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As relações de poder no direito


Autoria:

Éverton Torres


Estudante cursando o 10º Semestre do Curso de Direito no Centro Universitário Jorge Amado em Salvador (BA), aprovado no Exame de Ordem 2010.1

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Resumo:

Este artigo explicita uma discussão sobre a relação entre o direito e o poder de forma crítica fundamentado em diversos autores, teóricos e críticos.

Texto enviado ao JurisWay em 28/09/2010.

Última edição/atualização em 29/09/2010.



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1. Introdução

 

O objetivo deste trabalho é fazer uma reflexão crítica sobre as relações de poder no direito procurando destacar a relação entre o poder e o direito no âmbito das relações jurídicas, enfatizando como o poder influencia no campo destas relações. A preocupação da temática surgiu a partir da leitura dos livros; Teoria Geral do Direito de Francesco Carnelutti, O Que é Poder de Gerard Lebrun, A Essência da Constituição de Ferdinand Lassalle, e a Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva, de Max Weber.

 

É imprescindível fazer uma discussão mediante a evidente força do poder nas relações jurídicas, torna-se necessário problematizar esse tema, embarcando em tórias de diversos pensadores de diversas épocas, procurando embasar e esclarecer como se forma as estruturas do Estado, poder e direito. Perante essas discussões pergunta-se: Até aonde se limita à força do poder nas relações jurídicas? ; O que são as relações jurídicas? ; Em que se constitui o poder?

 

2. As Bases das Relações de Poder.

 

Segundo Talcott Parsons (1979) em seu livro Política e Sociedade, o poder reside na capacidade de assegurar a “real” obrigatoriedade dos compromissos, e assim se necessário, sua execução pode ser garantida por sanções negativas. Tanto que ele afirma em seu livro que:

 

“O poder é a capacidade generalizada de garantir a execução de compromissos obrigatórios assumidos por unidades de um sistema de organização coletiva, quando as obrigações são legitimadas com respeito à sua relação com as metas coletivas e quando existe recalcitrância, existe a garantia de cumprimento através de sanções situacionais negativas”. (p.24).

 

Weber (1991) acrescenta que o poder não surge de um contrato, se assemelhando a Parsonns afirmando que; “Poder significa toda probabilidade de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa probabilidade”.(Weber, 1991 p.33). Outra idéia de Weber que será citada mais adiante é a sua teoria da “Dominação”.

 

Entretanto Carnelutti em seu livro; Teoria Geral do Direito contrapõe Weber e Parsonns afirmando que o poder é “A relação psicológica estabelecida pelo comando entre dois sujeitos de interesses opostos,...” (1999 p. 264). Percebe-se que conceituar poder é uma tarefa árdua e muito subjetiva, suas características divergem de autor para autor, entretanto, é perceptível que o poder só existe com a relação de no mínimo duas pessoas, o poder nunca existiu e nunca existirá fundamentado em uma única pessoa, ou seja, não existe em uma relação unipessoal. Portanto percebe-se que o poder é consubstanciado na coletividade, na vontade de mais de uma pessoa. Então a capacidade de obrigar, convencer, persuadir, ou até mesmo de intimidar alguém a fazer algo é a característica básica do poder. Entretanto pergunta-se; Para que serve o poder? ; Quem é o titular dele? ; De onde ele surge?

 

Além de falar de poder, é necessário introduzir como o poder é a essência do Estado e do direito, e explicar como e porque se constitui o Estado. Kant (1998) explica de forma maestral como é constituído tal Estado;

 

 Ordenar de tal forma uma multidão de seres razoáveis, que desejam, todos, leis gerais para sua conservação, mas cada um dos quais está propenso a isentar-se delas em segredo, e dar-lhes uma constituição tal que, apesar do antagonismo erguido entre eles por suas inclinações passionais, eles constituam obstáculo uns aos outros, de modo que, na vida pública, seu comportamento seja como se estas más disposições não existissem.  (p. 38).

 

A partir desta idéia de Kant torna-se necessário politizar o homem para inseri-lo num domínio cujos fins são a paz e a segurança, fins estes, que não seriam alcançados pelo homem em seu estado natural. Acerca deste tema (estado natural) são necessários citar Hobbes, e seus estudos sobre a teoria do Estado Absoluto, e John Locke e sua doutrina do Estado Liberal.

 

A sua egressão do homem do estado natural (tema abordado por Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau), e a formação das sociedades, percebe-se a necessidade de organizar, e estruturar a sociedade de maneira sistematica que respeitasse os interesses coletivos. Hobbes acreditava que o homem em seu estado natural era o seu próprio “lobo”, e que suas garantias de vida diminuiriam sem a presença de alguém que o defendesse desse notável perigo, portanto seria necessário agrupar esses homens e criar uma sociedade forte e absoluta que criasse a segurança necessária para as pessoas viverem. Diante desta necessidade surge a idéia de Estado Absoluto criado por Hobbes, ou seja, o grande Leviatã. Este estado existiria para defender os homens e para organizar a sociedade na mão de uma única pessoa, o soberano. O soberano é único que tem um poder irresistível, capaz de ordenar e unir os pensamentos e o caráter dos indivíduos, e de mudar o antagonismo e a concorrência em solidariedade. Isto, somente ocorre pelo fato do Estado estar instituído, pois, o homem em seu estado natural jamais conseguiria agir de tal maneira.

 

Para John Locke, um inglês que visando os interesses da burguesia, que precisava se desligar do poder absoluto do soberano na época do Antigo Regime, no qual o soberano possuía controle de tudo e de todos, explicava que o homem abandonava dois poderes que dispunha no estado de natureza para atingir a segurança da propriedade; de fazer tudo que lhe era conveniente, e de punir as infrações cometidas contra a lei natural. Sua teoria se consubstancia nessas duas renuncias, para abordar que o principal fim da criação do contrato social é a conservação da propriedade privada, acreditando que o poder supremo não tem autoridade para violar a propriedade alheia, e que é um absurdo o soberano tomar arbitrariamente os bens dos súditos. Portanto o autor Gérard Lebrun (1999) que explica:

 

“Locke não mais considera o poder como o núcleo político do social: trata-se, simplesmente, de uma instancia que exerce uma função social determinada. E o que se deve temer, acima de tudo, é que o poder ultrapasse esta função, e que os súditos fiquem privados de recurso contra ele. Está, portanto, no abuso de poder o maior risco de ruína para o corpo político”. (p. 62).

 

Portanto John Locke (2001) acreditava que o poder absoluto do soberano era demasiado forte que tornaria o homem mais inseguro que no Estado Natural, tanto, que escreveu em sua obra; O Segundo Tratado do Governo Civil:

 

“O indivíduo exposto ao poder arbitrário de um único homem que tem cem mil sob suas ordens encontra-se em uma situação muito pior que aquele exposto ao poder arbitrário de cem mil homens isolados [...] Por isso, seja qual for a forma de comunidade civil a que se submetam, o poder que comanda deve governar por leis declaradas e aceitas, e não por ordens extemporâneas e resoluções imprecisas.(...) Pois todo o poder que o governo detém, visando apenas o bem da sociedade, não deve seguir o arbitrário ou a sua vontade, mas leis estabelecidas e promulgadas;...”(p.165)

 

O autor de o Segundo Tratado do Governo Civil está apresentando o ideário da liberdade em contraponto à visão totalitária do poder. Uma crítica visível à teoria Hobbesiana de poder.

 

As duas teorias explicitadas no texto demonstram que mesmo divergentes remontam uma necessidade de criação de um estado que vise a defesa do homem, de seus bens, da propriedade privada e de sua família. Hobbes defende a teoria do Estado Absoluto que acredita na força soberana, inalienável, absoluto e forte. Locke defendia a formação do Estado Liberal, estado esse que respeitaria a propriedade privada, e não utilizaria a força soberana do Estado para defender os interesses do soberano.

 

Esse estado se prende a uma ambição de constituir uma sociedade que seja conduzida por leis invioláveis.  Perante essa apreensão é que surge o direito positivado, que é a ferramenta mestra para organização do Estado. Todos os conflitos explícitos na sociedade precisariam ser resolvidos de forma justa, e o Estado é quem regula essa desordem, criando leis visando essa adequação, para que exista segurança jurídica e social, de todos aqueles que formam a sociedade.

 

Fichte (1994), filosofo clássico alemão, em sua obra: “Fundamentação do Direito Natural” acreditava que a força e a fraqueza da lei é de impor a cada um de limitar a própria liberdade de agir sobre o mundo externo de tal modo que não se interfira a liberdade alheia: ”Eu devo reconhecer, em todos os casos, o ser livre fora de mim como um ser livre, isto é, devo limitar minha liberdade mediante o conceito de possibilidade da liberdade do outro” (p.47) teoria visivelmente semelhante da de Kant, sobre a invasão da liberdade alheia. Essa seria a idéia de relação jurídica para Fichte

 

Fichte acrescenta mais, afirmando que não é possível a instauração de uma relação jurídica no Estado Natural, pois neste estado existiria uma condição de insegurança recíproca, porque os contratos feitos não seriam respeitados e não existiria uma força para obrigar o cumprimento do contrato. Então seria necessária a constituição de diversos contratos; “Contrato de União”, “Contrato de Cidadania”, Contrato de Propriedade”, “Contrato de Proteção” e finalmente “O Contrato Social” que legitimaria a força coativa do Estado que se formaria, sendo que  este Estado não se separaria da população, o Estado seria a representação do povo.

 

Um autor que não se pode faltar ao falar do tema das “Relações de poder no Direito” é Max Weber. Na sua vasta obra tem que se abranger o tema “Dominação” (probabilidade de encontrar obediência em um determinado mandato). Entretanto em sua teoria o Poder e Dominação se distinguem. A primeira é a probabilidade de impor a própria vontade independente de qualquer resistência. O conceito de poder em Weber está relacionado com o que é imanente nas relações sociais. Isto já é encontrado em Nietzsche (Genealogia da Moral), o poder é intrínseco às relações sociais. Já as três formas existentes de Dominação estão pautadas pelo conceito de dominação legítima, seja pela burocracia, pela tradição ou pelo carisma. Weber destaca esses três tipos de dominação legitima.

 

A dominação legal é baseada na racionalidade, sendo que a sua idéia básica é: “qualquer direito pode ser criado e modificado mediante um estatuto sancionado corretamente quanto à forma” (Cohn. 2002. p.128). Seu tipo ideal é a burocracia. Essa dominação é baseada na dominação pela regra, pela lei instituída. Os dominados obedecem ao direito de mando do superior (do dominante), neste tipo de dominação não se obedece à pessoa. Weber (1991) destacava que a dominação legal é

 

“Baseada na crença na legitimidade das ordens estatuídas e do direito de mando daqueles que, em virtude dessas ordens, estão nomeados para exercer a dominação [...] obedece-se à ordem impessoal, objetiva e legalmente estatuída e aos superiores por ela determinados, em virtude da legalidade formal de suas disposições e dentro do âmbito de vigência destas” (p.141).

 

Neste tipo de dominação, os dominados possuem especializações e graduações necessárias para complementar os cargos à escolha do chefe, que escolhe as pessoas, não por motivos pessoais ou por mera vontade e sim pela capacidade dos dominados de ocupar aquele cargo. Portanto a obediência esta graduada numa hierarquia de cargos que visa a subordinação dos inferiores aos superiores. Gabriel Cohn em seu livro sobre a análise do trabalho de Weber acrescenta mais, ele exemplifica afirmando que a estrutura moderna do Estado, Município, de uma empresa capitalista e das associações políticas correspondem a esse tipo de dominação. A burocracia constitui o tipo mais puro da dominação legal, apesar de nem toda dominação ser exclusivamente burocrática, pois nenhuma é exercida completamente por funcionários contratados, como por exemplo, os grandes monarcas, ou os cargos mais altos das associações políticas. Por isso para que esse tipo de dominação seja exercido, é decisivo que o trabalho seja predominantemente burocrático. Esse tipo de dominação está em ascensão em todas as partes devido ao desenvolvimento do capitalismo. Portanto o direito é criado por uma ordem sistêmica, fundamentado nas regras, leis e burocracia.

 

A dominação tradicional é baseada no poder senhorial, sendo que a sua idéia básica é a fidelidade, pois obedece-se à pessoa pela dignidade própria, pela tradição. Seu tipo ideal é a dominação patriarcal. Neste tipo de dominação é impossível criar um novo direito, pois a tradição seria mais forte que esse novo direito. As normas e leis são baseadas na vontade do senhor, que “age conforme seu prazer, sua simpatia ou antipatia e de acordo com pontos de vista puramente pessoais”.(Cohn. 2002. p.131). Weber (1991) classifica essa dominação da seguinte forma:

 

 “Baseada na crença cotidiana na santidade das tradições vigentes desde sempre e na legitimidade daqueles que, em virtude dessas tradições representam a autoridade [...] obedece-se à pessoa do senhor, nomeada pela tradição e vinculada a ela (dentro do âmbito da vigência dela), em virtude de devoção aos hábitos costumeiros” (p.141).

 

Weber destaca que no quadro administrativo deste tipo de dominação, os dominados são parentes, amigos ou pessoas que estejam ligados por um vinculo de fidelidade com o senhor. Neste tipo de dominação não existe o conceito burocrático de dominação: a “competência”. Existem dois tipos de estruturas características neste quadro administrativo: a estrutura puramente patriarcal de administração e a estrutura estamental. Na estrutura patriarcal de administração, os servidores são completamente dependentes do senhor, como os escravos, servos, plebeus e etc. o quadro administrativo é completamente dependente dele, e não existe nenhuma garantia contra o seu arbítrio. Já na estrutura estamental os servidores não são pessoalmente do senhor, as pessoas são independentes, e a estrutura estamental é totalmente autônoma e autocéfala, pois exerce-se por conta própria e não pelo senhor. Portanto a estrutura hierárquica é ferida pelo privilégio. Portanto o direito é criado por uma ordem patriarcal, fundamentado nas relações pessoais do senhor com os servos, ou na relação de amizade que os dominantes tem com vassalos e etc.

 

E finalmente Weber teoriza a dominação carismática. Esta tem a virtude de devoção afetiva e seu carisma. A dominação se da pela adoração, pode ser por: “faculdades mágicas, revelações ou heroísmo, poder intelectual ou de oratória”.(Cohn. 2002. p.134). A fonte desta devoção pessoal é a emoção. Seus tipos idéias puros são as dominações do profeta, do herói guerreiro e do grande demagogo. A obediência se deve pelas qualidades excepcionais do líder. Weber acreditava que essa dominação é:

 

“Baseada na veneração extracotidiana da santidade, do poder heróico ou do caráter exemplar de uma pessoa e das ordens por esta reveladas ou criadas [...] obedece-se ao líder carismaticamente qualificado como tal, em virtude de confiança pessoal em revelação, heroísmo ou exemplaridade dentro do âmbito da crença nesse seu carisma” (p.141).

 

O quadro administrativo é escolhido pelo carisma e vocações pessoais, e não devido a qualificações pessoais, privilégio, grau de parentesco ou fidelidade e posição. A administração não é exercida por regras, ela é irracional. As decisões tomadas pelo dominador decorrem mediante uma nova criação, baseada na revolução do direito natural. A dominação carismática apresenta-se na forma pessoal de um profeta, um príncipe guerreiro que com seu carisma e suas virtudes excepcionais, são vangloriados pela fé de seus súditos que crêem cegamente nos dominadores. Portanto o direito é criado por uma divina, ou sobre-humana, fundamentado nas virtudes, características peculiares, carisma ou até mesmo profecias.

 

Portanto, percebe-se que as relações de poder são a base de toda a estrutura do Direito positivo, ou seja, a essência do poder precede o Direito. O poder é a essência principal do direito e das relações jurídicas. É perceptível esta relação na teoria geral do direito civil, que explica que as relações jurídicas possuem dois pólos; o ativo e o passivo, na qual essa relação gere uma criação de direitos e deveres para ambos os pólos, e a garantia de eficácia desses direitos e deveres se deve ao Estado.

 

3. As Relações de Poder no Direito

 

No parágrafo único do Art.1° da Constituição da República federativa do Brasil de 1988; “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Ou seja, segundo a Constituição brasileira quem legitima o poder normativo é o povo, a população que elege representantes para consentir a estrutura jurídica brasileira. Portanto, mesmo com a existência da democracia indireta, prevista por Sieyès, que acredita que a representação seja a melhor defesa da democracia, o povo foi, é, e sempre será a força da Constituição.

 

Ferdinand Lassalle (1998), em seu livro a Essência da Constituição, evidencia, a partir de sua teoria, a existência de dois tipos de Constituição: a real e a escrita. A partir desse fato, o autor defende, que a Constituição real seria pautada nos fatores reais de poder, que consubstanciam as realidades de cada sociedade, e a Constituição escrita seria nada mais que, uma mera folha de papel, que reúne todos os fatores reais do poder, compondo-os em instituições jurídicas. Ou seja, a constituição para Lassalle, seria a força política dos Monarcas e aristocratas, a força econômica dos banqueiros e grandes burgueses, a força social dos pequenos burgueses, camponeses, operários e desempregados e a força física do Exercito. Todos esses fatores reais de poder formam a verdadeira Constituição, sendo que esta visa os interesses de todos, e que mesmo sem uma Constituição escrita a força constitucional irá continuar existindo. Essa força constitucional irá formar as normas e instituições jurídicas a partir de seus interesses.

 

Entretanto, o autor Konrad Hesse (1991), que titulariza sua teoria na obra; “A Força Normativa da Constituição” defendia que a “folha de papel” criticada por Lassalle teria sim a característica de impor tarefas, ordenar e conformar a realidade política e social, e afirma mais: se a teoria lassalliana fosse completamente verídica, as relações jurídicas não existiriam e somente existiriam relações de poder. Todavia ele acredita que fatores políticos, históricos e sociais formam também a estrutura da força normativa da Constituição, sendo que esta possuiria vontades próprias, acreditando que não exista somente uma vontade de poder, mas também uma vontade de Constituição. A partir da idéia de que as relações de poder seria mais fortes que a força normativa da constituição, Hesse acreditava que a teoria de Lassalle desmerecia a Constituição e que a Constituição Real iria substituir a Constituição jurídica e sustentação do poder jurídico existiria em prol dos dominadores. Portanto Hesse acreditava que o poder deveria ser traduzido em norma e que todos deveriam respeitar essa normatividade, pois esse poder tornaria a Constituição normativa legitima.

 

Ao fazer uma critica ao pensamento de Ferdinand Lassalle, o que ele chama de fatores reais de poder é chamado por Paulo Bonavides de Poder constituinte. Poder esse que sempre existiu, continua existindo e sempre existirá. Paulo Bonavides (2001) acredita que a massa, a população, aqueles que o Estado representa, ou seja, a organização sistemática dessa sociedade é o poder constituinte;

 

“Poder constituinte sempre houve, porque jamais se deixou de haver o ato de organização de uma sociedade estabelecendo os fundamentos de sua própria organização. O que nem sempre houve, porem, foi uma teoria desse poder,...”. (p.121)

 

Portanto o poder constituinte é um meio instrumental de se estabelecer a Constituição, a forma de estado e a estrutura de organização da sociedade política. Esse conceito é puramente político, pois não se apreende a questões jurídicas, como Bonavides chama: “extrajuridico”. Esse conceito só existe nos casos de poder constituinte originário.

 

O austríaco Hans Kelsen (2000), normativista, acreditava que a norma jurídica deveria ter um principio legal que deveria coagir as pessoas. Essa fundamentação é necessária, pois as pessoas sentiriam-se intimidadas ao infringir as normas. No seu livro “Teoria Pura do Direito”, o Direito é baseado no principio da imputabilidade, afirmando que as normas jurídicas deveriam ter o seguinte conteúdo: “Dada a não prestação, deve ser sanção”, ou seja, ele acreditava que se a norma possuísse um conteúdo coercivo, as normas seriam excepcionalmente eficazes. Ele acreditava que a positivação das normas, pautada no principio da imputabilidade, dariam maior segurança jurídica e legitimidade, portanto todos os atos aprovados pelo Estado e pela população de forma legítima, eram legais. Muitos sistemas totalitários se estabeleceram pelo planeta, baseando-se nesta teoria, inclusive o nazismo que emergiu pelo sucesso do partido nazista, que chegou ao comando da Alemanha.

 

4. Considerações finais

 

Fazendo uma analise critica do normativismo, pode-se perceber que as relações jurídicas se dão como uma relação de obrigação, uma relação fundamentada no dever ser, pois o direito por ser uma ciência social deve ser aprofundado no principio da imputabilidade previsto por Kelsen. Em qualquer relação jurídica existe uma relação de poder, por exemplo, compra e venda, a indenização, o contrato e etc. Pois cada exemplo desse intensifica essa relação na medida em que na relação de compra e venda, o comprador deve pagar o vendedor e este deve dar o que foi comprado ao comprador, assim como na indenização, o indenizado deve receber a indenização da outra parte, e no contrato, ambos os pólos tem que cumprir a sua parte no contrato. Então percebe-se que as relações de poder se encontram nos dois pólos da relação jurídica, na qual o não cumprimento de um dever, acarreta relações de poder negativas que obriguem a parte não comprometida a ser sancionado por um poder superior que segundo Hobbes é o Estado, que tem o poder consentido de dar a segurança jurídica e a obrigação de dar cumprimento ao fato, ou por um poder natural, que segundo Fichte as pessoas poderiam fazer justiça com as próprias mãos mesmo que não existisse seguridade.  Portanto como já foi frisado antes o direito precede o poder, ou seja, para que se cumpra o Direito é necessário se ter o poder para fomentar tal fato.

 

A partir de uma análise critica percebe-se que as características formais do direito sempre foram embasadas nas relações de poder. Portanto nas sociedades mais complexas às mais simples, os dominantes sempre detiveram o poder e por conseqüência o Direito. E a positivação deste direito dogmatiza as condutas pessoais e as relações sociais, consubstanciando uma visão estreita do direito, na qual as características deste direito, são extremamente totalitárias. Portanto, partindo do pressuposto, de que cada sociedade dentro de um sistema estatal possui características suas, peculiares, que o direito estatal não prevê, e não enxerga essa força cultural, se estabelece uma relação de opressão a aqueles que não conseguem se encaixar nesta perspectiva. Portanto o poder não se situa somente nas relações jurídicas de obrigação, dever ser, em relações contratuais ou como teoria do poder constituinte, mas sim em um âmbito geral, que engloba o direito como uma força poderosa que manuseada pelos dominantes, pode oprimir, reduzir, ou extinguir sociedades, devida a essa sua característica.

 

5. Bibliografia

 

WEBER, M. - Economia e Sociedade: Fundamentos da Sociologia Compreensiva, vol. 1. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991

 

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

 

PARSONNS, Talcott. Política e Sociedade: Editora Nacional, 1979.

 

FICHTE, Johann. Fundamentação do Direito Natural. São Paulo: Editora Nacional,1994.

 

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Ed.11. Editora Malheiros, 2001

 

LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo civil: ensaio sobre a origem, os limites e os fins verdadeiros do governo civil. Petrópolis: Ed.3. Editora Vozes, 2001

 

HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes – Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991.

 

LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição – Rio de Janeiro: Ed.4, Lumen Juris, 1998.

KANT, Immanuel. Sobre la paz perpetua. Madrid: Ed.6. Editora Tecnos, 1998.

 

LEBRUN, Gérard. O Que é Poder. São Paulo. Ed.14. Editora Brasiliense, 1995.

 

CARNELUTTI, Francesco. Teoria Geral do Direito. São Paulo. Editora Lejus, 1999.

 

COHN, Gabriel. Max Weber. São Paulo. Editora Ática. 2002

 

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
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