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Os traços da minha negritude: memórias e reflexões de um negro de pele branca


Autoria:

Jonathan Reginnie De Sena Lima


Bacharel em Direito pela Faculdade Metropolitana da Grande Recife (FMGR), licenciando em Pedagogia pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) pós-graduando em Direito Constitucional Aplicado pela Damásio e integrante do GEPERGES Audre Lorde

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Texto enviado ao JurisWay em 19/12/2012.

Última edição/atualização em 13/07/2014.



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Resumo

Este artigo busca analisar as relações etnicorraciais, dentro de um prisma sociológico, antropológico, político e jurídico perpassando por discussões teóricas acerca das situações de preconceito, racismo e intolerância que vem se introduzindo de maneira cada vez mais forte e sutil, silenciosa em nossa sociedade, buscando, ao término desta releitura iniciar o processo de resgate e restauração das relações com a ancestralidade negra a partir de uma perspectiva que busca observar as similitudes e as particularidades que entrelaçam o continente e os povos africanos e os povos do Brasil.

Introdução

A questão da identidade negra é tema recorrente nos pensamentos diários na sociedade brasileira por sua complexidade e necessidade de estudos aprofundados com o objetivo de romper alguns preconceitos e interdições. No ramo acadêmico este tema torna-se ainda mais interessante quando se analisa indivíduos que, em seu desenvolvimento pessoal acabam assumindo uma postura política no sentido de desenvolver mecanismos de ação no combate de discriminações com ênfase às discriminações etnicorraciais. Em especial este artigo versará sobre aqueles indivíduos que não são considerados negros por grande parte da população uma vez que não trazem em si insígnias fenotípicas da negritude, mas que compartilham da filosofia e dos mecanismos de reconhecimento identitário negro-africano de tal maneira que estimula a relação proximal com a ancestralidade negra, buscando não só proferir discursos, mas também exercitá-lo em sua práxis.

Analisar as interfaces da realidade sócio histórica da conjuntura do negro e populações afrodescendentes no Brasil é necessário, buscando observar como as noções e imagens preconceituosas interagem no que se refere à parcialização do provimento de uma série de Direitos e Garantias Fundamentais, tratados aqui sob um patamar de condições mínimas de vida, e por isso basilares, intensamente reduzidas no que se pode conceber em comparação com as condições de oferta e manutenção dos mesmos direitos aos ditos brancos (eleitos historicamente como classe socialmente dominante).

Perpassando pelos princípios da filosofia das religiões de matrizes africanas que se fundem à noção de organização social tradicionalmente africana, que irradia para as diversas searas da vida social, escolhemos a antropologia como instrumento hermenêutico, para melhor compreendermos a conjuntura do negro e analisar como este está sendo tratado na sociedade brasileira, busca-se analisar com um pouco mais de profundidade a relação entre as religiões de matrizes africanas, e a instauração de uma identidade social que persiga a imensa necessidade de compreender e respeitar a diversidade sob o prisma do dialetismo das relações sociais.

Palavras-chave

Identidades sociais, afrodescendência, negritude, africanidade, processos de exclusão etnicorracial, mecanismos de pertencimento etnicorracial, pluralidade, igualdade, influências.

Considerações iniciais

Em diversas oportunidades já fui levado a questionar o que é ser negro; quem é negro; quais os critérios de classificação, pertencimento e reconhecimento etnicorracial; como vem sendo construída essa identidade; qual a situação econômica e os papéis sociais que os negros vêm desenvolvendo em nosso país. Essas proposições me fizeram abrir a mente e iniciar um resgate ao mesmo tempo em que instigou-me à pesquisa.

Sendo afim com as ciências humanas, em especial à filosofia, buscar o fundamento e tentar compreender a completude do tema em sua complexidade que congrega diversas áreas do conhecimento humano (transitando desde fundamentos da filosofia até as teorias mais recentes da economia política), tornou-se para mim uma necessidade tanto acadêmica como pessoal investigar a linha de ascendência, a história e a influência a que viemos sendo expostos em pouco mais de cinco séculos de historiografia nacional oficial.

Despertado há pouco tempo por duas brilhantes docentes, a professora Doutora Denise Maria Botelho, nas aulas de Educação Afro-brasileira no curso de Licenciatura Plena em Pedagogia pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e pelas orientações normativas profundamente discutidas nas aulas de Direito Constitucional Positivo II, ministradas pela professora Mestra Renata Dayanne, pessoas por quem nutro profunda admiração, resolvi assumir, por total afinidade, a identidade negra (apesar de todas as discussões e disposições contrárias, por fenotipicamente ter características que mais se aproximam aparentemente do padrão estético branco) trajando o compromisso ético e moral, afinal, como formador de opinião, percebo como necessário debater o tema, pesquisar, sair da inércia muitas vezes imposta pelo senso comum e quebrar paradigmas, tratei de investir algum tempo analisando práticas e lendo alguns livros, leis e artigos (de cunho científico e não científico) que tinham por objetivo analisar pontos cruciais tratados ora nesse pequeno texto.

Há muito me questiono sobre as diretrizes que norteiam o discurso que envolve as questões etnicorraciais, com especial importância para os mecanismos de pertencimento aos mais diversos grupos étnicos enquadrados pelo homem como sendo necessários à interpretação da essência humana. Muito me inquietava o pensamento sobre a metodologia de classificação, qual a mais correta, qual a mais precisa: a autodeterminação dos sujeitos ou a heterodenominação advinda de um agente revestido da legitimidade estatal?

Iniciando algumas reflexões acerca dos principais paradigmas que dividem a opinião das massas, devemos pensar em como esses mecanismos interagem entre si e como percebem e são percebidos dentro da dinâmica social de determinado lugar, como vieram sendo constituídos tais instrumentos e, portanto, analisando o processo histórico e não apenas seu produto.

O paradoxo aparente de um negro envolto em pele branca

            É interessante analisar que paira no imaginário da coletividade brasileira uma ideologia que é absolutamente correlata à perspectiva dos mecanismos taxonômicos referentes aos traços fenotípicos, ou seja, às características físicas ou insígnias de negritude/branquitude para que se possa efetivamente emitir um juízo de valor no que se refere a pertencer ao “grupo dos negros”, “grupos mestiços” ou ao “grupo dos brancos”.

 Além desses institutos de classificação fortemente higienistas, há também um fenômeno ligados à perspectiva freyriana com a instituição de classificações referentes às mestiçagens que, até hoje, se atém, ainda que inconscientemente, de maneira mais proximal à matriz branca, de tal maneira que o indivíduo tende a negar seus traços e sua ascendência negra em prol de uma identidade antropológica unificada branca. Importante também é se fazer perceber que dentro desta perspectiva (iniciada por Gilberto Freyre), estamos longe de formarmos uma democracia racial, sendo, na verdade, permeados de um sentimento forte de silenciamento e, na mesma proporção, iniciando a instigação dos nossos preconceitos e discriminações com relação não apenas ao pertencimento etnicorracial mas a diversas outras categorias de análise.

            A língua, enquanto instrumento de silenciamento, é um dos mecanismos sociais mais efetivos na difusão de ideologias em que podemos analisar de maneira bastante efetiva a influente perpetuação das expressões de cunho discriminatório (tomada aqui, nos casos a seguir, discriminação como fator negativo). Varias são as situações em que encontramos expressões como “denegriu” ou “a coisa ficou preta”, “tem que ter ordem pra não ficar um samba de crioulo doido”, uma das mais ofensivas, por se pautar numa perspectiva eminentemente higienista, “mulato” que possui como radical o vocábulo mula, tentando passar a ideia de que o mulato constituiria uma espécie híbrida entre seres de raças diferentes e, por esse motivo, que fosse estéril, geneticamente inferior e impedida de reproduzir-se, portanto.

Entretanto, cabe observar que a noção e o sentimento de pertencimento etnicorracial passam muito mais pelo crivo subjetivo do indivíduo do que a análise dos seus caracteres fenotípicos, sendo de imensa necessidade a oitiva do sujeito para que possamos, de maneira efetiva, entender sua natureza, seus referenciais, seu universo sináptico de elementos culturais.

Carlos Serrano e Maurício Waldman (2010) em sua obra Memória D’África: A temática Africana em sala de Aula, assim apresentam a relevância do tema ora abordado:

“[...] no tocante à realidade brasileira de hoje, Memória D’África: A temática Africana em sala de Aula posiciona-se como uma contribuição direta aos segmentos da população brasileira de origem africana que, desde os primórdios da colonização, com o concurso da discriminação racial, tiveram as suas práticas ancestrais abafadas, marginalizadas e/ou deturpadas, comprometendo, assim, a sua inserção plena no processo social brasileiro mais amplo.

Tal repressão cultural, quando muito disfarçada pelo mito da “democracia racial”, desdobra-se, aliás, em não reconhecimento de valores e práticas sociais de raiz africana interiorizados pelo conjunto da população brasileira, independentemente da sua origem racial. Portanto nesse contexto, verifica-se grande repercussão na identidade nacional, que não pode subsistir nem simplesmente reconhecer-se enquanto tal na hipótese de excluir os seus elementos africanos ou os que procedem da releitura de contribuições dessa origem.”(págs. 12 e 13)

Trabalhar a perspectiva da africanidade reflete, na verdade, a necessidade de investigação realística sob os novos prismas como a identidade se constitui. Pensar o negro e suas relações históricas e sociais é atentar para a valorização dos traços culturais negros no Brasil e como o Brasil influenciou  o cenário social do continente africano sob novos moldes, os moldes da consciência, da pluralidade e da necessidade de interpretação das realidades pelos seus instrumentos e não pelos instrumentos padronizadores, que inibem as singularidades.

Assim, sob esse aspecto, exprime brilhantemente Makota Valdina: “Eu não quero que me tolerem, eu quero é que me respeitem...”, pois somente com o respeito será possível a construção de uma realidade onde a pluralidade considerará as diferenças como possibilidades de aprendizagem, como possibilidade de construção diária de cidadania, de civilidade, de solidariedade plena e realística, integrando povos e culturas.

Para além de traços unicamente fenotípicos, reconhecer-se enquanto negro, no Brasil, perpassa por questões políticas e ideológicas mais ligadas à assunção de certas identidades sociais e características antropológicas comuns. A Carta Constitucional, bem como o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/10) prevê que o indivíduo tenha direito de igualdade, mas não apenas a igualdade considerada em seu sentido formal e absoluto (sob o instituto do instrumento normativo contido art. 5º da Constituição Federal de 1988 “todos são iguais perante a lei”), mas considerando também a possibilidade de consegui-lo através do princípio doutrinário que, para se buscar a efetivação da igualdade é importante, na verdade, a promoção de condições igualitárias que foram suprimidas durante mais de cinco séculos de história, imputando aos negros e comunidades indígenas e outros indivíduos das mais diversas etnias uma condição de inferioridade intelectual/cognitiva, física, ideológica ou de qualquer ordem que seja, negando-lhes a possibilidade de inserção em espaços sociais e relegando-os a espaços de menor relevância e prestígio social.

Preto versus negro

            O termo preto liga-se com tonalidade, com a cor. No universo do discurso das “raças humanas”, esse termo refere-se ao conjunto de caracteres negróides que expressam-se principalmente pela pigmentação da pele e traços do rosto ou biótipos, sendo que o principal fator de reconhecimento, o marco adotado se dá mediante a presença em maior ou menor grau de melanina, proteína responsável pela cor mais escura na epiderme. Assim, exclui-se do indivíduo toda a possibilidade de subsistência de um ideário que se funde em mecanismos psicológicos ou de reconhecimento social. Está, portanto, desprovido de história, de consciência, está despido de experiências e similitudes, sem valores, proximidade ou crenças, está isolado e sem sentido, perdido no universo da abstração.

O negro, embora utilizado enquanto sinônimo usualmente referenciando a tentativa de eufemismos, uma vez que se criou a falsa noção de que o termo preto é preconceituoso, envolve, na verdade, uma série de instrumentos de pertencimento, de afinidade, de concordância com princípios, valores e referenciais cuja gênese se aplica à africanidade, ou seja, com a parte tradicional da parcela negro-africana cujo conjunto de crenças e valores se aproximam das religiões e culturas tradicionalmente africanas, sofrendo poucas interferências ao longo dos séculos nas seguidas invasões estrangeiras e diásporas negras.

O negro não tem obrigatoriedade de filiar-se ao critério da pigmentação da pele ou da presença dos traços fenotípicos. Pelo contrário, esta perspectiva é mais flexível e reflexiva partindo do referencial psicológico do sujeito que é emanado aos demais, e não impondo a ele classificação pré-determinada baseada em uma padronização que anula sua história, seu contexto e suas percepções.

Dos critérios de analise do pertencimento etnicorracial

            Pensando acerca deste tópico, embora seja muito contraditória a vasta literatura especializada, me permito, antes, expor acerca das duas formas aceitáveis e suas implicações para que, ao final, possa expor meu ponto de vista sem querer extinguir o assunto ou assumir uma postura monopolizadora, monocrática, impositiva, acerca das concepções do leitor, tendo em vista que estão intimamente ligadas com as vivências e as diversas interpretações dos seres.

Permitam-me iniciar este tópico com um texto de nossa Constituição Federal aqui utilizado como ponto norteador, como chave hermenêutica e instrumento de análise:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana.”

         Sabendo-se desses princípios, é absolutamente pertinente que se façam alguns questionamentos ou apontamentos de acordo com a funcionalidade e complexidade do assunto ora tratado, a saber:

1.      O que é soberania, como se comporta ou se expressa, qual o objetivo deste instituto político?

2.      O que é cidadania, como se comporta ou se exprime este instituto, quais as diretrizes sociais deste dispositivo?

3.      Qual a amplitude do princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que a definição de dignidade varia de acordo com a matriz axiológica de cada indivíduo no tempo e no espaço?

Pensar em relações humanas é, portanto, fazer observar espaços e relações de poder, é investir na busca pela compreensão e, portanto, inserir-se num contexto em que a realidade é muito mais complexa do que aparentemente se apresenta. Desta maneira, buscamos indicar, de maneira inicial, as duas concepções referentes aos critérios de julgamento do pertencimento etnicorracial de uma pessoa.

Autodenominação dos povosou análise endógena

            Essa metodologia de pesquisa e pertencimento busca muito mais estabelecer os traços psicossociais que o sujeito construiu com as diversas situações na vida do que impor um padrão estético mantido pela sociedade brasileira. Analisando, a posteriori, sob os fundamentos sócio antropológicos e históricos, percebi que este é o critério mais apropriado uma vez que a identidade social é o principal instrumento de análise, cabendo ao indivíduo, e somente a ele, prolatar seu grupo de referência ou de pertencimento etnicorracial. É, desta forma, fruto dos processos de síntese que o indivíduo passou na vida, fazendo com que sua história não seja apagada por categorizações há muito determinadas e pouco efetivas.

Heterodenominação ou análise exógena

Analisando com mais intensidade e profundidade, esses sistemas políticos (uma vez que não podemos desvincular o caráter político das demais esferas e fazendo-se perceber que a política aqui mencionada em nada se aproxima das concepções partidárias e sim com as políticas públicas de um Estado), ainda que imperfeitos – e legitimados em sua própria imperfeição – buscam, através de agente revestido de uma pseudolegitimidade derivada da atribuição das funções do Estado, investir em uma taxonomia etnicorracial e, em seus critérios pessoais, sem nenhuma motivação ou fundamentação.

Algumas considerações sobre os critérios de pertencimento

Devemos privilegiar, a meu ver, a dimensão psicológica do sujeito, tornando-o autor e não objeto de análise, sobressaindo-se, portanto, o critério da autodeterminação dos povos, critério, aliás, adotado pela nossa Carta Magna, que assegura no seu art. 4º:

“A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: [...]

III - autodeterminação dos povos;

Esse dispositivo vanguardista, privilegia a perspectiva subjetiva e não a classificação de terceiros que em nada conhecem a história da pessoa a ser classificada, suas relações sociais  suas experiências de vida.

Alguns desafios à implantação da heterodenominação ou análise exógena

Pensemos na possibilidade de instaurar o critério da heterodenominação, algumas questões controversas e, no mínimo, inquietantes se sobressaem:

        Quais critérios nós utilizaríamos como diretores da pesquisa (traços fenotípicos, ancestralidade, traços socioculturais e/ou religiosos)?

        Como nos certificarmos que o agente não estará tendendo ao processo de embranquecimento da população brasileira, negligenciando indícios negro-africanos e indígenas sob o escopo de sobrepujar a cultura e a ideologia branca em nossa sociedade?

        Como promover o estudo das características fenotípicas a fim de que a análise seja efetivamente criteriosa e não pautada exclusivamente nas concepções subjetivas do agente, desconsiderando o que seria mais proximal a seu pensamento e a seu direito ao exercício da cidadania plena e aos direitos mais fundamentais e, a meu ver, irrenunciável enquanto ser humano (direito à conhecer, reconhecer e vivenciar vínculos com sua ancestralidade)?

Os critérios objetivos devem ser construídos seguindo um entendimento multidisciplinar que permita no sujeito constituir (ou pelo menos saber sobre) elementos de identificação, diferente, por exemplo, dos processos que vieram sendo feito com os povos indígenas no Brasil e grupos negros na África, agrupados genericamente sem preocupação com suas particularidades culturais, econômicas, linguísticas e religiosas, como índios ou com os povos africanos que envolviam maciços grupos étnicos, alterando profundamente o mosaico multiétnico e denominando-os de africanos ou índios (nomenclatura equivocada uma vez que havia o pensamento de que se havia chegado às Índias).

A Constituição Federal 1988 e as normas infraconstitucionais no sentido de promover igualdade e respeito à cultura negra

Conforme LIMA (2012), ao analisar os Direitos e Garantias Fundamentais:

“Com a influência dos princípios de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, invocados como temas nucleares assumidos nos aportes teóricos da Revolução Francesa, procurou-se observar a existência de direitos inerentes à essência da natureza humana e, por este fato, tendentes à universalidade, sendo assim inicialmente chamados de Direitos Naturais (posteriormente nomeados como Direitos Humanos) resultados de questionamentos filosóficos já iniciados muitos anos antes quando da Antiguidade Clássica. Esses direitos tiveram interpretações diversas de acordo com a época histórica e as concepções das doutrinas aplicadas ao direito.”

Percebemos, assim, a necessidade extrema de incorporarmos em nosso sistema jurídico uma modalidade diferenciada de promoção de igualdade em que fosse possível, à baila dos princípios básicos regentes da Revolução Francesa, instituir condições básicas, basilares à convivência pacífica e respeitosa dos povos.

Constituição Federal de 1988

            A nossa Carta Magna, promulgada no ano de 1988, veio a incorporar em seu arcabouço ideológico uma série de concepções humanísticas, tentando, a todo custo, instaurar determinadas garantias, por ser pós-ditadura, tentando resguardar os direitos dos cidadãos. Sendo bastante extensa e analítica (fato este que acabou por fazer com que nossa atual Constituição Federativa viesse a ser conhecida pela alcunha de Constituição Cidadã), este compêndio legislativo deveras avançado, já trazia em seu interior questões de enorme relevância social, como por exemplo o direito a um meio ambiente saudável (assunto tratado em outros países tomados por desenvolvidos apenas décadas depois devido ao enorme consumo dos recursos naturais), a importância de se poder saber sobre sua ancestralidade, sua classificação etnicorracial entre outros temas complexos e controversos.

Este instrumento normativo substantivo é, na verdade, como um documento em que se depositam os anseios, preocupações e as propostas desenvolvimentistas para nosso país e, por conseguinte, para nosso povo.

            Desta maneira, sustenta ainda a C.F./88 que a pluralidade, questão amplamente discutida em nossa atualidade, não seja negada em prol de uma ou outra camada social de tal forma que os motes da população não mais vivam em função da manutenção do status quo, ou seja, da situação hierárquica de sobreposição social que algumas classes vêm exercendo há séculos. Analisando nossos traços históricos, é de imensa relevância a observação de que conforme houve o fenômeno da “descoberta do Brasil”, nossos padrões, impostos pela força das espadas e pela ascensão da cruz, referendadas pela violência física, religiosa e ideológica, nos fizeram “embranquecer” e, junto com o fenômeno do embranquecimento, passamos a, analogamente, dotar de carga depreciativa todas as referências não-brancas a que fomos expostos em nossa história, relegando a um segundo plano os movimentos e ideologias negras e indígenas.

É nesse sentido que precisamos de uma norma substantiva que nos dê base para, ainda de maneira inicial, possamos cobrar das autoridades um posicionamento que não permita que terceiros possam intervir, garantindo-nos o pleno acesso às liberdades previstas pela Constituição.

Legislação infraconstitucional

            A lei fundamental é o instrumento pelo qual o legislador originário fundamentou todos os critérios e assuntos cuja importância é mais profunda, ou seja, que possuem maior relevância jurídica e social dentro da esfera nacional. Contudo, é absolutamente incongruente que se espere que a Constituição consiga em seus poucos capítulos abarcar toda a amplitude dos conteúdos a ser iniciados nela. Para isso é necessário que tais assuntos sejam tratados em legislação infraconstitucional (emendas constitucionais, tratados, leis ordinárias) para regulamentar as condutas tidas como necessárias ou reprováveis, a depender dos casos.

Lei 10.639/10 – Educação Afro-brasileira

            Esta lei altera o disposto na Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), de tal forma que, além de garantir formal e taxativamente o ensino de uma disciplina cujo teor se ligue com a construção identitária nacional onde se possa observar a historicidade da cultura afro-brasileira enquanto elemento fundamental na compreensão de nossa realidade, ainda percebe-se que a herança ancestral deve ser analisada de maneira não caricaturada ou vil, tratada simplesmente como uma data em que se deva colocar nossas crianças para brincar e estudar poucos traços, marcos, personagens, processos ou agentes de imensa importância de nossos antepassados negros.

Lei 11.645/10 -  Obrigatoriedade da temática de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena

Esta lei estabelece “diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”, sendo assim, se preocupa não em garantir efetivamente o ensino, mas em iniciar a preocupação no sentido de buscar-se novos horizontes, novas frentes de pesquisa e de ensino nas culturas supracitadas. É a preocupação em iniciar metodologicamente, através de normatização que se transformará ainda em orientações, a possibilidade de implantação das proposições normativas contidas nesta lei.

Lei 12.288/10 – Estatuto da Igualdade Racial

            Este dispositivo normativo trata de iniciar e instrumentalizar, de maneira mais diretiva, as garantias no sentido de promover a efetivação do mandamento constitucional de tratamento e de reconhecimento das influências positivas da cultura e dos povos que integraram nossa imbricada rede de interações etnicorraciais no decorrer de nossa história, entendida aqui desde antes da chegada dos portugueses às terras brasileiras.

            Nesse instrumento, o legislador tentou, através do processo de normatização, introduzir o caráter reflexivo e integrador, cujo sentimento de equidade seja inserido fortemente e permaneça pautado nas críticas às discriminações negativas, tento em vista que as idiossincrasias não são e nem poderiam ter um entendimento fragmentador e reducionista enquanto instrumentos de sobrepujança ou de ostentação de processos de negação dos pensamentos, processos de identidade e das origens étnicas, em cujas particularidades residem possibilidades infinitas para a construção de uma realidade que enseje a pluralidade etnicorracial e o respeito à diversidade.

            Conforme se pode observar, toda legislação tende a formalizar relações sociais que trazem em sua origem fundamentos sociológicos de relação de poder. Nesta, repousa o entendimento de que é necessário à construção da paz uma interpretação normativa que possibilite a integração dos povos.

O Código Penal e os crimes de racismo e injúria qualificada.

            É de imensa importância se observar algumas questões acerca da legislação penal, como por exemplo, o fato de que esta se constitui enquanto a ultima esfera de ação do poder jurisdicional do Estado, constituindo-se, de maneira singularíssima, na última instancia jurisdicional, mais conhecida como ultima ratio, a que poderá um particular investir contra outro acerca de práticas tipificadas pelo Estado enquanto reprováveis, ilícitas, indesejadas.

Estas práticas, na verdade podem culminar, ao fim de um devido processo legal ou através de representação do Ministério Público enquanto garantidor das normas substantivas, na suspensão de direitos e, de maneira ainda mais intensa a depender da potencialidade lesiva ou da gravidade da ação (ou omissão), na suspensão da liberdade individual, imputando-lhe sanções intensas com o objetivo de reduzir-lhes a possibilidade de reiterar tais práticas ou exprimir algumas ideologias altamente lesivas à estabilidade social. Essa última seara (a penal) é de imensa força repressiva na prevenção de condutas adversas.

Devido à supressão das liberdades ou direitos dos seres humanos, ela acaba sendo responsável pelas detenções, fato pelo qual o sistema penitenciário brasileiro se mantém ainda hoje superlotado, parecendo ser “fiel depositário das ameaças da sociedade” frente à esfera criminal ainda hoje.

Com a efetiva autorização da Constituição, que trata no art. 5º, inciso XLII que “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”, tomada como conduta reprovável tão intensa que existem autores que elevando-a à característica análoga aos crimes hediondos, tamanha sua ameaça à segurança pública e à manutenção da paz social.

Constitui um grande avanço no sentido de promover uma situação mais favorável à criminalização das condutas representativas do ideário pacifista pretendido pelo Estado, em prol do que se convencionou chamar de bem comum, tendo em vista que as chagas causadas pelo racismo e/ou injúria na sua forma qualificada (tipificada pelo parágrafo 3º do artigo 140 do Código Penal) acabam por gerar diversas tensões e instabilidades sociais. Desta forma, por fim, a repressão dessas práticas encontra-se devidamente expressa da seguinte maneira:

“Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

[...]

§ 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:”(grifo nosso)

A identidade negra: construções, abstrações e supressões

            A identidade negra veio se constituindo no Brasil como uma identidade de resistência, de rompimento de paradigmas estruturais e estruturantes da segregação social e econômica, de base para movimentos contra a hegemonia. Esses traços revolucionários vieram, na verdade, servindo como chaves hermenêuticas para analisar as mais diversas expressões sociais, religiosas, políticas, artísticas e ideológicas que nós da sociedade brasileira, em especial negros, temos buscado difundir, sob uma ótica em que a diversidade (e não a padronização) é o que nos faz crescer e evoluir como seres humanos em constate transformação, perspectiva inclusive defendida pelas religiões de matrizes africanas, conforme analisaremos posteriormente, sob o pensamento que a dialética e nas relações sociais deve ser mantida também visando estabelecer-se enquanto dialógica, ou seja, os espaços de vivencia e aprendizado dialogam, são indissociáveis.

            Desde o processo de “descoberta do Brasil”, se é assim que podemos chamar, os negros vieram a ser força motriz da esfera econômica e social, mas seu grau de referência nos feitos e processos históricos é inversamente proporcional às contribuições que deram na grande parte dos segmentos sociais para o desenvolvimento deste país.

Intitulados de seres sem alma, perpassando pela teoria camita (em referência a Cam - filho de Noé descrito na Bíblia por ter sido amaldiçoado pelo seu pai ao ter zombado dele) até pensamento de o povo que necessitava ser escravizado para que pudesse receber a dádiva de receber a devida noção de civilização, o negro sofreu flagelos corporais e, com muito maior intensidade, flagelos psicológicos, sociais, familiares.

Dos processos de negação ao nome, à terra, à ancestralidade fomos jogados em porões nos navios negreiros, fomos sentenciados às senzalas e às guerras, fomos rotulados como incapazes, sem cultura, tratados como mercadorias, tornados filhos do desprezo, quando não do adultério dos senhores de engenho, embebidos pelo silêncio da agonizante viagem, num cenário de sofrimento, das terras áridas e tropicais que um dia, fatidicamente, ligaram o continente africano ao Brasil...

            Há que se fazer notar que, na verdade, os negros conjugam, no seu contexto social e histórico, funções deveras importantes e, mesmo com a tentativa intensa de silenciar-nos, ainda estamos com voz ativa, organizando-nos, requerendo melhorias, fazendo observar que nossas origens são nossa força e orgulho que não deve, sob nenhuma hipótese, ser negada ou novamente deturpada.

A condição idiossincrática dos negros no Brasil, ainda hoje, se dá como produto do processo de execração, acontecido através de séculos de supressão cultural, em contraditoriedade com supremacia social cedida à cultura europeia com o que se convencionou chamar, muito pretensiosamente, de “intelectualidade europeia”, com a ideia de civilização europeia que barbaramente impõe suas concepções ostensivamente aos demais povos, despindo-os de qualquer sentido, retirando-lhes as particularidades inerentes aos fenômenos locais. Outro ponto deveras importante para a análise desse sentimento de superioridade europeia advém dos instrumentos e marcos históricos e geográficos utilizados para medir, segregar e separar o mundo, notadamente perceptível, uma vez que as condições geográficas (relevo e, em especial, o fator clima) serviram para que, em sua visão dominadora e silenciadora pudessem engendrar pensamentos de ser a África e todos os territórios intertropicais como lugares naturalmente impenetráveis em cujas terras habitavam horrores, monstros e canibais regulados pelas temperaturas baixas que faziam permear na mentalidade eurocêntrica uma perspectiva que interpretava, pautada na da mitologia judaico-cristã, as temperaturas mais frias como perspectiva que equipararia à condição de Céu, enquanto as temperaturas mais quentes estariam ligadas às temperaturas abrasantes do inferno e de suas criaturas horrendas e condições angustiantes numa visão dantesca absurdamente deturpada do continente africano e regiões centrais, afinal é a África o mais central dos continentes tendo em vista que é nele que se encontram o Meridiano de Greenwich com o paralelo do Equador, encontrando-se, também, com parte de sua massa territorial distribuída na zona intertropical e temperada.

            O processo de escravização, já existente antes da chegada dos colonizadores europeus, antes tinha um caráter totalmente diferente e passou a ser concebida, pelo crivo capitalista na primeira fase (expansão marítima comercial), como apenas um objeto de valor ou de prestígio, não mantendo nenhuma corresponsabilidade para com sustento do escravo, como acontecia com o chefe da tribo ou a pessoa que se assenhoreou dele por motivos específicos como a dívida (e não de maneira arbitrária como acontecia habitualmente com os europeus). Enquanto mercadoria, na ideologia mercantilista, o negro perdeu sua história e tradição, encaradas aqui como condições mínimas de dignidade, de respeito e, portanto, fundamentais à manutenção da vida e de seus elementos constitutivos.

            Separados da família, perde seus costumes ou ter que exercitá-los às escondidas modificou, certamente, as estruturas psicológicas de muitos dos africanos que, retirados de sua terra, viram-se forçados a iniciar uma odisseia angustiante, para terras desconhecidas com pessoas que nunca teria visto, cujos costumes, religião e línguas nativas muitas vezes sequer mantinham contato.

Pelos seus princípios lógicos e, de maneira mais efetiva, logísticos, visando evitar comunicação e rebeliões, os colonizadores europeus acharam por bem utilizar-se dos nomes dos portos de exportação da mão de obra escrava para nomear esses grupos de escravos, analisando também as insígnias fenotípicas como instrumento fragmentador das diversas identidades e etnias ocupantes do espaço africano, fazendo com que o imaginário europeu fosse aguçado, estimulado no sentido de construir estratégias e metodologias de inferiorização que permitiram que o negro africano fosse mais facilmente escravizado com o auxílio de alguns chefes de tribo (faça-se perceber que houve diversos processos de resistência que foram utilizados tanto na África quanto no Brasil como instrumento de não aceitação das realidades desiguais existentes naqueles ambientes).

Desta maneira esse resgate de informações, suprimidas ao longo de séculos de silenciamento é necessário com o objetivo de desconstruir nossas ideologias e tentar repensar essa modalidade tão difundida de um negro fraco, fragmentado em sua natureza, irracional e residente em uma terra instável e, naturalmente, imposta enquanto zona de combate e de pobrezas incomparáveis que, na História mundial só desempenhou papeis de coadjuvante (realidade pouco efetiva que em nada demonstrava sua veracidade e, em diversas ocasiões veio sendo posta à prova, tamanho o grau de sua incoerência).

A filosofia de vida voltada ao controle de malefícios sociais  e ao estímulo à solidariedade

            Inegável é a contribuição que o continente africano nos dá no sentido de estimular a construção de uma sociedade que visa ser menos desigual, que procura reduzir as disparidades e os desafios puramente econômicos com o objetivo de promover justiça e paz social. Uma sociedade que, mesmo com as desigualdades, tenta engendrar-se num sentimento em que o coletivo e a solidariedade social são mais importantes do que a individualidades, as particularidades e anseios dos indivíduos, nos mostrando que alguns preceitos sociais importantes reverberam em estruturas econômicas, sociais, históricas e culturais.

            A ideia de solidariedade, forte entre os povos africanos, inclusive entre pessoas de diferentes etnias, está posta como elemento fundamental num continente cujo diferencial se dá pela realidade pluriétnica ou, nas palavras de WALDMAN e SERRANO (2010), se comportando como um complexo “mosaico étnico”. Já nas sociedades ditas complexas e civilizadas, como se autoproclamou a sociedade europeia, o sentimento de solidariedade advém de uma organização clânica, de um pensamento fragmentador pautado unicamente na perspectiva da gênese dos grupos e dos vínculos decorrentes da estratificação social. Assim sendo, o campo das relações sociais estabelecidas no seio do continente africano se consubstanciam enquanto universo de possibilidades infinitas, onde o respeito às diferenças se transforma em fator de aglutinação e, ao mesmo tempo, fator de diferenciação entre os mais diversos grupos sociais.

            WALDMAN e SERRANO (2010) assim expressam a relação tradicional entre política, respeito às diferenças e solidariedade:

“O poder político tradicional permitiu e foi capaz de criar mecanismos de solidariedade e de convivência entre povos muito diversificados, operando com base na construção de consensos, estratégia fundamental em um edifício de poder no qual a autoridade central se estabelecia como mantenedora da pluralidade de interesses e de manifestações culturais e religiosas” (pag. 123) (grifo nosso)

            Devido à sua profundidade em discutir questões de infinita relevância, como o preconceito, as diferenças, culturas, mitos e outros temas, permito-me, pois, reproduzir a música de Chico Cézar intitulada Respeitem meus cabelos, brancos que muito tem a ver com aqueles irmãos negros que trazem em si as insígnias fenotípicas em sua pele, e que, acima de tudo, buscam que suas características sejam valorizadas, respeitadas e que suas idiossincrasias sejam percebidas não como instrumento de inferiorização, mas, simplesmente na direção da percepção de que pode vir a existir unidade na diversidade:

“Respeitem meus cabelos, brancos
Chegou a hora de falar
Vamos ser francos
Pois quando um preto fala
O branco cala ou deixa a sala
Com veludo nos tamancos.

 

Cabelo veio da África
Junto com meus santos

Cabelo veio da África
Junto com meus santos.

 

Benguelas, zulus, gêges
Rebolos, bundos, bantos
Batuques, toques, mandingas
Danças, tranças, cantos
Respeitem meus cabelos, brancos.

 

Se eu quero pixaim, deixa
Se eu quero enrolar, deixa
Se eu quero colorir, deixa
Se eu quero assanhar, deixa
Deixa, deixa a madeixa balançar.

 

Se eu quero pixaim, deixa
Se eu quero enrolar, deixa
Se eu quero colorir, deixa
Se eu quero assanhar, deixa
Deixa, deixa a madeixa balançar.”

Brasil – África: similitudes e particularidades

            Aos que não conseguem ver claramente uma ligação, um elo, um denominador comum entre essas massas territoriais devidamente separadas pelo Atlântico, entre o lócus geográfico, os marcos geográficos, referenciais e feitos históricos que cada uma delas mantém entre si, se torna perceptível, na verdade, que seu imaginário está apenas permeado por ideologias que fazem com que consumamos silenciosa e acriticamente determinados pontos de vista cujo caráter muitas vezes afropessimista não nos encoraja a perceber nada de válido, valioso ou relevante em nossa formação enquanto povo e enquanto nação assentada na pluralidade dos povos e das concepções e ideologias, forçando-nos a, inconscientemente, reproduzirmos a África em sua aridez, em seu primitivismo (que, afinal, nunca existiu tendo em vista que as mais expoentes civilizações nasceram em terras africanas), em suas “fraquezas”, fragilidades e barreiras naturais ou culturais.

            No que me cabe à nossa observação, a África mantém com o Brasil um intricado modelo de referenciais que são conjugados entre esses espaços geográficos, envolvendo modelos de sociedade e esquemas culturais que são compartilhados numa velocidade enorme, embora encobertos pelo véu do anonimato e dos diversos processos de embranquecimento existentes na sociedade brasileira.

Muito além dos empréstimos linguísticos, a cultura africana repercute em esferas muito mais práticas referentes a modos de pensar e executar determinadas atividades, mas também com evidências de natureza social, histórica, religiosa e antropológica. Analisar as similitudes e as divergências vão muito além de contrapor espaços geográficos que, pela sua conjuntura geopolítica tendem a prolatar sua proximidade, ou melhor, sua unidade geográfica.

Assim como nas terras africanas, o Brasil passou por um processo histórico de subjugação, de submissão, de silenciamento em prol de um povo estranho e, nesse sentido, bárbaro, alienígena, alheio às realidades sociais, linguísticas e culturais desses espaços, modificando de maneira drástica a dinâmica populacional, introduzindo estruturas, instrumentos e instituições que não se fazia necessário mas que, por força da imposição e da ideologia da época, se fez importante reforçar e prolatar como instrumento de dominação. Eis que por uma demanda mercadológica baseada em pensamentos religiosos, políticos e científicos (se assim podemos chamar os métodos da época), construiu-se uma teoria em que negros deveriam ser forçados a trabalhar em prol da libertação de sua alma pecadora (quer dizer, inicialmente os negros sequer possuíam almas, eram tomados como animais dotados apenas de força, mas em alma) através do trabalho, pois sua penitencia seria naturalmente se transformar na força motriz da economia da época (principalmente quando da época da Idade Moderna, uma vez que a alma era o que dava ao ser humano o caráter mais divino, cuja existência permitia a proximidade com Deus (um deus branco europeu que, na concepção da Idade Média, assola seu povo com pragas, penitências, pestes bem como curas, interdições e pecados, com salvações, indulgências e arrependimentos).

Entretanto, essas concepções vieram a tomar força com uma teoria que categorizava as pessoas conforme seus caracteres físicos, de tal maneira que, determinados traços fenotípicos seriam o bastante para classifica-lo dentro de uma escala de proximidade com o ideal branco ou com a escória dos negros, ao pensamento da época. Contemporaneamente, convencionou-se chamar este tipo de observação, baseada em critérios de cientistas higienistas, de racismo de marca – espécie bastante recorrente no nosso País em contraste com o racismo de origem em outras partes do mundo, como nos Estados Unidos da América, por exemplo.

WALDMAN e SERRANO assim exprimem algumas considerações acerca da realidade africana que, ao mesmo tempo se torna tão idêntica e tão divergente com a realidade brasileira:

“O mundo africano corresponde a um todo integrado onde se relacionam não só aspectos sociais mas também o espaço e o tempo vivenciados por suas sociedades. Aliás, o entrosamento do tempo com o espaço é, sobretudo, uma premissa africana. No pensamento tradicional africano, o binômio espaço-tempo compartilha tamanha cumplicidade, que tornou-se prescindíveis artifícios regulamentadores externos à realidade vivida, caso dos cronômetros e dos relógios que demarcam um tempo eminentemente matemático e abstrato.”(pág 136)

 

O homem e o meio-ambiente: uma relação dialógica de pertencimento, respeito na dialética social e religiosa tradicional

            É inenarrável a proximidade que o homem africano tem com o meio ambiente. Numa relação altamente sui generis, ele exprime respeito, cuidado e necessidade de preservação e sustentabilidade, valores que são hoje suscitados pelas sociedades ditas evoluídas, modernas e civilizadas que, após muito degradarem o meio ambiente (produto dos processos contínuos de avanços nas áreas de amplitude técnico-científica e social) têm se visto em situações de extrema vulnerabilidade ambiental e imposto, inclusive, a outros povos conforme seja o produto de séculos de degradação e utilização indiscriminada dos recursos naturais, uma situação caótica e inconveniente frente às gerações presentes e futuras de países que pouco mantém vínculos.

            Para o pensamento africano tradicional, em linhas gerais, o homem não está desvinculado da natureza, pelo contrário, encontra-se absolutamente ligado ao contexto socioambiental que o cerca, devendo, desta forma, zelar por sua integridade, respeitando-o uma vez que, como veremos a seguir, na própria mitologia ioruba, por exemplo, os deuses estão intrinsecamente ligados com elementos da natureza. A seguir alguns exemplos da proximidade que legitima a sacralização dos espaços naturais e dos elementos biológicos, geológicos, geopolíticos e físicos.

            SERRANO e WALDMAN (2010), assim exprimem a relação do binômio poder estatal e religião, antinômicos nas sociedades de cunho europeu):

“[...] o sagrado surge como um princípio importante para o exercício do poder legitimando-o. O chefe sintetiza a sociedade como um todo. A sua saúde constituirazão para o bem-estar da sociedade como um todo. É o principal mediador, com as forças vitais ancestrais que trazem fertilidade aos campos e harmonia da sociedade. Portanto, estabelece um elo importante com o povo desde sua entronização até sua morte” (pág. 160)

            Entre as diversas similitudes, Brasil e África estão ligados pelas estratégias de resistência entre os indivíduos de pele escura e a possibilidade de engendrar lutas na tentativa de solução de conflitos e anomias buscando, sempre que possível, pacificar as decisões baseados em conceitos que se ligam com a ancestralidade (viva ou desencarnada, em outro ponto do Cosmos – o Orun dentro da perspectiva ioruba). SERRANO e WALDMAN (2010), assim exprimem o que convencionam chamar de vínculos e complementaridades:

“Inferências de âmbito antropológico, geográfico, histórico e sociológico que transformam o Brasil e a África em coparticipes nas mais diversas situações e experimentos da vida humana. Tanto na realidade brasileira quanto na africana são dominadas pela tropicalidade, pela pujança do meio natural, pela multiplicidade, cultural e religiosa. Sem qualquer sombra de dúvida, estamos diante de duas realidades nas quais as analogias predominam sobre as diferenças, materializando caminhos comuns passiveis de serem trilhados por africanos e brasileiros.

Podemos igualmente enfatizar a presença da África na realidade social e cultural brasileira alimentada pelo trafico de escravos, o que acabou por transplantar para o Brasil, por mais de três séculos e meio, diversas manifestações daquele continente. Essas influências, mesmo severamente reprimidas, continuaram vivas, atuantes e com inegável presença no cotidiano nacional. Constituem atualmente parte indissociável de valores e posturas que tornam os brasileiros um grupo distinto, portador de signos identitários que contribuem para torná-lo distinto dos demais povos.” (pág. 13 - grifo nosso)

            Em contraposição, as divergências se dão de maneira complexa de tal forma que a unidade brasileira e a pluralidade de concepções africanas se esbarram no enfrentamento real às diversas formas de pensamento com relação aos preconceitos e discriminações negativas (saibam da existência de discriminações positivas visto que discriminar é pôr em evidência de maneira axiologicamente valorosa ou depreciativa).

            Pensar que nosso modelo de colonização, evidentemente de caráter exploratório, teve o objetivo de unicamente destruir os recursos em prol do enriquecimento desenfreado pregado pelas potências mercantilistas do século XVI faz com que possamos entender um pouco dos problemas socioambientais ainda existentes no Brasil. Assim sendo, essa ideologia (que ainda integra o pensamento dos cidadãos brasileiros), torna muito difícil a transformação de certas concepções arraigadas no imaginário social da população, tendo em vista que a desconstrução de uma ideologia é muito mais difícil e trabalhosa que sua construção e sedimentação.

Desta maneira, é preciso iniciar um processo eficaz de desenraizamento das ideologias de cunho predatório, de uma exploração irresponsável e desenfreada, pautada unicamente no suprimento de necessidades efêmeras e pouco efetivas, cujo objetivo maior é a ostentação de um padrão social de vida, de um status quo conferido em nossa sociedade onde o indivíduo é mais notório e respeitável por aquilo que possui e não pelas características morais e éticas que o constituem enquanto sujeito que utiliza suas habilidades e competências no tempo e no espaço, para exercer seus atributos e conceitos, não como produto de ideologias consumeristas de cunho consuetudinário altamente prejudiciais.

Na religiosidade tradicional africana, existem, a depender da localidade geográfica, as divindades ligadas à natureza e seus elementos, a saber, os orixás, os voduns e os inquices. Os orixás têm sua origem na tradição cultural ioruba, os voduns têm ligação com o povo jêje e os inquices têm como matriz principal a cultura banto.

Os sacerdotes destas religiões têm como função primordial a ligação entre os seres humanos e as divindades superiores. Assim sendo, seu papel social em traduzir oralmente as diversas histórias, míticas ou não, os conhecimentos sobre os elementos naturais, as plantas, as ervas medicinais ou ritualísticas, os animais, e os procedimentos e rituais dentre outras tradições é de importância fundamental na transmissão dos conhecimentos dentro da sociedade. A esses sacerdotes chamamos de babalorixá, quando o sacerdote é do sexo masculino e ialorixá quando é uma sacerdotisa.

Os orixás e seus domínios naturais: o sincretismo da religião com os movimentos migratórios e modelos de exploração ambiental

Pensar as relações sociais nesta conjuntura é, na verdade, dotar de diversas significações o mundo mitológico e a própria gênese da criação. A professora Dra. Denise Botelho em seu texto Religiosidade Afro-brasileira: a experiência do candomblé analisa essa relação da seguinte maneira:

“Ao descrever as origens do universo e das criaturas, as relações entre os seres humanos e as divindades e, ainda, como se dá o equilíbrio dinâmico entre eles, o mito de cada divindade dota de sentido o mundo e fornece um sistema de valores e de princípios para os seus seguidores.”

Dentro do panteão tradicionalmente africano, incorporado por algumas de nossas religiões afro-brasileiras mais eminentes, a análise de determinadas características e da personalidade dos orixás (inquices ou voduns a depender da matriz étnica) refletem a importância dos seus domínios naturais. Antes, é preciso entender o que é um orixá e quais suas atribuições.

Orixá é uma palavra que deriva de dois radicais iorubas, a saber, ori (cabeça ou coroa) e (luz). Desta feita, o orixá é o ser espiritual responsável pela proteção de determinados ambientes, elementos ou forças naturais, que se integram na complexidade do universo, sendo sua relação determinante para diversos atos da vida cotidiana. É de imensa importância se analisar que a relação com o orixá, que diferentemente de outras religiões tem sentimentos e feitos que misturam características humanas e divinas, este tem discricionariedade, ou seja, seu ori, seu pensamento, guia ou fundamento norteador, é que decidirá se determinado pedido deverá ou não ser executado e sob quais moldes assim deverá ser feito.

É absolutamente relevante se fazer notar que o candomblé, a umbanda e outras religiões de matrizes africanas são monoteístas, sendo Olodumaré ou Olorun (no caso do candomblé de matriz ioruba – mais difundido no Brasil) o deus maior dentro do panteon africano tradicional, o ser incriado, se expressando como a energia que cria todas as coisas no universo, sendo os demais orixás, divindades de segunda geração, como vibrações de diferentes amplitudes relacionando-se a diferentes dimensões, domínios, características e áreas de atuação. Assim sendo, BOTELHO expressa que:

“O candomblé é uma religião monoteísta. Olodumare – o Supremo Criador do Universo – é auxiliado no grande projeto de perpetuação da humanidade pelas divindades do panteon iorubá – os orixás. Tais divindades são acionadas por rituais preparatórios e o momento da absoluta sacralidade se dá quando os orixás expressam suas histórias mitológicas aos sons de atabaques e outros instrumentos, bem como das cantigas que retratam as características e feitos dessas divindades.”

É mister se fazer saber que nenhum orixá deve ser adorado isoladamente, tendo em vista que todos interagem entre si e mantem, assim como os seres humanos, relações interpessoais e sentimentos de proximidade entre si e com os seres humanos, buscando o equilíbrio.

Apesar de a incorporação dos orixás ser condição de integração, de comunicação entre Orun (ou Orum) e Ayé (ou Ayê), nem todos os orixás incorporam (estado de transe) de tal maneira que, se estudarmos as religiões de matrizes africanas observarmos que nem Olodumaré, o deus maior, nem o Iroko, orixá tipificado na forma de árvore incorporam uma vez que Olodumaré é a energia inicial e o Iroko representa a ligação da humanidade com sua ancestralidade, ou seja, com as almas desencarnadas que se encontram em um espaço diferente de nosso corpóreo, físico.

Segundo WALDAN e SERRANO (2010), ao analisar o capítulo sobre religiosidade africana:

“Para o africano, de um ponto de vista ontológico, a vida social insere-se, na sua totalidade, numa constante busca de equilíbrio. Seu pressuposto é um sistema de forças – incluindo deuses, ancestrais e mortos das linhagens – que se expressa desde os tempos primordiais até a sociedade presente, segmentada em espaços como o étnico, clânico, das linhagens e aldeão. Esse sistema estabelece uma hierarquia de estruturas baseadas em critérios de ancianidade, uma qualidade social referendada por esta mesma visão ontológica”(pág. 137)

É de grande interesse que se perceba algumas questões análogas ou decorrentes, talvez, do processo de sincretismo, que ocorreu entre as religiões de matrizes africanas e as demais religiões com suas respectivas divindades.

O número 7

            Sete são os orixás derivados de Oxalá, sete são as cores do arco-íris, sete são os pontos de energia (conforme poderá ser percebido no índice de imagens constantes no anexo deste texto), sete são as notas musicais e os dias da semana.

Importante se fazer notar que as religiões de matrizes africanas sofreram, entre si, o processo de sincretismo, para que não se pense que esse processo se deu unicamente de maneira a considerar como padrões mínimos o candomblé ou a umbanda e a matriz judaico-cristã.

Na perspectiva da louvação aos deuses, é importante que haja confluência, ou seja, que todos se empenhem na obtenção da evolução e que nós, os humanos demos cumprimento a todas as obrigações, respeitemos as interdições e limitações a que estamos naturalmente vinculados percebendo, entretanto, possibilidades de crescimento efetivo, factível e não apenas iniciarmos divagações e conjecturas. Não se deve pedir a apenas um dos orixás mas pedir que todos deem anuência à possibilidade de obtenção de determinado pedido em conjunto, permitindo que o desejo, a aspiração seja percebida como possível e que seja mostrada enquanto viável entre eles.

Conclusão

            Longe de ser apenas uma espécie de categorização, o sujeito negro no Brasil passa por uma série de processos muitas vezes concomitantes ou alternantes de negação e aceitação, da noção de pertencimento e exclusão, das dúvidas constantes, de processos impostos de silenciamento, processos de embranquecimento que cominam numa identidade que, a cada dia, vem se formatando paradoxalmente enquanto instrumento de resistência, de força, denúncia, de lutas contra as desigualdades num país de dimensões continentais e abismos sociais cuja amplitude é proporcional àquele.

            Implantar, de maneira séria, as diretrizes regentes da identidade negra é resgatar o respeito retirado de nossos antepassados, é devolvê-los ao seio da sociedade brasileira exaltando suas potencialidades exercidas e seu legado deixado a nós negros, em especial aos negros de pele branca, que não permite que sejamos novamente silenciados ou que recebamos silenciosamente algumas críticas e desclassificações por nossas características sócio históricas ou genéticas deveras particulares.

            Aceitar-se como negro é assumir uma postura ideológica que se aproxima da valorização do ser humano e da multiplicidade das características sociais, econômicas e culturais (religiosa, linguística, política, estrutural) fazendo-se perceber que as diferenças não excluem a possibilidade de crescimento, quer seja espiritual, quer seja materialmente.

Referências

Textos sugeridos

1.      BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Vade Mecum. 2011. Editora Saraiva.

2.      SERRANO, Carlos e WALDMAN, Maurício. MEMÓRIA D’ÁFRICA – A temática Africana em sala de Aula. 2010. 3ª Edição. São Paulo. Editora Cortez.

3.      A lenda da Criação. Disponível em: http://odeigbo.webs.com/olorumouolodumar.htm

4.      Candomblé - Um pouco de história. Disponível em: http://odeigbo.webs.com/

5.      7 Orixás da Umbanda. Disponível em: http://www.paimaneco.org.br/orixas/orixas-da-umbanda

6.      As Sete Linhas.Disponível em: http://casaiemanjaiassoba.com.br/setelinhas.html

7.      7 Orixás da Umbanda.Disponível em: http://www.paimaneco.org.br/orixas/orixas-da-umbanda. Acessado em: 23/08/2012.

8.      Os Orixás. Disponível em: http://www.caboclopery.com.br/os_orixas.htm. Acessado em: 23/08/2012.

9.      Exús. Disponível em: http://xango.sites.uol.com.br/exus.html. Acessado em: 23/08/2012.

10.  Nações Ketu Jeje e Angola: O CANDOMBLÉ COMO SISTEMA DE TRANSMISSÃO DE IDENTIDADE In: Orixás, Umbanda e Candomblé. Disponível em: http://wwworixas.blogspot.com/2010/05/nacoes-ketu-jeje-e-angola.html. Acessado em: 23/08/2012.

11.  FERNANDES, Fernando.Marte, Jorge da Capadócia
e Ogum do Brasil. O sete e a varinha mágica de Ogum.
Disponível em: http://www.constelar.com.br/revista/edicao37/jorge5.htm

12.  OLIVEIRA, Aurea. IBEJI - ERÊ - CÓSME E DAMIÃO In UMBANDA ON LINE. Disponível em: http://wwwumbandaonline.blogspot.com/2008/05/ibeji-er-csme-e-damio.html

13.  Fonte Estudo Religioso. Disponível em: http://estudoreligioso.wordpress.com/2008/07/24/nacoes-da-umbanda/

14.  MESTRE FREITAS.Disponível em: http://axeforteor.dominiotemporario.com/mestre_freitas_91.html. Acessado em: 26/08/2012

15.  Juremeiro Mestre Neto
Goiânia – Goiás.

Disponível em: http://juremeironeto.blogspot.com/

16.  BOTELHO, Denise. RELIGIOSIDADE AFRO-BRASILEIRA: a experiência do candomblé. In: Educação Africanidades - Brasil, MEC.

17.  BRASIL. Lei 7.716/89. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7716.htm. Acessado em: 26/08/2012.

18.  BRASIL. Lei 10.639/10. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm. Acessada em 26/08/2010.

19.  BRASIL. Lei 11.645/10. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acessado em: 26/08/2012.

20.  BRASIL. Lei 12.288/10. Disponível em:http://www.leidireto.com.br/lei-12288.html. Acessado em: 26/08/2012.

21.  LIMA, Jonathan Reginnie de Sena. Direitos e Garantias Fundamentais: Uma análise sócio-antropológica do surgimento e implantação dos Direitos Humanos. 2012. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=7621. Acessado em 06/09/2012.

Vídeos sugeridos

1.      Preconceito e racismo na escola - Parte 1. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SP1ZX47muUE. Acessado em: 15/08/2012.

2.      Sagrado no Mais Você [Rede Globo] - Cultos Afro (Candomblé Umbanda) - Parte 01.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=RsWOKL6Fesk. Acessado em: 23/08/2012.

3.      Sagrado no Mais Você [Rede Globo] - Cultos Afro (Candomblé Umbanda) - Parte 02.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=h6AIXpNuU0U. Acessado em: 23/08/2012.

4.      Makota Valdina - Um Jeito Negro de Ser e Viver – Completo.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=9X-tqRFwEKk&feature=related. Acesso em: 23/08/2012.

5.      A IGUALDADADE RACIAL e a INTOLERÂNCIA RELIGIOSA - Ricardo Barreira.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=Trch___RvG0. Acessado em 23/08/2012.

6.      Bença, entrevista com Makota Valdina.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=P0ziJx0KWRE&feature=related. Acessado em 23/08/2012.

7.      Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (1/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=ZbOcW5oF2fQ&feature=relmfu. Acessado em 25/08/2012.

8.      Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (2/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=vjPZmCRRcTc&feature=relmfu. Acessado em: 25/08/2012.

9.      Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (3/4). Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=5rP1zG5m6UU&feature=relmfu. Acessado em: 25/08/2012.

10.  Pleno - STF julga constitucional política de cotas na UnB (4/4). Disponível em:http://www.youtube.com/watch?v=HVNM9Fu5qms&feature=relmfu. Acessado em: 25/08/2012.

11.  Minha Fé - Zeca Pagodinho Ao Vivo - DVD MTV - 2010 - HDTV.Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=fl4sSBjHQJ0. Acessado em 25/08/2012.

12.  Margareth Menezes - Cordeiro de Nanã/Deixa a Gira Girar/Atabaque Chora. Disponível em:http://www.youtube.com/watch?v=OyIsfdwhQRE. Acessado em 26/08/2012.


Anexos

Textos

Espectros

Jonathan Reginnie

E no silêncio dos inocentes

Pela força dos grilhões

Renegando nossos nomes

Nossa cor e tradição,

Nossos deuses tão presentes

Nossa voz se faz ausente

Sangram nossos corações

 

Que os Orixás perdoem

Nossas falhas e inconstâncias,

Zumbi, que do alto ecoa

Como herói que não se cansa

Ganga Zumba e sua lança

Sua força e importância

Emergem dos corações

 

É na força do guerreiro

Na cor de nossas lembranças

Que Xangô demonstra os feitos

Com as falas, com as danças

Mostrando riqueza e graça

A sublime e iluminada

Cor do povo de Aruanda

 

Oxalá, meu pai amado

Me ilumina sempre atento

Olodumaré nos dá

Força, fé e provimento

Iansã, grande rainha

Olha pela vida minha

Do alto do firmamento

 

Ogum, Oxóssi, Ibeji, Nanã

Iaôs dançam com os atabaques

O babalorixá reinou

No terreiro iluminado

Quanto axé dos agogôs

Nos guiam em nosso caminho

E protegem nossos passos

 

Que o Yroko sagrado

Nos conecte aos ancestrais

Que a cultura nos permita

Viver com amor e paz

Que a importância de outrora

Nos permita ainda agora

Falar com os ancestrais

 

Respeite minha cultura

Minha cor, minha mensagem

Não desvirtue a realidade

Cor não mede capacidade

Não fragmente a identidade

Nunca tente silenciar

Minha ancestralidade.


Resgate afro-brasileiro

Claudiane Caroline A. Wanderley

Conta a história que nas terras africanas numa cidade chamada Ifé

Nasceu a religião afro-brasileira denominada Candomblé

Trazida para o Brasil pela nação ioruba

Viajando pelos mares sob a proteção de Yemanjá

 

Em seu culto à natureza, com suas divindades geniosas

Candomblé é a religião afro-brasileira mais influente do país

Onde as mães e pais de santo são canais dos orixás

Ensinando a humanidade o que fazer pra ser feliz

 

Olodumaré é o grande criador, de todo o Orum ele é senhor

Ogum é orixá guerreiro, vai à frente do caminho, pioneiro

Oxossi é caçador, dos animais o grandioso protetor

Ossain detém o poder do axé, filho caçula de Yemanjá

Nanã controla a lama e os pântanos e as águas paradas está sempre a governar

 

Oxumaré é o arco-íris, entre terra e céu transporta a água

Orixá da beleza é Logunedé, seis meses vive como homem e os outros seis como mulher

Omolú ou Obaluaiê representa as doenças contagiosas, mas também a sua cura

Yroko é dono do tempo e do espaço, decide o início da vida e o quanto ela dura

 

Obá, orixá corajosa, mulher de Xangô, não era bonita e nem fazia questão de ser formosa

Enquanto a majestosa Oxum representa beleza, maternidade, fertilidade e riqueza

Xangô é orixá do trovão e da justiça, orgulhoso, autoritário e ao mesmo tempo generoso

Yansã é senhora dos ventos e da tempestade e junto com Xangô manda no elemento fogo

 

 Ewá é uma bela virgem que protege tudo que nunca foi tocado, aquilo que é inexplorado

Yemanjá é senhora do mar e dos oceanos e a mãe de todos os orixás

Quem gosta de cachaça é Exu, quem veste branco é Oxalá

Do Candomblé nasceu o culto à natureza através dos Orixás!


Assim nasceu o Candomblé

 

“No começo não havia separação entre o Orum, o Céu dos orixás, e o Aiê, a Terra dos humanos.

Homens e divindades iam e vinham, coabitando e dividindo vidas e aventuras.

Conta-se que, quando o Orum fazia limite com o Aiê, um ser humano tocou o Orum com as mãos sujas.

O céu imaculado do Orixá fora conspurcado.

O branco imaculado de Obatalá se perdera.

Oxalá foi reclamar a Olorum.

Olorum, Senhor do Céu, Deus Supremo, irado com a sujeira, o desperdício e a displicência dos mortais, soprou enfurecido seu sopro divino e separou para sempre o Céu da Terra.

Assim, o Orum separou-se do mundo dos homens e nenhum homem poderia ir ao Orum e retornar de lá com vida. E os orixás também não podiam vir à Terra com seus corpos. Agora havia o mundo dos homens e o dos orixás, separados. Isoladas dos humanos habitantes do Aiê, as divindades entristeceram.

Os orixás tinham saudades de suas peripécias entre os humanos e andavam tristes e amuados.

Foram queixar-se com Olodumare, que acabou consentindo que os orixás pudessem vez por outra retornar à Terra.

Para isso, entretanto, teriam que tomar o corpo material de seus devotos.

Foi a condição imposta por Olodumare.

Oxum, que antes gostava de vir à Terra brincar com as mulheres, dividindo com elas sua formosura e vaidade, ensinando-lhes feitiços de adorável sedução e irresistível encanto, recebeu de Olorum um novo encargo:

preparar os mortais para receberem em seus corpos os orixás.

Oxum fez oferendas a Exu para propiciar sua delicada missão.

De seu sucesso dependia a alegria dos seus irmãos e amigos orixás.

Veio ao Aiê e juntou as mulheres à sua volta, banhou seus corpos com ervas preciosas, cortou seus cabelos, raspou suas cabeças, pintou seus corpos.

Pintou suas cabeças com pintinhas brancas, como as pintas das penas da conquém, como as penas da galinha-d’angola. Vestiu-as com belíssimos panos e fartos laços, enfeitou-as com jóias e coroas.

O ori, a cabeça, ela adornou ainda com a pena ecodidé, pluma vermelha, rara e misteriosa do papagaio-da-costa. Nas mãos as fez levar abebés, espadas, cetros, e nos pulsos, dúzias de dourados indés.

O colo cobriu com voltas e voltas de coloridas contas e múltiplas fieiras de búzios, cerâmicas e corais.

Na cabeça pôs um cone feito de manteiga de ori, finas ervas e obi mascado, com todo condimento de que gostam os orixás.

Esse oxo atrairia o orixá ao ori da iniciada e o orixá não tinha como se enganar em seu retorno ao Aiê.

Finalmente as pequenas esposas estavam feitas, estavam prontas, e estavam odara.

As iaôs eram as noivas mais bonitas que a vaidade de Oxum conseguia imaginar. Estavam prontas para os deuses.

Os orixás agora tinham seus cavalos, podiam retornar com segurança ao Aiê, podiam cavalgar o corpo das devotas.

Os humanos faziam oferendas aos orixás, convidando-os à Terra, aos corpos das iaôs.

Então os orixás vinham e tomavam seus cavalos.

E, enquanto os homens tocavam seus tambores, vibrando os batás e agogôs, soando os xequerês e adjás, enquanto os homens cantavam e davam vivas e aplaudiam, convidando todos os humanos iniciados para a roda do xirê, os orixás dançavam e dançavam e dançavam.

Os orixás podiam de novo conviver com os mortais.

Os orixás estavam felizes.

Na roda das feitas, no corpo das iaôs,

eles dançavam e dançavam e dançavam.

Estava inventado o candomblé.”

 

Disponível em: http://www.alaketu.com.br/ritos/festas.htm. Acessado em 26/08/2012.


Coisa de Pele

Jorge Aragão

Podemos sorrir, nada mais nos impede
Não dá pra fugir dessa coisa de pele
Sentida por nós, desatando os nós
Sabemos agora, nem tudo que é bom vem de fora


É a nossa canção pelas ruas e bares que
Nos traz a razão relembrando Palmares
Foi bom insistir, compor e ouvir
Resiste quem pode à força dos nossos pagodes


E o samba se faz, prisioneiro pacato dos nossos tantãs
E um banjo liberta da garganta do povo as suas emoções
Alimentando muito mais a cabeça de um compositor
Eterno reduto de paz, nascente das várias feições do amor

Arte popular do nosso chão... é o povo quem produz o show e assina a direção
Arte popular do nosso chão... é o povo quem produz o show e assina a direção

 

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