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Resumo:
Trata-se de uma análise iusfilosófica esquemática acerca da teoria da norma jurídica.
Texto enviado ao JurisWay em 11/03/2011.
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A teoria da norma jurídica mediante uma análise iusfilosófica esquemática
Faustino da Rosa Júnior
1. Introdução: as normas jurídicas
Quando estudamos a perspectiva estrutural, utilizamos o exemplo do conceito kelseniano de direito, segundo o qual “o direito é um conjunto de normas coativas” (Hans Kelsen). Isto conduziu-nos a uma aproximação da noção de norma como expressão da linguagem, determinando-a, entre as diversas funções da linguagem, na função diretiva, uma vez que os enunciados normativos se propõem a provocar comportamentos nos demais. Dentro das diretivas, por sua maior força, identificamos as normas jurídicas como prescrições e analisamos os oito elementos que compõem a sua estrutura, segundo G. H. Von Wright. Posteriormente, distinguimos as normas jurídicas das outras normas, como as morais e as de trato social, assim como com outras diretivas, como as regras técnicas. Nesta oportunidade, caracterizamos as normas jurídicas como bilaterais, heterônomas, primordialmente externas e coercíveis. Nesta unidade, assim, aprofundaremos o estudo da norma jurídica, fundamentalmente no diz respeito à análise da estrutura lógica das normas jurídicas e do exame das concepções dos principais autores que mais influenciaram no estudo desta temática.
1.1 Norma jurídica e proposição normativa
As normas jurídicas expressam-se em uma linguagem normativa. Logo, é necessário o estudo da distinção entre norma jurídica e proposição jurídica, cuja origem está
Uma proposição normativa é um enunciado descritivo que refere a uma ou a várias normas jurídicas. O conjunto destes enunciados constitui a ciência jurídica, a qual descreve o direito (que está integrado pelo conjunto das normas jurídicas), exatamente através de proposições normativas. Portanto, as normas jurídicas são expressões de uma linguagem (prescritiva), enquanto que as proposições normativas são uma metalinguagem; disto resulta que as primeiras não podem qualificar-se de verdadeiras ou de falsas, senão de justas ou de injustas, de eficazes ou de ineficazes, etc., enquanto que as segundas sim, por ser, em última instância, meras descrições.
Exemplo: Art. 121, do Código Penal brasileiro: “Homicídio simples – Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos”.
Norma jurídica: “Se aplicará a pena de prisão ou reclusão de seis a vinte anos, àquele que matar a outro”.
Proposição normativa: “No direito penal brasileiro, o homicídio simples é reprimido com a pena de reclusão ou prisão de seis a vinte anos”.
1.2 Estrutura lógico-formal da norma jurídica
1.2.1 Hipótese e disposição: dever ser e imputação
Seguindo a análise da norma jurídica desde um ponto de vista formal, para se conhecer seus elementos estruturais e as relações entre estes, a definiremos no plano lógico como juízo hipotético, que pode ser representado da seguinte forma:
Se é A, deve ser B.
Dado A deve ser B.
Trata-se de uma fórmula que apresenta uma condição ou fato antecedente e uma consequência ou fato consequente unidos por um nexo como vínculo de imputação ou de atribuição (dever ser ou relação de imputação).
A hipótese ou suporte fático é a primeira parte e a disposição ou consequência jurídica é a segunda, ambas sempre vinculadas mediante um nexo ou uma relação de imputação.
A hipótese ou suporte fático pode-se identificar com os fatos lícitos ou ilícitos. Igualmente, a consequência jurídica pode ser positiva ou negativa.
Posição de Hans Kelsen: concebe a estrutura da norma jurídica como um juízo hipotético que expressa um enlace específico (imputação) de uma situação fática condicionante (transgressão) com uma consequência condicionada (sanção); pode-se advertir que, para este autor, a norma (primária) aparece como a relação entre uma conduta ilícita e sua consequente sanção. Dito juízo, então, está composto pelos seguintes três elementos: hipótese ou suporte fático, disposição ou conseqüência jurídica e nexo.
1.2.1.1 Hipótese de incidência ou suporte fático
Consiste na transgressão à norma, na conduta antijurídica, na hipótese fática que condiciona a aplicação da sanção, enfim, aqueles fatos cuja ocorrência está condiciona à aplicação da consequência jurídica.
1.2.1.2 Disposição ou consequência jurídica
Consiste na sanção ou no efeito jurídico previsto na norma, cuja aplicação encontra-se condicionada à ocorrência da hipótese fática (ou suporte fático) determinada. A sanção é sempre um ato coativo derivado do descumprimento normativo.
1.2.1.3 Nexo
Consiste no enlace que conecta e vincula a hipótese com a consequência e se expressa com o verbo dever ser. A norma está enunciada em termos condicionais, o direito ocupa-se da conduta que deve ser, portanto, o nexo expressa-se justamente com o verbo dever ser; este é o elemento que determina a relação de imputação que caracteriza a norma jurídica porque, em virtude de estabelecer a conduta que deve ser, a consequência (sanção) é imputada à transgressão (hipótese).
Fórmula:
Dado que A deve ser B.
Dada a transgressão normativa deve ser a sanção ao responsável.
Como ensina Hans Kelsen, sendo o direito uma ordem coativa da conduta humana, a sanção é o elemento pelo qual esta coação se materializa e, ao mesmo tempo, é o elemento que permite distinguir o direito de outras ordens normativas da conduta, pois somente ele é uma ordem coativa. Se as normas são os elementos que compõem o direito, lógico será que nelas se estabeleçam atos coercitivos, que sejam sancionadoras. Daí a presença, em sua estrutura, do ilícito e da sanção.
* Observação: Se a transgressão é descumprimento de um dever imposto pela norma, por quê este elemento (o dever) não está presente na estrutura lógico-formal dela?
Kelsen denomina de norma secundária, em relação à norma primária que contém a sanção, àquela cujo conteúdo é o dever, a conduta oposta a da hipótese da norma primária, e a considera um mero derivado lógico desta, irrelevante em sua compreensão da norma.
* Exemplo:
- Norma primária: “O que matar a outrem terá pena de seis a vinte anos...”
- Norma secundária: “Deve-se não matar...”
Esta formulação de Hans Kelsen fundamenta-se na idéia de que as normas jurídicas constituem técnicas de motivação social que induzem aos homens a comportar-se de determinada maneira, distinguindo duas técnicas: de motivação direta e de motivação indireta. A motivação direta é própria da moral, que simplesmente indica o conteúdo da norma, o que se deve fazer. Exemplo: “Deve-se cumprir as promessas”, “Deve honrar aos teus pais”, etc. A contrario sensu, o direito é visto, por Hans Kelsen, como uma técnica de motivação indireta, na medida em que o comportamento que se pretende lograr não está diretamente expressado, mas que se ameaça com sanções para a conduta não desejada ou, eventualmente, com um prêmio para a desejável; daí que, para o presente autor, a norma jurídica genuína é a que prescreve uma sanção (norma primária).
1.3 A norma jurídica como mandato ou ordem (Hans Kelsen e John Austin)
Segundo o autor inglês John Austin, as normas jurídicas são “ordens ou mandatos formulados pelo soberano aos súditos”. Uma ordem é uma expressão de vontade de um soberano, isto é, uma autoridade que tem a faculdade de mandar, que está dirigida aos súditos, que estão obrigados a segui-la sob a ameaça de uma sanção (um mal) para o caso de descumprimento de dito mandato.
Para Austin, o elemento distintivo das normas jurídicas em relação a todos os outros mandatos centra-se no fato de que os mandatos jurídicos têm sua origem na vontade do soberano.
Segundo o autor austríaco Hans Kelsen, difere nesse aspecto com a postura de John Austin, na medida em que sustenta que as normas, como juízos do dever ser, carecem de uma vontade psicológica, pela qual rejeita a identificação proposta por Austin. Neste sentido, diversos exemplos demonstram a impossibilidade de se assimilar uma norma jurídica a uma ordem: (a) existem normas, como as normas consuetudinárias, que não derivam de uma autoridade e que, portanto, não se encontram enunciadas na forma de mandatos; (b) as normas subsistem com a independência da vontade do emissor, como ocorre com o testamento cuja vigência depende do falecimento do outorgante; (c) não se pode ver vontade psicológica real nos legisladores ao ditarem uma lei, porque pode ocorrer que estes votem favoravelmente, mesmo ignorando completamente o conteúdo do referido projeto de lei.
1.4 Regras primárias e regras secundárias (Herbert Hart)
A crítica mais importante ao pensamento kelseniano foi formulada por Herbert Lionel Adolphus Hart.
O professor inglês Hart, considera que a visão de Kelsen sobre os elementos que integram a estrutura da norma jurídica aparece como limitada àqueles enunciados que prevêem sanção, contemplando o direito exclusivamente a partir do ponto de vista do descumprimento da norma, esquecendo que o normal e o habitual é que estas sejam aceitas, acatadas, respeitadas e cumpridas espontaneamente por seus destinatários. Ademais, tampouco adverte que no ordenamento jurídico existe um importante número de normas que não prevêem sanção, isto é, nem todos os enunciados que compõem o direito tem esta mesma estrutura, mas que existem outros que somente conferem autorizações ou ordens. O erro de Kelsen consiste em centrar sua atenção especialmente nas normas que estabelecem obrigações ou proibições.
Hart aceita considerar o direito como um conjunto de normas, porém seu aporte consiste em afirmar que estas podem ser de dois tipos. Em sua obra, The concept of law, assim as caracteriza: “Segundo as regras de um dos tipos, que pode ser considerado o tipo básico ou primário, prescreve-se que os seres humanos façam ou omitam certas ações, o queiram ou não. As regras do outro tipo dependem, em certo sentido, das do primeiro ou são secundárias em relação a ela. Porque as regras do segundo tipo estabelecem que os seres humanos podem extinguir ou modificar regras anteriores, ou determinar de diversas maneiras o efeito delas, ou controlar sua atuação. As regras do primeiro tipo impõem deveres; as do segundo tipo conferem faculdades, públicas ou privadas. As regras do primeiro tipo referem-se a ações que implicam movimento ou mudanças físicas; as do segundo tipo prevêem atos que conduzem não simplesmente a movimento ou mudança física, mas à criação ou modificação de deveres ou obrigações.” (HART, Herbet Lionel Adolphus. The concept of law. Oxford: Clarendon Press, 1961, p. 101).
Assim, Hart distingue as classes das normas jurídicas atendendo à diversa função que estas cumprem no ordenamento jurídico, afirmando que o direito está composto por dois tipos de regras: regras primárias e regras secundárias.
1.4.1 Regras primárias
São aquelas que estão dirigidas a provocar comportamentos nos indivíduos, impondo-lhes deveres de fazer ou de omitir certos atos; são norma de conduta ou de comportamento e seus destinatários são os indivíduos. Assim, são as regras que determinam as condutas.
1.4.2 Regras secundárias
São aquelas que estão referidas às primárias e que, portanto, não têm por fim direto regular os comportamentos dos indivíduos. São normas instrumentais ou de organização e seus destinatários são os funcionários dos órgãos e poderes do Estado. Por sua vez, as regras secundárias classificam-se em:
1.4.2.1 Regras de reconhecimento
Destinam-se a identificar as normas primárias estabelecendo critérios de validade a partir dos quais se pode considerar a uma norma como pertencente ao ordenamento jurídico. Hart ensina que, no fundo, a regra de reconhecimento é ditada pelo que os tribunais dizem, pois, em última instância, uma norma só pode ser considerada direito e compor o ordenamento jurídico, na medida em que ela for reconhecida como tal e aplicada pelos juízes e pelos tribunais na resolução dos casos concretos.
1.4.2.2 Regras de modificação
Destinam-se a regular o processo pelo qual se introduzem novas normas primárias e se modificam e expulsam as existentes, isto é, regulam a produção, a modificação e a revogação das normas primárias, dinamizando assim o ordenamento jurídico. Tratam-se das normas que regulam o processo legislativo.
1.4.2.3 Regras de adjudicação
Destinam-se a atribuir e regular a competência dos juízes na tarefa de determinar se as normas primárias foram infringidas, isto é, regulam a aplicação do direito. Tratam-se das normas de organização judiciária e de direito processual.
1.5 Enunciados não-normativos
1.5.1 Aproximação
Outras críticas foram formuladas à tese de Hans Kelsen por iusfilósofos argentinos como Carlos Alchorrón e Eugenio Bulygin. Para Kelsen, o direito está composto por normas coativas. Os referidos autores argentinos, por sua vez, vão mais longe, inclusive que a postura de Hart, ao classificar as normas em regras primárias e regras secundárias, sustentando que o ordenamento jurídico está composto por enunciados de diferentes tipos, alguns dos quais nem sequer são normas. Assim, segundo estes autores, num sistema jurídico, podem-se encontrar três classes de enunciados.
1.5.2 Enunciados que preveem sanção para o caso de descumprimento
São as normas que estabelecem uma conduta como devida e a correspondente sanção para o caso de descumprimento da mesma. Trata-se das normas coativas que concebe Kelsen como o único ingrediente do direito.
Exemplo: Art. 121, do Código Penal brasileiro: “Homicídio simples – Matar alguém: Pena – reclusão, de seis a vinte anos”.
1.5.3 Enunciados que obrigam, proíbem, facultam ou permitem realizar ou omitir algo, sem dispor sanções
São também enunciados normativos, entre os quais se incluiriam as regras secundárias de Hart, que não contém sanções.
Exemplo: Art. 78, do Código Civil brasileiro: “Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes”.
1.5.4 Enunciados que não estabelecem nenhuma conduta como obrigatória, proibida, permitida ou facultativa e que, portanto, não são normas
São enunciados meramente instrumentais, como as classificações ou definições legislativas; em consequência, não são enunciados normativos.
Exemplo: Art. 1º, do Código Civil brasileiro: “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”.
2. Normas e princípios (Ronald Dworkin)
2.1 Aproximação
Pode-se dizer que Ronald Dworkin é um dos representantes mais destacados na doutrina contemporânea que reage contra o modelo iuspositivista de Herbert Hart, entendendo que o conceito que reduz o direito às normas é incompleto e insuficiente.
Dworkin considera que o direito não está composto unicamente por normas, mas também, e fundamentalmente, por princípios. Os princípios estão acima e são superiores às normas e podem ser de dois tipos: diretrizes políticas (polices) e princípios em sentido estrito (principles).
2.2 Diretrizes políticas (polices)
São modelos que estabelecem objetivos que hão de ser alcançados, metas ou propósitos sociais, econômicos, políticos, etc.; são próprios do Poder Legislativo, já que normalmente se recorre, neste âmbito, a estes como argumentos que justificam as normas que criam para alcançar ditos objetivos e podem talvez se encontrar nas exposições de motivos que encabeçam algumas leis.
2.3 Princípios em sentido estrito (principles)
São modelos que estabelecem certas exigências da justiça, da equidade ou da moralidade objetiva; são próprios do Poder Judiciário no sentido de que se configuram como princípios que jogam um papel fundamental na tarefa de interpretação e de aplicação do direito.
2.4 Distinção entre princípios em sentido amplo (diretrizes políticas e princípios em sentido estrito) e normas
Ambas as categorias de princípios distinguem-se das normas fundamentalmente:
2.4.1 Pelo conteúdo
Os princípios têm um conteúdo intrinsecamente moral, as normas podem ter conteúdos diversos.
2.4.2 Pelos destinatários
Os destinatários das normas são os indivíduos em geral, os destinatários dos princípios são os encarregados de criar e de aplicar as normas.
2.4.3 Pelo modo de se resolver as contradições
Quando duas normas se contradizem, o conflito resolve-se declarando uma válida, segundo certas pautas, como lei superior prevalece sobre uma norma inferior, lei posterior prevalece obre lei anterior, ou lei especial prevalece sobre lei geral. Os conflitos entre princípios, em contrapartida, consideram-se como um conflito de valores que se resolve com um critério de “dimensão de peso” ou “balanço”, pelo qual se privilegia um princípio sem considerar o outro como inválido.
3. Espécies de normas jurídicas (Humberto Ávila)
O gênero normas jurídicas pode ser subdivido, segundo os ensinamentos de Humberto Ávila, de acordo com sua finalidade e estrutura em três grandes categorias: regras, princípios e postulados.
3.1 Regras
Expressam um padrão de comportamento esperado pelo ordenamento jurídico, ou seja, sua estrutura é determinada pela descrição imediata de uma conduta específica que deve ser operada pelo seu destinatário. Assim, indicam meios concretos (condutas) em torno à realização de determinados fins. Desta maneira, seu conteúdo é dotado de relevante grau de concreção, razão pela qual resulta mais fácil sua aplicação aos casos concretos e menor a necessidade de sua carga argumentativa, no âmbito da justificação, no que diz respeito à implementação de sua respectiva subsunção. Regras opostas, em princípio, se anulam no âmbito da validade, restando para ser aplicada somente uma a cada caso concreto.
3.2 Princípios
São a expressão jurídica dos valores, razão pela qual são normas que expressam fins a serem seguidos por determinadas condutas (regras). Neste sentido, sua estrutura não é composta pela descrição de uma conduta, mas sim por um bem ou uma finalidade a ser perseguida pelos seus respectivos destinatários. Desta feita, seu conteúdo é dotado de alto grau de abstração e de indeterminação, de maneira tal que se torna mais difícil sua aplicação e o ônus argumentativo no âmbito da justificação de sua incidência e de sua subsunção aos casos concretos. Princípios aparentemente opostos não se anulam, mas apenas um deles tem censurada sua incidência no âmbito da eficácia, diante de um caso concreto.
3.3 Postulados
São constituídos por métodos adequados de aplicação de regras e de princípios. Assim, os postulados indicam a forma e a conveniência da utilização de determinada regra ou determinado princípio, assim como indicam o procedimento necessário para o atendimento da carga argumentativa necessária à aplicação de uma norma jurídica, seja ela um princípio ou uma regra.
4. Classificação das normas jurídicas segundo diferentes critérios
As normas jurídicas podem ser classificadas atendendo a numerosos critérios.
4.1 Pelo âmbito espacial de sua validade
Este critério considera a porção de espaço na qual a norma jurídica é aplicada: (a) Normas jurídicas de direito interno: como as normas constitucionais, federais, estaduais e municipais; e (b) Normas jurídicas de direito externo: como os tratados internacionais.
4.2 Pelo âmbito temporal de sua validade
Este critério considera a determinação do tempo de vigência da norma jurídica:
4.2.1 Normas de vigência determinada
São aquelas cujo âmbito temporal de validade está pré-estabelecido.
4.2.2 Normas de vigência indeterminada
São aquelas que não têm fixado o tempo o qual irão reger, porém este sempre será determinável. Se, no mesmo texto, a lei, por exemplo, não estabelece o dia em que vai entrar em vigor, será partir dos noventa dias da data da publicação no Diário Oficial (Art. 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil) e até que seja revogada.
4.3 Pelo âmbito material de sua validade
Este critério considera a índole do conteúdo que a norma regula e parte da divisão do direito objetivo em ramos:
4.3.1 Normas de direito constitucional
São aquelas que, por sua vez, podem ser materiais ou meramente formais.
4.3.2 Normas de direito público
São aquelas que, por sua vez, podem ser administrativas, tributárias, econômicas, processuais, penais, etc.
4.3.3 Normas de direito privado
São aquelas que, por sua vez, podem ser cíveis, comerciais, relativas ao consumidor ou ao trabalhador, etc.
4.4 Pelo âmbito pessoal de sua validade
Este critério considera os destinatários, no sentido da determinação ou indeterminação do número de casos que regula seu enunciado.
4.4.1 Normais gerais
São as que regulam um número indeterminado de casos como as normas do Código Civil ou do Código Penal.
4.4.2 Normas individuais ou individualizadas
São as que regulam um número determinado de casos, como uma sentença, uma lei de expropriação de um imóvel, etc.
4.5 Por sua imperatividade
Considerando a possibilidade de disposição dos destinatários, podem ser:
4.5.1 Normas imperativas ou de ordem pública
São aquelas que não podem ser deixadas de lado por disposição dos destinatários; imperam independentemente da vontade das partes, como as normas que estabelecem as porções hereditárias, segundo o parentesco.
4.5.2 Normas supletivas ou dispositivas
São aquelas que deixam a possibilidade aos destinatários de dispor de forma diversa do que, por elas, é estabelecido, como ocorre com a maioria das normas que regulam os contratos. São supletivas porque suprem a vontade das partes, isto é, somente serão aplicadas quando as partes não tenham feito uma disposição contratual em outro sentido.
4.6 Por seu conteúdo normativo
No que diz respeito ao caráter da norma, em função de que algo deva, não deva ou se possa fazer, as normas podem ser obrigatórias, facultativas ou permissivas.
4.6.1 Normas obrigatórias
São as que dispõem a realização de um ato ou omissão.
4.6.2 Normas proibitivas
São as que negam ou proíbem a realização ou a omissão de um ato.
4.6.3 Normas permissivas
São as que simplesmente facultam a realização de um ato ou de uma omissão.
4.7 Por suas fontes
Por suas fontes, podem ser constitucionais, legais, consuetudinárias, jurisprudenciais e contratuais.
4.7.1 Normas constitucionais
São as que emanam da manifestação de uma Assembléia Nacional Constituinte (Constituição).
4.7.2 Normas legais
São as que emanam do Poder Legislativo (lei).
4.7.3 Normas consuetudinárias
São as provêem dos grupos que geram um costume jurídico.
4.7.4 Normas jurisprudenciais
São as que surgem das interpretações contidas nos pronunciamentos dos tribunais superiores, como o Supremo Tribunal Federal brasileiro, ou dos critérios uniformes emanados de sentenças de distintos tribunais sobre a mesma matéria.
4.7.5 Normas contratuais
São aquelas constituídas pelos particulares nos contratos, e que têm força de lei para os mesmos em virtude do princípio da autonomia da vontade e do princípio da obrigatoriedade dos contratos.
4.8 Pelos efeitos de sua violação
Em face das consequências que acarreta sua violação, as normas jurídicas podem ser normas perfeitas, normas plus quam perfcctaes, normas minus quam perfectaes e normas imperfeitas.
4.8.1 Normas perfeitas
São aquelas cujo descumprimento implica em uma sanção que consiste na nulidade do ato, sem a possibilidade do restabelecimento do estado de coisas anterior à violação da norma.
4.8.2 Normas plus quam perfectaes
São aquelas que ademais da nulidade do ato impõem ao infrator uma sanção.
4.8.3 Normas minus quam perfectaes
São aquelas cuja violação não impede que o ato produza seus efeitos, isto é, não se declara nulidade, porém estabelecem uma sanção para o infrator.
4.8.4 Normas imperfeitas
São aquelas que não estabelecem uma sanção para o caso que a norma seja descumprida.
5. A justiça, a validade e a eficácia das normas jurídicas
Como ensina Norberto Bobbio, a análise da norma jurídica apresenta três questões básicas mais relevantes: o problema de se a norma é justa ou injusta, o de se é válida ou inválida e o de determinar se é eficaz ou ineficaz.
5.1 A validade da norma jurídica
O problema da validade normativa consiste em estabelecer a existência da norma, enquanto tal como pertencente a um sistema jurídico positivo determinado, sendo preciso para a sua determinação a realização de uma série de investigações de caráter empírico-racionais. Par que a norma seja válida o deve ser tanto forma como materialmente.
Uma norma é formalmente válida, quando cumpriu com dois requisitos:
(1º) Foi editada pela autoridade que tinha a competência para isto; uma norma inválida, neste sentido, é, por exemplo, a sentença de um juiz sobre uma matéria que não é de sua competência, como no caso de um juiz penal que resolve uma questão civil.
(2º) Foi editada conforme os procedimentos estabelecidos nas normas constitucionais e infraconstitucionais; uma norma inválida, neste sentido, é, por exemplo, uma lei que não foi publicada oficialmente.
Assim, o requisito de validade formal consiste em que a norma jurídica emane de autoridade competente e que haja sido editada em conformidade com os procedimentos estabelecidos. Com a ausência de alguns deles, a norma será formalmente inválida, por tanto, inexistente.
Uma norma é materialmente válida, quando seu conteúdo não é contrário aos estabelecidos numa norma superior a ela. Isto é, para a validade material, requer-se que seu conteúdo não seja incompatível com o de uma norma hierarquicamente superior. Uma norma inválida, neste sentido, seria, por exemplo, se o Poder Legislativo sanciona uma norma penal que estabeleça que um determinado delito será reprimido com a pena de tortura. Estar-se-ia em presença de uma norma sem validade, enquanto seu conteúdo é contrário ao disposto em disposição constitucional, que consagra direito fundamental de vedação às penas de tortura e de tratamento degradante.
Logo, para que uma norma seja válida, é preciso que tenha sido editada por autoridade competente, conforme os procedimentos estabelecidos e que seu conteúdo não seja incompatível com o de uma norma hierarquicamente superior.
5.2 A eficácia da norma jurídica
Uma norma é eficaz quando é cumprida por seus destinatários e quando, em caso de que venha a ser violada, as autoridades competentes imponham as sanções contidas nela para tal finalidade.
Portanto, é preciso que se cumpram ambos os requisitos, que seja geralmente observada pelas pessoas a quem se dirigem e que, no caso de inobservâncias, sejam aplicadas pelos órgãos competentes.
Para determinar a eficácia é necessário efetuar uma observação do comportamento efetivo, tanto dos indivíduos, cuja conduta a norma regula, como dos órgãos que têm a função específica de aplicar o direito. Analisar o comportamento destes sujeitos frente à norma é uma indagação que corresponde à Sociologia Jurídica.
5.3 A justiça da norma jurídica
Como ressalta Norberto Bobbio, o problema da justiça de uma norma jurídica é o da correspondência ou não dela com os valores superiores ou finais que inspiram uma determinada ordem jurídica. Esta indagação implica perguntar-se, então, se a norma é apta ou não para realizar aqueles valores.
É esta uma questão muito complexa, porém, em geral, diz-se que preocupa mais ao iusfilósofo ou filósofo do direito, quem buscará a correspondência da norma com os princípios de justiça contidos no Direito Natural (iusnaturalistas) ou com os valores ou princípios da moralidade social ou os do próprio sistema jurídico (iuspositivistas). A norma será justa na medida em que guarde coerência com estes princípios.
5.4 Independência dos três critérios
As três indagações dão origem a três problemas independentes entre si, no sentido de que validade, eficácia e justiça são perspectivas distintas a partir de onde se pode valorar uma determinada norma jurídica, pelo qual é possível, por exemplo, que se apresentem casos nos quais uma norma inicialmente válida e justa não alcance eficácia na comunidade jurídica ao qual está destinada.
Diante disso, Hans Kelsen vinculou estreitamente validade e eficácia normativa, considerando esta última como uma condição da primeira. Ao ser editada a norma alcança imediatamente validade, porém o transcurso do tempo deverá permitir verificar sua convalidação nos fatos de modo a poder também predicar sua eficácia, isto é, se efetivamente é observada pelos sujeitos aos quais se dirige ou se, caso contrário, os órgãos encarregados procedem a sua aplicação, impondo, eventualmente, a sanção estabelecida. A eficácia funciona, em consequência, como uma condição necessária para conservar a validade.
Obviamente, o ideal será a norma válida, eficaz e justa, porém, na experiência jurídica, apresentam-se situações como as consignadas cuja necessária solução formula problemas àqueles que operam com o direito.
Comentários e Opiniões
1) Lucas (26/11/2012 às 15:01:43) Em primeiro lugar, parabéns ao Faustino pelo artigo, ficou muito bom, mas no 4.2.2 não seriam após 45 dias? e não seria o artigo 1º do LICC e não o 3º? Att, Lucas. | |
2) Antonio (14/06/2013 às 18:14:37) muito bem elaborado.. | |
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