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Resumo:
A infeliz realidade no dia a dia dos acompanhamentos das prisões, onde observamos que na maioria das vezes que afirmam que houve prisão em flagrante dentro da residencia, não passou de uma espúria invasão de domicilio.
Texto enviado ao JurisWay em 07/07/2015.
Última edição/atualização em 14/07/2015.
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Introdução.
O presente trabalho visa abordar um dos bens jurídicos mais importantes tutelados pelo Estado, a liberdade.
A luz da filosofia, sociologia e do direito, abordaremos o presente assunto que indubitavelmente é de suma relevância.
Sob o enfoque do contratualista, Rousseau , trarei a tona os primórdios do conceito de liberdade, e num segundo momento o contrato social.
Que trata-se da transição entre a liberdade “plena”, sem freios, para a liberdade controlada e mitigada, por um terceiro imparcial dotado de poderes de punição.
Com esta explanação do tema liberdade sob o enfoque filosófico, poderemos com mais segurança, adentrar no assunto sob a perspectiva jurídica.
Evidentemente que trata-se de um assunto de inesgotável discussão, de maneira que não será possível exaurí-lo, porém, traremos à baila, o caráter de subsidiariedade da privação de liberdade, no enfoque da presunção de inocência, consolidado na Carta da República de 1988.
Explicitando embora de forma sucinta, a correlação entre o pacto social e a liberdade, refletindo com base nestes argumentos ,se o Estado ainda permanece legitimado no seu poder de punir.
Sendo talvez um retrocesso ao Estado Natural descrito pelos contratualistas, sendo o retorno do caos, da insegurança pela própria vida, da família, propriedade , honra e liberdade.
Do Pacto Social.
Jean Jacques Rousseau, abordou o pacto social com muita propriedade, sendo considerada a sua obra Do Contrato Social, um legado para toda as gerações .
Conseguindo explicar de forma abstrata e indireta, o quão importante é este significado de liberdade, pós-pacto social, quando obtempera:
“Portanto, o soberano não é formado senão por particulares que o compõe, nem podendo haver interesse contrario ao deles, por conseguinte, o poder soberano não tem nenhuma necessidade de fiador, em relação aos súditos, porque é impossível que o corpo queira causar dano a todos os seus membros, e veremos, logo depois, que ele não pode causar dano a ninguém em particular. O soberano, por aquilo que é, é sempre tudo o que deve ser. (...) Afim de que, pois, o pacto social não seja um vão formulário, ele encerra tacitamente este ato, que só pode dar força aos outros, recusando-se a obedecer a vontade geral e será contrario por todo o corpo; o que não significa outra coisa senão que será forçado a ser livre; pois tal é a condição que, dando cada cidadão à Pátria, garante-lhe toda a dependência pessoal, condição que faz o artificio e o jogo da maquina politica e que só torna legítimos os atos civis, os quais, sem isso, seriam absurdos, tirânicos e sujeitos aos maiores abusos. (...) O que o homem perde pelo contrato social, é a sua liberdade natural e um direito ilimitado a tudo o que tenta e pode atingir, o que ganha é a liberdade civil e a propriedade de tudo que possui. Para não se enganar nessas compensações, é preciso distinguir muito bem a liberdade natural, que não tem por limites senão as forças do individuo, da liberdade civil, que é limitada pela vontade geral e da posse, que não passa do efeito da força ou o direito do primeiro ocupante, da propriedade que não pode ser fundada num titulo positivo.” (Rousseau, Jean-Jacques, Do Contrato Social , tradução de J. Cretella Jr e Agnes Cretella, 3° Ed. Ver, São Paulo,págs.44/45 e 47/48, Editora Revista dos Tribunais, 2012).
Rousseau, traz a sistemática desta legitimação do corpo social, na personificação e instituição do Soberano, e que a partir deste momento, a liberdade possui limitações, por outro lado.
O Soberano possui a incumbência de proteger e assegurar a propriedade, embora o autor se limite a trazer esta proteção á propriedade, podemos ampliar ao conceito de bem jurídico com um todo.
Pois, é ele, o Soberano, a partir do Pacto Social, o responsável em assegurar a vida, liberdade e propriedade, até mesmo pelo fato, de ser incongruente o Estado proteger a propriedade, e não fazer isto, no que cerne a vida e a liberdade que antecede os demais bens jurídicos nesta “escala” de prioridades.
Numa leitura da realidade contemporânea, é notório que O Estado perdeu o controle social à muito tempo, e o afã exacerbado por bens materiais elevou a criminalidade a estágios avassaladores.
Rousseau, descreve os motivos que ensejaram o homem a “pactuar” para melhor assegurar sua liberdade, quando diz:
“Suponho que os homens que chegam a este ponto, em que os obstáculos que impedem sua conservação no estado de natureza, levam, por sua resistência, para as forças que cada individuo pode empregar para se manter nesse estado. (...) Encontrar uma forma de associação, que defenda e proteja com toda força comum a pessoa e seus bens de cada associado e pelo qual cada um se uniria a todos, obedecendo, entretanto só a si mesmo e permanecendo tão livre quanto antes. Tal é o problema fundamental ao qual o contrato social fornece a solução. (...) Cada um de nos reúne sua pessoa e todo o seu poder sob a suprema direção da vontade geral; e nos recebemos num corpo cada membro, como parte indivisível do todo. (Grifos) .” (Rousseau, Jean-Jacques, Do Contrato Social , tradução de J. Cretella Jr e Agnes Cretella, 3° Ed. Ver, São Paulo,págs.39/40, Editora Revista dos Tribunais, 2012).
Notamos que o conceito real de liberdade é totalmente antagônico ao que na contemporaneidade, extraímos que mediante a realidade anterior ao pacto social, a mitigação da liberdade foi justamente o meio empregado, para verdadeiramente se tornar livre.
Diante do panorama atual, o poder de punir do Soberano permanece, no entanto, ele ainda consegue assegurar os principais bens jurídicos tutelados?
O coletivo erigiu este Soberano, uma vez que admitiu que a liberdade plena sem restrições era nociva à coletividade ,em contrapartida, o Estado asseguraria a inviolabilidade da vida, família, propriedade e liberdade.
Foi com base nesta “promessa”, que o homem se abdicou de sua liberdade natural, para a liberdade “vigiada”, entretanto, de nada adiantaria o homem deixar de fazer o que bem entende para se submeter a este “terceiro imparcial”, sem que todos estes bens jurídicos fundamentais estivessem seguros.
É neste ponto, que adentramos no mérito que se buscou inicialmente, esta claro que o Soberano perdeu o controle sobre seus subordinados, e o pacto fora quebrado.
Em contrapartida, enquanto o Estado de Natureza volta a vigorar, traz consigo o caos absoluto e as incertezas inerentes à ele. E a humanidade volta a fica mercê da lei do mais forte, do mais astuto.
Com a pequena diferença, O Soberano não cumpre o seu papel, mais ainda o poder de punir esta em suas mãos. E sob esta perspectiva filosófica, o Estado perdeu a “mão”, e não mais conseguindo controlar o seio social, restringe a liberdade indiscriminadamente, como estratégia pra tentar “reaver” este controle social.
II- DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.
Nesta transição entre o Estado Natural e o Pacto Social, chegamos ao Estado Democrático de Direito,
Segundo o entendimento de Dimitri Demoulis:
“O conceito de Estado de Direito apresenta utilidade se for entendido no sentido formal da limitação do Estado por meio do direito. Nessa perspectiva, o conceito permite avaliar se a atuação dos aparelhos estatais se mantém dentro do quadro traçado pelas normas em vigor. Isso não garante o caráter justo do ordenamento jurídico, mas preserva a segurança jurídica, isto é, a previsibilidade das decisões estatais. O conceito do Estado de direito material é, ao contrário, problemático. As tentativas de "enriquecimento" do conceito, no intuito de considerar como Estado de direito somente o ordenamento que satisfaz os requisitos da justiça, estão fadadas ao fracasso, já que não parece possível definir o que é um Estado justo” DIMOULIS, Dimitri. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007. p., 155.
Conforme denota o autor, no Estado Democrático há limitações para atuação estatal em detrimento do individuo, posicionamento este, que esta em consonância ao pacto social.
Quando qualquer um dos “contratantes” burla o pacto realizado, automaticamente o individuo legitima a atuação do Estado em sua individualidade.
Porém, esta ingerência não pode ocorrer de qualquer forma, e é neste momento, que as limitações decorrentes do arcabouço normativo atua como instrumento delimitador, trazendo segurança jurídica para o individuo, bem como norteando de que maneira o Estado deve buscar a punição daquele que supostamente desrespeitou o pacto.
É justamente neste momento, onde o individuo burla o pacto, e o Estado busca a punição dele, que muita das vezes há o confronto dos interesses individuais com os interesses estatais.
Também é nesta circunstancia, que um dos bens jurídicos mais importantes tutelados pelo Estado é colocado em “xeque”, a liberdade.
Tal qual a liberdade, neste impasse entre a lesão à um bem jurídico, e a NECESSIDADE, ADEQUAÇÃO E PROPORCIONALIDADE da medida restritiva da liberdade que chegamos ao ponto chave do presente trabalho.
Prisão Preventiva art. 312 do Código de Processo Penal.
A prisão cautelar, o Desembargador PAULO RANGEL com a maestria que lhe é peculiar, define o seu conceito:
“A prisão cautelar é uma espécie de medida cautelar, ou seja, é aquela que recai sobre o individuo, privando-o de sua liberdade de locomoção, mesmo sem sentença definitiva. É cediço que a medida cautelar pode recair sobre a coisa (res) v.g, busca e apreensão , sequestro, arresto, e sobre a pessoa (personae), e é exatamente da privação da liberdade, antes da sentença proferida no processo de conhecimento, que vamos tratar neste capitulo. A prisão cautelar tem como escopo resguardar o processo de conhecimento, pois, se não for adotada, privando o individuo de sua liberdade, mesmo sem sentença definitiva, quando esta for dada, já não será possível a aplicação da lei penal. Assim, o caráter da urgência e necessidade informa a prisão cautelar de natureza processual. RANGEL, PAULO. DIREITO PROCESSUAL PENAL, RIO DE JANEIRO, EDITORA ATLAS, 21° EDIÇÃO, 2013.
Na mesma toada AURY LOPES JR:
Porque pensamos o processo penal a partir do “principio da necessidade”, que, como será explicado na continuação, considera que o processo penal é um caminho necessário para alcançar-se a pena e, principalmente, um caminho que condiciona o exercício do poder de penar (essência do poder punitivo) à estrita observância de uma série de regras que compõe o devido processo penal (ou, se preferirem, são as regras do jogo, se pensarmos no célebre trabalho II do processo come giuoco de CALAMANDREI).LOPES JR, AURY, DIREITO PROCESSUAL PENAL, EDITORA SARAIVA, SÃO PAULO, 2014.pág.35.
O instituto das medidas cautelares, mesmo que não seja a medida extrema de prisão é uma restrição à liberdade do indivíduo, restrição esta, que será aplicada antes do trânsito em julgado.
De forma alguma, num Estado que se denomina como Democrático de Direito, pode estar tão afoito em seu direito de punir a ponto de usurpar as regras do jogo como citado CALAMANDREI.
Entretanto, a regra que deveria servir como exceção, esta sendo usada como regra, basta uma leitura simplória do arcabouço Constitucional, para verificarmos que o principio da inocência, devido processo legal, ampla defesa, deve prevalecer contra qualquer preceito infraconstitucional.
Pensarmos de outra maneira, é inverter a ordem hierárquica de todo o sistema normativo.
Há que se ressaltar o caráter de imprescindibilidade da prisão cautelar, ainda mais na atual conjuntura, onde que para os mais pragmáticos a Lei 12.403/11, ratifica embora sem necessidade, a ordem da prisão cautelar.
Porém, a Constituição já seria instrumento suficiente para suplantar a desnecessidade da mencionada extrema medida de prisão, o que para muitos não era suficiente.
Veio a lei para “chover no molhado”, embora nomine e delimite as medidas cautelares diversas da prisão. Mas, a insistência em discordar do que a Constituição rege ainda permanece.
E na prática, a prisão cautelar ainda tem sido a medida mais utilizada em primeira instância, e muitas vezes confirmada pelos Tribunais estaduais, embora dissonante ao preceito constitucional.
A proximidade das decisões aos preceitos Constitucionais, infelizmente passa a ocorrer somente nos superiores tribunais, o que denota tempo e dinheiro, o que na maioria das vezes, aqueles que estão submetidos à seara penal não possuem.
Dentre tantos argumentos que são utilizados pelos juízes das varas que são ratificados por muitos tribunais estaduais, esta a gravidade em abstrato do crime.
A gravidade em abstrato do crime e a necessidade de apontamento concreto.
Por ser uma fundamentação tão corriqueira nas varas e nos tribunais estaduais, se consolidou jurisprudência maciça neste sentido, pelos tribunais superiores, no sentido de que não é suficiente para a mantença da prisão preventiva, a gravidade em abstrato do crime.
É de fácil percepção a intenção do legislador nas mudanças ocorridas nas Medidas Cautelares, indubitavelmente, o que se busca é sacramentar no que tange à prisão cautelar, o seu caráter de subsidiariedade, que extraímos do seio constitucional.
Sobretudo pelo principio da inocência capitulado no art. 5° inciso LVII, da CF.
A gravidade em abstrato do crime, não encontra qualquer respaldo legal e não constitui argumento idôneo para o encarceramento do acusado. Nessa mesma perspectiva, os Tribunais Superiores se manifestam da seguinte maneira:
HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO TENTADO. PRISÃO EM FLAGRANTE. PLEITO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO FUNDAMENTADO APENAS NA GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA. INEXISTÊNCIA DE NOVOS FUNDAMENTOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. 1. A prisão cautelar, para ser mantida ou decretada, deve atender aos requisitos autorizativos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal, os quais deverão ser demonstrados com o cotejo de elementos reais e concretos que indiquem a necessidade da segregação provisória. Precedentes. 2. A superveniência de sentença condenatória, impondo ao Paciente a pena mínima de 3 anos e 8 meses, sem acrescer qualquer fundamento quanto à manutenção do cárcere, reforça a motivação para a concessão do writ, por ter se limitado a manter a prisão do réu, sem acrescer qualquer fundamentação nova. 3. Ordem concedida para assegurar ao Paciente o benefício da liberdade provisória mediante condições a serem estabelecidas pelo Juízo da origem, determinando, por conseqüência, a expedição de alvará de soltura em seu favor, se por outro motivo não estiver preso(STJ - HC: 109977 SP 2008/0143631-8, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 11/11/2008, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/12/2008).
Decisão: Habeas corpus. Dupla supressão de instância. Tráfico de drogas. Prisão preventiva. Contrariedade à orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal. Liminar deferida. 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de concessão de liminar, impetrado contra decisão que negou seguimento ao HC 293.366, do Superior Tribunal de Justiça. 2. Extrai-se dos autos que o paciente foi preso em flagrante em 20.03.2014 na posse de 35g de maconha. Nos termos do art. 310, II, do Código de Processo Penal, o Juízo de origem converteu a prisão em preventiva por entender que “a concessão da liberdade provisória encontra obstáculo na expressa vedação legal disposta no art. 44, da Lei nº 11.343/2006, observado, igualmente, que a própria Constituição Federal estabeleceu tratamento diferenciado para o crime de tráfico de drogas. Afora a circunstância acima elencada, verifica-se que não há nos autos quaisquer comprovantes de ocupação lícita e de endereço fixo, a revelar que a soltura do indiciado neste momento poderá frustrar a aplicação da lei penal e o regular andamento do feito.” 3. Dessa decisão a defesa impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e, após o indeferimento da medida liminar, apresentou pedido de soltura do paciente ao Superior Tribunal de Justiça. A Relatora do HC 293.366, Min.ª Laurita Vaz, negou seguimento à impetração por considerar inviável a supressão de instância requerida. 4. Neste habeas corpus, o impetrante alega a ausência de fundamentação idônea para a manutenção da prisão do paciente, o que justificaria a mitigação da Súmula 691/STF para fins de imediata expedição de alvará de soltura. Decido. 5. Inicialmente observo que, inexistindo pronunciamento colegiado do Superior Tribunal de Justiça, não compete ao Supremo Tribunal Federal examinar a questão de direito implicada na impetração. Esse entendimento foi consolidado na Súmula 691/STF e só é excepcionado nas hipóteses de manifesta ilegalidade ou abuso de poder, bem como nos casos de decisões manifestamente contrárias à jurisprudência desta Corte ou teratológicas. 6. No caso dos autos, contudo, verifico que o decreto de prisão preventiva não foi baseado em dados objetivos reveladores da gravidade concreta da conduta ou mesmo em elementos individualizados que evidenciem risco efetivo de reiteração delitiva pelo ora paciente. Em verdade, a decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva baseou-se no art. 44 da Lei nº 11.343/2006 e na gravidade abstrata do delito de tráfico de drogas. 7. A jurisprudência do Tribunal em matéria de prisão cautelar exige a demonstração, empiricamente motivada, da presença dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal (Cf. HC 109.449, Rel. Min. Marco Aurélio; e HC 115.623, Rel.Min. Rosa Weber). Nesse sentido, ambas as Turmas desta Corte desautorizam a decretação de prisão preventiva com base na gravidade abstrata do delito ou em circunstâncias elementares do tipo penal. Foi seguindo esse entendimento que a Primeira Turma, na sessão de 11.06.2013, julgou o HC 115.558, sob a relatoria do ministro Luiz Fux. Naquela oportunidade, reiterou-se a ilegalidade da prisão cautelar para garantia da ordem pública e para conveniência da instrução criminal [...] quando fundamentada, como no caso sub examine , tão somente na gravidade in abstracto , ínsita ao crime. (trecho da ementa) 8. Especificamente quanto ao crime de tráfico de drogas, o Plenário do Tribunal, ao julgar o HC 104.339, Rel. Min. Gilmar Mendes, reconheceu a incompatibilidade entre a vedação apriorística de concessão de liberdade provisória (Lei nº 11.343/2006,art. 44) e as garantias da presunção de não culpabilidade, do devido processo legal e da fundamentação das decisões judiciais. Nessa oportunidade, por maioria de votos, entendeu-se que a previsão constitucional de que o crime de tráfico de entorpecentes é inafiançável (art. 5º, XLIII) não traduz dizer que seja insuscetível de liberdade provisória, pois conflitaria com o inciso LXVI do mesmo dispositivo, que estabelece que ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança (trecho do voto do Ministro Gilmar Mendes). 9. Nessas condições, e considerando a natureza da droga apreendida, defiro a cautelar para assegurar ao paciente o direito de aguardar em liberdade o julgamento da ação penal, ressalvada a possibilidade de expedição de nova ordem de prisão por fundamento superveniente. Comunique-se ao Juízo de origem. Abra-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República. Publique-se. Brasília, 07 de maio de 2014.Ministro Luís Roberto Barroso RelatorDocumento assinado digitalmente.(STF - HC: 122355 SP , Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 07/05/2014, Data de Publicação: DJe-090 DIVULG 12/05/2014 PUBLIC 13/05/2014)
Entende-se pela melhor doutrina, que é necessária a demonstração de existência de periculum libertatis, bem como do comissi dilicti, razão pela qual associado ao principio da inocência o caráter subsidiário da prisão cautelar, foi ratificado de uma vez por todas pela lei 12.403/2011, a prisão cautelar deve ser vista sob a luz constitucional.
A liberdade deve ser sempre a regra, não há outra interpretação que se possa extrair da Constituição senão esta.
A prisão como ultima ratio do processo penal.
Aury Lopes Jr., defende o caráter instrumental das medidas cautelares:
“ Filiamo-nos á corrente doutrinária que defende seu caráter instrumental, em que “las medidas cautelares son, pues, actos que tienen por objeto garantizar el normal dessarrollo del processo y, por tanto, la eficaz aplicacion del jus puniendo. Este concepto confiere a las medias cautelares la nota de instrumentalidade, em cuanto son médios para alcanzar la doble finalidade arriba apuntada” (citando –SARA ARAGONESES, PRIETO-CASTRO, HERCE QUEMADA, FAIREN GUILLEN, entre outros).“Constitui uma impropriedade jurídica (e semântica) afirmar que para a decretação de uma prisão cautelar é necessária a existência de fumus boni iuris. Como se pode afirmar que o delito é a “fumaça do bom direito”. Ora, o delito é a negação do direito, sua antítese! No processo penal, o requisito para a decretação de uma medida coercitiva não é a probabilidade de existência do direito de acusação alegado, mas sim de um fato aparentemente punível. Logo o correto é afirmar que o requisito para a decretação de uma prisão cautelar é a existência do fumus comissi delicti, enquanto probabilidade da ocorrência de um delito (e não um direito), ou, mais especificamente , na sistemática do CPP, a prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria. LOPES JR. AURY, PRISÕES CAUTELARES, 4° EDIÇÃO, VER. ATUALIZADA E AMPLIADA, SÃO PAULO, SARAIVA, 2013.
Atrelado a todo este raciocínio desenvolvido, para aqueles que são mais propensos à estrita legalidade temos o art. 282 § 6° do Código de Processo Penal, vejamos:
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:
§ 6o A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319). (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
Conforme se destaca do parágrafo 6°do supramencionado artigo, as medidas cautelares diversas da Prisão preventiva conforme o art. 319 do CPP, são:
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
IX - monitoração eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
§ 1o (Revogado).
§ 2o (Revogado).
§ 3o (Revogado).
(Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011)
§ 4o A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
O parágrafo 6° do art. 282, ressalta o que a CF/88 trata de forma taxativa, sobretudo no que cerne ao Principio da Inocência, de que a prisão deve ser o ultimo artificio que o Estado deve se valer.
Porém, é necessário para muitos, que a Lei ratifique a Constituição, e o mencionado parágrafo 6° do art. 282 do CPP trouxe pra esta “casta”, a comprovação do desnecessário ,de que a prisão é medida subsidiária das opções de restrição da liberdade.
Embora a prisão esteja incluída dentre as Medidas Cautelares, não pode ser penosa ao extremo e ser utilizada como instrumento de antecipação pena, antes da dilação final probatória, que se perfaz pelo contraditório, ampla defesa com as formalidades inerentes ao devido processo legal e por fim o transito em julgado.
O que é mais revoltante é que embora a subsidiariedade da prisão seja ratificada pela CF/88 e mais recentemente pelas modificações pontuais feitas no CPP, continuam prevalecendo “as constituições dos tribunais estaduais e das varas”.
Pois, o que a lei a e a CF nos mostra é que respeitados os requisitos, deve-se esgotar as vias das medidas diversas da prisão, e somente com o desrespeito a tais restrições, que o Estado deve se utilizar da prisão.
Isso sem levar em consideração, o principio da inocência, acertadamente TOURINHO FILHO obtempera:
“Se ninguém é considerado culpado até que transite em julgado eventual sentença condenatória, é um não-senso prender uma pessoa presumivelmente inocente. Embora a Prisão provisória seja um mal, ainda que necessária, todas as legislações do mundo tem procurado, dentro do possível, medidas que garantam o comparecimento do acusado aos atos do processo sem os males da privação da liberdade, reservando provisória, mesmo sendo um mal, para os casos de efetiva necessidade”.( Tourinho Filho, Fernando da Costa, Manual de Processo Penal, 1928, São Paulo; Saraiva, 5° edição revista e atualizada e aumentada, 2003)pág.576
Todos estes argumentos seriam suficientes para que a ampla defesa fosse respeitada, juntamente com o contraditório e o principio da inocência, e consequentemente a prisão ser tratada como ultima ratio do processo.
Constatamos que hoje, esta não é realidade, muitos magistrados julgam em dissonância dos preceitos e princípios constitucionais, invertendo-os e fazendo com que a prisão se torne a regra, e o principio da inocência torna-se uma mera abstração teórica, desprovida de fundamentos.
Se por um lado a balança da justiça esta quebrada, pois, não mais consegue sopesar com equidade o que é colocado diante dela, a espada esta mais afiada do que nunca, e certamente tem cortado com seu fio afiado, muitos inocentes que não deveriam nem estar diante dela...
CONCLUSÃO.
Conforme fora demonstrado, a humanidade vivia em um Estado Natural, onde a lei do mais forte imperava, e os principais bens da vida, encontravam-se totalmente vulneráveis.
Fartos desta total vulnerabilidade em relação ao mais forte, ou o mais astuto, achou-se por bem, outorgar esta liberdade “plena”, por uma liberdade mitigada ou assistida, pelo qual a “pessoa” confiada foi o “Estado”.
Por intermédio do Contrato Social, o Estado representava uma figura forte, que com “seus braços firmes”, e sua “cara de mau”, tornaria o caos em paz, e não traria somente a sensação, mas, a própria paz, àqueles que se submetem á ele.
O tempo passou, e aquela representação de força e autoridade, esta com os braços flácidos e as pernas trêmulas.
A liberdade é o bem jurídico mais importante tutelado pelo Estado, depois da vida, embora a Constituição Federal tenha todo um arcabouço voltado a tutelar este bem jurídico tão crucial.
A restrição à liberdade tem sido o remédio que o Estado tem se socorrido corriqueiramente, e como todo remédio os seus efeitos colaterais não tardaram a aparecer.
Arbitrariedades constantes são praticadas em detrimento a este bem jurídico tão importante, evidentemente, que o presente trabalho não buscou esgotar o tema da liberdade em todas as suas nuances.
Mas, talvez nos levar a pensar, que o pacto fora quebrado e o Estado não consegue mais cumprir “o que prometeu”, e mediante esta quebra, o que fazer?
Na perspectiva atual, o Estado perdeu a sua força, por outro lado, os “inimigos do Estado” ganham espaço e força cada vez mais, e retornamos ao Estado de natureza, onde caos absoluto impera.
E o Estado, não conseguindo cumprir com sua parte no contrato, tal qual proteger os seus subordinados, utiliza talvez a maneira supostamente mais fácil, tal qual o cerceamento de liberdade do individuo.
Alias, o direito penal é a arma letal que o Estado se utiliza para todas as mazelas , o Estado descumpre o seu papel no “contrato”, e ainda outorga todo o ônus proveniente disto aos seus subordinados.
Apesar da liberdade ser regra, segundo denota a CF/88, ratificado taxativamente pelo Código de Processo Penal, a subsidiariedade da prisão não tem sido respeitada.
E absurdos tem sido cometidos, devido a este afã estatal em punir, e aprisionar a qualquer preço, infelizmente tem sido esta a realidade atual.
O contrato esta rompido, e as partes retornam ao seu estágio rudimentar, a lei do mais forte impera, e ninguém esta seguro.
E o Estado? Não protege a vida, liberdade e a propriedade privada, porém, continua detendo o poder de punir e prender, sem cumprir com sua parte no contrato...
BIBLIOGRAFIA.
BITTAR.Eduardo C.B. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas, 3ª Edição.
Rousseau, Jean-Jacques, Do Contrato Social , tradução de J. Cretella Jr e Agnes Cretella, 3° Ed. Ver, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2012. págs.44/45 e 47/48.
(Rousseau, Jean-Jacques, Do Contrato Social , tradução de J. Cretella Jr e Agnes Cretella, 3° Ed. Ver, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2012). págs.39/40.
KANT, I. A Fundamentação da metafísica dos costumes, São Paulo: Martin Claret, p. 88
DIMOULIS. Op. Cit. p., 140. No mais, acrescenta o autor que o Estado de Direito oferece uma importante garantia de segurança jurídica que, por sua vez, constitui precípua finalidade do direito moderno. Ibidem. p., 141.
RANGEL, PAULO. DIREITO PROCESSUAL PENAL, RIO DE JANEIRO, EDITORA ATLAS, 21° EDIÇÃO, 2013.pág. 752.
LOPES JR, AURY, DIREITO PROCESSUAL PENAL, EDITORA SARAIVA, SÃO PAULO, 2014.pág.35
STJ - HC: 109977 SP 2008/0143631-8, Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 11/11/2008, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/12/2008.
STF - HC: 122355 SP , Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 07/05/2014, Data de Publicação: DJe-090 DIVULG 12/05/2014 PUBLIC 13/05/2014.
GOMES, Luiz Flávio; MARQUES, Ivan Luís. Coordenação. BIANCHINI, Alice; MARQUES, Ivan Luís; GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches; MACIEL, Silvio. Prisão e Medidas Cautelares. Comentários à Lei 12.403, de 4 de maio de 2011. São Paulo: RT, 2011. p. 24.
LOPES JR. AURY, PRISÕES CAUTELARES, 4° EDIÇÃO, VER. ATUALIZADA E AMPLIADA, SÃO PAULO, SARAIVA, 2013.págs. 25 e 26.
Tourinho Filho, Fernando da Costa, Manual de Processo Penal, 1928, São Paulo; Saraiva, 5° edição revista e atualizada e aumentada, 2003)pág.576.
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