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A Aplicação da Teoria do Elo no Enfrentamento à Violência Doméstica


Autoria:

Isabella Godoy Danesi


Advogada OAB/PR 94.604, Especialista em direito penal e processual penal pela Universidade Estadual de Ponta Grossa/PR.

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Resumo:

Pretende-se discutir a possibilidade e o resultado da aplicação da teoria do elo no enfrentamento à violência doméstica com a pretensão de indicar que atender ocorrências de maus tratos aos animais pode servir como ação de prevenção a outros crimes.

Texto enviado ao JurisWay em 12/11/2020.



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Resumo: Pretende-se discutir com o presente trabalho a possibilidade e o resultado da aplicação da teoria do elo no enfrentamento à violência doméstica com a pretensão de indicar que atender ocorrências de maus tratos aos animais pode servir como ação de prevenção a outros crimes. Assim, visa revelar que com a implementação de projetos restaurativos tratando principalmente os agressores e as vítimas indiretas destes crimes os índices de reincidência diminuem e o egresso é recuperado, propiciando o fim ao ciclo de violência.

O método utilizado para elaboração do presente trabalho foi o dedutivo. A metodologia adotada foi dividida em duas partes sendo em um primeiro momento a pesquisa bibliográfica, legislativa e documental, e posteriormente a análise dos dados apresentados na dissertação de mestrado do Capitão da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Marcelo Robis Francisco Nassaro, que identificou nas ocorrências policiais a conexão dos maus tratos aos animais e a violência contra as pessoas.

A conclusão que se chegou com o presente trabalho é que o tema possui extrema relevância para a sociedade e sua pesquisa deve prosseguir uma vez que é um assunto pouco difundido no Brasil e pode trazer grandes avanços contra a criminalidade.

Palavras-chave: Criminologia, vitimologia, justiça restaurativa.


Introdução


O presente trabalho visa abordar aspectos jurídicos e criminológicos dos crimes cometidos no âmbito doméstico contra pessoas e animais. Assim, analisando suas peculiaridades e semelhanças é possível identificar uma conexão entre eles.

Esta conexão foi denominada a teoria do link aqui no Brasil chamada de a teoria do elo e teve como precursor o FBI (Federal Bureau of Investigation) que identificou que pessoas que tinham histórico de crueldade animal ao mesmo tempo possuíam históricos de cometimento de outros delitos e por isto incluíram a crueldade animal como um comportamento alerta.

Baseado nestas constatações conforme citado pelo mestre Francisco Robis (2013, p.14) o pesquisador Phil Arkow descreveu que o Link e o ciclo da violência é um adulto que abusa de uma criança ou um animal como resultado de ter testemunhado um abuso ou ter sido vítima de abuso infantil ele mesmo. Ademais, afirma que a violência doméstica, abuso infantil e crueldade animal estão intimamente ligados uns aos outros.

Fundamentos que são concretizados em análise dos dados e estatísticas fornecidos por diversos pesquisadores e psicólogos pelo mundo bem como pelos dados apresentados por Marcelo Robis Francisco Nassar pela análise realizada em fichas criminais de pessoas autuadas pela Polícia Militar do Estado de São Paulo nos anos de 2010, 2011 e 2012.

Oportunidade em que foi possível verificar que as pessoas que cometeram crimes de maus tratos contra os animais também cometeram outros crimes, especialmente os violentos contra as pessoas.

O que demonstra a relevância do tema, uma vez que geralmente estes atos violentos são comportamentos aprendidos e reproduzidos.

Por isto, faz-se primordial identificar, atender e responsabilizar os agentes destes crimes, proporcionando para os mesmos a oportunidade de refletirem sobre os seus comportamentos e desta forma se recuperarem e se ressocializarem, diminuindo a reincidência e prevenindo novos crimes.

Sem esquecer também da importância do reconhecimento das vítimas diretas e indiretas destes tipos de violências para que se possa fornecer o tratamento adequado para que elas se curem das sequelas deixadas e não perpetuem o ciclo da violência.


Objetivos

Verificar o resultado da aplicação da teoria do elo no enfrentamento à violência doméstica.

Averiguar se de fato com a implementação de projetos restaurativos tratando principalmente os agressores e as vítimas indiretas destes tipos de violências os índices de reincidência diminuíram e seria possível encerrar ciclo de violência, com a prevenção de futuros crimes.

 

Método e Técnicas de Pesquisa

O método utilizado para elaboração do presente trabalho foi o dedutivo. A metodologia adotada foi dividida em duas partes, sendo em um primeiro momento a pesquisa bibliográfica e documental, e posteriormente a análise dos dados presentes na dissertação de mestrado do Capitão da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Marcelo Robis Francisco Nassaro.

 

Resultados

Conclui-se então que os maus tratos aos animais não surgem isoladamente, sendo a violência contra o animal reconhecida como um sinal de problemas no ambiente familiar inclusive servindo como alerta de ocorrência de violência doméstica.

O crime de maus tratos aos animais está tipificado no Artigo 32 da Lei 9.605/1998 (BRASIL, 1998). Já os atos violentos no âmbito doméstico estão descritos no artigo 5º da lei 11.304/2006 (BRASIL, 2006).
No entanto, apesar destas leis terem sido criadas em momentos muito distintos e serem visivelmente diversas, escondem minuciosas semelhanças.

Ambas as formas de violências descritas atingem o elo mais fraco, os considerados pelo Direito Penal como vulneráveis, são eles: os animais, crianças, adolescentes, mulheres e idosos.

E por esta razão, ocorrências desta natureza revelam agressores doentes que muitas vezes ao cometerem os referidos crimes estão reproduzindo comportamentos aprendidos na infância principalmente dentro do âmbito familiar.

Porquanto conforme a respeitável psicóloga Zusana Nardi (BENETTI, 2012) a origem dos comportamentos violentos foi associada a vivências abusivas durante a infância. O que se leva a crer que homens violentos foram testemunhas de violência, seja contra os animais ou entre os seus pais, familiares ou até mesmo foram vítimas diretas de agressão quando criança o que se nota que crianças expostas a estas situações possuem uma maior probabilidade de se identificarem com o agressor, reproduzindo assim os comportamentos violentos aprendidos.

Neste mesmo sentido conforme citado pelo autor Nassaro (2013, p.15) o texto publicado no site elêtronico da ONG PET-abuse.com, confirma a compatibilidade de perfil entre pessoas que praticam violência doméstica e maus tratos aos animais, vejamos:

Muitos estudos em psicologia, sociologia e criminologia, durante os últimos 25 anos têm demonstrado que criminosos frequentemente tem históricos de maus tratos aos animais durante sua infância e adolescencia. Pesquisas tem demonstraado padrões consistentes de maus tratos aos animais com formas de violência mais comuns, incluindo abuso infantil, abuso de companheiro e de pessoas idosas. De fato a Associação de Psicologia Americana considera os maus trato aos animais com um dos critérios de transtorno de conduta.

Entretanto, conforme citado pelo autor (NASSARO,2013) foram os pesquisadores Phil Arkow e Frank R. Ascione que em suas pesquisas cientificas perceberam com exatidão que os casos de violência as pessoas normalmente envolviam maus tratos aos animais e vice-versa.

Ademais, para ilustrar e explicar esta conexão o FBI (Federal Bureau of Investigation) desenvolveu A teoria do Link aqui no Brasil conhecida como a teoria do elo. Pois, haviam constatado em suas investigações criminais que 80% dos assassinos começaram torturando animais e que a maioria absoluta os psicopatas conhecidos como seriais killers iniciaram seus crimes matando animais.

Por estas razões concluíram que se fosse possível rastrear as pessoas cruéis com os animais seria possível identificar possíveis assassinos e evitar futuros crimes.

Estes dados revelaram que na maior parte das vezes o agente dos maus tratos aos animais apresenta traços mais elevados de violência e insensibilidade.

Além do mais muitas vezes estes agentes já praticaram outros crimes de motivaçõs diversas e apresentam registros criminais anteriores, destacando-se crimes de lesão corporal, receptação, porte ilegal de arma, tráfico de entorpecentes, roubo entre outros.

Já a violência doméstica apesar de ocorrer de diversas maneiras, é certo que o autor desse crime é motivado pela necessidade de manter o controle de toda a família e uma das formas, muito frequente é utilizar o animal como ferramenta de coerção já que há uma relação muito próxima de afetividade entre esse animais e seus entes familiares (NASSARO, 2013 p. 42). Nas pesquisas citadas pelo autor Francisco Robis (2013 p. 41) onde há crueldade animal há abuso infantil e vice-versa: Foram encontrados animais abusados em 88 porcento dos lares de 57 famílias com animais de estimação onde crianças eram abusadas psicologicamente.

No mesmo sentido a psicóloga Maria José Sales Padilha (MPSP, 2017) em suas pesquisas realizadas com as vítimas de violência doméstica chegou em dados de que das 453 mulheres entrevistadas que buscaram atendimento na Delegacia da Mulher e registraram boletim de ocorrência, metade declarou que seus agressores já haviam sido violentos com animais.

Portanto, importante ressaltar que estes tipos de violências possuem uma maior peculiaridade que as demais uma vez que resultam também em sequelas para as crianças e adolescentes que assistem os atos violentos, chamadas de vítimas indiretas destes crimes.

Porque estas tendem a assimilar aqueles comportamentos presenciados como algo normal, comum e as vezes até engraçado ou divertido. Pois, sabe-se que as crianças veem em seus pais e entes queridos um exemplo a ser seguido e tendem a reproduzir as mesmas condutas violentas. Por isto que quando adultos podem vir a transmitir os traços violentos e padrões para seus filhos, concretizando e perpetuando o ciclo violência.


Discussão

Tendo em vista que conforme o exposto a teoria do elo se presta para demonstrar e ilustrar a conexão entre a violência contra os animais e a violência contra as pessoas tendo em vista que comportamentos violentos estão intimamente ligados ao eu destes agentes. Porque conforme a teoria da associação diferencial de Sutherland (SUTHERLAND, 1950) estas práticas são aprendidas uma vez que o comportamento criminoso é resultado de um aprendizado por parte do indivíduo sobre a conduta criminosa, através da assimilação.

Mas importante ressaltar também que não basta apenas identificar esta conexão é preciso que quando observada seja possível apresentar resultados para o mundo prático.

Portanto, a aplicação da teoria do elo em casos de violência seja contra animais ou contra as pessoas realiza a também uma função preventiva de novos crimes seja na forma primária pois, possibilita o combate aos fatores indutores da criminalidade antes que eles incidam sobre o indivíduo. Atua na raiz do delito, neutralizando o problema antes que ele apareça.

Ou até mesmo e não menos importante na forma de prevenção terciária que tem como destinatário o recluso e como objetivo evitar sua reincidência por meio da ressocialização.

Por tal respectiva entende o Ilustre Doutor Gross (2004, p.21):

Sob este enfoque verificamos que o sistema punitivo imposto pelo Estado deve não apenas servir como meio de punição, mas também como instrumento de prevenção o que implica na ressocialização do criminoso, para que ao término do cumprimento da pena não venha a reincidir.

Entretanto, para alcançar estes fins são necessárias algumas medidas. Como por exemplo: implementar uma justiça restaurativa para estes casos. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios define este Instituto como (TJDFT, 2019):

Um método que busca, quando possível e apropriado, realizar o encontro entre vítima e ofensor, assim como eventuais terceiros envolvidos no crime ou no resultado dele, com o objetivo de fazer com que a vítima possa superar o trauma que sofreu e responsabilizar o ofensor pelo crime que praticou.

Portanto, adequado ao caso visto que o referido Instituto busca construir soluções mais efetivas, proporcionando um tratamento adequado para os agentes agressores e suas vítimas diretas e indiretas por meio de encaminhando a tratamentos psicológicos e psiquiátricos bem como promovendo cursos e programas de orientação.

Referidas medidas foram inclusive propostas no projeto de Lei em trâmite nº 1159/2020 (BRASIL, 2020) que dispõe sobre os Conselhos de Defesa dos Animais do Distrito Federal observadas as finalidades de defesa, preservação e conservação da fauna e promoção do bem-estar animal bem como a responsabilização dos agentes que cometerem crimes contra os animais e o meio ambiente conforme seu artigo 8º com a seguinte redação (BRASIL, 2020):
Art. 8. Os responsáveis por violações aos direitos dos animais, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, estarão sujeitos às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo outras sanções cabíveis, estarão sujeitos às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a gravidade do caso:

I - Encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

II - Encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;

[...]

Ademais, o referido projeto tem como um de seus objetivos instituir o órgão especializado de Defesa dos Animais para proporcionar uma resposta mais assertiva quando presente ocorrências de maus tratos aos animais, para cumprimento dos direitos destes que estão inclusive previstos na Lei 9.605/98 (BRASIL, 1998) que dispõe sobre crimes ambientais e contra os animais.

Mas além disso estes órgãos poderão com a mesma eficiência realizar um diagnóstico e atendimento mais acertado também em ocorrências de violência doméstica, abuso infantil entre outras crueldades contra as pessoas porque como ficou elucidado quem é insensível ao sofrimento dos animais também o será́ em relação aos seus semelhantes.


Conclusão

Por todo o exposto, de acordo com as diversas pesquisas realizadas e os dados demonstrados, conclui-se perfeitamente que os maus tratos aos animais merecem a devida atenção não sendo apenas uma ameaça a estes seres, mas também uma ameaça a toda sociedade, uma vez que restou evidente a conexão entre os maus tratos aos animais e a violência contra as pessoas.

Concretizando assim a possibilidade da utilização da teoria do elo para o enfrentamento da violência doméstica como meio de identificar e solucionar problemas intrafamiliares para assim romper com o perpetrado ciclo da violência.
Deve se então lançar mão de medidas restaurativas por meio de projetos que buscam recuperar e ressocializar os agentes destes tipos de violências, bem como promover o encaminhando as vítimas diretas e indiretas para tratamentos e acompanhamento psicológico.

Ressalta-se que a intenção deste trabalho não foi de esgotar o assunto uma vez que existe grande necessidade de prosseguir com a pesquisa, já que se trata de um tema baseado em dados parciais com enorme complexidade e pouco difundido no Brasil.

 

Referências

BRASIL, Lei do meio ambiente. Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, Disponível em: Acesso em: 21 jul. 2020.

_________. Lei nº 11.340 de 2006, Disponível em: Acesso em: 21 jul. 2020.

_________.Projeto de Lei nº 1159/2020, Disponível em Acesso em 24 jul. 2020.

CUNHA, Karina Cristina Ribeiro; SALES, Juliana Dias et al. Índice de reincidência na Lei Maria da Penha após intervenção psicológica no Fórum do Gama – DF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5344, 17 fev. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63543. Acesso em: 23 jul. 2020.

DE LIMA JUNIOR, José César Naves. Manual de Criminologia. Editora JusPODIVM, 2014.
GROSS Jr, Rauli. A Responsabilidade do Estado pela Reabilitação do Apenado, 2004. Dissertação mestrado em Direito 2004. 101f. Departamento de Direito Universidade do Vale do Itajaí, 2004.

KAY, Aline Ortiz. A aplicação da justiça restaurativa no processo penal. Curitiba, 2018.

MPSP. Maus tratos a animais está relacionado à violência doméstica, apontam estudos. Disponível em: Acesso em 25 jul. 2020.

NARDI, Suzana Catanio dos Santos; BENETTI, Silvia Pereira da Cruz. Violência conjugal: estudo das características das relações objetais em homens agressores. Bol. Psicol., São Paulo. V. 62. N 136. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttex&pid=S0006-59432012000100006%Ing=pt&nrm=iso Acesso em: 25 jul. 2020.

NASSARO, Marcelo Robis Francisco, Maus tratos aos animais e violência contra as pessoas. São Paulo: 2013.
SUTHERLAND, Edwin & CRESSEY, Donald. Criminologia. Milano: Giuffrè Editore, 1950.

TJDFT. Justiça Restaurativa: entenda conceitos e objetivos. Disponível em https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2019/maio/justica-restaurativa-entenda-os-conceitos-e-objetivos Acesso em 26 jul. 2020.

 

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