JurisWay - Sistema Educacional Online
 
É online e gratuito, não perca tempo!
 
Cursos
Certificados
Concursos
OAB
ENEM
Vídeos
Modelos
Perguntas
Eventos
Artigos
Fale Conosco
Mais...
 
Email
Senha
powered by
Google  
 

Responsabilidade civil dos profissionais da área de saúde diante do CDC, da CF/1988, do CP e do CC


Autoria:

Sérgio Henrique Da Silva Pereira


Sérgio Henrique da Silva Pereira Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet - A Revista do Administrador Público], Investidura - Portal Jurídico, JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação. Participação na Rádio Justiça.

envie um e-mail para este autor

Resumo:

O artigo analisa as responsabilidades dos profissionais da área de saúde, as entidades de atendimento médico-hospitalar emergencial (clínicas, hospitais, casas de saúde e unidades de saúde, públicas ou privadas).

Texto enviado ao JurisWay em 05/08/2014.

Última edição/atualização em 24/10/2014.



Indique este texto a seus amigos indique esta página a um amigo



Quer disponibilizar seu artigo no JurisWay?

O artigo analisa as responsabilidades dos profissionais da área de saúde, as entidades de atendimento médico-hospitalar emergencial (clínicas, hospitais, casas de saúde e unidades de saúde, públicas ou privadas) diante das normas contidas no CDC, na CF/1988, no CP e no CC.

 

Sumário: 1) Juramentos; 2) Carreiras promissoras e formação profissional; 3) Códigos de ética; 4) Legislação; 5) Comparativo entre omissão de socorro de condutor e profissional de saúde; 6) Conclusão.

 

1) Juramento:

 

1.1) Hipócrates   

"Eu juro, por Apolo médico, por Esculápio, Hígia e Panacea, e tomo por testemunhas todos os deuses e todas as deusas, cumprir, segundo meu poder e minha razão, a promessa que se segue: 

Estimar, tanto quanto a meus pais, aquele que me ensinou esta arte; fazer vida comum e, se necessário for, com ele partilhar meus bens; ter seus filhos por meus próprios irmãos; ensinar-lhes esta arte, se eles tiverem necessidade de aprendê-la, sem remuneração e nem compromisso escrito; fazer participar dos preceitos, das lições e de todo o resto do ensino, meus filhos, os de meu mestre e os discípulos inscritos segundo os regulamentos da profissão, porém, só a estes. 

Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém. 

A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva.  

Conservarei imaculada minha vida e minha arte. 

Não praticarei a talha, mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa operação aos práticos que disso cuidam. 

Em toda casa, aí entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o dano voluntário e de toda a sedução, sobretudo dos prazeres do amor, com as mulheres ou com os homens livres ou escravizados. 

Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto. 

Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça [1]".

 

1.2) Juramento do Médico (Declaração de Genebra*) 

“No momento de me tornar um profissional médico: Prometo solenemente dedicar a minha vida a serviço da Humanidade. Darei aos meus Mestres o respeito e o reconhecimento que lhes são devidos. Exercerei a minha arte com consciência e dignidade. A saúde do meu paciente será minha primeira preocupação. Mesmo após a morte do paciente, respeitarei os segredos que a mim foram confiados. Manterei, por todos os meios ao meu alcance, a honra da profissão médica. Os meus colegas médicos serão meus irmãos. Não deixarei de exercer meu dever de tratar o paciente em função de idade, doença, deficiência, crença religiosa, origem étnica, sexo, nacionalidade, filiação político-partidária, raça, orientação sexual, condições sociais ou econômicas. 

Terei respeito absoluto pela vida humana e jamais farei uso dos meus conhecimentos médicos contra as leis da Humanidade. 

Faço essas promessas solenemente, livremente e sob a minha honra. 

* Adotada em 1948 e revista em 1994 pela Assembleia Geral da Associação Médica Mundial [1.1]

 

2) Carreiras promissoras e formação profissional (ética)

Medicina, enfermagem, fisioterapia, profissões que têm como diretrizes a manutenção da saúde humana. Tais cursos demandam - além do conhecimento técnico a essência - amor. De nada adianta ser um profissional da área de saúde se não há a nobre essência da solidariedade humana diante de outro ser humano. No site do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) foi divulgado (14/07/2013) matéria da Veja Online sobre promissoras carreiras profissionais para os próximos dez anos. A dez carreiras são: saúde, educação, tecnologia da informação e comunicação (TIC) e engenharia [2].

 

E o que é saúde?

“A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade [3].”

 

Com as políticas públicas de acesso [facilitação] ao ensino universitário, o Brasil teve uma proliferação vertiginosa de universidades. Antes da Constituição Federal de 1988, o acesso à educação superior era uma exclusividade para poucos. Os estabelecimentos privados de ensino, no caso os cursinhos pré-vestibulares, eram obrigatórios para os que quisessem ingressar numa universidade, principalmente as públicas. Aos párias seculares o sonho de cursar nível superior era uma miragem.

A carreira de medicina sempre foi uma das mais concorridas.  Ao longo da história humana quem curava de doente era considerado quase um semideus. Com o avanço da humanidade e distanciamento dos dogmas, tabus e crendices, a medicina passou a ser considerada uma profissão de pessoas intelectualizadas. A figura do médico, por exemplo, no século XIX era quase de uma dignidade sacerdotal, ou seja, as opiniões dos médicos e as suas posturas não poderiam ser questionadas pelos pacientes, pois os médicos tinham conhecimentos aquém dos mortais. Demais profissionais de saúde não tinham vozes, isto é, o que o médico falava ninguém mais poderia questioná-lo.

As mudanças sociais foram acontecendo devido aos próprios avanços proporcionados pelas tecnologias e quebra de paradigmas psicológicas. Novas áreas (acadêmicas e profissionais)  surgiram, o médico foi cedendo espaço aos demais profissionais, no que diz respeito ao contato, acompanhamento e tratamento. Importante lembrar que houve – ainda há, mas pouco – um hiato entre a medicina ocidental e a oriental. Se um médico acupuntor brasileiro [prática alternativa de saúde], por exemplo, na década de 1970, quisesse aplicar “agulhadas” em algum paciente poderia ser chamado de “louco”. Sem motivos reais, a prática de acupuntura vem sendo monopolizada [reserva de mercado] por certos profissionais de saúde. As justificativas são diversas [reserva de mercado], sendo que a medicina ocidental em nada lembra a medicina oriental, e vice-versa [4].  

 Os cuidados com a saúde do enfermo passou a ser dirigido por atuações de vários profissionais [multidisciplinar], desde fisioterapeutas até nutricionistas, dependendo do caso. No Brasil, o ato médico foi parar no Congresso Nacional.

Com os avanços tecnológicos, uma nova realidade surgiu para os profissionais de saúde humana: o paciente inquiridor. O acesso à rede mundial de computadores (internet) proporcionou aos pacientes mais conhecimentos sobre seus problemas. As consultas, então, entre profissionais de saúde e pacientes formou um novo contexto, assim os profissionais de saúde não mais são mais declaradores de doenças e profilaxias, mas profissionais que devem responder às dúvidas de seus pacientes, e a estes o direito de obterem respostas precisas e educadas. 

A ética profissional tem sido discutida por muitos Conselhos (enfermagem, medicina etc.) principalmente quanto aos descasos e ineficiências técnicas dos profissionais da área de saúde aos pacientes. No livro “Ética para os futuros médicos. É possível ensinar? [5], logo no prefácio, há informação sobre a situação da medicina tanto no Brasil mundialmente:

 

“A medicina que, no passado, era simples, ineficaz e razoavelmente inócua, com a revolução tecnológica se tornou complexa, eficaz, mas potencialmente perigosa. Publicação recente da American Hospital Association aponta o número de 98 mil para as mortes anuais nos EUA em conseqüência (“sisc”) de erros cometidos na prática médica. Assinala que, naquele país, morrem mais pessoas a cada ano em resultados de erros cometidos nos atos médicos do que em acidentes rodoviários (43.458), câncer de pulmão (42.297) ou AIDS (16.516). Estes números assustadores revelam que as iatrogenias [6] e os erros profissionais do médico poderão se tornar o maior problema de saúde no século XXI. Este cenário trágico poderá ser revertido se formarmos médicos além de tecnicamente competentes, que sejam portadores de sólido embasamento ético-humanístico, capazes, portanto, de estabelecer uma relação médico-paciente generosa, solidária, empática e prudente”.

 

Continuando com a apresentação, o humanista Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (CREMEB), Jecé Freitas Brandão, urge mudanças substanciais na formação dos futuros profissionais da área de medicina: 

“É sabido que a maioria dos pacientes que freqüenta (“sic”) os ambulatórios/consultórios é constituída pelos denominados pacientes funcionais ou psicossomatizados e pelos portadores de afecções crônicas. Esta clientela majoritária, pela complexidade e subjetividade dos seus sofrimentos, somente pode ser aliviada adequadamente por médicos equipados com elevada cultura humanística. Para a construção desta competência humanística essencial é necessário a inclusão na grade curricular de matérias como história da medicina, fundamentos de antropologia, filosofia, psicologia, tudo isso permeado pelo cimento da ética médica e da bioética”. 

 

 

3)Códigos de ética

a)Médica

O sexto Código de Ética Médica brasileiro entrou em vigor no dia 13 de abril de 2010. Entre as novidades estão [7]: 

•Revisão de cuidados paliativos;

•Reforço à autonomia do paciente e regras para reprodução assistida e a manipulação genética; e

•Extensão de seu alcance aos médicos em cargos de gestão, pesquisa e ensino.

 

 

O Código de Ética Médica brasileiro traz vedações aos médicos e faltas graves: 

“Capítulo IV 

DIREITOS HUMANOS 

É vedado ao médico:

Art. 23. Tratar o ser humano sem civilidade ou consideração, desrespeitar sua dignidade ou discriminá-lo de qualquer forma ou sob qualquer pretexto”.

 

“Capítulo V

RELAÇÃO COM PACIENTES E FAMILIARES

É vedado ao médico:

Art. 33. Deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em casos de urgência ou emergência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo”.

 

“Capítulo XIV

DISPOSIÇÕES GERAIS

II - Os médicos que cometerem faltas graves previstas neste Código e cuja continuidade do exercício profissional constitua risco de danos irreparáveis ao paciente ou à sociedade poderão ter o exercício profissional suspenso mediante procedimento administrativo específico”.

 

 

b) Código de Ética e Deontologia da Fisioterapia:

 

 “Artigo 6º - O fisioterapeuta protege o cliente/paciente/usuário e a instituição/programa em que trabalha contra danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência por parte de qualquer membro da equipe de saúde, advertindo o profissional faltoso”.

“Artigo 9º - Constituem-se deveres fundamentais do fisioterapeuta, segundo sua área e atribuição específica:

I – assumir responsabilidade técnica por serviço de Fisioterapia, em caráter de urgência, quando designado ou quando for o único profissional do setor, atendendo a Resolução específica;

II - exercer sua atividade com zelo, probidade e decoro e obedecer aos preceitos da ética profissional, da moral, do civismo e das leis em vigor, preservando a honra, o prestígio e as tradições de sua profissão”.

 

“Artigo 10 -  É proibido ao fisioterapeuta:

I - negar a assistência ao ser humano ou à coletividade em caso de indubitável urgência”.

  

c) Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem (RESOLUÇÃO COFEN 311/2007) 

“Art. 26 – Negar assistência de enfermagem em qualquer situação que se caracterize como urgência ou emergência”.

“Art. 112 – A caracterização das infrações éticas e disciplinares e a aplicação das respectivas penalidades regem-se por este Código, sem prejuízo das sanções previstas em outros dispositivos legais”.

“Art. 113 – Considera-se infração ética a ação, omissão ou conivência que implique em desobediência e/ou inobservância às disposições do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem”.

 

Vemos que em todos os códigos de ética, os respectivos profissionais têm a obrigação de atenderem cidadãos em situações de emergência e urgência. E o que é emergência e urgência?

 

“Emergência- ocorrência imprevista, com risco potencial à vida, cujo portador necessita de atenção imediata, a fim de se garantir a integridade das funções vitais básicas, esclarecer se há agravos à saúde, ou providenciar condições que favoreçam a melhor assistência médica; urgência- ocorrência de agravos à saúde, com risco real e iminente à vida, cujo portador necessita de intervenção rápida e efetiva, estabelecida por critérios médicos previamente definidos, mediante procedimentos de proteção, manutenção ou recuperação das funções vitais acometidas. Longe de ser apenas um exercício de retórica tais sugestões pretendem contribuir para o aperfeiçoamento efetivo da prática médica [8]”.

 

"Uma situação de urgência é quando existe a necessidade de um atendimento com rapidez, na proporção da gravidade, mas sem risco eminente à saúde. Já a emergência é toda a situação que envolve risco de morte, entre elas, as paradas cardiorrespiratórias e as hemorragias. Ao contrário do que muitos imaginam, as fraturas de braços, dedos e pernas, desde que não sejam fraturas expostas, são situações de urgência e não de emergência” [9].

 

Pelo que se depreende, não há um consenso sobre as terminologias, todavia, à condição humana, seja em qual estado se encontrar, da simples torção no pé até ferimentos graves, a ação humanitária é necessária para que o “verniz” civilizatório (civilidade) não se extinga nas relações humanas. E nossos “selvagens” pajés sabiam muito sobre isso: sem solidariedade não há sobrevivência e muito menos existência digna.

 

 

4) Legislação: 

a) Código Civil (LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002): 

 “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

“Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo”.

“Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu”.

 

 

b) Código Penal (DECRETO-LEI No 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940) 

“Tempo do crime

        Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 1984)”.

 

“Lugar do crime (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 1984)

        Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 1984)”.

 

“Relação de causalidade (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”.

 

“Relevância da omissão (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        § 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”.

 

“Omissão de socorro

        Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

        Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa”.

        Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial: (Acrescentado pela L-012.653-2012)

Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte”.

 

 

c) Código de Defesa do Consumidor (LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990) 

“Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

(...)

X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral”.

 

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.

 

“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

        Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código”.

 

  “Art. 40. O fornecedor de serviço será obrigado a entregar ao consumidor orçamento prévio discriminando o valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados, as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços.

        § 1º Salvo estipulação em contrário, o valor orçado terá validade pelo prazo de dez dias, contado de seu recebimento pelo consumidor.

        § 2° Uma vez aprovado pelo consumidor, o orçamento obriga os contraentes e somente pode ser alterado mediante livre negociação das partes.

        § 3° O consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços de terceiros não previstos no orçamento prévio”.

 

“Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:

        Pena Detenção de três meses a um ano e multa”.

 

 

d) CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 (CF/1988)

 

Fundamento:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 

(...)

III - a dignidade da pessoa humana”.

 

Objetivos:

 

“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

(...)

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

 

Obrigações dos cidadãos, da Administração Pública, dos concessionários, dos permissionários e dos autorizados:

 

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

 

Consumidor:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: 

XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.

 “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”.

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

V - defesa do consumidor”.

 

Saúde:

“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010)”.

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

“Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado”.

 

Da Família, da Criança, do Adolescente, do Jovem e do Idoso

“Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”.

 

Pelos artigos 135, do CP, e 186, do CC, é fácil examinar que qualquer pessoa, independente de ser ou não profissional da área de saúde, é obrigada a prestar socorro quando algum indivíduo se encontra inválido ou ferido, ao desamparo ou em grave e iminente perigo de vida. A dignidade da pessoa humana é o fundamento da República Federativa do Brasil e está expressa logo no primeiro artigo da Carta Cidadã. Não é de se estranhar, pois a Carta Política foi idealizada por um povo que sofrera várias violações aos seus direitos humanos durante a ditadura militar (1964 a 1985). 

Torturas físicas e psicológicas, descaso com a saúde dos prisioneiros de guerra. Eis os acontecimentos que causaram mais do que dores físicas, mas colocaram os torturadores no mesmo nível dos nazistas. Assim, dignidade humana é um atributo do próprio ser humano em toda a sua constituição corpórea e psíquica.

A dignidade da pessoa humana tem fulcros na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Convenção Americana de Direitos Humanos (1969), no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1992) e outros tratados, convenções sobre direitos humanos.

A mesma Carta Política preconiza os objetivos fundamentais da República, pois sem tais objetivos não há de materializar, substancialmente, os direitos humanos na sociedade brasileira. E só é possível quando existir em todas as relações humanas seja entre fornecedores e consumidores, vizinhos, Administração Pública e administrados. 

As normas jurídicas que punem quem viola um direito não se baseiam no simples punir por punir, mas cercear direitos temporários para que o condenado possa se reeducar, ou seja, fazer introspecção sobre seu ato e se conscientizar de que a melhor maneira de viver é a postura fraternal – quando há socialização e ressocialização embasadas aos direitos humanos.

 

 

5) Comparativo entre omissão de socorro de condutor e profissional de saúde

 

Definem-se como Primeiros Socorros (PS) o atendimento providenciado à pessoa doente ou ferida, podendo ser realizada pela população em geral.  (VELDE,  et  al.,  2007  apud PERGOLA, A. M. 2008) [10].

 

Pelo Código de Trânsito Brasileiro, qualquer cidadão que desejam obter à habilitação de trânsito terrestre deve se submeter às aulas técnico-teóricas. Entre as disciplinas exigidas pelo CONTRAN (resolução nº 168, consolidada) estão os primeiro socorros. Nas salas de aulas dos Centros de Formações de Condutores (CFCs) ou autoescolas, os instrutores de trânsito [teórico] ensinam noções básicas de socorro pré-hospitalar. Seja autor ou não de acidente de trânsito, a primeira providência é sinalizar o local, depois, se possível diante das circunstâncias presentes – pode-se omitir ao socorro direto em caso de perigo iminente à própria vida de quem vai socorrer, como em casos de linchamento, ferimento grave, substâncias perigosas que demandam uso de equipamentos de proteção especial, mas não a postura de deixar de comunicar as autoridades competentes sobre o acidente de trânsito -, as aplicações das avaliações primária e secundária.  A primeira avaliação consiste em verificar os sinais vitais da vítima, como batimentos cardíacos e respiração, e aplicar, se necessário, as ressuscitações cardíaca ou respiratória, já a avaliação secundária é a verificação de existência ou não de fratura, queimadura, torções, luxações e as manobras cabíveis (imobilização de fratura, luxação e entorse; proteção da área queimada).

A precariedade que se encontra o usuário de via terrestre diante de acidente de trânsito é muita. Sem equipamentos individuais de proteção quem socorre se expõem a várias doenças, desde AIDS até tuberculose. Não é por menos que os profissionais do Corpo de Bombeiros têm equipamentos (combitubo, luvas etc.) tanto para a proteção individual como para melhor assistência ao acidentado.

Sendo profissional de saúde ou não, qualquer pessoa deve prestar socorro quando vê outro semelhante (indiferente de etnia, sexo, religião) em estado debilitante ou em iminente perigo de vida.

Não podendo ser diferente, o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo condenou motorista e ocupantes de automotor por omissão de socorro – um mês de prisão. No caso, ciclista cruzou a pista de rolamento repentinamente. Mesmo pela ação intempestiva do ciclista, que gerou o acidente de trânsito, o tribunal considerou a omissão de socorro como “descaridade e desprezo pela vida humana, a partir de uma intolerável demonstração de egoísmo [11]”.

Se os que obtiveram a habilitação de trânsito são obrigados – assim aprenderam nas salas de aulas dos CFCs – a prestarem socorro a quem se acha em estado debilitante ou iminente perigo de vida, seja por acidente de trânsito ou não, mas dentro de suas possibilidades técnicas e materiais (proteção de uso individual), não menos diferente é para os profissionais de saúde, que têm mais conhecimentos técnicos e prestaram juramentos de dedicação à vida humana.

 

E o que dizer de tais profissionais da área de saúde que estejam em hospitais ou em clínicas? 

 

Por exemplo, numa clínica odontológica. De repente, alguém passa mal. O dentista nada faz, pois não é “alçada” dele. 

Outra situação. Imagine que uma idosa fora atendida por fisioterapeuta. A idosa pega o elevador para descer até o primeiro pavimento. Ao sair do elevador torce o pé. A idosa pega o elevador e se dirige para o pavimento que tem fisioterapia. Já no local relata que torceu o pé. Nisso o profissional de fisioterapia diz que ela [idosa] terá que marcar nova consulta para ser atendida. O acompanhante da idosa pergunta como ela irá caminhar, e o fisioterapeuta diz:

“Aqui não é emergência. Emergência só no outro prédio que fica na rua tal”.

Prosseguindo. Depois a mesma profissional anuncia que no quarto andar há ortopedista. Idosa e acompanhante vão para o quarto andar. Já no pavimento recebe a seguinte frase:

“Aqui não é emergência, o senhor tem que marcar consulta ou, então, se dirija a este endereço que lá tem emergência.”

Não satisfeito o acompanhante da idosa argumenta:

“Aqui não é emergência, mas será que não tem algum profissional de saúde para examinar? Será que, pelo menos, não se pode enfaixar?”

 

Nesse ínterim um médico diz que ali não é emergência e que a legislação não o obriga ao atendimento. Depois é dito que há ortopedista, mas o ortopedista poderá ou não atender, pois não há consulta marcada com ele.

 

Estatuto do Idoso (LEI Nº 10.741, DE 1º DE OUTUBRO DE 2003):

“Art. 2º O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade”.

“Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”.

“Art. 4° Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei”.

 

Como idoso é peso morto no Brasil, pela mentalidade cultura, infelizmente, não é de se espantar com tais decisões. 

 

 

Abaixo, transcrevo aqui pareceres de Conselhos Regionais de Medicina:

 

• “ CREMERJ Nº 169/2006 [12]: 

INTERESSADOS: Vários médicos e estabelecimentos assistenciais de saúde.

                

RELATORES: Cons. Aloísio Carlos Tortelly Costa

Consª Marília de Abreu Silva

Comissão Disciplinadora de Pareceres do CREMERJ – CODIPAR

 

ACERCA DO ATENDIMENTO A PESSOAS INVÁLIDAS E/OU ACIDENTADAS EM VIAS PÚBLICAS.

                                                               

EMENTA: Deve o médico em plantão analisar cada caso individualmente e avaliar se sua saída para prestar atendimento fora do ambiente hospitalar não representa risco para os pacientes presentes ou para aqueles que possam chegar a qualquer momento. Caso possível, deverá prestar socorro à pessoa inválida em via pública, apesar de ser, inicialmente, tal incumbência do Corpo de Bombeiros, através do Grupo de Socorro de Emergência, conforme Decreto n. 9.503/86. 

CONSULTA: Constantemente, vários médicos e estabelecimentos assistenciais de saúde se reportam a este Conselho com o fim de serem orientados sobre quem teria competência para socorrer pessoas enfermas ou acidentadas em vias públicas. Em geral, questionam se deve o médico se ausentar do plantão para prestar atendimento a paciente grave fora de o ambiente hospitalar. 

PARECER: O Decreto Estadual n. 9.503, de 09 de julho de 1986 criou o Programa de Atendimento de Emergências em Vias Públicas, delegando competência ao Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro, através do Grupo de Socorro de Emergência - GSE, para agir em situações de emergência em vias públicas.

 Contudo, há que se advertir que o socorro deve ser prestado por todos os cidadãos a qualquer pessoa que necessite, sobretudo nos casos de risco de vida, para que não se infrinja o artigo 135 do Código Penal Brasileiro, crime de omissão de socorro:

 

“Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir nesses casos, o socorro da autoridade pública.”

 

Por outro lado, o Código de Ética Médica estatui, no capítulo referente à responsabilidade profissional, que é vedado ao médico: 

“Art. 36. Afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro médico encarregado do atendimento de seus pacientes em estado grave. 

Art. 37. Deixar de comparecer a plantão em horário preestabelecido ou abandoná-lo sem a presença de substituto, salvo por motivo de força maior.”

 

Deste modo, em relação à possibilidade de o médico se ausentar do plantão para atender à pessoa necessitada fora do ambiente hospitalar, o CREMERJ orienta que deve ele analisar cada caso individualmente e avaliar se sua saída não representará risco para os pacientes presentes ou para aqueles que possam chegar a qualquer momento. Caso possível, deverá prestar socorro à pessoa inválida em via pública, apesar de ser, inicialmente, tal incumbência do Corpo de Bombeiros, através do GSE. 

De qualquer forma, se o médico se ausentar do plantão para prestar o atendimento, deverá documentar no livro de ocorrências a razão de sua saída.

 

É o parecer, s. m. j. 

(Aprovado na Sessão Plenária de 30/08/2006)”.

 

 

•“PARECER CREMEC Nº 13/99 14/06/99 [13] 

PROCESSO-CONSULTA CREMEC Nº 1137/99

INTERESSADO: Prof. Dr. Francisco de Assis Negreiros Colares – Supervisor da Residência em Clínica Médica do HUWC - UFC

ASSUNTO: Atendimento a pacientes externos durante o plantão em Hospital sem Serviço de Emergência funcionante.

RELATOR: Cons. Helvécio Neves Feitosa                           

          EMENTA: O plantonista, mesmo de hospital que não dispõe de Serviço de Emergência, não pode deixar de atender ao paciente que procure o hospital em casos de urgência ou emergência. Não cabe a outros profissionais fazer triagem na portaria do hospital. O paciente só deverá ser removido para outro hospital, após prestados os primeiros socorros e em condições estáveis. Caso contrário, o mesmo deverá ser internado. O plantonista não deverá se ausentar do plantão para acompanhar paciente transferido.                                                     

 

       DA CONSULTA

 O Supervisor da Residência em Clínica Médica do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC) – UFC, Dr. Francisco de Assis Negreiros Colares, através do Ofício protocolado no CREMEC 1137/99, encaminhou a este egrégio Conselho Regional de Medicina consulta, em cujo preâmbulo o consulente aborda o fato do HUWC não dispor de Serviço de Urgência ou Emergência para atendimento a pacientes externos, quer seja durante o dia ou à noite, permanecendo fechado durante o período noturno. Refere que na portaria do hospital existe uma placa indicando a inexistência desse Serviço Médico.  Também não há plantão administrativo para efetuar admissões à noite e nem Serviço Social.  Informa que, no Setor de Clínica Médica, dois médicos residentes são designados para o plantão noturno, os quais são os únicos responsáveis pelo atendimento às intercorrências noturnas nas enfermarias (126 leitos).  Isso posto, o interessado formula as seguintes perguntas, in verbis:

 

‘. Que atitude o plantonista deve tomar no caso de ser informado pelo porteiro do Hospital da chegada de um paciente solicitando atendimento?

. Deve ou não ir atender?

. Constitui omissão de socorro o fato de não ir atender o paciente?

. No caso de ir atender o paciente e sendo constatado gravidade ou risco de vida, como proceder?

. Deve acompanhar o paciente a outro hospital onde exista emergência, deixando o seu plantão?

. Incorre em omissão de socorro de apenas constatar a gravidade e encaminhar o paciente para atendimento em outro hospital?’

 

PARECER 

Um hospital não é legalmente obrigado a manter Serviço de Emergência. A sua inexistência, entretanto, deverá ser amplamente divulgada junto à população, orientando a clientela para como proceder e para onde encaminhar o usuário que necessite de atendimento.  Em hospitais de médio ou grande porte onde não haja Serviço de Emergência funcionando, situação em que se encontra HUWC, o médico plantonista atenderá apenas aos pacientes internados, o que não o exime de prestar os primeiros socorros em um caso de emergência ou urgência e providenciar a remoção ou o encaminhamento do demandante ao serviço adequado mais próximo, após a avaliação do quadro clínico.

 Da mesma maneira que um hospital não é obrigado a manter um Serviço de Emergência, pois isto dependerá de sua estrutura interna, organização, finalidade, sistema operacional, local em que está instalado, demanda, ligação funcional com outros hospitais, etc., um Serviço de Emergência já em funcionamento só poderá ser fechado, desde que sejam atendidas as necessidades da população local e assegurado o atendimento emergencial em estabelecimento próximo.  Sabemos que isto, lamentavelmente, não se aplica no caso do HUWC, que tem uma finalidade não só assistencial, mas de formação médica, que já teve um Serviço de Emergência que tão relevantes serviços prestou à população, tendo de fechá-lo por absoluta falta de recursos. Causa-nos indignação o descaso por parte das autoridades constituídas e a falta de vontade política na resolução dos problemas crônicas e graves que permeiam o setor público, na área da saúde e do ensino, em nosso país. 

Levando em conta a imprevisibilidade de muitas situações de urgência em Medicina, o médico - e somente ele – será responsável legal e eticamente pela ponderação e avaliação do caso, ou seja, se o paciente pode ser despedido sem maior risco de agravo à sua saúde pela demora do atendimento ou outra distorção possível (por exemplo, não entendimento claro da orientação dada, a qual deve ser sempre detalhada) ou se é melhor deixá-lo no serviço apesar das más condições de assistência.  Na dúvida, sempre agir em favor do paciente.  Não é possível, portanto, ao porteiro do hospital ou a outro profissional, fazer qualquer tipo de triagem. (grifo nosso) 

O Conselho Federal de Medicina, na sua resolução nº 1451/95, define como URGÊNCIA a ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata.  A mesma resolução define como EMERGÊNCIA a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo portanto, tratamento médico imediato. 

Em casos de urgência ou emergência, nenhuma outra consideração deve prevalecer a não ser tentar salvar a vida da pessoa, com os recursos disponíveis.  Não havendo recursos ou faltando ao médico a capacidade técnica necessária, cabe prestar os primeiros socorros e providenciar a remoção, encaminhamento ou vinda de atendimento de emergência.  É importante assinalar que o médico sempre, em qualquer circunstância, é obrigado a prestar os primeiros socorros de emergência, sob pena de infração legal e ética.  A omissão, nesses casos, é crime previsto no Código Penal adiante transcrito:

 

“Art. 135 – Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, a criança abandonada ou extraviada, ou a pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único - a pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte”.

 

O Código de Ética Médica (CEM) trata da omissão de socorro no seu artigo 35: “Deixar de atender em setores de urgência e emergência, quando for de sua obrigação fazê-lo, colocando em risco a vida de pacientes, mesmo respaldado por decisão majoritária da categoria”.  A omissão é qualificada como “delito de ação pública representativa”.  A despeito do CEM especificar a condição de atendimento em “setores de urgência e emergência”, em outra circunstância ou lugar, se for o único médico disponível, não poderá recusar o atendimento em casos de emergência (Coutinho, Código de Ética Médica Comentado, 1989). 

Quando se tratar de urgências, caberá sempre, em qualquer circunstância, o primeiro atendimento, após o que o médico orientará o paciente ou seus acompanhantes a procurar estabelecimento mais adequado se ocorrer impossibilidade de internação, superlotação, falta de recursos ou de profissionais especializados. 

Após atender o paciente e sendo constatada gravidade ou risco de vida, na impossibilidade de internação hospitalar, o médico depara-se com a necessidade de transferência para outro hospital que tenha Serviço de Emergência e que tenha leitos disponíveis. Esta é uma das situações mais conflitantes e que pode chegar a consequências [“sisc”]  desastrosas, pois além das implicações puramente médicas, há aspectos administrativos, financeiros e até políticos, que se transformam em complicadores sociais do problema. 

Se um paciente necessita, deve ou quer ser transferido ou encaminhado para outro hospital, o médico deve fazê-lo em boas condições clínicas, ou seja, quando o paciente não está em risco iminente de morte e apresenta sinais vitais estáveis, mesmo em níveis não ideais. 

Decidida a transferência ou encaminhamento, as seguintes medidas tornam-se necessárias: o paciente deve ter assegurada a permeabilização das suas vias aéreas para adequada oxigenação; deverá ter um ou dois acessos venosos instalados; deverá ter assegurada a manutenção de sua temperatura corporal; se necessária uma imobilização, esta deverá ser feita; as drenagens heroicas [“sisc”]  deverão estar providenciadas e funcionando bem; as lesões sangrantes externas deverão estar contidas; a antibioticoterapia e a imunoterapia anti-tetânica, se necessárias, deverão ser adotadas, etc. 

O médico deverá preparar um relatório de transferência circunstanciado, que contemple desde as hipóteses diagnósticas até as medidas terapêuticas adotadas, bem como os motivos da transferência. 

 A grande dificuldade, uma vez decidida a transferência ou encaminhamento em tempo hábil e estabilizadas as condições clínicas do paciente, está no transporte dos pacientes graves de um hospital para outro.  Todas as ambulâncias, idealmente, deveriam atender às estritas especificações técnicas para a função e o pessoal para-médico [“sisc”], igualmente, deveria existir e ser de excelente qualidade técnica. Ambas as condições, em geral, são inadequadas em nosso meio, com raríssimas exceções. 

Tantas e tamanhas dificuldades exigem mais e maiores cuidados por parte dos médicos quando transferem pacientes, e por isto devem manter contato com o colega do hospital de referência com a finalidade de se orientarem mutuamente, minimizando dificuldades e riscos para o paciente e para ambos os médicos. 

Problemas de ordem pessoal entre médicos e de ordem financeira entre hospitais não deveriam presidir as desavenças que as transferências podem causar, levando com frequência [“sisc”]  a péssimos e lamentáveis resultados práticos e éticos. Devem ser evitados desentendimentos entre médicos e pacientes e/ou familiares, pois a situação somente piora o quadro geral das dificuldades e tudo acaba chegando ao Conselho sob a forma de denúncia contra quem transferiu ou contra quem recebeu o paciente, ou contra ambos.

   Caso não haja possibilidade de transferência do paciente em condições seguras ou este apresente, a juízo do médico, risco de morte elevado para ser transferido, cabe ao médico fazer a sua parte, ou seja, internar o paciente e prestar a assistência necessária, mesmo em condições não ideais (por exemplo, indisponibilidade de leito, medicamentos ou aparelhagem adequada), desconsiderando os aspectos burocráticos, para proteção do paciente e do próprio médico, até que se possa transferí-lo [“sisc”] em condições de risco minimizadas.  De acordo com FRANÇA, 1994 (Comentários ao Código de Ética Médica), há circunstâncias em que, pelas condições e recursos disponíveis, a transferência do paciente diante da gravidade do caso pode ser considerada omissão de socorro, face ao atendimento ter sido possível onde ele se encontrava. 

Na opção pela transferência do paciente, a qual só deve ser feita quando atendidas as condições citadas anteriormente (sinais vitais estáveis, cuidados necessários, ambulância equipada e pessoal para-médico [“sisc”]  capacitado, hospital referido devidamente contactado [“sisc”]), o médico não deverá deixar o seu plantão para acompanhar o paciente, pois o atendimento às  intercorrências será de sua responsabilidade.  

 

CONCLUSÃO 

Diante do exposto, podemos concluir que, em resposta aos quesitos formulados pelo consulente, o plantonista deverá conduzir-se de acordo com as seguintes orientações:

1 – Ao ser informado pelo porteiro do hospital da chegada de um paciente solicitando atendimento, deverá realizar o atendimento para confirmar ou não se a situação é de urgência ou emergência;

2 – O fato de não ir atender ao paciente constitui-se em omissão de socorro, com suas implicações éticas e legais;

3 – Ao atender o paciente e sendo constatado gravidade ou risco de vida, o plantonista deverá prestar os primeiros socorros e providenciar a transferência do paciente para outro hospital que tenha Serviço de Emergência, desde que o mesmo apresente condições clínicas estáveis, que permitam a remoção, com a garantia de atendimento no hospital referenciado. Caso contrário, o paciente deverá ser internado, mesmo que as condições de atendimento não sejam ideais;

 4 – O plantonista não deve deixar o plantão e acompanhar o paciente durante a transferência, pois as intercorrências clínicas na sua ausência não o eximirão da sua responsabilidade;

5 -  O fato de apenas constatar a gravidade e encaminhar o paciente para atendimento em outro hospital, sem prestar os primeiros socorros, procurar estabilizar as condições clínicas e providenciar a transferência em condições de segurança também constitui-se em omissão de socorro, em virtude do atendimento ter sido possível onde ele se encontrava.

 

Devemos ressaltar que é responsabilidade da direção da instituição hospitalar, particularmente do Diretor Técnico, assegurar as condições mínimas para o desempenho ético-profissional da Medicina. Portanto, o atendimento a situações de emergência, com os recursos mínimos necessários, deve ser previsto em qualquer hospital. A não observância desta recomendação implica em ilícito ético, previsto no Código de Ética Médica, no seu artigo 17.

 

Este é o parecer. 

Fortaleza – CE, 14 de junho de 1.999. 

 HELVÉCIO NEVES FEITOSA

Conselheiro Relator”.

 

 

• “PARECER CREMEC Nº 06/2003 24/02/2003 [14]

PARECER CREMEC Nº 06/2003

24/02/2003

PROCESSO CONSULTA CREMEC Nº: 000747/03

INTERESSADO: Dra. Maria Sidneuma Melo Ventura – CREMEC 2991 – Presidenta da Comissão de Ética Médica da MEAC/UFC.

ASSUNTO: atendimento a recém-nascido externo

RELATOR: Cons. Helvécio Neves Feitosa

EMENTA: o médico plantonista, mesmo de hospital que não dispõe de Serviço de Emergência para atendimento a recém-nascidos externos, não pode deixar de prestar os primeiros socorros ou os cuidados julgados imprescindíveis para a preservação da vida e prevenção de maiores danos à saúde dos pacientes externos que demandem ao hospital. O não atendimento, em casos de urgência ou emergência, implica em omissão de socorro, com infração ao Art. 35 do CEM e ao Art. 135 do CP. 

 

DA CONSULTA

            Dra. Maria Sidneuma Melo Ventura, CREMEC 2991, presidenta da Comissão de Ética Médica da MEAC/UFC, encaminhou solicitação de parecer protocolada neste Conselho em 17/02/2003, em virtude de carta-consulta enviada à Comissão de Ética da referida unidade hospitalar, assinada pelo Prof. Manoel Oliveira Filho, Diretor Clínico da MEAC, nos seguintes termos: 

            "Em 28/01/2003 foi chamado um médico neonatologista para atender a um recém-nascido, advindo da cidade de Pindoretama – CE, que encontrava-se dentro da ambulância e em uso de cateter com oxigênio".

 

            Diante do exposto, o Diretor Clínico da MEAC faz as seguintes indagações:

            "1) Que impedimento legal existe para que o médico não possa atender nesta condição?

            2) Como a MEAC não recebe recém-nascido e este chegou a nossa porta, devemos atendê-lo ou não?"

 

DO PARECER

            Como o tema da consulta versa sobre o atendimento a recém-nascidos, quer cheguem de ambulância ou por outro meio ao hospital, julgamos tratar-se genericamente, na maioria das vezes, de casos de urgência ou emergência. O Conselho Federal de Medicina, na sua resolução nº 1451/95, define como URGÊNCIA a ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata. A mesma resolução define como EMERGÊNCIA a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo, portanto, tratamento médico imediato.

            O atendimento a pacientes externos durante o plantão em hospital sem Serviço de Emergência funcionante foi motivo de parecer aprovado por este Conselho (Parecer CREMEC nº 13/99, referente ao Processo-Consulta CREMEC No 1137/99), do qual tivemos a honra de ser Relator. Como o assunto do presente parecer é correlato, a linha de argumentação adotada será basicamente a mesma daquele primeiro, com algumas modificações julgadas pertinentes.

            Devemos ressaltar, em princípio, que um hospital não é obrigado a manter Serviço de Emergência para atendimento a recém-nascidos (ou adultos). A sua inexistência, entretanto, deverá ser amplamente divulgada junto à população, orientando a clientela no sentido de como proceder e para onde encaminhar o usuário que necessite de atendimento. Em hospital de grande porte onde não haja Serviço de Emergência para atendimento a recém-nascidos externos, que é o caso da MEAC/UFC, o médico neonatologista deverá atender apenas aos pacientes internados, o que não o exime de prestar os primeiros socorros ou os cuidados considerados imprescindíveis em um caso de urgência ou emergência e providenciar a remoção ou encaminhamento do demandante ao serviço adequado mais próximo, após a avaliação do quadro clínico. Neste aspecto, não importa se o recém-nascido encontra-se dentro de uma ambulância, na porta do hospital ou no seu interior. 

            Um outro aspecto relevante a ser considerado é a triagem para atendimento a esse tipo de paciente. Ao levarmos em conta a imprevisibilidade de tais situações, o médico – e somente ele, na situação específica, de preferência o neonatologista – será responsável legal e eticamente pela ponderação e avaliação do caso, ou seja, se o paciente pode ser despedido sem maior risco de agravo à sua saúde pela demora do atendimento ou outra possível distorção (por exemplo, não entendimento claro das orientações dadas, as quais devem ser detalhadas) ou se é melhor deixá-lo no serviço, apesar das condições de assistência inadequadas. Na dúvida, sempre agir em favor do paciente. Não é possível, portanto, delegar a triagem ao porteiro do hospital ou a outro profissional.

            Em casos de urgência ou emergência, nenhuma outra consideração deve prevalecer a não ser salvar a vida do paciente, com os recursos disponíveis. Caso não haja recursos ou faltando ao médico a capacidade técnica necessária, cabe prestar os primeiros socorros e providenciar a remoção, encaminhamento ou vinda de atendimento de emergência. É importante ressaltar que o médico sempre, em qualquer circunstância, está obrigado a prestar os primeiros socorros de emergência, sob pena de infração legal (omissão de socorro – Art. 135 do Código Penal - CP) e ética (Art. 35 do Código de Ética Médica - CEM). Em casos de urgência, caberá sempre, em qualquer circunstância, o primeiro atendimento, após o que o médico orientará o paciente ou seus acompanhantes a procurar estabelecimento mais adequado, se ocorrer impossibilidade de internação, superlotação, falta de recursos ou de profissionais especializados.

            Após atender o paciente e ao se constatar gravidade ou risco de vida, na impossibilidade de internação hospitalar, o médico depara-se com a necessidade de transferência para outro hospital que tenha Serviço de Emergência e que tenha leitos disponíveis. Esta é uma das situações mais conflitantes e que pode chegar a conseqüências [“sisc”]  desastrosas, pois além das implicações (ou complicações) puramente médicas, há aspectos administrativos, financeiros e políticos, que se transformam em complicadores sociais do problema.

            Se um paciente necessita ou deve ser transferido ou encaminhado para outro hospital, o médico deverá fazê-lo em boas condições clínicas, ou seja, quando o paciente não está em risco iminente de morte e apresenta sinais vitais estáveis, mesmo em níveis não ideais. Decidida a transferência ou encaminhamento, as seguintes medidas tornam-se necessárias: o paciente deve ter assegurada a permeabilização das suas vias aéreas para adequada oxigenação; deverá ter um ou dois acessos venosos instalados; deverá ter assegurada a manutenção de sua temperatura corpórea; se necessária uma imobilização, esta deverá ser feita; as drenagens heróicas [“sisc”]  deverão estar providenciadas e funcionando bem; as lesões sangrantes externas deverão estar contidas; a antibioticoterapia e a imunoterapia anti-tetânica, se necessárias, deverão ser adotadas, etc. Em se tratando de recém-nascido, todas as demais medidas cabíveis e julgadas pertinentes em tais situações deverão ser incrementadas.

            O médico deverá preparar um relatório de transferência ou encaminhamento circunstanciado, que contemple desde as hipóteses diagnósticas até as medidas terapêuticas adotadas, bem como os motivos da transferência.

            A grande dificuldade, uma vez decidida a transferência ou encaminhamento em tempo hábil e estabilizadas as condições clínicas do paciente, está no transporte de pacientes graves de um hospital para outro. Todas as ambulâncias, idealmente, deveriam atender às estritas especificações técnicas para a função, e o pessoal para-médico [“sisc”], igualmente, deveria existir e ser de excelente qualidade técnica. Ambas as condições, em geral, são inadequadas em nosso meio, salvo raríssimas e honrosas exceções.

            Tantas e tamanhas dificuldades exigem mais e maiores cuidados por parte dos médicos quando transferem pacientes, e por isso devem manter contato com o colega do hospital de referência com a finalidade de se orientarem mutuamente, minimizando dificuldades e riscos para o paciente e para os médicos envolvidos.

            Problemas de ordem pessoal entre médicos e de ordem financeira entre hospitais ou municípios não deveriam presidir as desavenças que as transferências podem causar, levando com freqüência [“sisc”]  a péssimos e lamentáveis resultados clínicos e éticos. Devem ser evitados desentendimentos entre médicos e pacientes e/ou familiares, pois tal situação somente piora o quadro geral de dificuldades e tudo acaba chegando ao Conselho Regional de Medicina e/ou à Justiça Comum, sob a forma de denúncia contra quem transferiu ou contra quem recebeu ou deixou de receber, ou contra ambos.

            Caso não haja possibilidade de transferência do paciente em condições seguras ou este apresente, a juízo do médico, risco de morte elevado para ser transferido, cabe ao médico fazer a sua parte, ou seja, internar o paciente e prestar a assistência necessária, mesmo em condições não ideais (por exemplo, indisponibilidade de leito, medicamentos ou aparelhagem adequada), desconsiderando os aspectos burocráticos, para a proteção do paciente e do próprio médico, até que se possa transferi-lo em condições seguras. De acordo com FRANÇA (Comentários ao Código de Ética Médica, 1994), há circunstâncias em que, pelas condições e recursos disponíveis, a transferência do paciente diante da gravidade do caso pode ser considerada omissão de socorro, face ao atendimento ter sido possível onde ele se encontrava.

            Na opção pela transferência do paciente, a qual só deve ser feita quando atendidas as condições citadas anteriormente (sinais vitais estáveis, cuidados necessários, ambulância equipada e pessoal para-médico [“sisc”]  capacitado, hospital referido devidamente contatado), o médico não deverá se ausentar do hospital para acompanhá-lo, pois o atendimento às intercorrências do plantão, mesmo na sua ausência, será de sua responsabilidade.

            Para concluir, respondendo especificamente aos quesitos formulados pelo Diretor Clínico da MEAC/UFC, no que diz respeito à primeira indagação, não vemos impedimento legal para o médico atender a recém-nascido em interior de ambulância que demande ao hospital. Com relação à segunda pergunta, mesmo não havendo Serviço de Emergência para atendimento a recém-nascidos externos, o médico deverá fazer uma avaliação inicial para verificar se se trata de casos de urgência ou emergência, pois, nestas situações, o médico estará obrigado a prestar os primeiros socorros ou os cuidados julgados imprescindíveis para preservação da vida e para prevenção de maiores agravos à saúde do paciente, bem como providenciar a transferência ou encaminhamento em condições seguras. Caso assim não proceda, estará sujeito a sanções no campo ético e penal, por infração ao Art. 35 do CEM e ao Art. 135 do CP.

            Este é o parecer, s. m. j.

            Fortaleza, 24 de fevereiro de 2003

HELVÉCIO NEVES FEITOSA

Cons. RELATOR”.

 

 

• “CREMESP PARECER nº 106.056/03 [15]

Assunto: Médico de hospital privado ser obrigado a prestar atendimento a paciente em situação de urgência, em local próximo, fora das instalações do PS.

Relator: Conselheiro Renato Azevedo Júnior.

Ementa: É obrigatório o atendimento de pacientes em situação de urgência (acidente, politrauma, desmaios ou patologias clínicas).

O consulente Dr. J.J.J.A.P., solicita resposta do CREMESP das seguintes questões:

 

"1) Numa situação que envolva urgência/emergência (acidente, politrauma, desmaios ou patologias clínicas), próximo a um hospital privado quando somos solicitados, devemos ir prestar atendimento fora da instalação do PS?

2) A recusa implica em omissão de socorro?

3) Devemos ir até o local e aguardar o serviço de resgate (192 ou 193)?

4) Se tivermos ambulância temos que ir ao local resgatar a vítima?"

 

PARECER

Em relação às questões formuladas, temos que citar o artigo 35 do Código Penal, bem como os artigos 2º, 29 e 58 do Código de Ética Médica, que rezam: 

CÓDIGO PENAL

Artigo 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública..."

 

CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA

Princípios Fundamentais

Artigo 2º - O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.

É vedado ao médico:

Artigo 29 - Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência.

Artigo 58 - Deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em caso de urgência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo.

Portanto, respondendo especificamente sobre as questões formuladas, temos a dizer:

1ª questão) Sim, lembrando que o serviço de APH deve sempre ser acionado nos locais onde ele exista.

2ª questão) A recusa pura e simples implica em omissão de socorro. Em determinadas situações isto pode não se caracterizar, como, por exemplo, no caso em que haja um único médico do PS e este esteja atendendo uma emergência.

3ª questão) O médico deve avaliar as condições clínicas em que se encontra o paciente. Após o primeiro atendimento, o médico deve aguardar junto ao paciente, assistindo-o, até a chegada do serviço de APH o qual, aliás, tem treinamento específico para remoção destes pacientes.

4ª questão) Não necessariamente. O médico deve avaliar as condições clínicas do paciente e decidir se aguarda o serviço de APH ou se resgata o paciente com ambulância do próprio hospital.

É sempre preferível o paciente ser transportado por ambulância equipada e com pessoal treinado, como ocorre nos serviços de atendimento móvel de urgência.

 

Este é o nosso parecer, s.m.j.

Conselheiro Renato Azevedo Júnior

APROVADO NA 3.074ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 30.01.2004.

HOMOLOGADO NA 3.077ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 03.02.2004”.

 

6)Conclusão

Qualquer pessoa, com base nos arts. 135, do CP, e 186, do CC, deve assistir outro semelhante que se encontra em estado debilitante ou grave perigo de vida seja em qualquer lugar, e mesmo diante de omissão de socorro de profissional de saúde. Aos leigos, que não têm quaisquer conhecimentos sobre primeiros socorros se espera, pelo menos, a solidariedade humana. O simples dialogar já é uma prestação de primeiros socorros, pois mantém a vítima alerta e ajuda na estabilidade de quem necessita de socorro. 

Entende-se por socorro não apenas em situações que haja perigo de vida, como hemorragia arterial, queimaduras de grandes proporções (2º grau, mais de 25% de superfície corporal queimada em adulto; 2º grau, mais de 20% de superfície corporal queimada em criança; 3º grau, mais de 10% de superfície corporal queimada em qualquer faixa etária), fratura exposta, evisceração, paradas cardíaca ou respiratória. 

Socorrer é antes de tudo conduta solidária, humanitária, independente de idade, sexo, religião, condição socioeconômica, se agente público ou não, se nacional ou estrangeiro, se profissional de saúde ou não Qualquer ser humano que esteja precisando de ajuda – torceu o pé, abalo emocional que coloque a pessoa em perigo, regurgitação – deve ser assistido com aplicações de técnicas básicas de primeiros socorros.

Aos que não são profissionais da área de saúde, mas têm conhecimentos sobre primeiros socorros, a ação de socorrer deve ser coerente dentro de suas possibilidades evitando atos de negligência, imprudência e imperícia. Aos profissionais da área de saúde, mais que obrigação legislativa, mas ética diante do juramento de Hipócrates, as medidas de primeiros socorros são obrigatórias, sendo a sua omissão crime.

Médico e enfermeiro, independente da especialidade, aprendem a identificar fratura, luxação, tipos de queimaduras, acidente vascular cerebral (AVC), pneumotórax. Também aprendem como proceder em tais casos com atendimento básico de primeiros socorros.  Daí que a simples recusa de examinar uma pessoa que sofrera torção no tornozelo constitui omissão de socorro.

Nos cursos de primeiros socorros, para as pessoas que não são da área de saúde, por exemplo, os alunos aprendem sobre técnicas de imobilizações em caso de luxação, entorse ou fratura. Aprendem também que nesses casos qualquer material à disposição pode ser usado para imobilizar. Seja uma revista dura, cabo de vassoura etc.

O que dizer, então, de centro médico-hospitalar emergencial que possui mais recursos, e a negativa de profissional de saúde ao menos examinar e imobilizar, por exemplo, o tornozelo. Infelizmente há uma verdade desumana em nosso país. Nos estabelecimentos públicos de saúde faltam materiais, medicamentos. Ainda há a superlotação e os desvios de verbas públicas que transformam esses estabelecimentos em centros de torturas medievais. Os profissionais de saúde se encontram sobrecarregados pela precariedade de recursos dentro dos próprios estabelecimentos. Em certos momentos tais profissionais têm que sortear quem vai viver ou morrer. Porém, não quer dizer que não há profissionais que não respeitam o juramento de Hipócrates, pois o mínimo de humanidade é esperado.

Nos estabelecimentos privados prestadores de serviços de saúde, os profissionais de saúde são vigiados e doutrinados para não causarem prejuízos econômicos às próprias  empresa, em poucas palavras, que o consumidor se dane. Dessa forma, a prestação de serviço de saúde vira uma agonia aos consumidores que devem esperar a intervenção Divina ou da ANS (Agência Nacional de Saúde). 

Todavia, a área de saúde vem se tornando campo visionário de lucros. São poucos os profissionais que se prendem ao juramento de Hipócrates. Há médicos que “vendem” medicamentos através de receituários com medicamentos [tipo de laboratório] específicos, pois assim ganham comissões das indústrias farmacêuticas. Por produtividade – ganhar mais dinheiro -, muitos profissionais de saúde atendem seus pacientes às pressas. Alguns profissionais chegam ao cúmulo de não olharem para os seus pacientes e logo receitam medicamentos. Os erros médicos são causas de várias complicações aos pacientes. Os erros são tantos que existe a Associação das Vítimas de Erros Médicos (AVERMES). 

O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP) lançou em 2001 o GUIA DA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE. No guia há: responsabilidade profissional; especialidades médicas com mais denúncias; principais queixas etc.(disponível em: http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Publicacoes&ação=detalhes&cod_publicacao=4).

 

Hipócrates deve estar se remoendo em seu túmulo.

 

Referências:

 [1] – Juramento de Hipócrates. Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CRM-SP). Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2014

[1.1] Juramento do Médico (Declaração de Genebra). Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (SP). Disponível em: < https://docs.google.com/viewer?docex=1&url=http://www.dhnet.org.br/dados/guias/dht/guia_crem_sp_relacao_medico_paciente.pdf>. Acesso em: 1 ago. 2014.

 [2] – Veja.com. As carreiras mais promissoras para os próximos dez anos. Disponível em: < http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=18987&catid=159&Itemid=75>. Acesso em 1 ago. 2014.

[3] – Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO) - 1946. Universidade de São Paulo - USP. Biblioteca Virtual de Direitos Humanos. Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2014

[4] Palmeira, Guido. A acupuntura no ocidente. Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2014

 [5] Neves, Nedy Cerqueira. Ética para os futuros médicos: é possível ensinar? / Nedy Cerqueira Neves. – Brasília: Conselho Federal de Medicina, 2006. Disponível em:< http://www.portalmedico.org.br/arquivos/etica_futuros_medicos.pdf>.

 [6] – MENDES, WYARA QUINTA. A DIFICULDADE DOS PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM PARA O CONTROLE DAS IATROGENIAS. SÁBADO, 26 DE JANEIRO DE 2013.  Disponível em> < http://www.portaleducacao.com.br/educacao/artigos/30098/a-dificuldade-dos-profissionais-de-enfermagem-para-o-controle-das-iatrogenias>. Acesso em: 1 ago. 2014

[7] - Sexto Código de Ética Médica brasileiro. Conselho Federal de Medicina (CFM). Disponível em: < http://www.portalmedico.org.br/novocodigo/>. Acesso em: 1 ago. 2014

[8] - Revista Bioética 2009 17 (1): 41 – 53. Uma visão assistencial da urgência e emergência no sistema de saúde. Disponível em: . Acesso em: Acesso em: 1 ago. 2014

[9] – Hospital Santa Cruz. Saiba qual é a diferença entre urgência e emergência. Disponível em: < http://www.hospitalsantacruz.com/index.php?option=com_content&id=264:saiba-qual-e-a-diferenca-entre-urgencia-e-emergencia&Itemid=198&lang=pt>. Acesso em: 4 ago. 2014

[10] PERGOLA, A. M., ARAUJO, I. E. M., O Leigo em Situações de Emergência, Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 42 p. 769 a 775, dezembro 2008, São Paulo

[11] – Rios, Josué Oliveira. Guia dos Seus Direitos. 12ª ed. São Paulo. p. 597.

[12] - ACERCA DO ATENDIMENTO A PESSOAS INVÁLIDAS E/OU ACIDENTADAS EM VIAS PÚBLICAS. PARECER CREMERJ Nº 169/2006. Disponível em: < http://www.portalmedico.org.br/pareceres/crmrj/pareceres/2006/169_2006.htm>. Acesso em: 5 ago. 2014

[13] - Atendimento a pacientes externos durante o plantão em Hospital sem Serviço de Emergência funcionante. PARECER CREMEC Nº 13/99 14/06/99. Disponível em: < http://www.cremec.com.br/pareceres/1999/par1399.htm>. Acesso em: 5 ago. 2014

[14] - Médico plantonista, mesmo de hospital que não dispõe de Serviço de Emergência para atendimento a recém-nascidos externos. PARECER CREMEC Nº 06/2003 24/02/2003. Disponível em: < http://www.cremec.com.br/pareceres/2003/par0603.htm>. Acesso em: 5 ago. 2014

[15] - Médico de hospital privado ser obrigado a prestar atendimento a paciente em situação de urgência, em local próximo, fora das instalações do PS. Centro de Bioética CREMESP. Disponível em: . Acesso em: 5 ago. 2014

 
Importante:
1 - Conforme lei 9.610/98, que dispõe sobre direitos autorais, a reprodução parcial ou integral desta obra sem autorização prévia e expressa do autor constitui ofensa aos seus direitos autorais (art. 29). Em caso de interesse, use o link localizado na parte superior direita da página para entrar em contato com o autor do texto.
2 - Entretanto, de acordo com a lei 9.610/98, art. 46, não constitui ofensa aos direitos autorais a citação de passagens da obra para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor (Sérgio Henrique Da Silva Pereira) e a fonte www.jurisway.org.br.
3 - O JurisWay não interfere nas obras disponibilizadas pelos doutrinadores, razão pela qual refletem exclusivamente as opiniões, ideias e conceitos de seus autores.

Nenhum comentário cadastrado.



Somente usuários cadastrados podem avaliar o conteúdo do JurisWay.

Para comentar este artigo, entre com seu e-mail e senha abaixo ou faço o cadastro no site.

Já sou cadastrado no JurisWay





Esqueceu login/senha?
Lembrete por e-mail

Não sou cadastrado no JurisWay




 
Copyright (c) 2006-2024. JurisWay - Todos os direitos reservados