47, no qual a prova deverá ser feita na fórma do § 4º do mesmo artigo.

Art. 53. Quando for contestada a existencia do casamento, e forem contradictorias e equivalentes as provas exhibidas de parte a parte, a duvida será resolvida em favor do mesmo casamento, si os conjuges questionados tiverem vivido, ou viverem na posse desse estado.

Art. 54. Quando houver indicios de que, por culpa ou fraude do official, o acto do casamento deixou de ser incripto no livro do registro, os conjuges poderão proval-o pelos meios subsidiarios admittidos para supprir a falta do registro dos actos do estado civil.

Art. 55. Quando a prova da celebração legal de um casamento resultar de um processo judicial, a inscripção do julgado no respectivo registro produzirá, quer a respeito dos conjuges, quer dos filhos, todos os effeitos civis, desde a data da celebração do mesmo casamento.

 

CAPITULO VII

DOS EFFEITOS DO CASAMENTO

Art. 56. São effeitos do casamento:

§ 1º Constituir familia legitima e legitimar os filhos anteriormente havidos de um dos contrahentes com o outro, salvo si um destes ao tempo do nascimento, ou da concepção dos mesmos filhos, estiver casado com outra pessoa.

§ 2º Investir o marido da representação legal da familia e da administração dos bens communs, e daquelles que, por contracto ante-nupcial, devam ser administrados por elle.

§ 3º Investir o marido do direito de fixar o domicilio da familia, de autorizar a profissão da mulher e dirigir a educação dos filhos.

§ 4º Conferir á mulher o direito de usar do nome da familia do marido e gozar das suas honras e direitos, que pela legislação brazileira se possam communicar a ella.

§ 5º Obrigar o marido a sustentar e defender a mulher e os filhos.

§ 6º Determinar os direitos e deveres reciprocos, na fórma da legislação civil, entre o marido e a mulher e entre elles e os filhos.

Art. 57. Na falta do contracto ante-nupcial, os bens dos conjugues são presumidos communs, desde o dia seguinte ao do casa mento, salvo si provar-se que o matrimonio não foi consummado entre elles.

Paragrapho unico. Esta prova não será admissivel quando tiverem filhos anteriores ao casamento, ou forem concubinados antes delle, ou este houver sido precedido de rapto.

Art. 58. Tambem não haverá communhão de bens:

§ 1º Si a mulher for menor de 14 annos, ou maior de 50.

§ 2º Si o marido for menor de 16, ou maior de 60.

§ 3º Si os conjuges forem parentes dentro do 3º gráo civil ou do 4º duplicado.

§ 4º Si o casamento for contrahido com infracção do § 11 ou do § 12 do art. 7º, ainda que neste caso tenha precedido licença, do presidente da Relação do respectivo districto.

Art. 59. Em cada um dos casos dos paragraphos do artigo antecedente, todos os bens da mulher, presentes e futuros, serão considerados dotaes, e como taes garantidos na fórma do direito civil.

Art. 60. A faculdade conferida pela segunda parte do art. 27 do codigo commercial á mulher casada para hypothecar ou alhear o seu dote é restricta ás que, antes do casamento, já eram commerciantes.

 

CAPITULO VIII

DO CASAMENTO NULLO E DO ANNULLAVEL

Art. 61. E' nullo e não produz effeito em relação aos contrahentes, nem em relação aos filhos, o casamento feito com infracção de qualquer dos §§ 1º a 4º do art. 7º

Art. 62. A declaração dessa nullidade póde ser pedida por qualquer pessoa, que tenha interesse nella, ou ex-officio pelo orgão do ministerio publico.

Art. 63. E' annullavel o casamento contrahido com infracção de qualquer dos §§ 5º a 8º do art. 7º

Art. 64. A annullação do casamento, por coacção de um dos conjuges, só póde ser pedida pelo coacto dentro dos seis mezes seguintes á data em que tiver cessado o seu estado de coação.

Art. 65. A annullação do casamento, feito por pessoa incapaz de consentir, só póde ser promovida por ella mesma, quando se tornar capaz, ou por seus representantes legaes nos seis mezes seguintes ao casamento, ou pelos seus herdeiros dentro de igual prazo, depois de sua morte, si esta se verificar, continuando a incapacidade.

Art. 66. Si a pessoa incapaz tornar-se capaz depois do casamento e ratifical-o, antes delle ter sido annullado, a sua ratificação retrotrahirá á data do mesmo casamento.

Art. 67. A annullação do casamento feito com infracção do § 7º do art. 7º só póde ser pedida pelas pessoas que tinham o direito de consentir e não assistiram ao acto, dentro dos tres mezes seguintes á data em que tiverem conhecimento do casamento.

Art. 68. A annullação do casamento da menor de 14 annos ou do menor de 16 annos só póde ser pedida pelo proprio conjuge menor até seis mezes depois de attingir aquella idade, ou pelos seus representantes legaes, ou pelas pessoas mencionadas no art. 15, observada a ordem em que o são, até seis mezes depois do casamento.

Art. 69. Si a annullação do casamento for pedida por terceiro, fica salvo aos conjuges ratifical-o quando attingirem a idade exigida no § 8º do art. 7º, perante o juiz e o official do registro civil, e a ratificação terá effeito retroactivo, salva a disposição do art. 58 §§ 1º e 2º

Art. 70. A annullação do casamento não obsta á legitimidade do filho concebido na constancia delle.

Art. 71. Tambem será annullavel o casamento quando um dos conjuges houver consentido nelle por erro essencial, em que estivesse a respeito da pessoa do outro.

Art. 72. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro conjuge:

§ 1º A ignorancia do seu estado.

§ 2º A ignorancia de crime inafiançavel e não prescripto, commettido por elle antes do casamento.

§ 3º A ignorancia de defeito physico irremediavel e anterior, como a impotencia, e qualquer molestia incuravel ou transmissivel por contagio ou herança.

Art. 73. A annullação do casamento, nos casos do artigo antecedente, só póde ser pedida pelo outro conjuge dentro de dous annos, contados da sua data ou da data desta lei, si for anterior a ella.

Art. 74. A nullidade do casamento não póde ser pedida ex-officio, depois da morte de um dos conjuges.

Art. 75. Quando o casamento nullo ou annullavel tiver sido contrahido de boa fé, produzirá os seus effeitos civis, quer em relação aos conjuges, quer em relação aos filhos, ainda que estes fossem havidos antes do mesmo casamento. Todavia, si só um dos conjuges o tiver contrahido de boa fé, o casamento só produzirá effeito em favor delle e dos filhos.

Art. 76. A declaração da nullidade do casamento será pedida por acção summaria e independente de conciliação.

Art. 77. As causas de nullidade ou annullação do casamento e de divorcio, movidas entre os conjuges, serão precedidas de uma petição do autor, documentada quanto baste para justificar a separação dos conjuges, que o juiz concederá com a possivel brevidade.

Art. 78. Concedida a separação, a mulher poderá pedir os alimentos provisionaes, que lhe serão arbitrados, na fórma do direito civil, mesmo antes da conciliação.

Art. 79. Quando o casamento for declarado nullo por culpa de um dos conjuges, este perderá todas as vantagens havidas do outro e ficará, não obstante, obrigado a cumprir as promessas que lhe houver feito no respectivo contracto ante-nupcial.

CAPITULO IX

DO DIVORCIO

Art. 80. A acção do divorcio só compete aos conjuges e extingue-se pela morte de qualquer delles.(Eu grifei)

Art. 81. Si o conjuge, a quem competir a acção, for incapaz de exercel-a, poderá ser representado por qualquer dos seus ascendentes, descendentes ou irmãos, e na falta delles pelos parentes mais proximos, observada a ordem em que são mencionados neste artigo.

Art. 82. O pedido de divorcio só póde fundar-se em algum dos seguintes motivos:

§ 1º Adulterio.

§ 2º Sevicia, ou injuria grave.

§ 3º Abandono voluntario do domicilio conjugal e prolongado por dous annos continuos.

§ 4º Mutuo consentimento dos conjuges, si forem casados ha mais de dous annos.

Art. 83. O adulterio deixará de ser motivo para o divorcio:

§ 1º Si o réo for a mulher e tiver sido violentada pelo adultero.

§ 2º Si o autor houver concorrido para que o réo o commettesse.

§ 3º Quando tiver sobrevindo perdão da parte do autor.

Art. 84. Presume-se perdoado o adulterio quando o conjuge innocente, depois de ter conhecimento delle, houver cohabitado com o culpado.

Art. 85. Para obterem o divorcio por mutuo consentimento deverão os conjuges apresentar-se pessoalmente ao juiz, levando a sua petição escripta por um e assignada por ambos, ou ao seu rogo, si não souberem escrever, e instruida com os seguintes documentos:

§ 1º A certidão do casamento.

§ 2º A declaração de todos os seus bens e a partilha que houverem concordado fazer delles.

§ 3º A declaração do accordo que houverem tomado sobre a posse dos filhos menores, si os tiverem.

§ 4º A declaração da contribuição, com que cada um delles concorrerá para a criação e educação dos mesmos filhos, ou da pensão alimenticia do marido á mulher, si esta não ficar com bens sufficientes para manter-se.

§ 5º Traslado da nota do contracto ante-nupcial, si tiver havido.

Art. 86. Recebidos os documentos referidos e ouvidos separadamente os dous conjuges sobre o motivo do divorcio pelo juiz, este fixar-lhes-ha um prazo nunca menor de 15 dias nem maior de 30 para voltarem a ratificar, ou retractar o seu pedido.

Art. 87. Si, findo este prazo, voltarem ambos a ratificar o pedido, o juiz, depois de fazer autoar a petição com todos os documentos do art. 85, julgará por sentença o accordo, no prazo de duas audiencias, e appellará ex-officio. Si ambos os conjuges retractarem o pedido, o juiz restituir-lhes-ha todas as peças recebidas, e si sómente um delles retractar-se, a este entregará as mesmas peças, na presença do outro.

Art. 88. O divorcio não dissolve o vinculo conjugal, mas autoriza a separação indefinida dos corpos e faz cassar o regimen dos bens, como si o casamento fosse dissolvido.

Art. 89. Os conjuges divorciados podem reconciliar-se em qualquer tempo, mas não restabelecer o regimen dos bons, que, uma vez partilhados, serão administrados e alienados sem dependencia de autorização do marido, ou outorga da mulher.

Art. 90. A sentença do divorcio litigioso mandará entregar os filhos communs e menores ao conjuge innocente e fixará a quota com que o culpado deverá concorrer para educação delles, assim como a contribuição do marido para sustentação da mulher, si esta for innocente e pobre.

Art. 91. O divorcio dos conjuges, que tiverem filhos communs, não annulla o dote, que continuará sujeito aos onus do casamento, mas passará a ser administrado pela mulher, si ella for o conjuge innocente. Si o divorcio for promovido por mutuo consentimento, a administração do dote será regulada na conformidade das declarações do art. 85.

Art. 92. Si a mulher condemnada na acção do divorcio continuar a usar do nome do marido, poderá ser accusada, por este como incursa nas penas dos arts. 301 e 302 do codigo criminal.

CAPITULO X

DA DISSOLUÇÃO DO CASAMENTO

Art. 93. O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos conjuges, e neste caso proceder-se-ha a respeito dos filhos e dos bens do casal na conformidade do direito civil.

Art. 94. Todavia, si o conjuge fallecido for o marido, e a mulher não for binuba, esta lhe succederá nos seus direitos sobre a pessoa e os bens dos filhos menores, emquanto se conservar viuva. Si, porém, for binuba, ou estiver separada do marido por culpa sua, não será admittida a administrar os bens delles, nem como tutora ou curadora.

CAPITULO XI

DA POSSE DOS FILHOS

Art. 95. Declarado nullo ou annullado o casamento sem culpa de algum dos contrahentes, e havendo filhos communs, a mãe terá o direito á posse das filhas, emquanto forem menores, e a dos filhos até completarem a idade de 6 annos.

Art. 96. Si, porém, tiver havido culpa de um dos contrahentes, só ao outro competirá a posse dos filhos, salvo si o culpado for a mãe, que, ainda neste caso, poderá conserval-os comsigo até a idade de 3 annos, sem distincção de sexo.

Art. 97. No caso de divorcio, observar-se-ha o disposto nos arts. 85 e 90, de accordo com a clausula final do artigo antecedente.

Art. 98. Fica sempre salvo aos paes concordarem particularmente sobre a posse dos filhos, como lhes parecer melhor, em beneficio destes.

CAPITULO XII

DISPOSIÇÕES PENAES

Art. 99. O pae ou a mãe que se casar com infracção do § 9º do art. 7º perderá em proveito dos filhos, duas terças partes dos bens que lhe deveriam caber no inventario do casal, si o tivesse feito antes do seguinte casamento, e o direito á administração e ao usofructo dos bens dos mesmos filhos.

Art. 100. A mulher, que se casar com infracção do § 10 do mesmo artigo, não poderá fazer testamento, nem communicar com o marido mais de uma terça parte de seus bens presentes e futuros.

Art. 101. O tutor ou o curador, culpado de infracção do § 11 do citado art. 7º, será obrigado a dar ao conjuge do pupillo ou curatelado quanto baste para igualar os bens daquelle aos deste.

Art. 102. Na mesma pena do artigo antecedente incorrera o juiz, ou o escrivão culpado da infracção do § 12 do mesmo art. 7º, e bem assim na de perder o cargo, com inhabilitação para exercer outro, durante 10 annos.

Art. 103. A lei presume culpado o tutor, o curador, o juiz e o escrivão, nos casos dos §§ 11 e 12 do art. 7º

Art. 104. O official do registro civil, que publicar proclamas sem autorização de ambos os contrahentes, ou der a certidão do art. 3º sem lhe terem sido apresentados os documentos exigidos pelo art. 1º, ou pendendo impedimento ainda não julgado improcedente, ou deixar de declarar os impedimentos, que lhe forem apresentados, ou que lhe constarem com certeza e puderem ser oppostos por elle ex-officio, ficará sujeito á multa de 20$ a 200$ para a respectiva Municipalidade.

Art. 105. Na mesma multa incorrerá o juiz que assistir ao casamento antes de levantados os impedimentos oppostos contra algum dos contrahentes, ou deixar de recebel-os, quando opportunamente offerecidos, nos termos do art. 13, ou de oppol-os, quando lhe constarem, ou deverem ser oppostos ex-officio, ou recusar-se a assistir ao casamento, sem motivo justificado.

Art. 106. Si o casamento for declarado nullo, ou annullado, ou deixar de effectuar-se por culpa do juiz, ou do official do registro civil, o culpado perderá o seu logar e ficará, durante 10 annos, inhibido de exercer qualquer outro cargo publico, ainda mesmo gratuito.

Art. 107. As penas comminadas neste capitulo serão applicadas sem prejuizo das que aos respectivos delictos estiverem comminadas no codigo criminal e no decreto n. 9886 de 7 de março de 1888.

CAPITULO XIII

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 108. Esta lei começará a ter execução desde o dia 24 de maio de 1890, e desta data por deante só serão considerados válidos os casamentos celebrados no Brazil, si o forem de accordo com as suas disposições.

Paragrapho unico. Fica, em todo caso, salvo aos contrahentes observar, antes ou depois do casamento civil, as formalidades e ceremonias prescriptas para celebração do matrimonio pela religião delles.

Art. 109. Da mesma data por deante todas as causas matrimoniaes ficarão competindo exclusivamente á jurisdicção civil. As pendentes, porém, continuarão o seu curso regular, no fôro ecclesiastico.

Art. 110. Emquanto não forem creados os logares de official privativo do registro civil, e de juiz dos casamentos, as funcções daquelle serão exercidas pelos escrivães de paz na fórma do decreto n. 9886 de 7 de março de 1888, e as deste pelo respectivo 1º juiz de paz, quanto á presidencia do acto, e quanto ao conhecimento dos impedimentos pelo juiz de direito da comarca respectiva ou pelo juiz especial de orphãos, nas comarcas onde o houver, ou pelo da 1ª vara, onde houver mais de um.

Art. 111. Os impedimentos, a que se refere o art. 47 § 3º, serão decididos pelo juiz do domicilio do impedido, antes de sahir do Brazil, e si elle houver sahido a mais de dous annos, ou não tiver deixado um domicilio notorio, serão decididos pelo juiz de orphãos da capital do Estado em que ultimamente houver residido.

Art. 112. Ao juiz de direito da comarca, ou ao de orphãos, conforme as distincções estabelecidas no art. 110, compete o conhecimento das causas de nullidade ou annullação de casamento e as de divorcio litigioso, ou por mutuo consentimento.

Art. 113. Para as causas do artigo antecedente não haverá alçada, nem ferias forenses, e as de annullação do casamento e do divorcio serão ordinarias.

Art. 114. Nas causas de divorcio, movidas nos termos do art. 81, Será sempre o ouvido o curador de orphãos.

Art. 115. Nas causas de annullação do casamento, o juiz nomeará um curador especial para defender a validade delle, até a appellação inclusive. Esse curador perceberá os mesmos emolumentos e honorarios taxados para os curadores dos orphãos pelos arts. 90 e 91 do decreto n. 5737 de 2 de setembro de 1874.

Art. 116. As sentenças que decidirem a nullidade ou a annullação do casamento, ou o divorcio, serão averbadas na casa das observações do respectivo registro civil pelo official deste ou pelo secretario da Camara Municipal, conforme as hypotheses previstas no art. 24 do decreto n. 9886.

Art. 117. A averbação se fará, nos casos de nullidade ou annullação do casamento, do seguinte modo: «Declarado nullo (ou annullado) por sentença de  do juizo de (escrivão F.) confirmada por acordão do Tribunal Appellação n. (Escrivão F.) e mutatis mutantis para as sentenças de divorcio.

Art. 118. Antes de averbadas no registro civil, as referidas sentenças não produzirão effeito contra terceiros.

Art. 119. Quando o casamento for impedido, ou o impedimento levantado em virtude de confissão feita nos termos do art. 8º ou do paragrapho unico do art. 17, a parte interessada em fazer ou impedir o casamento poderá haver vista della no cartorio, e reclamar perante o juiz, no 1º caso contra o impedimento e no 2º contra o levantamento delle, e sendo indeferido, aggravar de petição na fórma do § 12 do art. 14 do decreto n. 143 de 15 de março de 1842.

Art. 120. Nos outros casos de impedimento caberá contra as decisões do juiz o recurso de aggravo de petição, ou de instrumento, conforme a distancia do juizo ad quem.

Art. 121. O official do registro terá mais um livro, que poderá ser menor que o dos casamentos, mas deverá ser aberto e encerrado como este, para o registro dos editaes dos proclamas, na fórma do art. 6º

Art. 122. O juiz de paz perceberá por assistir ao casamento 2$000, si for celebrado na casa das audiencias, e o dobro, além da conducção, si for fóra. O official do registro perceberá metade daquelle salario e a mesma conducção por inteiro, incluido no seu salario o custo do termo do casamento.

Art. 123. Além daquelle salario, o official do registro perceberá de cada registro dos termos lavrados na conformidade do art. 35, das sentenças a que se referem os arts. 42 e 55, dos pregões de edital dos proclamas, das certidões de habilitação dos contrahentes ou da apresentação do impedimento, e das averbações a que se refere o art. 116, 1$ por cada acto.

Art. 124. Os demais actos do juiz de paz, ou do official do registro, relativos ao casamento, que não estiverem taxados no regimento de custas, ou no decreto n. 9886, serão gratis, e os mesmos dos artigos antecedentes tambem o serão, no caso do art. 40 do referido decreto.

Art. 125. Ficam revogadas as disposições em contrario.

O Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Justiça assim o faça executar.

Sala das sessões do Governo Provisorio, 24 de janeiro de 1890, 2º da Republica. - Manoel Deodoro da Fonseca. - M. Ferraz de Campos Salles. - Demetrio Nunes Ribeiro. - Aristides da Silveira Lobo. - Ruy Barbosa. - Benjamin Constant Botelho de Magalhães. - Eduardo Wandenholk.

 

 

3.    A FILOSOFIA E O JURÍDICO

 

Jürgen Habermas, o filho pródigo da Escola de Frankfurt nos ensina:

“As expectativas e os modos de pensar e de se comportar dos cidadãos, que não podem ser simplesmente impostos mediante o direito, podem ser, no entanto, explicitados a partir desses dois componentes da legitimação. As condições para uma participação bem-sucedida na prática comum de autodeterminação definem o papel de cidadão do Estado: os cidadãos devem respeitar-se reciprocamente como membros de sua respectiva comunidade política, dotados de iguais direitos, apesar de seu dissenso em questões envolvendo convicções religiosas e visões de mundo...O Estado liberal possui, evidentemente, um interesse na liberação das vozes religiosas no âmbito da esfera pública política, bem como na participação política de organizações religiosas. Ele não pode desencorajar os crentes nem as comunidades religiosas de se manifestarem também, enquanto tal, de forma política, porque ele não pode saber de antemão se a proibição de tais manifestações não estaria privando, ao mesmo tempo, a sociedade de recursos importantes para a criação de sentido. Os próprios cidadãos seculares como também os crentes de outras denominações podem, sob certas condições, aprender algo das contribuições religiosas, tal como acontece, por exemplo, quando eles conseguem reconhecer, nos conteúdos normativos de uma determinada exteriorização religiosa, certas intuições que eles mesmos compartilham...”[15]

 

3.1 A leitura de Antonio Negri: uma hermenêutica do poder constituinte ( MAQUIAVEL). Um hiato principiológico.

 

Essa visão ou interpretação tornou-se a mais comum, e até certo ponto estereotipada, ao longo desse debate de séculos sobre a obra de Maquiavel. No entanto, como vimos em Bobbio, é apenas uma dentre outras possíveis, e não esgota, de modo algum, a riqueza política do pensamento maquiaveliano. É preciso ir mais além. Nesse sentido, se a hermenêutica - termo derivado do grego hermeneuein e de hermeios, palavra relativa ao deus grego Hermes, inventor mitológico da linguagem e da escrita e intérprete da vontade dos deuses - é a teoria ou a filosofia da interpretação, capaz de instrumentalizar esta última em sua tarefa de descobrir, aclarar e expressar o significado que está contido no objeto de estudo para além de sua aparência e de sua exterioridade, analisar e aclarar o sentido do trabalho de Maquiavel não é algo que se possa fazer limitando-se o intérprete a uma exegese literal dos seus textos, ou isolando um trabalho em particular do conjunto de suas obras e do triplo contexto do homem, do seu lugar e do seu tempo. E é precisamente esse o caminho seguido por Antonio Negri [16]no seu “O poder constituinte”: o de evitar a perquirição meramente literal ou mais ou menos isolada de um momento específico dentro de uma totalidade que é ao mesmo tempo um produto da história e de uma época e um rompimento com essa história e essa época. O resultado é um mergulho no pensamento maquiaveliano que evita o lugar-comum de dar precedência e destaque ao Príncipe e, em conseqüência, de valorá-lo isoladamente do conjunto da obra do secretário florentino.

Esse caminho é um esforço hermenêutico que procura abarcar toda a imbricação dos escritos de Maquiavel entre si (incluindo os de natureza epistolar), com sua vivência e experiências pessoais, seu conhecimento, sua herança e originalidade intelectuais e o ambiente político em que viveu e trabalhou. Esse esforço, ainda que sem negar os elementos de historicidade do pensamento de Maquiavel, recusa enclausurar a obra interpretada na finitude histórica que resultaria, por exemplo, de sua leitura sob o foco da hermenêutica das tradições de Hans-Georg Gadamer.

Do mesmo modo, também não se detém na perquirição dos interesses que presidiram a ação intelectual do secretário e pensador florentino, ao estilo da hermenêutica crítica de Jürgen Habermas, mas abre sua interpretação para toda a riqueza de possibilidades contida no objeto investigado, principalmente as de ruptura. Como define o próprio Negri, no capítulo inaugural de O poder constituinte:

    Não nos interessa a arqueologia do poder constituinte; interessa-nos uma hermenêutica que, além das palavras e através delas, saiba interpretar a vida, as alternativas, a crise e a recomposição, a construção e a criação de uma faculdade do gênero humano: a de construir instituições políticas.”[17]

A situação da Itália, conforme aparece em escritos de Maquiavel, é peculiar, e mais moderna, por exemplo, que a da França. Nesta, a soberania absoluta do monarca estava assentada sobre um antigo sentimento de autoridade, desconhecido dos italianos. A profundidade da crise italiana exigia uma ação constituinte de extrema radicalidade, com toda a potência de um ato criador. Na França, ao contrário, a antiguidade de sua constituição material, aliada à humildade e à obediência dos súditos, tornava máximos os efeitos da institucionalização do poder, e mais fechado o tempo histórico. Essa diferença de condições levou a uma longa permanência do modelo dinástico absolutista na França, e a uma grande radicalidade da mutação do poder na Itália, ainda que neste último caso sua natureza fosse sempre republicana.

Em sua correspondência, amargando o exílio em meio à miséria de San Casciano, Maquiavel se debruça sobre a enorme desproporção de forças no campo internacional, sobre o jogo entre os dispositivos político-militares dos grandes Estados europeus, em face da impotência da Itália à época. Se o princípio constituinte não pode ser discutido no terreno quantitativo da força, somente o poderia ser no sentido qualitativo, como uma nova potência, uma nova qualidade política. Meditando, em meio à sua própria desdita, sobre os destinos individuais, o tempo e a ordem das coisas, o nexo entre elas assume um tom de desespero: a virtù, se chega a nascer, é filha de uma natureza avarenta. A fortuna é um limite objetivo ao desespero subjetivo e singular, e nessa imbricação terá que se exprimir a potência do princípio constitutivo, sem nenhuma outra fundação, senão a virtù aplicada sobre uma trama construída pelo tecido materialista e ateu da casualidade, formando um nexo que define a própria possibilidade da hipótese constitutiva.

            Então, Maquiavel, que em meio à sua tragédia pessoal havia começado a redação dos Discursos, a interrompeu para escrever O Príncipe. Não o fez como um trabalho autônomo e independente do primeiro, mas para aprofundar o conceito de poder constituinte, conectado aos pressupostos da problemática exposta nos Discursos: sob este ponto de vista, O Príncipe é uma fórmula republicana – “o príncipe novo cria repúblicas”, como diz Negri [18]. O resultado foi não apenas uma ruptura profunda na tradição do pensamento teórico-político ocidental, mas uma descontinuidade do alinhamento inicial dos Discursos com Políbios. Isso ocorre dentro de uma relação insolúvel entre virtù e fortuna, que não é um princípio dialético, não se resolvendo nem se superando, e por isso mesmo se mantendo na terrível precariedade de uma potência sempre aberta sobre uma multiplicidade de possibilidades, e que dessa forma jamais se recompõe inteiramente.

 

 

 

 

 

 

4.    CONCLUSÂO

 

No sentido que entendemos república, a partir do modelo de Montesquieu, o judiciário é o menos acessível à mudanças e ao povo. A linguagem do judiciário e o seu procedimento, mesmo o rito processual obstaculariza o entendimento do homem comum. Tal tradição, encontra raiz nas missas em latim e nos ensinamentos do catolicismo romano.

O presente artigo parece rancoroso no sentido da crítica, todavia, o “século da Luzes”, entendamos o século XVIII, motivado pelos anseios de liberdade, igualdade e fraternidade, encontrou resistências antes e depois de 1789. Na França foi uma tentativa frustrada e mal organizada , o sangue tingiu todas as possibilidades trazidas pelos clássicos Diderot, Voltaire, Jean le Rond d'Alembert, Robespierre, Marat, Danton entre outros.

Os norte-americanos, com pouco sangue e mais reflexão, souberam equacionar a questão do Direito, menos pautado na liturgia do Direito romano e mais na experiência do  “Common law” , Montesquieu e Maquiavel. Em outro momento, apuraremos o sentido da moral no Direito contrapondo Immanuel Kant e Hans Kelsen, entendemos que Kelsen baseia-se na interpretação dada pelo sábio de Königsberg em sua “Crítica da Razão Pura” obra de 1781 que Kelsen apoiou-se para a sua “Teoria pura do Direito”. Imperativo Categórico ? Em um segundo artigo, procuraremos adentrar no tema e mostrar, não sem esforço, que a moral advinda de Kant possui origem nas relações práticas e não nas relações puras, provavelmente aí, Kelsen tenha tornado seu trabalho , melhor, sua produção, inacessível.

Nosso caminho será sempre o da filosofia, nela encontraremos a dúvida como condutora pelas diferentes estradas a seguir. No presente artigo, nas citações que trouxemos à luz, cá e acolá, foi uma demostração que por se tratar de uma ciência essencial para a sobrevivência do homem, o Direito merece e carece de maior atenção dos que a ele dedicam tempo em seus estudos.

O sociólogo Boaventura de Sousa Santos, em seu livro “Pela Mão de Alice” conduz excelente reflexão sobre o que ele entende da pós- modernidade no social e no político. Dedica o emérito estudioso, o capítulo VII à cidadania, emancipação e utopia. Intitula o referido capítulo de “A socialização dos tribunais e a democratização da justiça” . O bom mestre entende que o paradigma que prende o Direito será quebrado, a dicotomia Law in books/law in action . Na página 165 do livro mencionado, o português nos leva ao seguinte dilema: “ A igualdade dos cidadãos perante a lei passou a ser confrontada com a desigualdade da lei perante os cidadãos”.

Boaventura de Sousa Santos, desenvolve uma esperança utópica com relação à democratização do Direito, antes seja assim, melhor a utopia que a dystopia. Que as instituições jurídicas se apresentam em crise de identidade frente ao povo é fato. A questão delgada é a resistência que o Direito apresenta frente a qualquer vento de mudança. Estatutos, ativismo jurídico, são medidas que surgem para aplacar a ânsia de justiça, todavia, são medidas paliativas. O próprio Boaventura , na última linha do seu livro nos diz: “ Mas se é verdade que a paciência dos conceitos é grande, a paciência da utopia é infinita”. Os debates se apresentam na Academia, cabe aos estudantes e aos pesquisadores do Direito, sociologia jurídica, antropologia jurídica e outras ciências, levarem a cabo essa proposta, mudarmos os conceitos ou aceitarmos pacientemente as utopias.

 

 

Sérgio Ricardo de Freitas Cruz

 

 

 

 

Bibliografia:

Acquaviva, Marcus Cláudio- “ Teoria geral do Estado”- Global Editora-1987-São Paulo SP.

Bauman, Zygmunt- “ A sociedade individualizada-vidas contadas e histórias vividas”- Zahar Editora- 2001- Rio de Janeiro RJ.

Bobbio, Noberto- “Direito, ética e Política”– Editora UniJuí- 2005-Ijuí-RS.

Carnelutti, Francesco- “Como se faz um processo”- Edijur -2012 Leme RJ.

Concilium- Revista internacional de Teologia-nº59 setembro de 1970- texto apreciado : “O que é duvidar ?” por Josef Goldbrunner, p. 1129

Freitas Câmara, Alexandre- “Lições de Direito processual civil Vol. II” Lumen Juris Editora- 14ª edição 2007 Rio de Janeiro RJ

Machado Neto, A.L- “O problema da ciência do Direito”- Progresso Editora- 1958- Salvador BA.

Maquiavel, Nicolau- “ O Príncipe”– Clio Editora- 2009- São Paulo SP

Matheus, B. Gareth-“Santo Agostinho- A vida e as idéias de um filósofo adiante do seu tempo” Zahar Editora – 2007 Rio de Janeiro RJ.

Miranda Guimarães, Ylves José de- “Comentários à Constituição- Direitos e Garantias individuais e coletivas”- Editora Forense- 1989- 1ª edição Rio de Janeiro RJ.

Morin, Edgar- “Cultura de massas no século XX – O espírito das massas” – Forense Universitária-1962-Rio de Janeiro RJ.

Santos,Moacyr Amaral- “ Primeiras linhas de Direito processual civil”-Editora Saraiva- 1º Volume 6ª edição-1978 São Paulo SP.

Sousa Santos, Boaventura- “Pela mão de Alice- o social e o político na pós-modernidade”- Cortez Editora- 1995- 10ª edição- São Paulo SP.

Venosa, Sílvio de Salvo- “Introdução ao estudo do Direito- Primeiras linhas”- Editora Atlas- 2004 São Paulo SP.

Weber, Max- “A ética protestante e o espírito do capitalismo”- Martin Claret- 2002 São Paulo SP.

 

 

 

Sítios pesquisados e recomendados:

www.planalto.gov.br

www.in.gov.br

http://www.stf.jus.br/

 

 

 

 



[1] In “ O Leopardo”- p. 42 Nova Cultural – tradução de Leonardo Codignoto São Paulo - 2003

 

[2]In “O problema da Ciência do Direito”- A.L Machado Neto- p. 19 .Progresso Editora- Salvador Bahia- 1958.

 

[3]Op. Cit. p. 105

[4]In “ Para além do bem e do mal”- Friedrich Nietzsche- p. 16. Editora Martin Claret – 3ª edição São Paulo 2011

[5]In “ Martin Heidegger, Nietzsche”, p.10  Editora Forense Universitária, Rio de Janeiro -2007.

 

[7]Alexandre Freitas Câmara – “Lições de Direito Processual Civil II” p. 42 Editora Lumen Juris- 14ª edição Rio de Janeiro  2007.

 

[9]  In J.J Canotilho-  Direito Constitucional – Almedina – Coimbra - Portugal – 1991 -  5ª edição - pp. 1056/1057

[10] Tércio Sampaio Ferraz Jr. Função social da dogmática jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980.

 

[11]In Marilena Chauí, Convite à Filosofia, p. 69, Editora Ática.

 

[12] A. L. Machado Neto, Teoria da Ciência Jurídica, p. 84, Ed. Saraiva.

 

[13] Laís Vieira Cardoso in jusvavegandi

[14]PERELMAN, Chaïm , Ética e Direito, p. 463. Editora Martins Fontes.

[15] In  Jürgen Habermas. Entre naturalismo e religião: estudos filosóficos. 2007.Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. p.399.

 

[16] Filósofo e cientista social italiano, antigo catedrático de Filosofia do Direito da Universidade de Pádua, da qual foi desligado por razões políticas, e cuja participação militante nos debates e embates políticos italianos da década de 1970 lhe rendeu uma condenação e um exílio na França, onde lecionou na Universidade de Paris VIII e no Collége Internacional de Philosofie. Retornando à Itália, cumpriu ainda pena na penitenciária romana de Rebibia, sem que isso o fizesse interromper sua vigorosa produção intelectual. Em O poder constituinte – ensaio sobre as alternativas da modernidade, está grande parte da base conceitual utilizada na sua obra de maior repercussão, Império, escrita em conjunto com Michael Hardt. Esta última obra é uma análise simultaneamente audaciosa, estranha e profunda dos processos da dominação capitalista global. Acompanhamos Negri desde seus artigos publicados quinzenalmente no Caderno Mias (Suplemento de filosofia) da Folha de São Paulo, isso na década de 1990.

 

[17]Antonio Negri . O poder constituinte: ensaio sobre as alternativas da modernidade. Rio de Janeiro. DP&A, 2002.

[18]Antonio Negri . O poder constituinte: ensaio sobre as alternativas da modernidade. Rio de Janeiro. DP&A, 2002, p.91

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