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Direito Grego


Autoria:

Roberto Victor Pereira Ribeiro


Graduado em Direito Publico Pós-graduado em Direito Processual Pesquisador de Ciências das Religiões, Teologia, Parapsicologia Membro da Associação Brasileira de Bibliófilos Membro da Associação Brasileira dos Advogados Advogado

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Texto enviado ao JurisWay em 08/08/2011.

Última edição/atualização em 09/08/2011.



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DIREITO GREGO



Nossa proposta a partir deste ponto é retratar um pouco a cultura jurídica grega. Demonstraremos que a sociedade grega era essencialmente democrata e extremamente cumpridora das leis. A referida Democracia permitia aos cidadãos gregos a participação de forma ativa nas deliberações legislativas, através da Ekklesia (assembléia popular). Os membros da Ekklesia podiam e deviam se inserir na criação das leis que regiam a vida, nos costumes, nos destinos da cidade e nas obrigações cívicas. Ao mesmo tempo que a democracia rendia ao cidadão a permissão e o dever de elaborar leis, também lhe cobrava o cumprimento e a observância da legislação. Neste ínterim, havia o famoso “compromisso Heliástico”, que era feito através de juramento, onde todos juravam acatar as leis e só julgar os concidadãos baseados nas mesmas. A lei tinha papel importante, tal qual possui hoje, face ao princípio da legalidade. Por isso, o Direito Grego ao contrário do que pensamos na hodiernidade, se desenvolveu e foi exemplo modelar em sua época.


1. FORMAÇÃO DO DIREITO GREGO

Antes de mais nada, cumpre-nos ressaltar a importância do capítulo 1 (Universo Grego) como meio para adentrar no estudo profundo do direito grego e seus aspectos. Assim, comungamos com o célebre comentário de Ortolan: “Para se conhecer bem uma legislação insta que se conheça bem a sua história”.

Michael Gagarin1 comenta que há três estágios de desenvolvimento do Direito em uma sociedade:

  • Sociedade pré-legal: Onde não há critérios estabelecidos sobre os litígios;

  • Sociedade proto-legal: O avanço chega com procedimentos para dirimir as disputas, porém não existem regras definidas ainda;

  • Sociedade legal: Estágio mais avançado de uma sociedade em crescimento. O Estado intervém nas querelas, através de normas e sanções. Há também a construção embrionária de um Direito positivado em códices.

    O Direito grego percorreu estas três etapas preconizadas por Gagarin, tanto é que, no início o direito era apenas falado, e só depois houve o advento das escritas legais.

    O Direito grego praticamente nasce das aspirações de Homero, pois suas obras e epopeias trazem regras de conduta, bem como as possíveis penas para a violação dessas regras, daí porque podemos afirmar que em Homero assiste-se a gestação do Direito Grego.

    Existem teorias que exclamam pela falta desses tão falados códices, se existiram por quê não chegaram até nós?

    Não aconteceu com a Grécia o que ocorreu com Roma.

Não encontramos os diplomas gregos reunidos como temos acesso à legislação romana.

Justitiano cuidou muito bem para que as leis romanas chegassem a hodiernidade.

Rodolphe Dareste2, profundo estudioso da legislação grega, comenta que só conseguiu reunir para seu estudo, pequenos fragmentos esparsos que dão imagem incorreta do direito que existiu à época de Sócrates e anterior a ele.

Por sua vez, Ugo Paoli3 assevera que deve se dar ao Direito ático tratamento de extensão, não deixando-se limitar apenas ao estudo formal das leis que nos sobrevieram, mas também se ater aos costumes e as reações da sociedade diante dos corpos jurídicos instalados.

Ocorreu com o direito na Grécia o que nós chamamos de tradição atávica oral. Na gênese do corpo jurídico, o grego preferia falar do que escrever, portanto, pouco se escreveu. A escrita se desenvolveu juntamente com o direito, porém quando ambos alcançaram o zênite da maturidade, a Grécia já não era o poderio de antes e encontrava-se em decadência.

Se a escrita, as formas de escritas e a produção de livros estivessem em acelerado estágio quando a civilização grega alcançou o ápice, como ocorreu em Roma, com certeza a história do direito grego seria bem diferente.

O direito grego só conseguiu ser soberano quando o povo atentou para a necessidade de escrever as normas que estavam respeitando. Destarte, era mais fácil aplicá-las e assegurar a justiça de quem as respeita. Neste ínterim, Teseu proclamou “Quando as leis são escritas, o pobre e o rico tem justiça igual”. Tais palavras viraram o lema da luta para escriturar o direito vigente da época.

Outro fator que atrapalhou muito a chegada do direito grego até nós, foi o fato de o especialista que estuda a Grécia dar mais atenção a História do que ao Direito, também porque os estudos eram feitos a maioria por filósofos e, estes não primam pela verdade jurídica, até mesmo porque não é o objeto de estudo e de trabalho deles.

Curiosidade: As grandes obras literárias de Atenas no século de Péricles (sec. V) foram redigidas em dialeto ático, porém a Odisseia, escrita em meados do século VIII a.C. teve o vernáculo do dialeto jônico.

Falando em Atenas, sabemos que foi lá onde a Democracia melhor se desenvolveu e o direito atingiu a melhor faceta em relação a processo e legislação.

Há também outras cidades-estados importantes para o direito grego, tais como: Esparta, Gortina, Tasos etc. Porém, foi em Atenas e Esparta as maiores manifestações do direito em plagas gregas.

Ilias Arnaoutoglou confirma este dado em seu livro “Leis da Antiga Grécia”: “O conhecimento da legislação dominante ficou restrito às cidades-estados, principalmente Atenas e Esparta.”.4

Curiosidade: O Alfabeto fonético grego foi criado em 776 a.C., no mesmo ano da primeira Olimpíada.

As leis eram escritas em pedra, madeiras e no bronze, assim como faziam com os escritos de Filosofia, Literatura e História, mas esses últimos mereceram grande destaque por muito tempo entre os estudiosos da Grécia, esquecendo-se por sua vez do direito grego.

Somente em meados da década de 90 lembraram-se da existência de leis e buscaram estudá-las.

O primeiro país a se dedicar neste estudo foi a Grã-Bretanha e, é de lá que surge o estudo mais recente das leis gregas Recueil des Incriptions Juridiques Grecques, de Todd Reinach.

Não se deve desprezar o estudo aprofundado de nenhum sistema jurídico, pois de lá tiram-se a lições para não errarmos hoje e também é lá que se encontra o berço da maioria de nossos institutos jurídicos.

Assim concorda Carlos Maximiliano: “O que hoje vigora, abrolhou dos germes existentes no passado: O Direito não se inventa; é um produto lento da evolução”.5

Com o direito grego não é diferente. O leitor poderá vislumbrar páginas adiante a explicação do surgimento de muitos temas jurídicos da contemporaneidade. Ademais, informação que poucos sabem: o Direito Grego serviu de base para o Direito Romano. Demonstro a seguir.

Como tão bem assevera Fábio Cerqueira: “Habitualmente, considera-se a civilização romana como a matriz do direito moderno. Todavia, é na Grécia que ocorreu a revolução intelectual que gerou o conceito de um direito que valha de forma igual para todos os cidadãos.6

Não esqueçamos também que foi na longínqua Mesopotâmia que nascera os dois primeiros grandes códigos de leis do mundo: Código de Hammurábi e Leis de Eshnunna. No entanto, há sempre a propagação de Roma ter sido a mentora de todo o Direito. Realmente a sociedade romana foi de vanguarda e celebrou o direito para o mundo, mas devemos também dar crédito as outras civilizações.

A grande virtude da Grécia é a liberdade. O Direito Grego era objeto de alcance de todos, sem a menor interferência dos aristocratas ou sacerdotes.

José Cretella complementa dizendo: “Na Grécia antiga, pela primeira vez, o direito é objeto de profundos e específicas indagações filosóficas, deixando de ser privativo dos sacerdotes, dos monarcas e dos moralistas, para ser cultivado por filósofos e juristas.”7

Colaciono duas citações para sedimentar ainda mais a argamassa que edifica as bases de sustentação da importância do Direito Grego para a humanidade.

Paulo Dourado de Gusmão leciona:

As leis gregas, a partir do século VI a.C., diferenciavam-se das demais leis da Antiguidade por serem democraticamente estabelecidas. Não eram decretadas pelos governantes, mas estabelecidas livremente pelo povo na Assembleia. Resultavam, pois, da vontade popular. […] Lançaram as bases da Democracia. Devemos a eles o princípio do primado da lei, incorporado à Cultura Ocidental. A justiça, pode-se dizer, era a meta do direito grego, confundida sempre com o bem da pólis”8. (grifo nosso).


Em seu expediente, Clayton Reis, exclama:

A Civilização Grega foi, sem contestação, a mais marcante e expressiva de que se tem conhecimento na história do homem na face da terra. O sistema jurídico atingiu pontos culminantes com seus vigorosos pensadores. Pela primeira vez, na história da civilização, fala-se em democracia.”9

O Direito Grego influenciou em demasia a construção do tão celebrado Direito Romano.

Vários autores, alguns inclusive consagrados mundialmente, atestam que a Lei das Doze Tábuas foi inspirada em modelo jurídico grego.

José Rogério Cruz e Tucci escreve a esse respeito: “Teria, destarte, sido enviada a Atenas uma comissão constituída, ao que parece, por três membros (Spurius Postumius, Servius Sulpicius e Aulus Manlius), com o objetivo precípuo de estudar as leis de Sólon”.10

José Arias11 confirma a tese de Cruz e Tucci sobre esses três enviados para estudar as leis gregas.

Os professores Ralph Pinheiro e Helena Bekhor doutrinam que existiu um cidadão chamado Hermodoro e que este “era um grego, residente, na época, em Roma e sobre isto não se não há dúvidas; ele contribuiu, traduzindo a legislação de Sólon, que há de algum modo ter influído na elaboração da lex-decenviralis.12

Arnaldo Sampaio Godoy13, René Foignet14, Ugo Brasiello15, Michel Villey16, só para citar alguns, defendem peremptoriamente a ida de emissários romanos à Grécia com o fito de estudar seu sistema jurídico.

Para encerrar essa questão, cito dois grandes nomes que defenderam a ida de romanos a Grécia, para aprender lições, visando alicerçar seu ordenamento jurídico.

O inolvidável jurisconsulto cearense Clóvis Bevilácqua17, pai do Direito Civil Brasileiro, atestava sem receio que no ato de compilação das Doze Tábuas, o Direito Romano, com certeza usou como inspiração a legislação grega.

Por seu expediente, Theodor Mommsen, Prêmio Nobel de Literatura, declarava: “Em todos os ramos da civilização romana […] na legislação e no sistema monetário, na religião, na formação da lendas nacionais, encontramos traços das ideias gregas, e, particularmente, a partir do começo do século V.”.18

Aliás, obra esta supracitada, traduzida pelo imortal da Academia Brasileira de Letras, Antônio Olinto, cidadão esse, que este humilde escriba teve o prazer de conhecer pessoalmente por ocasião de um encontro nacional do mesmo sodalício19 em que fomos consortes.

Criou-se por um certo período a noção de que o Direito Grego não teve importância alguma para a História, nem serviu de modelo para nenhuma sociedade. Talvez essa noção tenha vigido por certo tempo por conta de alguns fatores, tais como: Não havia, pelo menos no início, a escrita do direito, apenas o direito falado, transmitido de pai para filho; os gregos não celebravam a matéria jurídica como fenômeno cultural da sociedade, tanto é que a figura do advocatio, por lá não se perpetuou, entre outros fatos que depuseram contra a imagem jurídica da Grécia.

Fustel de Coulanges confirma a historicidade do direito falado: “Parece mesmo que as palavras da Lei costumavam ser ritmadas. Aristóteles afirma que, antes que as leis fossem escritas, eram cantadas. Restam vestígios dessa prática na língua; os romanos chamavam às leis carmina, versos; os gregos nómoi, cantos.”20

Esse nómos grego inclusive é considerado fonte do direito grego, conforme veremos a frente.


2. DIREITO GREGO E SUAS CARACTERÍSTICAS

Os estudiosos chegaram ao consenso que o primeiro direito palpável na Grécia foi o chamado Direito Homérico.

O direito desta época era autoritário, não zelava pela isonomia e era existente apenas para promover e defender as realezas, seus parentes e indicados.

Foi neste período que se formou o direito na cidade de Gortina, talvez a primeira cidade a instalar um direito propriamente dito para equilibrar e disciplinar a vida entre cidadãos.

Gortina era uma cidade-estado situada na ilha de Creta.

Aristóteles e Licurgo foram exímios estudiosos dessa cultura jurídica. O primeiro usou as lições que aprendeu, em sua obra “A Ética e o Nicômaco”, e o segundo observou o modelo para escrever a sua Constituição da Esparta.

Depois a concepção jurídica foi se espalhando por toda a Grécia, chegando ao zênite em Atenas e Esparta.

O Direito crescia com algumas características marcantes: laico; sem grandes juristas para interpretá-lo; sua aplicação só ocorria quando comprovadas cabalmente a lesão; direito sem profissionalização, sem advogado, órgão de acusação, oficiais de cumprimentos etc.

O nascimento da ordem jurídica e, por conseguinte do direito, é reputado aos deuses.

Segundo Fustel de Coulanges, “os antigos afirmavam que suas leis tinham-lhes vindo dos deuses. Os cretenses atribuíam as suas, não a Minos, mas a Júpiter; os lacedemônios acreditavam que seu legislador não fosse Licurgo, mas Apolo”.21

De acordo com as gerações passadas, os deuses intervieram na Terra, trazendo entre suas aplicações, o conteúdo das leis. A crença atribuía a tudo que fosse Lei e costume, aos ensinamentos dos deuses, e por isso era bom.

Vale ressaltar que essa verdade também reinava entre os romanos, a ponto de ser um dos conceitos básicos da formação do direito local. Ressaltei isto em minha obra anterior:

O Fas provém do Direito falado dos deuses. Seriam normas legais faladas pelos deuses e transmitidas aos sacerdotes e pitonisas. O Fas é o direito falado, dito, revelado pela divindade que influenciava o Direito público e privado.22

Isidor Stone também demonstra conhecer sobre a tese do direito divino entre os gregos: “Para reforçar sua lição, Zeus diz também a seu mensageiro: “E torne lei, por mim ordenada, que todo aquele que não possuir respeito (aidos) e direito (diké) deverá morrer a morte de um malfeitor público”.23

Narra a lenda, segundo Protágoras que:

quando foi criado, o homem vivia uma existência solitária e não era capaz de proteger a si próprio e sua família dos animais selvagens mais fortes que ele. Consequentemente, os homens se reuniram para proteger suas vidas fundando cidades. Mas as cidades foram conturbadas por lutas, porque seus habitantes faziam mal uns aos outros por ainda não conhecerem a arte da política que lhes permitiria viver em paz juntos. Assim, os homens começaram a se dispersar novamente e a perecer. Zeus temia que nossa espécie estivesse ameaçada de ruína total. Assim, enviou seu mensageiro, Hermes, à terra, com duas dádivas que permitiriam aos homens enfim praticar com êxito a arte da política e fundar cidades onde pudessem viver juntos em segurança e harmonia. As duas dádivas de Zeus eram a aidos e a diké. Aidos é um sentimento de vergonha, uma preocupação com a opinião alheia. Diké significa respeito pelos direitos dos outros. Implica senso de justiça e torna possível a paz civil resolvendo as disputas através de julgamentos. Ao adquirir aidos e diké, os homens finalmente se tornariam capazes de garantir sua sobrevivência.”


O próprio Sócrates personagem principal deste livro, defendeu a suposta intervenção divina em duas citações:

O homem é um ser inteligente e só quem poderia criar coisas são seres inteligentes, portanto tinha de haver alguém mais inteligente que o homem para tê-los criado. Com isso também a sua sobrevivência pacífica. Seria isso os deuses”.

Mas sim para que obedeçam às leis; que enquanto se lhes mantiverem fiéis as cidades serão poderosíssimas e felicíssimas. Acho que foram os deuses que as inspiraram aos homens. Porque entre todos os povos a primeira Lei é respeitar os deuses”.24

Portanto, houve uma teocracia ou uma teonomia25.

Outro exemplo de tradição que implantou o direito também dessa forma ocorreu entre os judeus. Comentei isto em minha obra passada:

O povo ia se acostumando com a vigilância das leis e começava a se formar a ideia de um Estado judicial. É válido lembrar que a teocracia judaica era permeada por uma realidade jurídica, da qual Deus governava e ditava as leis, e era o principal juiz do povo.26

Atribui-se a Zeleuco de Locros o título de primeiro legislador da Grécia. Por volta de 650 a.C., este homem reuniu em um código todas as leis que vigiam àquela época, além de ter fixado penas para cada espécie de delito cometido. Antes qualquer delito, fosse leve ou sério, apenava-se com a mesma sanção.

Entretanto, a primeira legislação codificada que se tem notícia, foi encontrada em Dreros, ilha de Creta, por volta de 662 a.C.


3. FONTES DO DIREITO GREGO

A classificação se divide em duas raízes: a primeira são as chamadas fontes epigráficas, e a segunda são conhecidas como fontes literárias.

Entre as citadas fontes epigráficas estão todos os documentos (leis) tornados públicos pela sociedade elaboradora da norma, são escritos em pedra, bronze, madeira etc. Muitos desses escritos sobrevieram até nós.

Quanto as fontes literárias, essas nos chegaram quase que na suas integralidades e são conhecidas como:

* Discursos de oradores áticos, tais como: Antífonas, Lísias, Isareus, Isócrates, Demóstenes, Esquino, Licurgo, Hipérides e Dinarco;

* Monografias embrionárias de Constituições;

* Escritos de grandes filósofos, como por exemplo: Aristóteles e suas obras: “A Política” e a “Ética e o Nicômaco”; Platão e suas “As Leis”;

* Epopeias de Homero;

* Lei de Gortina e Lei de Dura;

E por fim, os escritos de Hesíodo, considerado o pai do termo “Nomos”.

Os mestres Vicente Bagnoli, Susana Mesquita e Cristina Godoy comentam que “O nomos era a fonte do direito. Esta noção foi pela primeira vez usada por Hesíodo, que tratava em seus escritos da justiça do camponês; contrapondo-se, portanto, a Homero, o qual apresentava em suas epopeias a justiça aristocrática”.27


4. CONCEITO DE JUSTIÇA

A definição de Justiça na Grécia variava de cultura para cultura, de cidade-estado para cidade-estado, de cidadão para cidadão etc

Por isso houve necessidade de se propagar pelo menos um consenso sobre o que é a justiça, aliás axioma este, que nem nos dias atuais conseguimos dimensionar.

Vou repassar o que descobri por justiça na Grécia, e para isso usarei novamente o método de citações.

Aristóteles pregava que “o homem, quando não aperfeiçoado, é o melhor dos animais; mas quando isolado da lei e da justiça, é o pior de todos”28

Percebe-se nesta sentença o quanto Aristóteles valorizava a justiça, a ponto de afirmar que o homem distante dela se torna o pior dos animais selvagens.

A educação espartana, conforme demonstrada no capítulo anterior era muito rígida e só visava a preparação do infante para as batalhas. A educação em Atenas e em boa parte da Grécia era totalmente paradoxal com a de Esparta. Era comum se cultivar as lições profícuas dos grandes escritores da época. O pai ensinava o filho os primeiros vocábulos por meio de símbolos, histórias, parábolas etc.

Todos nós em pelo menos um episódio na vida, fomos colocados para dormir com histórias da carochinha ou canções de ninar. Tenho certeza que muitos de nós ainda lembra aquela história que a mamãe contava, aquela canção que papai cantava, e por ai vai.

Assim, começávamos a aprender novas palavras, novas ações, sentimentos etc.

No célebre Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley, existe a figura da hipnopédia, sistema computadorizado que enquanto os bebês dormem, ficam escutando lições de aprendizado social da máquina. Coisas do tipo: “O Nilo é o mais extenso dos rios da África e o segundo em comprimento de todos os rios do globo”29

Pois bem, era prática comum entre os gregos ensinar aos filhos, lições sobre palavras ou costumes, por meio das histórias de seus heróis. Por exemplo, para ensinar o conceito de justiça, quase todo educador grego usava a estória de Odisseu, personagem mítica do grande Homero.

Isidor Stone assim explica:

Odisseu tenta encontrar uma criatura dotada de grande força, um homem selvagem que nada conheça de justiça ou de lei, os elementos básicos que caracterizam o homem civilizado.”.

E prossegue:

As palavras traduzidas como “justiça” e “lei” são dikas e themistas. Essas palavras são as formas plurais de diké e themis. No singular são termos abstratos: o primeiro designa costume, a lei ou a justiça, enquanto o segundo refere-se aos que é decente ou correto conforme o estabelecido pelo costume, a tradição ou o precedente. O que Odisseu encontra na terra dos ciclopes confirma suas apreensões. Ela não é organizada como uma comunidade. Cada um vivia solitário em sua caverna individual, úmida e fedorenta, com suas mulheres, seus filhos e seus rebanhos.”30


Destarte, os pais contavam aos filhos, para que os mesmos começassem a se interessar por justiça e lei, a fim de não passarem pelas mesmas privações dos ciclopes.

Na República, de Platão, duas personagens conversam acerca do direito e da justiça, e por fim concluem que a justiça é o interesse do mais forte, e que o direito, é quem empresta essa força.

De fato, podemos entender a justiça e o direito através do conceito de Trasímaco, personagem platônico citado na República. O Direito é uma força motriz que assegura a sociedade e ao cidadão como ente individual um leque de garantias e ressalvas. Uma vez conquistado esse “direito” há a perfeição de um ato concreto ou abstrato que tem um efeito ao qual denominamos de “justiça”, pois atendeu a todos os requisitos que a sociedade e o cidadão quiseram e precisam. Portanto, a justiça é o interesse do mais forte, porque o mais forte o é por conta de um atributo chamado “direito”.

Em Roma a justiça era lecionada como sendo um dos grandes conceitos básicos do Direito Romano, figurando ao lado do Jus, da Aequitas, da jurisprudentia, dos juris praeceptas e do fas.

A Justitia era a vontade firme e perdurável de dar a cada um o seu direito. No campo do Direito, praticar a justiça é encontrar-se perfeito.31

Cícero entendia que a “justiça, virtude por excelência, é senhora e rainha de todas as virtudes.”.32

Zeferino Rocha demonstra que Hesíodo, o poeta do campo e dos camponeses, foi um dos primeiros a hastear a bandeira da justiça:

Hesíodo se transformou num apaixonado poeta do direito. Deixando de lado a tradicional objetividade das epopeias, ele começa a falar, na primeira pessoa, e se torna o porta-voz de uma doutrina que maldiz a injustiça e enaltece o direito. […] somente quando é baseada no direito, a sociedade pode ser melhor. A deusa Diké, deusa da justiça, é, por, enaltecida e colocada ao lado de Zeus, o mais importante dos deuses.”33

E prossegue:

Foi a paixão pelo direito que levou Hesíodo a descrever, na Cosmogonia e na Teogonia, a origem dos deuses e do mundo dentro das coordenadas de uma ordem, que é, ao mesmo tempo, uma ordem cósmica e uma ordem ético-social. Há uma ordem na vida dos deuses, e é, por isso, que, apesar de serem imortais e onipotentes, eles também estão sujeitos à lei do destino.”34


Essa passagem me faz lembrar uma sentença de São Tomás de Aquino:

O Direito é um aspecto da ordem segundo a qual a sabedoria divina põe em movimento as forças da criação”.

E a persona principal deste trabalho, o que achava da justiça?

Escolhi uma passagem da vida de Sócrates para expor seu pensamento acerca da justiça.

A citação é retirada de sua biografia: “Aquele que conhece o bem faz o bem. Logo o entendimento justo leva à ação justa. E só o justo pode ser um homem virtuoso”.

Sócrates achava que quando o homem agia errado era porque não sabia o mal que estava fazendo, por ser néscio de sabedoria.

Por isso, era bom que existissem leis, ajudando assim, o homem a conviver em harmonia e justiça na sociedade.


5. IMPORTÂNCIA DA LEI

A Lei tratada por Rui Barbosa como tendo a marca maior: a proteção indelével do oprimido: “A característica da Lei está no amparar a fraqueza contra a força, a minoria contra a maioria, o direito contra o interesse, o princípio contra a ocasião.

Esta mesma “lei”, como instituto jurídico de prevenção e manutenção do Estado de Direito, também teve muitas homenagens na Grécia.

No ínicio era chamada de diké ou themis.

A diké ficou caracterizada na época Homérica e definia os direitos e deveres de cada um sob a tutela autoritária do chefe do genos (família ou sociedade).

Era proveniente desses chefes o surgimento das themistes, decisões emanadas da autoridade, com princípios e fórmulas mágico-religiosas que derivavam de Zeus.

A diké em seu expediente empresta a noção de ordem e equilíbrio entre o cidadão e a coletividade.

Era tão importante, que teve épocas onde os gregos tudo queriam regulamentar. Se não fosse por meio de lei, era ilegitima qualquer prática cidadã.

Arnaldo Godoy comenta que “Na Ilha de Creta, por exemplo, regulamentava-se responsabilidades de animais, propriedade dos mesmos, multas para aqueles que recebiam animais sob guarda e não os devolviam.”35

Entretanto, é mister que se comente que a aristocracia algumas vezes editou ou modificou leis apenas para o seu bem-estar.

Tal prática é peremptoriamente criticada por Zeferino Rocha:

As leis continuamente modificadas e revogadas de modo arbitrário justificavam a impressão daqueles que professavam um relativismo ético inteiramente subjetivo, o qual fazia as leis depender dos caprichos daqueles que eventualmente detinham o poder”.36

Por conta de tais expedientes, a sociedade se reuniu e instaurou duas armas potentes contra isso: o cargo de guardião das leis e a lei que disciplinava a criação de leis.

O Nomophýlakes, literalmente “guardião da lei”, tinha como tarefa supervisionar o respeito às leis. Em nosso ordenamento pátrio temos função semelhante com o Supremo Tribunal Federal que é o legítimo Guardião da Constituição Federal Brasileira.

Em Atenas, Andócides I, escreveu uma lei que validava as novas leis e decretos propostos:

As autoridades não tem permissão para usar uma lei não escrita, em caso algum. Nenhum decreto do Conselho ou da Assembleia deve prevalecer sobre uma lei. Não é permitido fazer uma lei para um indíviduo se ela não se estender a todos os cidadãos atenienses e se não for votada por seis mil pessoas, por voto secreto.”37

Essa lei também fazia a diferença entre lei (nomos) e decreto (pséphisma).

Demóstenes escreve acerca de uma lei que previa o reexame das leis, dando aos avaliadores (Assembleia) a faculdade de ratificar ou não a lei examinada.

No décimo primeiro dia da primeira tribo a presidir a Assembleia; tendo o arauto orado, a ratificação das leis procederá conforme segue: primeiramente as leis relativas ao Conselho, depois as leis gerais, em seguida aquelas relativas aos nove arcontes e finalmente aquelas relativas às autoridades”.38

A lei se tornou muito importante para a convivência social das cidades-estados, a ponto de fazer todo cidadão ser conhecedor das diversas leis, a fim de não macular o direito alheio.

Isidor Stone disserta que “A Lei impõe ao cidadão o dever elementar de conhecer a lei. Ele não pode esquirvar-se argumentando ignorá-la. Um das primeiras vitórias da gente comum em sua luta pela justiça foi obrigar a classe dominante a escrever a lei, para que todos tivessem acesso a ela e pudessem saber que lei estavam sendo acusados de violar.”.39

Interessante, na Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, encontramos dispositivo que dispõe o mesmo raciocínio: Todos devem saber das leis, e ninguém pode alegar desconhecimento.

Vejamos:

Art. 3º - Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.”

Teria o Direito Brasileiro importado a inteligência da legislação grega?

Na República, de Platão, a personagem Trasímaco lembra que “As formas de governo fazem leis visando seus interesses, determinam assim o que é justo, punindo como injusto aquele transgredir suas regras”.

Antes, ele havia dito que “a força é um direito, da qual a justiça é o interesse do mais forte”.

Assim como na Grécia, onde o cidadão propõe a lei e o Conselho e a Assembleia votam pelo seu provimento ou não, depois do exame. No Brasil ocorre a mesma equação, agora com fatores diferentes. Explico.

Aqui (no Brasil) somos nós que propomos as leis, mas com execeção da Iniciativa Popular, a maioria das leis é levada adiante pelos parlamentares que compõem o Poder Legislativo e, em algumas vezes, com funções atípicas, exercem este comando o Poder Judiciário e o Poder Executivo. No entanto, é o povo que faz as leis.

Assim preconiza a Constituição Federal, quando proclama:

Art. 1º - Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”. (grifo nosso)

Então quando um Deputado estiver na tribuna propondo um projeto, uma lei, uma alteração legislativa, somos nós que estamos exercendo esse poder, pois subentende-se que o elegemos para o ato.

Na Grécia também funcionou assim, logo, quando o governo cria a lei e determina o que é justo, é o povo que está dizendo isso através da Assembleia (Ekklesia) e do Conselho.

Mesmo assim, os sofistas eram contrários a qualquer espécie de legislação.

Segundo Arnaldo Godoy, os sofistas não entendiam o sistema explicado acima e por isso “criticavam as leis, que imputavam como a vontade dos mais fortes”.

Já para Demóstenes, quando a “lei é clara, recusa toda ação, já ocorridas a quitação e a desobrigação do compromisso anteriormente assumido”

Acompanhando o relator, Santo Tomás de Aquino, profundo estudioso da cultura helênica através de Aristóteles, disse que a “lei é eterna ou divina, natural e humana, é um princípio ético que não distingue moral direito e religião”.

Sócrates afirmava que “as leis são sagradas, e sagradas permanecem mesmo se os juízes chamados a interpretá-las erram”.40

O escopo principal desse pensamento Socrático é dizer que a lei nasce com fundamentação e espírito bom, e que independente de sua aplicação, ela jamais perderá a sua essência a sua imaculabilidade.

Curiosidade: As leis eram escritas em axones, tabuinhas de madeiras sustentadas por eixos giratórios.

Para Xenofonte, o filósofo explicou a justiça das leis.

Primeiro pegunta: “Conheces as leis do Estado?” Xenofonte responde: “Conheço-as”. Sócrates redargue: “Que são elas?” Xenofonte explica: “O que de comum acordo decretam os cidadãos estatuindo o que deve e o que não deve fazer-se”. Sócrates encerra: “Portanto, legal é o que se conforma com esses regulamentos políticos, ilegal o que os transgride”.41

Corrobora com tal pensamento o famoso brocardo romano: Jus est ars boni aequi. O Direito é a arte do bom e do justo.

Sócrates defendeu a lei até o momento final de sua vida.

Isidor Stone conta que Críton, um de seus epígonos, propôs a ele a fuga. Então, Sócrates recusou. Assim ele comenta: “Sócrates recusa-se a ser salvo. Diz que não retribuirá o mal com o mal. Recusa-se a violar a lei, mesmo para salvar sua vida ameaçado por um veredicto que considera injusto. Sócrates pede a Críton que imagine o que lhe diriam as Leis de Atenas se elas lhe aparecessem na cela para discutir a questão com ele.”.42


6. LEGISLADORES DA GRÉCIA

Antes já havia mencionado que reputa-se a Zeleuco de Locros, o título de primeiro legislador grego. Esse grande legislador teve seu reconhecimento consagrado quando editou uma lei proibindo a maledicência pública, vindo a ser a primeira norma regulamentando os exageros de expressão.

Porém dois nomes marcaram de sobremaneira a história jurídica grega; falamos de Drácon e Sólon.

6.1 Dracon.

Drácon ou Draconte, com equivalência em grego Drákõn, tornou-se um célebre legislador grego no século VII a.C.

No inicio, sua função era de ser um dos arcontes do Estado de Atenas. Por ser de família aristocrática, em 621 a.C. recebeu poderes extraordinários para desenvolver leis que amortecessem os conflitos sociais existentes desde o golpe de estado provocado por Cilón e o exílio de Megacles.

Confiado a ele a missão de codificar todas as leis orais, Drácon as escreveu uma a uma, findando assim com um grande código de leis rígidas e baseadas nas regras tradicionais arbitradas pelos juízes da época.

Ficou patente em seu código as mudanças que se originavam a partir do édito da nova legislação. Uma das mudanças radicais foi a transferência do direito de vingança para o Estado. Destarte, tornou-se proibido a conduta de fazer justiça com as próprias mãos.

Curiosidade: Em nosso ordenamento jurídico pátrio tal conduta também é proibida. Vide art. 345 do Código Penal.

A legislação desenvolvida por Drácon também ficou conhecida por ser a primeira a ter previsão de sanções a infrações contidas no bojo da lei. Sem dúvidas o modo de reunião das leis e por fim a codificação tornou-se marco de introdução ao direito penal contemporâneo.

O Código de Drácon ficou muito conhecido devido a sua rigidez quase sobre-humana, além de apenar todos os crimes sérios com a morte. Não havia meio termo na legislação draconiana, se o crime era sério ou não, só havia a punição da morte para o infrator. Nada de detenção ou sanção pecuniária.

Por isso até hoje o termo “draconiano” ostenta um peso imenso. Fala-se de draconiano quando a situação é muito dura, rígida, áspera, cruel etc.

O vocábulo “draconiano”, proveniente de Drácon, me faz lembrar o velho Drácula, personagem famosa criada por Bram Stoker.

O Escritor inspirou-se no príncipe romeno Vlad Tepes, nascido em 1431 e governante da Romênia, para criar a persona do tão famigerado e temido Conde Drácula.

Vlad Tepes ou Vlad III era conhecido por tratar seus inimigos com perversão. Mesmo não sendo um vampiro, como muitos aldeões romenos pensavam, sua crueldade alimentava o imaginário a ponto de se espalhar pela Europa sua fama de homem-morcego.

Por que o nome de Drácula foi associado ao príncipe Vlad?

Seu genitor o rei Vlad II, era consorte de uma fraternidade cristã romena, conhecida como Ordem do Dragão. Esta sociedade foi criada por ricos da região com o fito de juntarem forças para proteger o território romeno da invasão dos turcos otomanos.

Na fraternidade o rei Vlad II recebeu o epíteto de Dracul (dragão), e, por consequência, o filho Vlad III, passou a ser conhecido como Draculea (filho do dragão).

A partir de então, Draculea, como passou a ser chamado, tornou-se conhecido por sua perversidade e crueldade. Em uma ocasião, dois súditos emocionados com a presença do príncipe esqueceram-se de tirar o chapéu em reverência a sua chegada. Por conta disso, seus chapéus foram fixados com pregos em suas cabeças.

Outra lenda conta que Vlad avistou um aldeão com a roupa completamente suja. Se aproximou do homem e perguntou se o mesmo tinha esposa, o homem espantado disse que sim. Em seguida ele perguntou se a sua esposa era sadia, o homem novamente confirmou que sim. O príncipe então ordenou que localizassem a mulher do aldeão e mandou que decepassem ambas as mãos dela.

Era comum as inúmeras vezes que o conde Vlad ordenava aos seus soldados que trouxessem vítimas para serem empaladas em sua frente, enquanto ele devorava seu banquete. Alimentava-se risonho em meios a gritos de agonia.

Outro monarca que também tinha esse costume era Herodes.

O histórico de torturas na história do povo hebreu é enorme. O famigerado Herodes Antipas, tetrarca da Galiléia à época de Cristo, era especialista em torturar seus custodiados. Gordon Thomas comenta: “O tetrarca gastava horas assistindo homens e mulheres sendo não só marcados, mas também surrados com chibatas ou pendurados por ganchos com pesos fixados a seus pés, as solas só ligeiramente afastadas do solo”.43

Não pude evitar de comentar essa coincidência de nomes: Drácon e Drácula. Ambos rígidos e cruéis, um dispôs legislação nefasta e o outro executava vorazmente suas vítimas.

Curiosidade: Dracon também era o nome da grande serpente que atacou a deusa Atena e foi morta por ela. Atena matou e a jogou no céu onde a mesma transformou-se na constelação de Draco, ou Dragão.

Na legislação de Drácon tanto o furto como o assassinato recebiam a mesma pena: a morte.

Dêmades, político ateniense do século IV, certa vez asseverou: “as leis de Drácon foram escritas com sangue e não com tinta”.

Mas havia também dispositivos pitorescos, para não chamar de engraçados ou inócuos.

Pausânias relata que Teágenes tornou-se o grande vencedor dos III Jogos Olimpicos. Dois anos depois faleceu, mas em homenagem ao grande atleta, construiu-se uma estátua em sua reverência. Um inimigo de Teágenes, ia toda noite até a estátua e lhe chicoteava, na intenção de estar castigando o próprio atleta. Um dia a estátua caiu em cima do homem e o matou. A família processou a estátua, conseguiu a condenação e, por conseguinte, seu lançamento em alto mar, por conta de um artigo da lei draconiana que previa o banimento de objetos inanimados que caíssem e matassem pessoas.

Das duas, uma: ou era praxe chicotear estátuas de inimigos, fazendo com que as mesmas cedessem em suas bases e por fim caíssem lesando pessoas, ou então, Drácon quis inserir dispositivo hilário para aquebrantar um pouco a rigidez do código.

Sabe-se que o código draconiano ficou vigente por sete anos.

Curiosidade: Sabemos da existência do Código Draconiano graças a uma inscrição em pedra que sobreviveu até nossos dias. O primeiro artigo de sua legislação era: “Dever-se-á honrar os deuses e os heróis do país e oferecer-lhes sacrifícios anuais sem afastar-se dos ritos seguidos pelos ancestrais”.

Curiosidade 2: As leis draconianas possuem um papel importante na História do Direito, entretanto, não são as primeiras codificações de leis escritas como já se pensou. A primeira legislação escrita da humanidade é o código de Ur-Nammu, datado de 2040 a.C.

Curiosidade 3: Foi Drácon quem primeiro diferenciou o homicídio involuntário do homicídio voluntário e a legítima defesa.

Curiosidade 4: A legítima defesa que era chamada por Cícero de lei sagrada, lei não escrita, mas que nasceu com o homem, lei anterior aos legistas, à tradição, aos livros, e que a natureza nos oferece gravada em seu código imortal [...] lei pensada num perigo iminente, preparado pela astúcia ou pela violência, sob o punhal da cupidez ou do ódio, diante disso todo meio de salvação é legítima”.

6.2 Sólon

Trinta anos após a regência da legislação draconiana, surge Sólon, um homem do povo e para o povo.

Sob seu regime, Sólon cria um novo código de leis, além de promover reformas institucionais, econômica e social.

No campo da Economia, reorganizou a agricultura, fomentando a plantação de oliveiras e vinhas, visando a exportação de azeites e vinho. Criou também uma operação financeira ainda muito usada nos dias de hoje. Quem nos fala é Franco Massara:

Sólon inventou então aquela operação econômica que hoje nós diríamos “desvalorização da moeda”. Mandou recolher todas as moedas existentes, fundiu-as e cunhou outras mais leves no peso mas naturalmente maiores em quantidade; depois restituiu aos cidadãos conservando para cada moeda o valor nominal que possuía antes da fusão e... do aligeiramento. Os devedores viram as dívidas aligeiradas em 27 por cento e os credores consolaram-se com o aumento do número de moedas em cuja possessão reentravam. Em termos simples: tornaram-se todos mais ricos, ou menos pobre, do que antes.”44


No social, recomendou aos pais que ensinassem um ofício profissional aos filhos, e caso não fizessem, podiam ser abandonados pelos filhos na velhice. Eliminou as hipotecas e libertou todo escravo que estivesse nessa condição por dívidas. Atraiu muitos estrangeiros prometendo-lhes a cidadania.

Foi um avanço na cultura jurídica da Grécia a libertação do cárcere por motivos de dívidas.

Passou a ser lei “Nenhum homem livre, cidadão da mesma Atenas, poderá sofrer a humilhação da escravidão por dívidas.”45

Redação esta escrita na Athens Politican no capítulo 6, quadrante 1,9.

Curiosidade: A pessoa que era presa por dívidas era chamada de Katakeímenos.

Sólon ainda fez mais: alterou a estrutura funcional dos arcontes, do Areópago e da Assembleia, por fim criou também o Conselho da Bulé, ou dos quinhentos.

Mas seu maior engenho na seara jurídica foi ter criado a cultura e a permissão para o povo ter uma segunda Corte, onde podiam apelar as causas perdidas injustamente nos tribunais.

Aristóteles ressalta o regime de Sólon:

Ao que parece estas três constituem as medidas mais populares do regime de Sólon: primeiro, e a mais importante, a proibição de se dar empréstimos incidindo sobre as pessoas; em seguida, a possibilidade, a quem se dispusesse, de reclamar reparação pelos injustiçados; e terceiro, o direito de apelo aos tribunais, disposição essa referida como a que mais fortaleceu a multidão, pois quando o povo se assenhoreia dos votos, assenhoreia-se do governo.”.46


Para isto, criou o Tribunal dos Heliastas, Corte esta que podia ser acessada por qualquer pessoa que quisesse apelar das decisões tribunícias.

Curiosidade: Para Aristóteles, Sólon foi o fundador da Democracia.

Liderou também um censo, de onde retirou dados para dividir a sociedade de acordo com a renda de cada individuo, possibilitando assim, a ascensão social dos demiurgos.

Costumava pregar aos quatros ventos que o mal social era como uma doença contagiosa.

Certa vez, fez um discurso sobre os desatinos da sociedade:

Mas enriquecem persuadidos por ações injustas. Não poupando os bens sagrados nem os públicos eles roubam por rapinagem. E não preservam os veneráveis alicerces da justiça que, em silêncio, conhece o presente e o passado e com o tempo sempre vem para punir. Essa ferida inevitável já alcança a cidade inteira que depressa chegou à dolorosa servidão: São esses os males que grassam entre o povo: dos pobres muitos chegam à terra estranha, vendidos e agrilhoados com inadequados grilhões”.


Por tais façanhas, Sólon é considerado um dos sete sábios da Grécia Antiga.

Montesquieu era um admirador incontido da postura de Sólon como líder:

Sólon, que permitia em Atenas que cada qual deixasse seu próprio bem a quem quisesse, mediante testamentos, contanto que não existissem filhos, contradizia as leis antigas, as quais ordenavam que os bens ficassem na família do testador. Contradizia também as suas próprias leis, porque, suprimindo as dívidas, havia procurado estabelecer a igualdade.”47

Sólon não era apenas um grande homem de Estado e economista hábil, era também um poeta de traços profícuos.

Certa vez escreveu os seguintes versos sobre idade:


Sete anos depois do primeiro sopro, o menino muda todos os dentes;


Fortificado por igual período, mostra os primeiros sinais viris.


Em um terceiro, seus membros crescem, a barba surge em seu rosto incerto.


Depois de um quarto período igual, sua força e seu vigor alcançam o apogeu.


Quando se passam cinco vezes sete anos, o homem deve pensar em se casar.


Aos quarenta e dois, é bastante sábio para fugir de atos vis, estultice e medo.


Quando tem sete vezes sete anos, ao juízo, somam-se perspicácia e eloquência.


E mais sete anos de habilidade, elevam-nos à perfeição.


Quando esses períodos somam nove, embora enfraquecidas as faculdades resistem.


Quando Deus lhe concede dez vezes sete, o homem idoso se prepara para o céu.


A idade de setenta anos, que em nosso ordenamento jurídico prevê a aposentadoria compulsória, era citada na antiguidade como o marco final da vida de um homem. Aos setenta o homem tá apenas recomeçando a caminhar novamente por seus devaneios. É com setenta anos que o homem começa a entender que a flor apodrece mas o perfume fica.

A legislação de Sólon trouxe várias inovações.

Fustel de Coulanges dizia que “O código de Sólon é inteiramente diferente; vê-se que corresponde a uma grande revolução social. A primeira coisa que nele se nota é que as leis são as mesmas para todos. Não estabeleceu distinção entre o eupátrida, o simples homem livre e o teta. Sólon orgulhava-se, em seus versos, de ter escrito as mesmas leis para os grandes e para os pequenos.48

O Direito antigo preconizava que o filho primogênito sempre era o único herdeiro. A lei de Sólon revogou isso e afirmou em termos legais: “Os irmãos repartirão o patrimônio”.

Sólon cria a figura do testamento, algo que não existia na legislação grega e talvez em nenhuma do mundo àquela época.

Sólon modificou a lei que permitia vender a filha. Mudou, mas ressalvou que se a mesma tivesse cometido um delito grave, assim poderia ser vendida.

A lei de Sólon prescrevia que só podia acompanhar o cortejo fúnebre quem era da família.

Só era permitido enterrar o morto com até três vestidos, acima desse número era crime.

Suas leis chegaram a posteridade através das lajes de pedras talhadas que permanecem expostas na Acrópole, muito embora, algumas estejam mutiladas e deformadas.

Originariamente Sólon escreveu suas leis em tabuinhas de madeira. Com a invasão persa, todas as peças de madeira foram aniquiladas.

Sólon antes de morrer obteve o juramento do povo que durante o prazo de dez anos, suas leis não seriam revogadas nem modificadas.

O grande estadista morreu em 559 a.C., em Atenas, depois de ter viajado a Ásia quase toda e de ter morado no Egito.

Curiosidade: Segundo Diógenes Laércio49, Sólon nasceu em Salamina em 639 a.C. e durante a vida trocou várias correspondências com Tales de Mileto.


7. DIVISÃO DO DIREITO GREGO

Na visão de Michael Gagarin, o Direito Grego era dividido da seguinte maneira:

    1. Direito Criminal ou Penal;

    2. Direito de Família;

    3. Direito Público;

    4. Direito Processual.

O direito criminal cuidava dos homicídios, sanções penais, roubos, furtos, enfim, tudo que fosse enquadrado como infração penal àquela época.

O direito de família era constituído de lições sobre adoção, casamento, filiação, sucessão e tudo aquilo que envolvesse pátrio poder e família.

O direito público tratava as questões políticas, econômicas e religiosas.

E o direito processual disciplinava as espécies de procedimentos para salvaguardar os direitos, além de fornecer as regras dos tribunais.


7.1 DIREITO PENAL GREGO

No campo das ciências criminais, o mundo grego foi o primeiro a separar a sanção do sentido meramente religioso. Portanto, o entendimento foi mudado: o criminoso era apenado porque cometeu um crime contra a sociedade ou contra outro cidadão, e não mais porque afrontou a Deus. Cabe-nos ressaltar que a filosofia pré-socrática foi muito importante nos estudos da ética e do direito, auxiliando a mudança desse pensamento.

Platão lecionava que a pena era o principal ato de justiça, por onde se recuperava as vezes o delinquente, fazendo com que ele conhecesse a verdade e a justiça. Assim, ele chamou as sanções de “uma medicina da alma humana”.

Sabemos que no início, os assassinatos eram resolvidos por meio da vingança privada, ou seja a famosa vindita, a fórmula da troca de crimes entre famílias. Com o advento do Direito Penal Grego vieram também as conceituações, as classificações de crime e as penas previstas para cada infração cometida.

Homero defendia a pena como “fatalidade decorrente de um crime”.

Entre os crimes mais cometidos estavam o roubo, o sequestro, homicídios, crimes econômicos, lesão corporal, suborno e crimes contra a honra.

O roubo era considerado um dos piores crimes, pois o infrator cometia dois erros, o primeiro era cobiçar o alheio e o segundo ela lesar o direito de propriedade de outrem.

Em Atenas, o roubo era preconizado pela legislação vigente:

Se o bem roubado for recuperado, o valor da penalidade deverá ser o dobro do valor do bem; não sendo recuperado, será dez vezes maior, além da punição legal. O ladrão deve ser mantido no pelourinho por cinco dias e cinco noites, se o tribunal impor uma pena adicional. Aquele que desejar poderá propor a pena adicional, quando a questão for colocada.”50

 

O crime de roubo só era autuado pela autoridade mediante uma acusação pública denominada de graphé klopês.

Da aquisição do produto roubado surgia outro crime: a recepção.

No Direito Grego quem comprava produto roubado não era punido caso não fosse descoberto. A lei diz assim: “Se alguém comprar na Praça do Mercado produto roubado e mantiver consigo, não será punido e deverá mantê-lo. Se a vítima do ladrão encontrar o bem roubado na casa de outra pessoa, ela deverá pagar os danos.”51

O sequestro era visto pela sociedade grega como um excesso do normal. Em alguns casos havia o perdão judicial. Era muito comum jovens inebriados pelas lanças de Eros, deus do amor no panteão grego, sequestrarem belas jovens para desposá-las.

No entanto, havia o sequestro hediondo, voltado apenas em punir o sequestrado com o direito de locomoção.

A lei que falava do sequestro preconizava:

“descoberto o cativeiro, se o cativo for homem livre, o juiz multará em dez estáteres, se a parte contrária for escrava, cinco estáteres, e ordenará libertar o cativo em um prazo de três dias. Se o autor da captura ilegal morrer durante o julgamento, seus herdeiros pagarão multa simples.

Como podemos ver, a única sanção para o sequestrador era a multa.

A lesão corporal era uma prática comum no antigo mundo grego. Esposos em mulheres, pais em filhos, patrões em escravos, juízes em condenados...

Mesmo assim havia previsão de crime para esta prática, bem como a sanção por seu exercício.

“Se causar ferimento com a mão, terá de pagar cinco dracmas; se escorrer sangue do nariz […]52 e se alguém der começo a uma briga, terá de pagar dez dracmas embora tenha começado […] dias em que tem de pronunciar-se, mas não depois. […] se alguém desfere um golpe em defesa própria, não será levado a juízo […] para cobrar multas do que infligem danos.”53

A ação contra lesão corporal chamava-se díke aikeías.

A prática do suborno era rarissíma, porém acontecia em algumas situações. A corrupção não é um privilégio das autoridades tupiniquins.

A lei ateniense era clara:

Se um ateniense aceita suborno, ou se ele mesmo a oferece a um outro (ateniense), ou corrompe alguém com promessas em detrimento das pessoas ou de qualquer dos cidadãos individualmente, por quaisquer meios ou dispositivos, será destituído de seus direitos, ele e seus filhos, e sua propriedade será confiscada.”54


E havia a disposição direta para cada espécie de autoridade: juízes que aceitam subornos eram processados com fulcro na lei Athens Politican 54.2; membros da Assembleia eram autuados com base na lei Deinity II, 17; Jurados, Advogados e Oradores na mesma lei no capítulo XLVI, 26.

Os membros do Tribunal Heliasta faziam juramento antes de tomarem posse, e uma das cláusulas desse juramento era expresso no sentido de repudiar o suborno.

O falso testemunho também era combatido na Grécia, muito embora não nos tenha chegado leis que expressem essa vedação.

É possível que fosse reprimida nos moldes do Direito Hebreu: o falso testemunho era castigado veementemente e sua tipificação se dá no capítulo 5, do livro Levítico da Biblia Sagrada: “se alguém for chamado como testemunha, mas não disser aquilo que viu ou que ouviu falar, então será culpado e merecerá castigo”.55

Parece que esse castigo era uma multa. Segundo uma lei da pólis de Estínfalo, situada na região do Peloponeso, que comenta o falso testemunho preconiza: “Se alguém acusar outra pessoa por falso testemunho deverá primeiramente levar ao tribunal a pessoa que deu o falso testemunho, segundo o acordo. Se a pessoa que deu o falso testemunho fracassar no tribunal, deverá pagar a metade da penalidade.”56

Na seara dos crimes econômicos, o leque era pequeno, havia muita sonegação de tributos, além de uma ou outra infração relativas a empréstimos marítimos.

Geralmente o devedor financeiro acabava sendo vítima do fenômeno chamado de aponia.

Aponia era o estágio onde o falido, tornado insolvente chegava. Para nós o fundo do poço, para alguns o inferno de Dante.

Paul Millet explica a aponia:

o homem atingido pela aponia não sentia vergonha por ficar além das cercas de uma sociedade decente por meio de reiteradas contravenções para com normas socialmente aceitas. Dada a natureza da sociedade ateniense, alguns desafortunados eram presos e terminavam como estalajadeiros, servos, trabalhadores de bordéis; mas apenas uma pessoa com personalidade forte desertaria”.57


Aquele que “desertava” era tido com um verdadeiro estelionatário.

Os homicídios, não precisamos nem tecer maiores comentários, também eram previstos como crimes e punidos de acordo com a legislação.

Chegavam até certo ponto, práticas comuns, uma vez que o grego tinha a liberdade concedida pelo Estado de portar armas no cinto 'para cima e para baixo'.

O homicídio de proteção, como era chamado, não era punido. Exemplo: Se alguém roubar uma casa a noite, sendo morto por uma vigia ou pelo dono, este não será apenado.58

Isidor Stone comenta que “o cidadão armado não apenas defendia a liberdade da cidade como também podia usar armas para defender sua própria liberdade”.59

O Direito Grego prestava de sobremaneira guarida à honra do cidadão. Já havia em seus compêndios legais, normas que tipificavam as condutas danosas a honra do cidadão e da família.

A conduta de causar vergonha e densonra a qualquer cidadão da Grécia era chamado de hýbris.

A lei prescrevia: “Se alguém cometer Hýbris contra alguma pessoa, seja uma criança ou mulher ou um homem, livre ou escravo, ou cometer qualquer ato ílicito contra qualquer dessas pessoas, qualquer ateniense elegível que deseje pode acusá-lo aos thesmothétai e os thesmotthétai devem apresentar o caso dentro de trinta dias a partir do momento em que a acusação for submetida ao tribunal. Qualquer pessoa que for considerada culpada, o tribunal deve decidir imediatamente a pena que ela merece sofrer ou pagar.”60

De acordo com a eminente doutrinadora Viviana Gastaldi a “Hýbris é um atentado à honra e à prosperidade, que tem como sanção somente a reprovação da opinião pública. O termo compeende também a ideia de ato ilícito religioso, como o delito de traição, ou qualquer ação contrária à segurança social.”61

Curiosidade: Nos séculos VII e Vi a.C. Hýbris era toda e qualquer injustiça, e se aplicava bastante nos delitos de sacrilégio, adultério, incesto, violações às hospitalidades, ofensas a mortos e parentes e injúrias verbais. Só depois com o avanço cultural o emprego de “injustiça” passou a ser como adikía.

A hýbris abrangia o que o nosso Código Penal prescreve por Calúnia, Difamação e Injúria, e outras condutas típicas da época.

A calúnia que Cesare Beccaria roga para que seja apenada com o próprio castigo que se aplicaria ao acusado se fosse verdade a notícia do crime. “Contudo, todo governo, seja republicano ou monárquico, deve aplicar ao que calunia a pena que inflingiria ao acusado se fosse culpado”.62

Já a Difamação, esta também podia ser vislumbrada na Grécia. Inclusíve, o grande Demóstenes defendeu cliente acusado de kakegoria, ou seja, falar mal dos outros.

Stone conta:

Uma causa particular defendida por Demóstenes, cerca de meio século após a morte de Sócrates, revela que fazer comentários depreciativos a respeito da origem humilde ou da profissão de uma pessoa era, na Atenas da época, uma infração à lei contra kakegoria(falar mal), que cobria diversas formas de difamação.”63


O grande causídico Demóstenes patrocinou a causa e obteve vitória, provando ao fim, que o acusado não havia cometido o crime de kakegoria, e que tudo não havia passado de um simples “problema de dicção”. Logo ele que era gago, vencer a causa assim. Gago, porém o maior orador da Grécia e de todos os tempos.

A prostituição era criminalizada na Grécia, não só a feminina como também a masculina.

A mulher que era flagrada se prostituindo, dificlmente era conduzida ao tribunal. Agora os homens eram duramente apenados. Contra a prostituição masculina havia legislação inteira.

Umas das leis preconizava:

Se qualquer ateniense se prostituir, não terá permissão para se tornar um dos nove arcontes, para exercer qualquer sacerdócio, para atuar com advogado do povo ou exercer qualquer ofício, em Atenas ou outro lugar, por sorteio ou por votação; não terá permissão para ser enviado como arauto, para fazer qualquer proposta na Assembleia do povo e em sacrifícios públicos. Qualquer pessoa que, tendo sido condenada por prostituição, desobedecer a qualquer dessas privações, será condenada à morte.”64


Era praticamente um dejeto na sociedade. Para o homem ficar sem ir na Assembleia ou deixar de laborar em algum ofício, era praticamente a morte anunciada e, para piorar, se descumprissem uma dessas vedações, seria condenado diretamente à morte. Qual seria a melhor forma de morrer, era a grande escolha que o prostituído tinha que fazer: Morrer socialmente ou morrer.

Falando em condenação à morte, essa era uma das penas previstas no ordenamento jurídico grego. Já feitas as consideraçoes pertinentes aos crimes mais cometidos em plagas gregas, devemos passar agora aos comentários sobre as sanções.

Antes, faz-se mister asseverar que no passado as sanções eram determinadas e executadas pelos familiares ou pelo próprio ofendido, numa clara exasperação pessoal tão bem consubstanciada em nosso Código Penal como exercício arbitrário das próprias razões, art. 345.

Platão foi o primeiro a diferenciar vingança de justiça:

“a primeira é individual ou tribal, a segunda é da cidade; a primeira é incivilizada e improdutiva, porque olha para o passado e só pretende causar dano, a segunda é razoável porque olha para o futuro e tenta ensinar a virtude.65

Na sociedade homérica, o desrespeito às regras leva-se a uma sensação de auto-culpa, onde o indivíduo que pratica um delito sente-se oprimido pelo temor e pela angústia. Essa era uma espécie de sanção baseada na vergonha e na inadequação social, ao qual os gregos chamavam de aideomai. Segundo Viviana Gastaldi “é por isto que, no mundo homérico, os heróis transferiam seus atos reprováveis aos deuses”.66

As sanções eram divididas em:

* Prisão;

* Multa;

* Tortura ou castigo corporal;

* Ostracismo;

* Pena de Morte;

* Atímia.

A detenção no direito grego tinha dois formatos; dois viés. O primeiro era a forma disciplinar de punir o infrator, geralmente o devedor, deixando esse por meses ou anos em cadeias fechadas, libertando-o no final da pena prevista na condenação. O segundo era o viés acautelatório, ou prisão em manutenção como era chamado pelos gregos. Era a prisão por qual passou Sócrates, esperando o dia para cumprir a execução de sua pena de morte decretada em julgamento.

Roma também dispunha da prisão com duas aplicações: prisões de acusados sob investigação e prisão depois de pronunciadas as penas de morte, aguardando apenas a execução.67

Curiosidade: Na Grécia antiga quem cometia crimes ficava sob o efeito do miasma, efeito este, que fazia todos rejeitarem sua presença ou companhia. As prisões eram bem afastadas da cidade por esse motivo, pois o condenado deveria passar antes por uma purificação, e só depois poderia voltar a circular em ares citadinos. Hodiernamente, nossas cadeias também são feitas em locais distantes e ermos, sabemos que é mais por segurança, mas será que não tem embutida ai uma tradição que remonta milênios? Deixar o individuo se purificando e evitando a população de sua presença desagradável por perto?

Franco Massara nos oferta uma breve descrição das possíveis prisões daquela época: “As celas, talhadas em grossos blocos de pedra e instaladas no subsolo eram esquálidas e úmidas; o prisioneiro ficava longas horas amarrado por grossas correntes, como um animal; o enxergão, sórdido e incômodo; de inverno o frio era de rachar, de verão o calor sufocante.”68

Viviana Gastaldi comenta que “no que concerne à prisão, convém salientar inicialmente que nunca se tratou de uma penalidade estabelecida pela lei. Os gregos emprobrecidos que não podiam pagar suas multas ficavam na prisão durante determinado período, até que pagassem suas dividas.”69 entre outros motivos que cabia a prisão.

Por nossa experiência em civilizações antigas e seus direitos, podemos dizer que tratava-se de prisão rudimentar, talvez em pequenos edifícios erigidos para este fim, ou quem sabe até em fendas nas grandes rochas da região.

Em nossas pesquisas, nos depararamos com descrições de quase todos os prédios importantes da Grécia, tais como prédio do Fórum, Ágora, prédio do arquivo situado na stoal sul da Ágora, grandes mercados, portos etc, mas nenhuma menção descritiva de como seria a cadeia pública de Atenas ou qualquer outra cidade-Estado.

No diálogo Fédon, encontramos com certa riqueza a descrição da cela de Sócrates, mas poucas informações sobre o local de prisões.

De sorte que, podemos afirmar que havia as duas espécies de detenção supracitadas, porém não há maiores verbetes sobre o restante.

Havia também a previsão sancional de multa.

Muito usada como pena acessória, o arbitramento de multa era efetuado sempre que havia alguma ofensa civil de cunho indenizatório ou quando vinha acompanhada de uma sanção principal, ex: castigo corporal e multa, pena de morte e multa, atímia e multa.

Curiosidade: a poiné era uma composição pecuniária resultante de um pacto entre as partes litigantes num processo. Geralmente, a poiné vinha em substituição a vindita70,servindo ao menos, para honrar o morto. O vocábulo poiné quer dizer: valorização, honra, pagamento.

A multa também era aplicada para aqueles que buscavam a guarida jurisdicional, porém não conseguiam provar suas alegações. Como meio de desestimular a busca desenfreada dos tribunais, criou-se a multa pelo não comprovação das alegações.

Franco Massara comenta: “pagava-se multa frequentemente elevada quando o acusado era reconhecido inocente ou quando o acusador não obtivesse pelo menos um quinto dos votos favoráveis à sua tese.”71

Aristófanes escreveu uma peça teatral com o título de As Vespas, onde retratava a mania compulsiva que o grego tinha de litigiosidade em tribunais.

Na sua peça As Nuvens, ironicamente ele diz “Não acredito, pois não vejo os juízes sentados no tribunal...”

Ele queria dizer que era mais fácil enxergar cidadãos gregos nos tribunais diuturnamente do que os magistrados que deviam comparecer para julgar.

Nos diálogos socráticos encontramos duas menções a multas que chamaram nossa atenção:

Nos Memoráveis III, Xenofonte discorre acerca de Críton, cidadão bastante conhecido em Atenas. Certa passagem, ele comenta que os sicofantas72 estavam perseguindo Críton e que por isso o mesmo denunciou-os ao tribunal pedindo que fossem punidos com castigo corporal e multa.73

A segunda passagem é bastante conhecida e acontece no próprio julgamento de Sócrates, onde o mesmo no final de sua defesa propõe a condenação em uma ínfima multa.

A tortura ou castigo corporal também era uma modalidade de pena.

Conforme demonstrado acima em citação sobre multa, o castigo corporal também era uma espécie de sanção, acessória ou principal.

Rogério Leal comenta que “empregam muitas vezes a tortura como método político de constragimento judicial, enquanto pena.”74

Sobre esse expediente já comentamos antes que: O crime de tortura tão bem rejeitado por nossa Carta Magna, em seu artigo 5º, inciso III, era costumeiramente praticado na antiguidade.75

Devemos afastar de qualquer forma de pena ou meio para obter informação o uso da tortura. O emprego dessa prática é nefasto, hediondo, cruel e sanguinolento.

A tortura na Grécia era efetuada de várias maneiras, uma delas era com uma vara pequena que possuía cordinhas de couro com pedacinhos de ossos de animais nas pontas. O desejo era rasgar a pele do torturado causando-lhe dor pelos milhares de ferimentos, a maioria nas costas.

A outra maneira era com o afogador. Prendia-se o pescoço dos criminosos com a golilha para impedir que engolissem alimentos ou objetos de valor. Dessa maneira iam definhando até não suportarem e morrerem.

A próxima sanção é a mais famosa do Direito Grego. Estamos falando do Ostracismo.

Clístenes, estadista ateniense, instituiu o ostracismo. Através de uma votação, os cidadãos decidiam se exilava ou não aquele que se revelava uma ameaça às liberdades estatais. A votação era feita mediante a inscrição do nome do suspeito em conchas chamadas ostrakon.

O cidadão suspeito que tivesse a marca de seis mil votos era exilado da cidade por até dez anos. Esse exílio de dez anos afastava totalmente o apenado da cidade e do território comandado pelo governo, porém a pena não dissipava o direito de propriedade do exilado, que quando voltasse, se voltasse, teria direito a recuperar os bens que deixou antes do exílio.

Era comum, suspeitos serem expulsos da cidade com uma enorme margem de votos, isto porque, a maioria não sabia escrever, tampouco ler, e por isso já compravam as ostras (ostrakon) com nomes já escritos. Quem tivesse muitos inimigos vendedores das cédulas de votação, com certeza estava fulminado naquela votação.

O início dessa sanção visava áqueles que queriam tomar o poder democrático a partir de eventos tirânicos, aliando-se a tiranos e déspotas.

Há historiadores que frisam “no ínicio era para conter os abusos de poderosos, só que depois virou instrumento de tirania popular, quem não fosse bem visto era exilado”.

Além de expulsar politicos corruptos ou tiranos, o objetivo do ostracismo também era banir os agitadores ou sediciosos, evitando assim, guerras intestinas, e, por conseguinte, perda do comando da cidade.

Segundo Moses Finley “Em uma sociedae que depende da comunicação verbal, o método mais eficaz para a censura, com exceção da pena de morte, é o da expulsão da comunidade.”76

Curiosidade: No Direito Romano que vigia à época da República, havia uma lei que previa ao cidadão passível de uma condenação capital, a possibilidade de antes do julgamento ou antes do cumprimento da pena, rogar aos juízes que dessem a ele o exsilium, isto é, sair da cidade de forma voluntária e nunca mais voltar a pisar os pés naquele território77.

Curiosidade 2: Abandono noxal, era esse o nome dado aos familiares que viravam o rosto àqueles que cometiam crimes. Antes quando alguém cometia um crime, seus familiares (oikos) se juntavam a ele para defender-lhe, depois os parentes passaram a ignorar, surgindo assim, o abandono noxal, embrião de nossa responsabilidade civil pessoal.

A sanção de ostracismo não permitia a ampla defesa, nem o contraditório, em suma, foi votado por seis mil cidadãos? Exílio imediato!

Rodrigo Gallo informa que: “As ostrakas encontradas pelos arqueólogos mostram que nenhuma pessoa pública de Atenas ficou livre da desconfiança do povo: algumas peças mostram até mesmo Péricles apontado como possível candidato à expulsão, embora nunca efetivamente tenha ocorrido”.78

O célebre historiador M. Rostovtzeff descreve um dos casos mais emblemáticos de ostracismo: “Foi um escândalo quando Alcebíades quebrou o costume e adornou a parede de sua casa com pinturas. Atenas era uma democracia e os ricos temiam tornar-se conspícuos pela exibição ou extravagância […] Tempos depois, o estratego ateniense foi julgado e condenado, mas desertou antes de ser capturado, buscando exílio em Esparta”.79

O primeiro apenado por ostracismo foi Hiparco, conhecido como o “amigo dos tiranos”.

Curiosidade: O primeiro processo de ostracismo condenando o político Hiparco só foi efetuado depois de vinte anos do surgimento da referida sanção.

Curiosidade 2: Entre os que foram apenados estão os conhecidos: Tucídides, famoso estratego que lutou contra os espartanos na Guerra do Peloponeso e o Almirante Temistocles, grande herói nas guerras pérsicas.

Fídias, o ilustre escultor da cidade de Atenas, criador do projeto arquitetônico do Partenon, desenhista e executor da grande estátua de Athenas Partenon, foi ostracizado. Não conseguiu se defender das acusações de desvio de verbas para a construção do Partenon e foi condenado por sete mil e trezentos votos.

O importante General Arístides foi exilado em 483 a.C. Um dos cidadãos votantes se aproximou do general e disse: “estou votando a favor, porque não aguento mais ouvir o nome de Arísitides, o Justo.”

O Filósofo Paulo Levorin80 opinou: “O ostracismo era uma instituição marginal, pois não tinha características essencialmente democráticas. Qualquer democracia poderia viver sem isso.

Curiosidade: Não passou do número de quinze ostracizados na Grécia.

Passamos agora ao comentários sobre a sanção mais nefasta do ordenamento jurídico grego: a pena de morte.

A pena de morte era usada a priori para crimes muito sério, onde a incolumidade citadina não estivesse sob eminente perigo. No entanto, segundo relato de Xenofonte em defesa a Sócrates, encontramos menção deste historiador sobre pena de mortes em crimes menores, vejamos:

Socrates merecia de nossa cidade não a morte, porém, honras. Julgai o fato à luz das leis e haveis de concordar comigo. Passível de pena de morte, segundo as leis, é quem for surpreendido roubando, furtando roupas, cortando bolsas, arrombando paredes, vendendo seus semelhantes, pilhando templos.” (grifo nosso)


Não nos parece, que a aplicação da pena de morte fosse usada em todos esses casos, alguns até banais, porém conforme sublinhado, Xenofonte se refere a lei como norteadora da conduta de apenar a morte nesses casos.

A pena de morte aos mais abastados era executada por meio de uma bebida a base do suco de planta venenosa (cicuta), citamos como exemplo o caso estudado neste livro: o Julgamento de Sócrates.

Aos mais humildes financeiramente a execução se dava através de aprisionar braços, pernas e pescoço com robustas braçadeiras de ferro em placas de madeira, fazendo com que, os condenados morressem de fome e sede. Essa pena foi aplicada aos revoltosos da Ilha de Samos por Péricles.

Outra forma de morte muito nefasta se dava por meio de amarrar a pessoa em uma roda, enquanto em cada volta no eixo seus membros iam sendo arrancados. Chamava-se pena capital de trochisteisa.

Curiosidade: Mársias, flautista, começou a rogar para si o título de o maior flautista do mundo. Destarte, irritou o deus Apolo, deus da música e das artes, que o julgou e o condenou a morte por Esfolamento.

De acordo com Olney Queiroz Assis:

Na sociedade de classes, desde os gregos e mesmo antes deles, a forma de reparar a ofensa sempre esteve submetida ao prestígio fundado na riqueza e na honra das pessoas. Em Roma, a Lex Julia […] A pena contra culpados quando de condição nobre é o confisco da metade dos bens; quando de baixa extração, é a pena corporal com o relego”.81


Aplicava-se constantemente a pena de morte nos casos de asebeía82, crime este ao qual foram acusados Sócrates, Protágoras e Aspásia.

A pena de morte, ainda tão polêmica, suja as egrégias páginas da história com sangue de pessoas, em alguns casos, até inocentes.

Hannah Arendt anota que os Hebreus “sempre sustentaram que a própria vida é sagrada, mais sagrada que tudo mais no mundo”. Mas nem isso, conseguiu impedi-los de incentivar a morte do Cristo.

O grande criminologista Cesare Beccaria defendia intrasigentemente a não aplicação de execuções que findavam com a morte. Em sua ínclita obra Dos Delitos e das Penas, o jurista italiano chama à atenção: “Não é absurdo que as leis, que são a expressão da vontade geral, que detestam e punem o homicídio, autorizem um morticínio público, para afastar os cidadãos do assassínio?”.83

Realmente, se formos pensar amiúde, o pensamento de Beccaria, como não poderia deixar de ser, é um peróla para adornar os pescoços daqueles que hasteiam a bandeira a favor da vida acima de qualquer fato.

Aliás, bandeira esta, defendida por Roma, em momentos de lucidez republicana ao qual passou: “nemini mortem irrogare, quanvis pessima merito” - não condenar ninguém à morte, nem mesmo pelo pior delito.

Outro inolvidável jurista, Enrico Ferri, um dos maiores advogados de todos os tempos, pautava o seguinte raciocínio: “só reconhecemos esse direito nos casos de legítima defesa e de necessidade. Só em tais casos o homem tem o direito de matar, para se salvar de uma agressão injusta ou de um perigo indeticamente irreparável”.84 (grifo nosso).

Nenhum juiz deve com a força de sua pena, enviar cidadão a se encontrar com o fenômeno da morte. Detenham-no, e deixem que a natureza faça o seu papel.

Segundo Franco Massara “a cicuta tinha um gosto muito amargo insuportável” e o seus efeitos são descritos no caso de Sócrates assim: “o que tinha lhe dado a poção começou a apalpá-lo e a examinar-lhe os pés e as pernas; num certo momento apertando-lhe fortemente o pé perguntou-lhe se sentia. Sócrates respondeu que não. O homem então afirmou que quando o efeito chegasse ao coração, então não havia mais um corpo animado alí.”.85

A poção preparada tinha a exata quantidade de veneno para tirar a vida do condenado.

Platão no diálogo Fédon relata que Sócrates pediu para fazer a libação86, então o guarda que trouxe a bebida disse: “Só sei, Sócrates, que trituramos a cicuta em quantidade suficiente para produzir seu efeito, nada mais”.87

Com pena similar e execução idêntica a de Sócrates foi apenado Aristogitão, admirador das conversas filósoficas entre mestres na Ágora.

Retorno a Beccaria expondo duas citações de extrema relevância:

Como conciliar tal princípio com a máxima que proíbe o suicídio? Ou tem o homem direito de suicidar-se, ou não pode passar tal direito a outrem nem à sociedade toda […] não deve existir qualquer necessidade de tirar a existência de um cidadão, a não ser que a morte seja o único freio que possa obstar novos crimes”.88

Convenhamos, as infrações cometidas por Sócrates, não davam respaldo para ele ser condenado à morte. Nenhuma das imputações restou provada, e se tivessem sido, não são passíveis de morte, pelo menos, na nossa opinião.

Curiosidade: A legislação previa que o cadáver só podia ser enterrado após ser lavado. Caso isto não ocorresse, quem tinha o dever de fazer e não fazia, era punido com a decepação das mãos. No caso de Sócrates, o mesmo efetuou seu banho: “Creio que ainda me resta tempo para um banho. É melhor, segundo me parece, lavar-me antes de tomar o veneno e não deixar para as mulheres o trabalho de lavar meu cadáver.”

Curiosidade 2: Não podia haver execução em dias considerados sagrados. Por exemplo: Sócrates teve que esperar trinta dias antes de ser executado com a cicuta.

Foi obrigado a viver ainda trinta dias após o julgamento, porque precisamente nesse mês se realizavam as festas de Delos e proíbe a lei executar qualquer condenado antes do regresso da teoria délia89”.90

Havia também a ação de probolaí, que tinha como disposição os seguintes dizeres: “ninguém tem permissão, durante esses dias, para sequestrar os bens ou se apropriar de alguma coisa de outra pessoa, por débitos em atraso.91

E por fim, a sanção denominada atímia.

Essa modalidade de pena previa a perda total ou parcial dos direitos civis. A perda total geralmente era aplicada aos condenados por crimes como: roubo, corrupção, falso testemunho, vadiagem e ociosidade. A parcial deixava o cidadão com capacidade reduzida nos termos da sentença. Por exemplo: Minarete ficará dez anos sem acessar o Templo de Diana ou Isófoles durante cinco anos não poderá votar na Assembleia.

Curiosidade: No início, bem nos primórdios do povo grego, a atímia condenava não somente o infrator como sua família inteira. O infrator apenado com a atímia tinha que fugir rapidamente para evitar a lapidação, escárnios e golpes em seu corpo. Sua casa era tomada e quando o apenado morria seu corpo não podia ser enterrado.

Curiosidade 2: Os nomes dos apenados por atímia eram gravados sobre o mármore ou o bronze para durarem anos e assim fazerem os descedentes se envergoram por décadas e décadas.

A Atímia assemelha-se muito a nossa pena restritiva de direitos, preceituada no art. 43 do Código Penal Brasileiro, in verbis:


Art. 43. As penas restritivas de direitos são:

V - interdição temporária de direitos

Curiosidade: A atímia no período homérico era chamada de demou phêmis.

Na visão de Viviana Gastaldi o apenado por atímia “desaparecia da vista de sua comunidade e a pena demandava que a cidade esquecesse de quem tinha cometido a injúria […] o atimos chegava a ser um homem invisível.”92

Uma outra sanção rarissíma e talvez só utilizada em épocas arcaicas era a lapidação. Este meio de sancionar como pena principal ficou esquecida nos primórdios da Grécia, porém, vez ou outra era resgatada e executada.

Heródoto narra um desses dias:

Lícides, um membro da boulé, manifestou que, na sua opinião, o melhor era aceitar a oferta que lhes apresentava Muríquidas e submetê-la à consideração do povo. Esta foi, em definitiva, a opinião que expressou Lícides, seja porque na realidade tinha recebido dinheiro de Mardônio ou, simplesmente, porque a solução lhe parecia oportuna. Os atenienses, porém, imediatamente se encolerizaram – tanto os da boulé quanto aqueles que se encontravam fora, quando souberam – e, rodeando Lícides, o atacaram a pedradas.”


Viviana Gastaldi complementa: “certo é que a lapidação era um castigo pouco frequente entre os gregos, somente aplicável em casos extremos, tais como a prodosia (ou seja, delitos que afetavam a vida externa e interna do Estado).”93

Antes de passarmos ao exame do próximo ramo jurídico, transcreverei o modelo ideal para Platão no que concerce as sanções e o direito penal.

No caso do ladrão, inclusive, tenha ele furtado uma grande coisa ou pequena, promulgaremos uma única lei e uma única punição legal para todos indiscriminadamente. Em primeiro lugar terá que pagar o dobro do valor do artigo furtado se perder seu caso e possuir bens suficientes acima do lote para pagá-lo; se não tiver condições para tanto, será aprisionado até conseguir pagar a

soma.”


O exemplo de apenar o criminoso era o buscado na Grécia, tanto é que, todas as condenações eram inscritas em grandes pedras ou em placas de bronze e expostas em praça pública, buscando assim, que todos vejam como o Estado trata o infrator. Na Ágora, reservava-se um local apropriado para publicar os nomes de todos os condenados, tornando assim, uma verdadeira proscrição para os deliquentes.


7.2 DIREITO DE FAMÍLIA NA GRÉCIA

Era o direito que regulava e disciplinava a vida da família grega e a sociedade como um todo.

Nos primórdios a célula maior da sociedade era a família, portanto, o direito que regulava a família, acabava regulando a sociedade no que tange à costumes, festas, cerimônias religiosas, cultos etc.

Tanto é que demonstraremos ao longo desse subcapítulo, leis que versam propriedade, status quo, entre outras idiossincrasias pertecentes a família, mas que se desdobra no contexto fático social.

O instituto “família” inicia-se com o casamento. Depois a sequência natural é: filiação, adoção; propriedade, doação; sucessão, herança, isto quando antes não é interrompida por um divórcio.

O casamento grego era monogâmico, sendo vedado inicialmente a bigamia. Digo inicialmente, porque em certas ocasiões, devido à muitas guerras, poucos homens sobreviviam, sendo assim, permitido por lei e por costume que os homens sobreviventes adotassem mais uma ou duas mulheres.

Curiosidade: Este fato ocorreu com Sócrates que precisou acolher Mirto, neta de Arístides, o Justo, como esposa, juntamente com Xantipa.

O casamento só era permitido entre cidadãos das famílias eupátridas de Atenas. Os primos e meio-irmãos podiam casar-se. Era proibido por lei o casamento entre gregos e estrangeiros:

Se um homem estrangeiro vive maritalmente com uma mulher ateniense, de qualquer modo ou maneira, ele poderá ser processado e levado perante aos Thesmothétai por qualquer ateniense que o queira e a isso esteja apto. Se for considerado culpado, ele e seu patrimônio serão vendidos e um terço do dinheiro será dado ao denunciador. A mesma regra se aplica a uma mulher estrangeira que viva com um ateniense como se fosse sua esposa. E se for provado que um ateniense vive maritalmente com uma mulher estrangeira ele terá de pagar multa de mil dracmas”. 94


Curiosidade: O casamento só era válido se fosse baseado no kata nomon, ou seja, de acordo com os costumes e as leis.

Havia também previsão para os casos de casamento mediante fraude95

E se alguém der uma mulher estrangeira em casamento a um ateniense dizendo ser parente dela, perderá seus direitos civis, e seu patrimônio será confiscado, e um terço deste passará ao denunciador. E aqueles que estão aptos poderão mover o processo perante os Thesmothétai como no caso da usurpação da cidadania.96

Essas leis proibitivas de casamentos entre cidadãos locais e estrangeiros eram vigentes em tais cidade: Atenas, Bizâncio, Argos, Tessália, Etólia, Messênia, Hierapitna, Teos, Gónos, Olinto, Éfeso, Tasos, Rodes, Mileto e Carondas.

Voltando ao casamento válido, este ocorria assim:

Os pais combinavam o casamento de olho no dote (pelo menos um décimo dos bens do pai da noiva), mas também com a preocupação dos status social. Tendo o pai combinado melhor casamento possível, o noivado e assinatura do contrato se efetuavam no lar da noiva, na presença de testemunhas, mas com frequencia sem a presença da noiva e do noivo. Alguns dias depois era dada uma festa na casa dela. Qualquer mês, com exceção de maio, podia ser escolhido, mas na época de lua crescente era a melhor. O noivo (30 anos) e a noiva (16 anos) passavam pelos banhos purificadores em tom de cerimônia pré-matrimonial. O pai da noiva servia como sacerdote matrimonial, conduzindo a cerimônia e fazendo sacrifícios de animais aos deuses (particularmente a Deusa Ártemis – deusa do matrimônio e Demeter deusa da fertilidade). O casal de noivos era coroado de flores e suas casas enfeitadas. Além da roupa alegre e festiva a noiva usava um véu comprido. Cortara um pouco antes as tranças do cabelo e dedicara seu cinto virginal e brinquedos de infância para Deusa Ártemis. No banquete de núpcias, os noivos recém-casados comia bolos de gergelim a fim de assegurar a fertilidade. Ao partirem para a lua de mel eram cobertos pelos convidados de tâmaras, figos, nozes e pequenas moedas de ouro ou prata e confeitos para terem prosperidade. Ao saírem da festa sapatos velhos eram jogados em sua direção para espantar o mal-olhado.

A procissão de casamento até a casa do noivo era encabeçada por tochas de fogo, na carruagem nupcial seguiam os noivos e o padrinho. Acompanhando a procissão seguiam músicos tocando flautas e harpas cantando alegremente hymen, hymen ho. Na chegada na casa do noivo se queimava o eixo da carruagem, significando a irreversibilidade do casamento.

Ao chegar a sua casa, o noivo carrega a noiva pelo hall de entrada até o leito nupcial. Enquanto os convidados ficam do lado de fora, cantando hinos pela virilidade do noivo e o melhor e mais forte amigo do noivo fica de guarda nupcial na porta do quarto. O noivo retira o véu da noiva e lhe dá o presente fálico do deus Apolo para a virginal noiva de Ártêmis, após isto anuncia que tudo está bem e os convidados felizes descem as escadas, pois o casamento está cumprindo.”97


A esposa grega só podia pedir divórcio se o marido fosse estéril ou cometesse bigamia. O esposo podia pedir divórcio em casos de adultério, esterelidade, bigamia e quando estivesse “cansado” da esposa.

Sólon redigiu em sua lei que o marido ofendido por adultério, poderia se vingar do adúltero como bem quisesse, além de poder processá-lo para cobrar indenização ou para propor ao Tribunal que lhe apenassem com castigo físico.

Curiosidade: Havia um ressarcimento financeiro nos casos de adultério (moikheia) chamado de khreos, ao qual representava a entrega do maior bem do adúltero ofensor.

Curiosidade 2: Havia um festival anual em homenagem ao deus Dionísio e a deusa Demeter, onde somente as esposas podiam acessar aas grandes festividades. A festança durava o período de um mês (maio no nosso calendário). Era terminantemente proíbido a participação de homens. As mulheres cortesãs (prostitutas) e as solteiras também não podiam entrar. Quem desse rol fosse flagrado na festa era apenado com a morte. As casadas durante essa festividade podiam trair seus esposos com outras mulheres sem serem punidas por adultério.

Curiosidade 3: Nos moldes do carne valle romano, em alguns países existe o dia de São Nicolau. Neste dia há o consentimento da sociedade para que zombem da Igreja Romana, deixando rapazes e moças encenarem em plena praça pública o ofício de bispo, padre, monsenhor etc. É permitido também neste dia que a mais alta corte da realeza desça as periferias da cidade para se dedicar aos prazeres da carne. José Luis Corral comenta: “Durante esse dia tudo pode acontecer, até que a esposa de um nobre ou de um grande do reino acabe fornicando em qualquer taverna da cidade com o filho de um carpinteiro. E até possível que algum rico herdeiro de sua estirpe seja de algum porqueiro, fruto de qualquer noite de São Nicolau.98

Fustel de Coulanges atribui ao Direito Ático (Grego) a introdução da figura do divórcio.99

Demonstra também como acontecia o “divórcio” em plagas romanas:

O efeito do confarreatio só podia ser destruído pela difarreatio. Os dois esposos, ao quererem separar-se, apresentavam-se pela última vez diante do fogo comum, presentes um sacerdote e testemunhas. Apresentava-se aos dois esposos, como no dia do casamento, um bolo de farinha. Mas, provavelmente, em vez de comê-lo, rejeitavam-no. Depois, no lugar de ,preces, pronunciavam fórmulas “de um caráter estranho, severo, odiento e terrível”, espécie de maldição pela qual a mulher renunciava ao cultos e aos deuses do marido. A partir dese momento, o laço religioso estava rompido. Cessada a comunhão do culto, assim cessava de pleno direito toda a restante comunhão, e o casamento estava anulado.”100


O divórcio é visto por Platão como meio desagregador para a sociedade (oikos):

Se um marido e a esposa, por discórdia gerada por diferença de temperamentos, não conseguem de modo algum entrar em acordo, será conveniente que fiquem sob o constante controle de dez membros do corpo dos guardiões das leis, de idade média, associados a dez das mulheres encarregadas do casamento. Se estes magistrados puderem obter uma conciliação, sua arbitragem terá força legal, mas se os ânimos do esposo e esposa estiverem tão inflamados pela cólera a ponto de tornarem impossível a presença da harmonia, os árbitros procurarão, na medida do possível, outras uniões adequadas para cada um deles”.

Na sua ótica devem se tentar todos os meios possíveis para consertar áquela união atribulada.

Lembro-me de um professor (juiz) que tive na disciplina de Direito de Família que costumava dizer: “Ave, eu tento tanto não separar o povo, passo horas e horas conversando com o casal, a fim de mostrá-los que ainda há amor, mas, no entanto, em posição adversa tem os advogados sedentos de honorários só buscando separar, separar e separar, onde vamos parar assim?”.

Eram essas as palavras do professor quase toda quarta-feira dia de maior elastecimento de sua aula.

Talvez ele nem soubesse que comungava de um pensamento platônico.

No contexto familiar grego o homem tinha posição superior a mulher, que por sua vez, também era subalterna ao filho mais velho. Quando ficava viúva, o Estado designava um tutor para ela.

Caso o homem não tivesse condições para ter filho, o que aos olhos dos gregos era uma maldição dos deuses, o casal poderia adotar uma criança.

A lei que regia adoção continha os seguintes preceitos:

Um homem pode adotar conforme deseje, de qualquer ascendência. A declaração de adoção deve ser feita na praça do Mercado (Ágora) quando os cidadãos estiverem reunidos em Assembleia, do alto da tribuna (bêma) da qual proclamações desse tipo são feitas. O adotador dará à sua hetaireía uma vítima de sacríficios e uma medida de vinho. Se herda todo o patrimônio do adotador, e se não há filhos legítimos, o adotado deve cumprir com todas as obrigações do pai adotivo, tanto para com os deuses, como para com os homens, e então recebe a propriedade de acordo com a forma prescrita para os filhos legítimos. […] O adotador pode, caso queira, renunciar ao adotado na praça do Mercado (Ágora), do alto da tribuna em que são feitas tais proclamações, na presença do conjunto dos cidadãos. O adotador depositará dez estáteresno tribunal, e os magistrados responsáveis por estrangeiros darão essa quantia àquele que foi objeto da rejeição. Nenhuma mulher e nenhuma pessoa menor de idade terá direito de adotar.101


No concernente a sucessão, os ascendentes estavam excluídos, não havia herança para eles. A divisão era: primeiro os filhos homens (as filhas só herdariam se não houvessem filhos varões) se não houvessem filhos de forma alguma, herdava os colaterais (sobrinhos) e por último, a esposa herdava uma parte ínfima.

Muito embora houvessem muitos bórdeis na Grécia como um todo, os filhos nascidos de aventuras fortuítas e furtivas, não eram a priori reconhecidos como herdeiros diretos. Em alguns casos com o advento do testamento, instituto este, trazido pela mente genial de Sólon, houve então, a possibilidade desses filhos bastardos passassem a gozar do direito de herança testados e deixados por seus aventurosos pais.

Curiosidade: Após o casamento, que na Grécia se dava por volta dos trinta anos do homem e dos dezesseis da mulher. A jovem nubente por seu verdume de experiência precisava de uma dama de companhia, e o homem por sua vez, no auge de seus trinta anos precisava de uma dama na cama. Por isso havia uma lista de cortesãs e suas qualidades assentada em uma das colunas da Ágora ateniense:

Pornaes: Eram as rameiras ordinárias. Trabalhavam buscando salários pequenos em bórdeis de quinta categoria. Sua prole nunca era reconhecida como filho de um cidadão ateniense. Os cabelos das pornaes eram tingidos de açafrão para serem facilmente identificadas no grupo social.

Auretrides: Eram as tocadoras de flauta. Sempre muito solicitadas por jovens nubentes de 21 a 30 anos.

Hetaerae: Conhecidas como as “amigas intimas”. Eram inspiradas na deusa Afrodite (deusa do amor), Consideradas as cortesãs maiores da hierarquia. Tinham formação em ciências, Filosofia, Retórica, Política, Artes, Dança, Teatro, Artes Marciais, Letras estrangeiras. Passavam por longo retiro de formação na ilha de Lesbos, antiga província de Atenas.

Uma das Hetaeraes mais famosas foi Frinéia. Cortesã esta que teve seu julgamento alvo de interessante estudo pelo egrégio jurista e prefaciador desta obra Ives Gandra da Silva Martins.102

O conspícuo doutrinador comenta as cincunstâncias do julgamento onde Frinéia foi despida de propósito por seu defensor que olhou a todos e interpelou: “mulher tão bela como esta poderia ter cometido algum crime? Jamais!” e desta maneira a cortesã foi absolvida.

No capítulo “sucessão”, havia no direito antigo a prescrição de que somente o primogênito herdaria o patrimônio do pai, Sólon legislou e ordenou: “Os irmãos repartirão o patrimônio”.

A propriedade vista como patrimônio poderia ser repassada de pai para filho, doada ou vendida.

A hereditariedade das terras e dos edifícios era algo comum na Grécia, para tanto, era necessário após a morte do pai, a celebração de um contrato causa mortis entre herdeiro(s) e Estado, atestando que aquela propriedade antes de fulano, passaria a ser a partir deste ato de ciclano, beltrano e hermano. Depois disso havia a publicação do ato para dar veiculação de caráter social. Em Roma a publicização dos atos não era feita.

O contrato também era celebrado e publicado como meio de reforçar a autoridade sobre a propriedade. Cícero asseverava que “é da essência de toda a cidade, de todo o Estado, que cada um possa possuir, com segurança, o que é seu, sem temer que se lhe tire”.103

Defende a utilização do contrato como meio de tornar real e pública a máxima romana, considerada juris praeceptas “de dar a cada um o que lhe é devido”.

E numa cartada final, sem ao menos sonhar que poderia reinar sobre o mundo o fenômeno do comunismo, bradou: “Ora, onde está a equidade, arrebatar de alguém o que passou de pai para filho depois de muitos anos, ou mesmo de séculos, para dar a outro que nada possuía?”104

Podia haver também a doação entre filho e mãe e entre marido e esposa:

Será lícito a um filho dar à sua mãe ou à sua mulher cem estáteres, ou menos, porém não mais. Caso ele doe mais, os ephibállontes podem reter o valor excedente e do-alo, se o quiserem. Se uma pessoa qualquer faz uma doação ao mesmo tempo em que deve dinheiro, ou tem multa a pagar, ou se acha envolvido em litígio, será nula a doação, provisto que o patrimônio restante sera insuficiente para saldar o débito.”105


O epílogo deste trecho de lei remete-nos a figura da “fraude a credores” e a”fraude a execução”, assunto que orbita a nossa teoria processual civil de execução.

Outra lei pertencente ao direito das sucessões demonstra o nascimento embrionário do espólio.

“Se tiver falecido uma pessoa qualquer que tenha feito uma penhora, ou perdido um processo, ou deva dinheiro dado em fiança, ou que se envolveu em fraude, ou que assumiu formalmente um compromisso financeiro, qualquer processo contra ele deve ser instaurado no prazo de um ano.”

Curiosidade: A morte de uma pessoa na Grécia era seguida da exposição do corpo (próthesis) e sua transferência para a tumba (ekphorá).

Trataremos adiante da seara jurídica estatal ou Direito Público do Estado.


7.3 DIREITO PÚBLICO

Era contextualizado como assunto de Direito Público tudo o que era regido pela intervenção estatal, os temas de ordem pública e as leis que disciplinavam a convivência com bens públicos, comércio, economia, nacionalidade entre outros.

De uma forma muito genérica podemos dizer que o alcance do Direito do Estado ou Direito Público era repassado e compreendido pelo cidadão grego como nós entendemos e observamos os preceitos constitucionais de nossa Carta Magna de 1988.

Faz-se mister comentar que os gregos tinham uma especial atenção ao instituto da lei.

Quando uma lei era votada em Assembleia ou aconselhada pelos membros do Conselho, sua revogação só podia ocorrer mediante uma ação intitulada graphè nómon me epitédeion theînai.

Havia um dispositivo na legislação que previa esta ação:

“É proíbido anular qualquer lei existente, exceto em uma sessão de nomothétai. E assim, qualquer ateniense que deseje anular uma lei, deverá propor uma nova lei para substituir a lei anulada. Não é permitido apresentar uma lei que conflite com as leis existentes”.106

Assim como Rui Barbosa professava “a lei sempre a lei, com a lei, e a favor da lei”.

Os gregos respeitavam e zelavam pelo meio-ambiente anos antes do nascimento de Cristo. Exemplo disso são as leis ambientais que vigiam em todo território heleno.

A consciência ecologica desse povo refletiu na elaboração de suas leis.

Em Atenas, havia texto de lei disciplinando o corte de árvores:

Quem quer que despoje oliveira em Atenas, não sendo por algum propósito religioso do povo ateniense ou de seus demos, ou para uso próprio até o limite de duas por ano, ou com vista a atender a necessidade de uma pessoa falecida, será devedor ao Tesouro de cem dracmas por cada oliveira, e um décimo dessa quantia caberá à deusa. Também deve pagar cem dracmas por cada oliveira ao denunciante. E as acusações relativas a esta matéria serão levadas ao arconte, de acordo com a instância pertinente.”107


Prevendo que poderia haver um desmatamento irracional desenfreado, o povo de Atenas em Assembleia (Ekklesia) votou esse texto de lei.

Em Creta, cada tribo que conquistava sua indepedência territórial - algo como nossos municípios emancipados – deveria escolher um exemplo jovem para no dia da festividade de fundação, plantar uma oliveira como símbolo de prosperidade daquele novo solo.

A Constituição de Atenas, trazia vários dispositivos contrários ao corte de árvores. Athenian Politican 60.2, II², 1177.17-21.

A prevenção do meio-ambiente era algo punjante na sociedade grega, assim como a vigilância sanitária das cidades e bairros.

Em Pérgamo a legislação trazia disposições expressas e detalhadas no que tange à conservação e a limpeza das ruas; sobre a escavação de poços com o fito de saneamento; observância de manutenção constante nas fontes e chafarizes públicos etc.

Na mesma Pérgamo, o direito de vizinhança vigorava juntamente com a fiscalização de normas relativas a logradouros públicos:

“as avenidas deverão ter no mínimo vinte pékheis (cerca de dez metros) de largura e as outras estradas deverão ter no mínimo oito pékheis (cerca de quatro metros) de largura, além das passagens usadas por vizinhos. Os proprietários de terra deverão manter as ruas próximas às suas casas e na área vizinha de até dez stádia.”108

Se não fosse observado o que encontra-se no bojo dessa lei, o fiscal deve aplicar multa de até cinquenta por cento do valor normal do imposto de moradia.

E a legislação grega ainda previa:

“as pessoas que jogam lixo na rua deverão ser obrigadas, pelos amphodárkhes a limpar o local de acordo com a lei”;

“Quanto aos entulhos. Os amphodárkhes deverão prevenir todo aquele que, enquanto estiver demolindo, escavar um fosso, ou fizer pedras ou argilas, para não ficar exposto na rua”;

Havia a tão famigerada taxa do lixo, que em plagas tupiniquins é considerada inconstitucional:

“No caso daquele que não pagar a parte do custo da decisão que regula a limpeza de esterco dos bairros, os amphodárkhes vão tomar garantias para depositar no Tribunal”;

A economia de água também era uma lição patente na cultura grega:

“As fontes da pólis e do subúrbio serão limpas e observadas se a tubulação por onde passa a água tem a espessura necessária. Ninguém tem permissão para dar de beber a animais, lavar roupas ou utensílios ou qualquer outra coisa em fontes públicas”;

“Quanto às cisternas, estas devem manter-se hipermeabilizadas e nenhuma deverá ficar cheia. Se algumas cisternas estiverem cheias, os fiscais deverão ordenar que seus proprietários as limpem em oito meses.”109

Na seara econômica, a Grécia tinha leis bem fundamentadas, que causam estranheza àqueles que não vislumbavam “vida jurídica” na terra de Homero.

Uma delas regulamentava a criação de moedas e outra previa taxas de importação e exportação:

“Os nomothétai, deliberaram, no ano do arconte Hipodamas; Nicodamas propôs: as moedas de prata áticas devem ser aceitas […] prata e têm a estampa da pólis. O verificador procederá o exame de acordo com essa norma, fazendo-o todos os dias, com exceção daqueles em que for feito pagamento em cédulas de papel”;

“se alguém não aceitar a moeda de prata conferida pelo verificador, tudo quanto estiver exposto neste dia lhe será confiscado”.110

O Direito Tributário também era prestigiado na Grécia antiga.

Na cidade de Ciparíssia, localizado no Peloponeso, a importação e exportação de mercadorias era regulada pela lei nos seguintes termos:

Se alguém importar qualquer coisa em território de Ciparíssia, ao descarregar sua mercadoria ele deve fazer o registro junto aos pentekostológoi e pagar um quinto do valor dos bens, antes que venda ou compre alguma coisa. Se não o fizer, pagará dez vezes ele valor. Quem quer que exporte pelo mar, será cadastrado juntos aos pentekostológoi e pagará um quinto do valor das mercadorias”. 111


Muitos estrangeiros buscavam a cidadania grega. A Grécia foi uma das poucas civilizações do mundo antigo onde o cidadão acobertado por seu manto tinha liberdade para falar, pensar, escrever, se associar, entre várias outras liberdades intrinsecas somente nos solos sagrados de Zeus.

De acordo com Olney Assis:

A cidadania só era concedida a estrangeiros em situações excepcionais, geralmente como recompensa pelos serviços extraordinários prestados à democracia. Péricles, por exemplo, divorciou-se da esposa e passou a conviver com Aspásia, que não era ateniense, mas nascida em Mileto. Foi apenas como marca de excepcional respeito a Péricles que os atenienses concederam a cidadania aos filhos dele”.112


Na Grécia o direito conhecido como isegoria113 era praticado de forma paupável, não ficava só na vontade do povo.

A Censura era algo quase inexistente na cultura helênica, e as poucas que porventura ocorriam, logo eram severamente expurgadas.

Platão, no entanto, se manifestou algumas vezes favorável a “triagem” dos escritos por magistrados.

Mas foi uma das parcas vozes nesse sentido.

Isidor Stone lembra que “Atenas era mais tolerante. O direito de associação era garantido por lei que remontava aos tempos de Sólon”.114

Esta lei fazia menção às associações para fins criativos da música, poesia e Filosofia.

Conseguir a cidadania grega não era algo muito fácil, mas algumas pólis possuíam em seus códigos legais, disposições referentes a concessão de cidadanias.

Em Tasos, a lei de concessão de cidadania previa:

“A Assembleia de cidadãos decidiu: decisão idêntica para os assuntos remanescentes com a decisão do Conselho; pregação a Héracles e a todos os outros deuses; os habitantes de Neapólis, que descedem de mulheres de Tasos, serão considerados cidadãos de Tasos e podem, eles e seus filhos, participar de tudo de que participam os cidadãos de Tasos; e quando eles atingirem a mesma idade que outros cidadãos de Tasos, deverão prestar juramento de fidelidade de acordo com a lei.”115

Não encontramos nenhuma lei mencionando a concessão de cidadania para nascidos em outros países ou territórios não-helênicos. Mas sabemos através da História que era possível.

Os nascidos em solo grego e que serviam ao exército de suas pólis eram considerados hérois entre as crianças e as mulheres.

Quando havia guerras ou batalhas e os soldados enviados faleciam, as cidades encarregavam-se de fazer um belo funeral regado a homenagens durante cinco dias.

Em Tasos, a lei preconizava:

Não se deve negligenciar nada no dia do funeral, nem antes do funeral; ninguém tem permissão para chorar os Bravos homens (Agathoí) por mais de cinco dias; não é permitido realizar os ritos consuetudinários; aqueles que o fizerem serão considerados impuros […] o secretário do Conselho deve inscrever os nomes dos mortos, seguidos dos nomes dos pais na lista de Bravos e devem chamar seus pais e filhos quando a pólis fizer sacrifícios aos mortos na guerra. Seus pais e filhos devem ser convidados aos jogos e a ocupar u lugar de honra; o organizador dos jogos lhe reservará um lher e lhes proporcionará um assento. Quando as crianças, cujos pais tiverem morrido, alcançarem a maoridade, receberão dos polemarcas, cada uma, se forem meninos, um par de grevas, um peito de armas, uma adaga, um capacete, um escudo e uma lança, de valor não inferior a três minas.”116


O Direito Público da Grécia era regido por estas leis apresentadas e tantas outras. Como não é nossa missão principal focar estritamente o direito helênico, demonstramos em dose homeopática alguns tópicos interessantes de sua legislação.

Curiosidade: Na simbologia grega a balança do Direito é segurada pela deusa Diké. Na mão esquerda de Diké fica a balança com os dois pratos, na mão direita, a deusa segura uma espada. O detalhe mais importante é que a deusa grega tem os olhos bem abertos e declara haver o direito quando os dois pratos estão em posição de ison, ou seja equilíbrio, isonomia.


8. O ADVOGADO NA GRÉCIA

Na Grécia antiga não havia a figura do causídico. O advogado tão amplamente homenageado nas lides romanas, na Grécia era visto como desnecessário.

No início, as pessoas que eram levadas ao tribunal, preparavam elas mesmos suas defesas. Com o passar dos anos foi se profissionalizando a figura do logógrafo ou atidógrafo, profissional que fazia as defesas escritas daqueles que eram chamados aos lítigios forenses.

O “advogado” (logógrafo) fazia as defesas em nome da arte e do altruismo, pois não podiam receber pagamento pelas belas peças escritas que faziam.

Os atidógrafos eram cidadãos que possuiam afinidade com as leis e com processos e por meio de suas retóricas convenciam o querelado, promovido ou requerido a contratar mesmo que de forma escondida, os seus serviços.

Eram hábeis em convencer o outro com a força dos argumentos e as conveniências das expressões.

Conseguiram difundir também, além da cultura de defesas escritas, a prática de bons discursos retóricos de defesa.

Passados alguns anos, quase todo cidadão grego era bom orador.

No diálogo Fedro, Sócrates afirma que quando o orador é bom, faz qualquer um da cidade acreditar que um asno é um cavalo.117

Isidor Stone comenta “Além disso, a retórica era necessária também – talvez mais ainda – para o cidadão defender-se nos tribunais. Os atenienses eram muito litigiosos e, como não havia advogados no sentido moderno do termo, os cidadãos precisavam de alguma habilidade em retórica e lógica para defender-se em casos de direito civil e criminal.”118

Fustel de Coulanges faz menção a duas leis que puniam or orador que levasse os cidadãos para o lado negativo:

“Havia uma lei, em verdade pouco aplicada, que punia todo orador que, comprovadamente, desse mau conselho ao povo. Havia outra lei que proibia o acesso à tribuna a todo orador que, por três vezes, tivesse aconselhado resoluções contrárias às leis existentes”.119

Para um entendimento mais límpido por parte do leitor, iremos explicar.

Havia a figura do logógrafo ou atidógrafo, profissional que fazia as defesas, bem como as peças oratórias dos litigantes. No entanto, esses profissionais não podiam comparecer as audiências, já que na Grécia a defesa era uma prerrogativa de cunho personalissímo: somente o litigante podia expressar suas razões no dia do julgamento.

Mesmo assim, diante de todo esse quadro inverso, existiram ilustres homens que fizeram fama como advogados.

É o caso de Lísias.

“Lísias foi o mais famoso “advogado” do período imediatamente após a restauração. Tais advogados não atuavam no julgamento, porém preparavam os discursos dos litigantes. Eram chamados logographoi, ou seja, redatores profissionais de arrazoados.”120

Lísias, era meteco e muito amigo de Sócrates, teve a sorte de nascer em berço esplêndido, pois seu pai era um rico empresário que migrou da Sicília para a Grécia, onde montou sua fábrica de armamentos.

Curiosidade: Além de Lísias, outros cidadãos se notabilizaram como logógrafos, foram eles: Isócrates, Demóstentes e Esquines.

Curiosidade 2: Lísias escreveu uma defesa para Sócrates usar no dia de seu julgamento, porém o filósofo-mor nem sequer a leu, preferiu fazer a sua, que já estava hermeticamente protegida por seu córtex cerébral. Rocha confirma esse fato: “Sócrates recebeu a oferta de um dos mais célebres desses profissionais, Lísias, mas recusou-a. Ele próprio quis preparar e fazer sua defesa”.121

A defesa própria como preferiu Sócrates, era a regra em Atenas. Psístrato foi citado em um processo de homicídio, compareceu para fazer sua defesa e o acusador diante do fato se amendontrou e fugiu, preferindo ser revel do processo.

Mesmo não sendo moral cobrar por serviços dessa natureza, os atidógrafos viviam exclusivamente desse sustento, e, era comum na Grécia saber quem pagava os serviços e quem não podia.

Stone demonstra isso:

“Aqueles que tinham condições financeiras para utilizar os serviços de redatores profissionais de discursos, como Lísias e mais tarde Demóstenes, precisavam treinar a arte da oratória e as sutilezas da argumentação”.122

Arnaldo Godoy corrobora com essa informação:

“Litigantes usavam a palavra, e aqueles que não confiam em seus talentos oratórios valiam-se de redação de profissionais que preparavam os discursos. Os logógrafos recebiam por suas peças.”123

E é o proprio Godoy que nos demonstra uma figura nova o “sinégoro”:

Havia também o socorro da redação dos amigos (sinégoros). Réu e autor podiam pedir ao tribunal que os ajudasse na escolha de amigos com maior facilidade de expressão. A autorização era raramente recusada. Exigia-se que o advogado amigo não cobrasse pelos serviços. Os sinégoros também eram chamados de síndicos, de onde radica a expressão do direito afeto à leis de quebra”.124


Curiosidade: O sinégoro parece um pouco com a figura do amicus curiae, que em nosso sistema jurídico brasileiro representa o amigo da corte, sendo um instituto que prevê a existência de terceiros em uma demanda. A figura do amicus curiae atua nas discussões de teses jurídicas que podem afetar a sociedade como um todo.

Zeferino Rocha comunga com as informações supracitadas:

“No tempo de Sócrates, aqueles que compareciam diante dos tribunais não contavam com auxílio de advogados. Eles próprios tinham que fazer suas defesas. Para tanto, valiam-se dos serviços de redatores profissionais de discursos.”125

Para finalizar esses comentários sobre a “Advocacia” na Grécia, transcreveremos passagem de Arnaldo Godoy acerca do grande Demóstenes:

“A amizade qualifica a famosa defesa feita por Demóstenes, em prol de Clesifonte. Esse último propusera no conselho moção em favor de uma coroa de ouro para Demóstenes. Clesifonte foi processado por Ésquines, e Demóstenes o defendeu. A defesa de Demóstenes torna-se a sua defesa. Defendendo Clesifonte, Demóstenes justificou suas virtudes.”126

Curiosidade: Na Grécia não havia Ministério Público nem promotores. Isidor Stone comenta “Todo cidadão tinha o direito – e o dever – de recorrer à justiça quando julgava que a lei foi infligida127; é algo semelhante à doutrina americana da citizen's arrest, a qual permite que qualquer cidade efetue uma prisão quando vê um crime sendo cometido128. Em Atenas, o cidadão podia não apenas prender como processar.129


9. MAGISTRADOS

A Magistratura na Grécia só podia ser exercida depois dos trinta anos.

Curiosidade: A legislação dos Essênios (seita que provavelmente Jesus Cristo conviveu) só permitia aos homens se tornarem juizes a partir dos trinta anos.

Como já asseverei em obra anterior: A necessidade de haver homens dotados de paciência e saber divino existiu desde a época de Abraão, quando este, junto com seu sobrinho Lot e sua mulher, saíram em peregrinação pelo mundo Criaram tribunais com números de dez homens eleitos por prazo determinado e escolhidos entre as tribos. Quatro mestre de religião e seis leigos. Eles não podiam ter menos de 25 anos e nem mais que 60.130

Várias eram as espécies de magistratura, desde as militares às políticas, nada comparado ao nosso regime que só comporta o Poder Judiciário.

O magistrado mais importante era o Arconte Rei.

A ele competia cuidar de todas as questões religiosas e também presidir o Areópago. Abaixo dele ficavam os seis arcontes thesmothetái, que faziam as revisões e a coordenações da leis.

Em seguida por ordem de hierarquia vinha os Demarcas e Polemarcas.

O demarca era o principal magistrado do Conselho, cabendo a ele as funções de zelar pelo cumprimento da justiça, observando as sentenças proferidas nos tribunais.

O polemarca era o juiz que cuidava das causas onde figuravam os estrangeiros (metecos).

Lísias em seu discurso contra Pancleonte demonstra bem essa diferenciação: “Há muito que ele me infortunava: fui ao local onde trabalhava e citei-o diante do Polemarca, pois o acreditava meteco; todavia alegou ser platense.”.

O organograma da magistratura grega é mais ou menos assim:

Boulé (Conselho de 500 cidadãos maiores de 30 anos, designados por sorteio e na proporção de 50 para cada tribo).

* Mandato de um ano, permitida uma recondução;

* Faziam prestação de contas de suas funções ao final do mandato;

* Havia uma comissão que era responsável pela Presidência do Conselho e por guardar os selos do Estado, bem como as chaves do Tesouro de Athenas.

Funções:

  • cuidavam de todos os departamentos da Administração Pública;

  • preparavam as leis que seriam submetidas à Assembleia.

  • executavam os projetos de Resolução;

  • faziam anualmente reuniões de cooperação com o restante da magistratura e com o Arcontado;

  • controlavam as finanças públicas e supervisionavam todos os funcionários que tinham acesso ao erário público;

  • recebiam os representantes diplomáticos estrangeiros;

  • ratificavam alianças e tratados internacionais;

  • organizavam os festivais e as cerimônias religiosas;

  • presidiam as reuniões da Ekklesia.

    Areópago (Conselho de ex-arcontes acima de 60 anos que tinham sabedoria ilustre e notório saber jurídico com privilégios vitalícios)

    Funções:

  • responsáveis em casos que envolvem cidadãos de Atenas na esfera penal em crimes como homicídios, envenenamento e incêndio doloso;

  • investigavam os crimes graves contra o Estado.

    Ekklesia ( Assembleia dos cidadãos de Atenas com 6000 membros acima de 30 anos).

    Funções:

    - revisavam anualmente as leis do Estado;

  • julgavam os processos de ostracismo;

  • recebiam e analisavam os processos remetidos pelo Conselho;

  • julgava delitos graves contra o Estado.

    Curiosidade: Havia uma espécie de juizados especiais na Grécia, nos moldes dos nossos previstos na lei 9.099/99. “Quanto às denúncias, se o valor da ação delatada não excede dez dracmas, os magistrados decidirão o caso; se for mais de dez dracmas, a questão tem de ser levada a juízo.”131

    Podemos resumir a visão grega sobre o magistrado nas célebres palavras de Aristóteles:

    “Por isso, sempre que há uma controvérsia. Recorre-se ao juiz; ir ao juiz, significa ir à justiça, pois o juiz é como se fosse a imagem viva da justiça; ao restabelecer a igualdade, age como se, de uma linha cortada em partes desiguais, tira da maior a parte que excede, atando-a à parte menor e quando o todo se divide entre duas partes iguais, costuma-se dizer que cada um tem o que é seu”.132

    Curiosidade: Fustel de Coulagens traça um panorama da magistratura ateniense:

     

    Atenas contava com grande número de magistrados. Em primeiro lugar, conservou todos os da época precedente: o arconte, que dava nome ao ano, e cuidava da continuidade do culto doméstico; o rei, que oferecia os sacrifícios; o polemarco, que figurava como chefe do exército e julgava os estrangeiros; os seis tesmótetas, que, segundo parece, administravam a justiça, mas na realidade nada mais faziam senão presidir aos grandes júris; havia ainda os dez hierópoioi, que consultavam os oráculos, e faziam alguns sacrifícios; os parásitoi que acompanhavam o arconte e o rei nas cerimônias; os dez atlótetas, que ocupavam o cargo durante quatro anos, para preparar a festa de Atenas; enfim, os prítanos, que, em número de cinqüenta, ficavam permanentemente reunidos a fim de velar pela manutenção do fogo sagrado da cidade e pela continuação dos banquetes sagrados. Por essa lista podemos ver que Atenas continuava fiel às tradições dos velhos tempos; tantas revoluções não haviam ainda destruído aquele respeito supersticioso. Ninguém ousava romper com as velhas formas da religião nacional; a democracia continuava com o culto instituído pelos eupátridas.

     

Vinham em seguida os magistrados especialmente criados para a democracia, que não eram sacerdotes, e que velavam pelos interesses materiais da cidade. Em primeiro lugar havia os dez estrategos, que se ocupavam dos problemas da guerra e da política; depois, os dez astínomos, que cuidavam da polícia; os dez agorânomos, que vigiavam os mercados da cidade e do Pireu; os quinze sitofilace, que cuidavam da venda do trigo; os quinze metrônomos, que controlavam os pesos e as medidas; os dez guardas do tesouro, os dez recebedores de impostos, os onze encarregados da execução das sentenças. Acrescentemos ainda que a maior parte dessas magistraturas repetiam-se em cada uma das tribos e em cada demo. O menor grupo da população, na Ática, tinha seu arconte, seu sacerdote, seu secretário, seu recebedor, seu chefe militar. Quase não se podia dar um passo na cidade ou no campo sem encontrar um magistrado.

Essas funções eram anuais, resultando daí que não havia ninguém sem esperanças de um dia exercer alguma magistratura. Os magistrados sacerdotes eram escolhidos por sorte. Os magistrados que não exerciam senão funções de ordem pública eram eleitos pelo povo. Todavia, tomavam-se precauções contra os caprichos da sorte ou do sufrágio universal; cada novo eleito era submetido a um exame, ou diante do senado, ou diante dos magistrados que deixavam o cargo, ou diante do Areópago; não se exigiam provas de capacidade ou de talento, mas se procedia a um inquérito sobre a probidade do candidato e sua família; exigia-se também que todo magistrado tivesse um patrimônio em bens de raiz.

Poderá parecer que esses magistrados, eleitos pelos sufrágios de seus iguais, nomeados apenas por um ano, responsáveis, e até revogáveis, tivessem pouco prestígio e autoridade. Basta, contudo, ler Tucídides e Xenofonte para se ter certeza de que eles eram respeitados e obedecidos. Sempre houve no caráter dos antigos, mesmo dos atenienses, grande facilidade para se submeterem a uma disciplina. Isso era talvez conseqüência dos hábitos de obediência que o governo sacerdotal lhes havia dado. Estavam acostumados a respeitar o Estado, e todos os que, nos diversos cargos, o representavam. Não lhes vinha ao espírito a tentação de desprezar um magistrado, porque este havia sido escolhido por eles; o voto era considerado uma das fontes mais santas da autoridade.

Abaixo dos magistrados, que não tinham outra obrigação que a de fazer executar as leis, havia o senado. Este não passava de um corpo deliberativo, uma espécie de Conselho de Estado; não agia, não promulgava leis, não exercia nenhum domínio.133

Curiosidade 2: O Magistrado que fosse pego em estado de embriaguez podia ser apenado com a morte.

Curiosidade 3: Hesíodo costumava chamar os juízes de “devoradores de presentes”, senhores aristocráticos que aceitavam subornos para proferir sentenças errôneas.

Por fim, usaremos as palavras de Arnaldo Godoy para resumir o direito material grego e seu avanço cronológico:

Os gregos publicizaram a justiça. Venceram o período de vingança privada, instaurando a víndita pública. Concentravam os poderes em decisão única. Desconheciam o princípio da reserva legal. A morte não extinguia a punibilidade. Vislubravam-se clamores sociais contra decisões injustas. No mundo antigo era próximo o vínculo entre família, religião e administração da justiça; a ideia de lei transcendia a perspectiva de atividade humana. Nos primeiros tempos só existia justiça familiar, patriarcal. O chefe de familia tinha competência para julgar descedentes e dependentes, executando sentenças, que ele mesmo pronunciava. Mais tarde o Estado assumiu responsabilidade para implementar soluções pacíficas, legais e previsíveis. Em momento anterior à organização de serviço judiciário de cunho estatal, réu e acusador reuniam-se em local adrede deteminado, levando parentes, amigos, que atestariam as boas intenções da parte. A solidariedade de parentes e amigos elevaria o número de votos, espécie de amizade judiciária que garantia a vitória de um dos litigantes. Na época clássica nasceram os tribunais, concebidos para desempate das solidariedades familiares que avolumavam, sob a tutela do Estado ainda incipiente, mas que se fazia presentek, mediano e assimilando o conflito de classes.” 134


O Direito Grego influenciou muito a construção do Direito Romano e, cedeu ao restante do mundo as suas idiossicrassias jurídicas.

Deixaram-nos as primeiras indagações sobre a punição e a verdadeira finalidade das penas. Platão defendia que a pena tinha que ser com o propósito de expiar a infração. Aristóteles foi o principal inspirador de Puffendorf135, quando este desenvolveu a teoria do fim ou da destinação da pena.

Fazem parte de seu legado jurídico: o reconhecimento e regulamentação da propriedade privada; a confecção original de algumas espécies de contrato; criaram a democracia, e por conseguinte o Estado Democrático de Direito; estudaram o que viria a ser o embrião do direito público; a elaboração da figura jurídica da hipoteca etc.

Portanto, o Direito Grego não deve mais ser o “patinho feio” das nossas aulas de História do Direito, Antropologia Jurídica e tantas outras que abordam a História do Pensamento Jurídico, pois está mais do que demonstrada a sua real e verdadeira importância para a concepção de um ordenamento jurídico sólido e social.

O próximo ramo do Direito a ser estudado é o Direito Processual Grego e para isso, antes de mais nada, vamos diferenciá-lo e conceituá-lo.

O Direito Grego material é aquele que tem como fim primórdial à administração da sociedade através da justiça, portanto, tendo de um lado esse pensamento, do outro, o Direito Processual Grego disponibiliza os meios e formatos para se alcançar esse “fim” almejado.


10. DIREITO PROCESSUAL GREGO

O Direito Processual Grego era regido por procedimentos e princípios bem avançados para sua época.

O direito de acusação era popular, numa espécie de jus postulandi original. Como não havia um órgão responsável pela acusação, nos moldes do nosso Ministério Público, Sólon então ampliou o direito de ação para todos, independentemente de serem o ofendido ou seus familiares. Era simples: a pessoa comparecia a presença do arconte (magistrado) fazia a denúncia e dava o nome do suposto criminoso.

Curiosidade: Havia um funcionário público que podia substituir processualmente o cidadão somente na hora de interposição da ação, era o perídromos.

A base do processo grego consistia no direito de ação concedido a qualquer pessoa, que fazia a denúncia e a citação do promovido. Depois, perante o Tribunal, os dois litigantes (ou mais) se dirigiam aos jurados (cidadãos juramentados) a fim de ganharem o duelo judicial.

Sobre este procedimento comenta I. F. Stone: “Não havia Promotor público em Atenas. Qualquer cidadão podia apresentar uma acusação em juízo.”136

Curiosidade: O Processo Penal Grego previa a prisão preventiva, bem como o pagamento de fiança pela soltura do apenado.

Esse direito estendido de provocar o judiciário a fim de fazê-lo tomar as medidas contra o malfeitor, tinha um único limite – em algumas pólis gregas dois – não podia figurar no polo ativo nem no polo passivo da demanda o incapaz jurídico. Em Gortina era visto como incapaz o Apódromos, homem jovem que não tinha ainda os dezesseis anos de idade, e, em outras cidades as mulheres também eram consideradas incapazes.

Em Atenas o escravo também era considerado incapaz, porém Sócrates começou a levantar a voz contra isso “demonstrando públicamente que um escravo era capaz, se bem conduzido pelo processo educativo, de ter acesso às mais importantes e difíceis questões da vida, era sem dúvida provar que era pelo menos igual, em sua alma, a qualquer cidadão”.137

O cerne da “ação” no direito processual micênico fixava-se na figura do promovente, pois dele deveria vir tudo que municiaria o processo: a defesa, a palavra, as testemunhas etc. o êxito da demanda dependia da arte de uma boa organização processual do cidadão. Mais uma vez reínteramos que não havia advogados138, tais como conhecemos nos dias atuais.

Curiosidade: O processo era presidido por um magistrado que não interferia no processo, nem quando motivado.

A distribuição judiciária era feita através das competências:

Justiça criminal:

- Areópago – cuida de homicídios voluntários, premeditados e incêndios;

- Efetos: homicídios involuntários, desculpável, legítima defesa.

Justiça cível:

- Juizes dos demos: Pequenas causas e situações do campo (interior);

- Árbitros: privados e público;

- Heliaia: Tribunal Popular – Júri.

- Juízes maritimos – comércio marítimo;

- Juízes comerciais – causas do comércio.

Ainda havia a competência distribuídas aos arcontes:

- causas de maus-tratos a pais, órfãos, herdeiros, pródigos, falência, tutelar e causas de viúvas gestantes que juravam que a concepção se deu antes da morte do marido

aos Polemarcos:

- cuidavam das causas que envolvia estrangeiros (metecos);

aos Tesmothéias:

- cuidavam das ações referentes a depósito e consignações.

Primeiro me debruçarei sobre os tribunais, suas composições e competências para jurisdicionar, para só depois, demonstrar passo a passo o processo e os procedimentos.

Justiça criminal – Areópago

Areópago, tribunal surgido no governo de Sólon, reconhecido como a mais alta corte de justiça da Grécia. Assemelha-se ao Supremo Tribunal Federal. A missão do Areópago era defender de forma perene a lei, a Constituição e os costumes.

Foi a primeira casa de justiça da Grécia, no início composto por cinquenta e um juízes com competência para julgar todos os delitos. Com a criação do Tribunal dos Heliastas, o Areópago delegou alguns assuntos que lhe eram de caráter privativo.

Curiosidade: A tradição fornece a Atena à criação do Areópago. Reza a lenda que a deusa Atena criou o tribunal para julgar Orestes, irmão de Ifigênia e filho de Agamêmnon e de Clitmnestra. Vingando a morte do pai, Orestes, assassinou a mãe e seu amante. A deusa o manietou e criou o tribunal para julgá-lo.

Curiosidade 2: Foi neste mesmo evento (o julgamento de Orestes) que originou-se a expressão voto de Minerva. No julgamento havia doze jurados para se chegar a decisão, porém houve um empate de seis a seis, obrigando assim, a deusa a proferir o seu “voto de minerva”, que acabou sendo em favor de Orestes.

Guardados os devidos respeito pelas lendas e mitos, na realidade deve-se a Sólon a instauração do tribunal.

O nome “Areópago” é proveniente de aerospagus, que por sua vez descende de Areios Pagos, que significa Colina de Ares. Essa montanha ficava próximo da gruta consagrada às Eumêmidas.

Alguns historiadores sustentam que esse nome foi dado ao supremo tribunal da Grécia, porque sua composição era repleta de guerreiros, e Ares é o deus grego da guerra.

Os membros do Areópago, antes de iniciar qualquer sessão de julgamento, faziam o seguinte juramento perante a deusa Athenas: “Ó Palas, protetora da cidade, tu que és senhora da terra mais sagrada, superior a todas pela guerra, pelos poetas e pela potência, deusa Atena dê-nos ponderação e discernimento para bem julgarmos.”

O Areópago era presidido pelo arconte-rei ou basileus.

A maior função deste tribunal era julgar os crimes de sangue premeditados e os incêndios dolosos.

As suas atribuições sofreram duas mudanças, uma no momento da instalação do Tribunal dos Heliastas que acabou absolvendo boa parte da matéria jurisdicional do Areópago e outra durante a administração de Efialtes em 461 a.C.

Ilias Arnaoutoglou, talvez um dos maiores pesquisadores da Grécia jurídica, confirma as mudanças e indica a competência do Areópago enquanto funcionou: “No Areópago, foram julgados os casos de homicídio doloso, envenenamento e incêndios criminosos”.139

Arnaldo Godoy resume o Areópago:

Os membros do Areópago eram sorteados numa lista de quinhentos candidatos, pertencentes às duas primeiras classes sociais (pentacosimedimnos e cavaleiros). O órgão era aristocrático. Seus membros eram vitalícios. O Areópago entrou em decadência a partir de 462 a.C, com as reformas de Efialtes, refletindo avanço da democracia em detrimento do regime aristrocrático. Aristóteles conta que Efialtes era cidadão incorruptível. Homem justo, tornara-se líder popular e passara a atacar o Conselho do Areópago. Teria eliminado membros do Conselho.140

Curiosidade: O Apóstolo Paulo pregou no Areópago em uma de suas visitas a Atenas141.

Licurgo, legislador espartano, chamava o Areópago de “a forma superior da Grécia” e Lísias, o grande orador e advogado, destacava que “esse tribunal é tão superior a todos os outros que mesmo os homens condenados por ele concordam que seus veredictos são justos”.

Justiça Criminal – Efetos

Tribunal que tinha competência para julgar os casos de homicídio não premeditados. Tinha a composição de cinquenta e um membros, escolhidos entre os Senadores.

Seus julgamentos eram divididos entre quatro câmaras: Pritaneu, Palládion, Delfínio e Freátis.

A primeira câmara (Pritaneu) julgava os entes animados, mas sem responsabilidade (animais) e os inanimados (coisas) que causavam a morte de humanos.

O Palládion decidia à respeito de homicídios involuntários (culposo).

Delfínio examinava os casos de homicídios com justificativa legal, como legitima defesa, estrito cumprimento do dever legal e estado de necessidade.

A câmara denominada de Freátis, pitorescamente ficava situada em outro edifício, distinto do que funcionava o Tribunal de Efetos e mais três câmaras. Era de sua competência o julgamento de cidadãos que exilados da cidade, cometiam homicídio em outros territórios.

Curiosidade: Como não podiam voltar a cidade, os exilados que cometiam crime, se aproximavam da costa em cima de um barco e dali faziam suas defesas perante a Câmara de Freátis reunida na praia.

Ilias Arnaoutoglou escreve sobre Efetos, mencionando uma de suas câmaras.

O Pritaneu era um tribunal que lidava com casos em que o assassino era desconhecido ou em que a morte havia sido causada por um objeto inanimado”.142

Justiça Cível – juízes dos demos

Os juízes dos demos – campo – tinham o dever e a competência de instaurar inquéritos preliminares, facilitando assim, a vida nas regiões mais bucólicas. Era também intenção desses inquéritos triar o que deveria ir a julgamento e o que não deveria.

Isidor Stone discorre acerca:

No sistema ateniense, tal como no sistema legal adotado na Europa séculos depois, o inquérito preliminar diante de um magistrado tinha mais ou menos a mesma função que o grand jury no direito anglo-americano. O magistrado ouvia ambas as partes e resolvia se seria necessário o caso ir a julgamento.”143

A distribuição no sistema brasileiro contempla as cidades interioranas, fornecendo magistrados que investido em funções judiciárias conhecem e julgam os processos em suas comarcas144 de trabalho.

Justiça Cível – Arbitragem

Era fornecido pelo Estado a figura do Árbitro público. O campo de atuação da arbitragem era na solução de controvérsias, geralmente de questões simples. O árbitro era escolhido pelo magistrado, diferentemente da arbitragem moderna, onde os litigantes elegem um arbitro para dirimir a querela.

Curiosidade: A arbitragem no Brasil é reconhecida e regulada pela Lei 9.307/96

Também havia a atuação de árbitros privados, que serviam como juizes para esclarecer casos menos complexos e que as partes desejavam celeridade. Neste ponto, a arbitragem privada é semelhante a nossa, pois os envolvidos escolhem o árbitro, geralmente conhecidos das duas partes e portanto, conhecedor do lítigio, e este busca julgar pela equidade.

Curiosidade: A decisão do árbitro público, escolhido pelo magistrado, não era uma decisão acordada entre as partes, mas imposta pelo Estado.

Os Aisymnétes eram nos tempos homéricos o árbitro/juiz que de forma atávica chegou aos dias pomposos da Grécia, sendo neste período, “os oficiais mais graduados na administração de uma pólis.”145

Curiosidade: Existia também a figura do conciliador, que era chamado de diallaktaí. Geralmente eram alistados pelo Estado para intervenções em conflitos de fronteiras entre Cidades-Estados.

Sobre a arbitragem, Arnaldo Godoy corrobora com as informações supracitadas:

Havia árbitros privados, escolhidos pelas partes. Os interessados se comprometiam em acatar as decisões. Havia também árbitros públicos, sorteados entre os cidadãos maiores de sessenta anos, cujas decisões eram passíveis de revisão, com efeito suspensivo. A justiça dos árbitros era mais rápida, menos custosa.”146

Justiça Cível – Heliaia (Tribunal Popular – Heliastas – Júri)

O tribunal de Heliastas era verdadeiramente um tribunal de justiça aberto a todos do povo.

Esta corte de justiça demonstra que o povo grego tinha soberania em matéria judiciária.

Alguns historiadores defendem apenas o nomé de Heliéia para este tribunal, porém encontramos em várias fontes distintas as demais nomeclaturas supracitadas.

O nome talvez seja proveniente do monte em que se reuniam os jurados do tribunal, localizado ao oeste da Ágora. Apesar de apostarmos mais, na tese que defende essa denominação com base no deus Hélios, sol. Como se reuniam sempre em campo aberto, tendo o sol como testemunha, resolveram colocar o nome de tribunal dos Heliastas em homenagem ao astro rei.

Os jurados eram escolhidos na razão de 600 por tribo (a região foi divida em 10 tribos por Clístenes) totalizado ao fim, 6000 cidadãos votantes.

De acordo com cada delito, os thesmothéias, responsáveis pela administração judiciária, decidiam quantos jurados iriam participar.

Curiosidade: para garantir a participação de jurados no tribunal de Heliastas, Péricles criou o misthós helíastikos, uma remuneração referente à três óbulos.

Curiosidade 2: No ínicio recebiam apenas um óbolo (sexta parte de uma dracma), depois a partir de 425 a.C. começaram a receber dois óbolos e por fim, três óbolos, o famoso trióbolo.

Era chamado de Heliasta, aquele cidadão que aceitava participar do sorteio e em seguida se sorteado, passava a compor o tribunal para um julgamento específico.

Curiosidade: Os funcionários públicos da Grécia eram chamados de dikastas.

Franco Massara define o tribunal assim:

Os eliastas eram juízes populares. Todos os cidadãos tinham o direito de fazer da Eliéia uma vez chegados à idade de trinta anos se solenemente jurassem observar as leis e ouvir imparcialmente os acusados e os réus.”147

O juramento Heliástico, como era chamado, rezava assim:

Farei o meu voto em consonância com as leis e decretos aprovados pela Assembleia e pelo Conselho, mas, se não há lei, em consonância com o meu sentimento de que é mais justo, sem favor ou inimizade. Votarei só sobre as questões suscitadas no cargo, e eu vou escutar imparcialmente os acusadores e defensores igualmente.”148

Os pedidos para se tornar um heliasta era enorme. Por isso, o tribunal escolhia apenas seis mil e os dividia em secções de quinhentos e um membro cada, e a estas secções eram distribuídas causas e a relação dos membros. Assim, o cidadão que iria exercer a função de juiz popular só era chamado a julgar no último momento anes de iniciar o julgamento. Fazia-se isso como meio de evitar os subornos e as corrupções.

Curiosidade: As decisões proferidas por este tribunal não permitiam recurso algum. O entendimento era de que tratava-se de um exame conjeturatório feito pelo povo através da soberania popular com expressão da vontade popular de forma definitiva, pois passou pelo crivo de quinhentos cidadãos investidos no papel.

O tribunal popular julgava questões públicas e privadas, não possuindo regras de jurisdição ou competência. Como dito anteriormente as suas decisões eram irrecorríveis, fulminando assim, o segundo grau de jurisdição.

O Tribunal de Heliastas utilizava esse número grande de jurados, em torno de 500 a 6.000, em parte como proteção à fraudes, uma vez que achava-se díficil subornar 500 individuos, primeiro porque sempre há de ter um honesto entre dezenas e depois porque quem teria condições financeiras para tanto.

Curiosidade: A primeira grande atividade do Tribunal Helieia foi ser uma instância de apelação.

Curiosidade 2: Este tribunal tinha uma função muito semelhante ao Conselho Nacional de Justiça no Brasil, pois ele “exercia uma espécie de controle sobre as atividades dos magistados, inclusíve fiscalizando o teor das decisões proferidas em julgamentos, motivo pelo qual podia até aplicar penas complementares aos magistrados faltosos”.149

Arnaldo Godoy comenta o referido tribunal:

O tribunal dos Heliastas tinha competência para acompanhar e julgar causas em geral, de âmbito público e privado, e muitos de seus membros eram pessoas de idade, de pequena e média condição. Anualmente os arcontes sorteavam seis mil jurados entre os cidadãos inscritos, maiores de trinta anos. Os sorteados eram designados juízes heliastas e prestavam juramento. Eram dívididos em dez seções de quinhentos membros; os restantes mil jurados eram suplentes.”150

Curiosidade: O sorteio dos juízes eram feito através de uma engenhosa máquina chamada Klêrôtêrion, encontrada recentemente em escavações da Ágora ateniense.

Paul Harvey, catedrático de Literatura Clássica, ao falar do Heliasta, comenta:

Esse sistema judiciário apresentava ao mesmo tempo vantagens e desvantagens. Ele proporcionava um alto grau de segurança contra a injustiça, pois era impossível a intimidação e corrupção de um grande número de jurados, pelo fato de não se saber com antecedência quais seriam eles. Por outro lado, os membros desses júris eram muito suscetíveis a apelos emocionais, mais inclinados portanto a admitir alegações que não constituíram propriamente evidências e menos familiarizados com a lei que os juízes propriamente ditos.” 151


As sessões de julgamento eram chamadas dikasterias e os membros que iriam compor o exame judicial dos fatos eram conhecidos como Heliastas. Estes membros se assemelham aos jurados dos dias hodiernos. O voto era efetuado de maneira secreta e ao final divulgado, refletindo assim, a vontade da maioria.

O número de jurados podia variar de caso para caso. As vezes eram chamados duzentos e um, em outras ocasiões chamados quinhentos e um, sendo o número total sempre impar para evitar empates.

Curiosidade: Douglas Macdowell, profundo estudioso de tribunais do Júri ao redor do mundo, atribui aos atenienses a invenção deste juizado popular.

O inolvidável Ruy Barbosa foi um dos mais ferrenhos defensores do tribunal do Júri no Brasil.

O grande baiano sempre foi a favor do julgamento popular, e foi ele que em várias ocasiões ocupou a tribuna do júri para abrilhantar e garantir a defesa de muitos que precisavam de seu sacerdócio jurídico. Nesta fase, Rui clamou: “Quando o Tribunal Popular cair, é a parede mestra da justiça que ruirá”.152

Curiosidade: O primeiro júri em Atenas ocorreu juntamente com a fundação da democracia ateniense, por volta de 590 a.C.

O procedimento do júri era simples: a defesa usava seu tempo para desconstituir tudo que fora acusada, a acusação em seguida formulava todas as questões anteriormente suscitadas e algumas novas se porventura tivesse. Em seguida os jurados efetuavam seus votos. Como havia muitos jurados (em torno de 200 a 500) não existia um espaço determinado para reunião de todos, para discutir novamente os fatos, por isso cada jurado efetuava logo seu voto.

Curiosidade: Os jurados sentavam-se em bancos de madeira separados pelos expectadores apenas por uma barreira ou cancela de barro.

No final, três jurados eram responsáveis pela contagem dos votos.

Curiosidade: Se a acusação obtivesse menos de 100 votos a favor de sua argumentação, devia uma multa para custear os prejuízos do processo.

Curiosidade 2: Os jurados ou heliastas se colocam em fila para depositar na urna do arconte-rei o seu voto: bolinha branca era a favor da absolvição e a preta a favor da condenação. Geralmente, se demorava muito devido ao número de jurados.

Sobre a contagem, Franco Massara faz as seguintes considerações:

A contagem não era feita em voz alta: o acusador, o réu, os juízes, e o público, apenas no fim tomavam conhecimento do resultado. O arconte-rei ajudado por dois heliastas fiscalizou, duas, três vezes, o total. Depois levantou-se. Os dois heliastas voltaram para junto dos colegas.”153

Por sua vez, Isidor Stone discorre:

No julgamento de um crime em Atenas, o júri votava duas vezes. Em primeiro lugar, votava-se a favor da condenação ou da absolvição do réu. Em caso de condenação, votava-se para decidir qual será a pena”.154

A personagem central dessa obra, Sócrates, foi julgado pelo tribunal popular e recebeu 281 votos pela condenação e 220 pela absolvição.

Stone diz que “se apenas 6% dos componentes do júri tivessem mudado de ideia, Sócrates teria sido absolvido”.155

Justiça Cível – Juizes Comerciais

Os Eisagogueis eram juízes competentes para as causas comerciais que exigiam rápida solução. Esses magistrados só laboravam em certos períodos do ano, onde o Mediterrâneo não oferecia perigo a navegação e as cargas transportadas.

As cortes de justiça eram essas apresentadas uma-a-uma.

Curiosidade: Alguns tribunais se reuniam esporadicamente no Odeon, antigo edifício erigido para perfomances musicais.

Platão sonhava com um poder judiciário responsável por todos os males sociais e processuais e para tanto punições exemplares para os magistrados:

No caso de alguém acusar um juiz de aplicar deliberadamente uma sentença injusta, o acusador deverá dirigir-se aos guardiões das leis e apresentar-lhes uma acusação. Sendo o juiz condenado em função de uma tal acusação se verá obrigado a pagar uma quantia correspondente à metade daquela avaliada para os danos sofridos pela parte lesada, e se for julgado que merece punição maior, os juízes do caso deverão estimar qual a punição exemplar a ser infligida, ou qual o valor adicional a ser pago pelo Estado ao queixoso.”156


Faz-se mister comentar que indenizações por erros judiciários existem no Brasil e estão sedimentados pelo artigo 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal de 1988, mas tais indenizações não saem do “bolso” da autoridade.

Curiosidade: O magistrado recebia misthós didastikos equivalente a meia jornada de trabalho ou o preço de alimentação por uma pessoa. O subsídio daqueles idos era pouco.

Auxiliares da Justiça

O Poder Judiciário Grego previa algumas funções auxiliares da justiça, tais como serventuários oficiais, os comissários de justiça (oficial de justiça) e os onze (carcereiros).

O Demarco era competente para convocar a Assembleia, zelar pelos livros oficiais do demos, conservar os livros de registro e cadastro e citar os devedores que não liquidavam as dívidas no prazo estipulado.

De acordo com Zeferino Rocha “Os onze tinham como função dar entrada nos processos e administrar a prisão. Eles também eram encarregadas de mandar executar os condenados.”157

Os onze eram auxiliares da justiça que exerciam a carceragem e preparavam as execuções e os castigos dos apenados. Uma espécie de carrasco. Eram eleitos um em cada dez tribos e o décimo primeiro era escrivão que secretariava o órgão.

Godoy corrobora “Eram responsáveis pelos prisioneiros. Puniam com a morte os ladrões. Puniam sequestradores e salteadores. Encaminhavam delações aos tribunais”.158

No texto Constituicional de Atenas, havia a previsão dos auxiliares de justiça “Onze”, encarregados do cárcere e das execuções.159

Curiosamente um dos “onze” aparece em várias cenas com Sócrates durante a prisão.

No Fédon há a seguinte citação: “Essas são as cousas que deveis ter em mente quando quiserdes falar e propor as questões que desejardes, tanto quanto o permitirem os Onze em nome do povo de Atenas.”160

Massara descreve: “Sócrates foi levado do Tribunal para o demostério, a prisão de Atenas, entregue à vigilância dos Onze.”161

E prossegue: “Pouco depois chegou um servo dos Onze com a taça de cícuta, meio utilizado pelos atenienses (meio não doloroso) para as condenações à pena capital por delitos graves ou ferozes”.162

Vamos passar agora ao exame das ações e suas diferenças.

A ação pública tratava de assuntos relacionados ao Estado, permitindo que qualquer cidadão impetrasse, enquanto a privada só cuidava de conflitos judiciários particulares e concendendo a promoção apenas aos interessados.

A ação pública era conhecida como ghaphé, e a privada como diké.

Exemplos de ação privada: assassinato, perjúrios, assalto, delitos sexuais, roubos, atentatos à propriedade etc;

Curiosidade: A ação pública de roubo era denominada graphé klopês.

Exemplos de ação pública: prestação de contas estaduais, impiedade, suborno, estrangeiros que pretende ser cidadão, falsidade ideólogica etc.

As ações públicas se iniciavam com as denúncias (eisangelía) feitas ao Conselho ou a Assembleia. As ações privadas geralmente terminavam com uma indenização (próklesis) para o autor.

Duas ações chamam a nossa atenção: primeira a ação de impiedade e segundo um embrião rudimentar da nossa ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade.

A ação de impiedade era chamada de graphaí asebeia e era uma das mais terríveis acusações que um homem podia receber.

Sócrates foi acusado de impiedade por Ânito, Lícon e Meleto, que disseram aos quatros ventos que o filósofo ensinava que “o sol era uma pedra e a lua uma terra”.

Na ótica dos acusadores, Sócrates negava a existência de deuses.

Claude Mossé comenta que “qualquer manifestação de dúvida ou indiferença a respeito da religião da cidade era considerada atentado à unidade da comunidade, e não é por acaso que a impiedade, a asebeia, era passível de uma graphaí de uma ação pública.”163

Stone relata passagem de Sócrates pelo fórum para fazer sua defesa prévia antes do julgamento:

No Eutífron de Platão, vamos encontrar Sócrates no pórtico do archon basileus. O velho filósofo está ali para o exame preliminar ao julgamento porque uma das acusações levantadas contra ele era a de impiedade, e o rei-magistrado era o archon que presidia em tais casos”.164


Outra ação que chamou nossa atenção foi a graphé paranomon.

Esta ação era semelhante a nossa Ação de Inconstitucionalidade prevista na Lei 9.868/99 e nos artigos 102,I, “a” e 103 da Constituição Federal de 1988.

Na Grécia antiga em dois casos foi suscitada a moção de inconstitucionalidade.

Caso dos Generais: Durante a batalha das Arginusas, os generais comandantes das tropas marítimas não recolheram os corpos dos sobreviventes feridos. Coincidentemente Sócrates participa desse julgamento como membro da comissão que presidia. A questão levantada foi de que cada General deveria ser julgado sozinho, de acordo com seus atos. O povo desejava julgar todos de uma vez imputando os mais terríveis atos a todos os réus.

Sobre o caso Stone comenta:

Quando teve início o julgamento perante a Assembleia, um dissidente teimosamente questionou a legalidade do julgamento conjunto, de acordo com a legislação e as tradições atenienses. Esse questionamento era realizado através de uma moção denominada de graphé paranomon, equivalente ao que hoje chamaríamos de moção de inconstitucionalidade.”

E complementa:

Normalmente – até onde podemos saber com base na parca documentação legal do século V a.C. - o julgamento dos Generais seria adiado até que a moção fosse debatida e votada. [..] a população se irritou e obrigou o tribunal a julgar todos de uma vez […] apenas Sócrates protestou até o fim contra esse procedimento ilegal e injusto.”165

O outro caso é permeado pela iniciativa da cidade em conceder uma coroa de ouro a Demóstenes, o grande orador e logógrafo. Ésquines, adversário de Demóstenes, na primeira oportunidade que teve ingressou com a graphé paranomon.

Sobre o caso Arnaldo Godoy tece comentários:

O caso mais conhecido fora a tentativa de se obstar a lei que outorgava a Demóstenes uma coroa de ouro, como prova de admiração e respeita da cidade pelo orador. Ésquines propôs a graphé paranomon, invocando que a medida era inconstitucional. Instruiu o pedido alegando que a lei proibia entrega de coroa a servidor público que não fora avaliado (caso de Demóstenes).166

O Controle de Constitucionalidade era preventivo, e aconteceu bem antes do famoso caso Marbury vs. Madison, onde o tribunal procedeu a judicial review.

Ainda sobre o caso, David Cohen explica que “o judiciário ateniense era palco de vaidades. Onde discutia-se menos a lei e mais o caráter e a reputação do orador.”167

Trataremos agora do Processo Grego e seus procedimentos.

O Processo iniciava-se com a denúncia ou com a queixa.

Havia funcionários públicos denominados de Eisagogêis, literalmente, aqueles que apresentam ações, que diuturnamente circulavam entre as comunidades a fim de escutar os reclames do povo e ingressar com a denúncia ( eisangelía )perante os magistrados.

Em Atenas havia cinco eisagoêis, dentre as suas atribuições a que mais se destacava era a de apresentar mensalmente casos ao tribunal. A grande maioria casos de foro público.

Aristóteles confirma esse dado: “São também designados por sorteio cinco encaminhadores, um para cada duas tribos, os quais devem encaminhar os processos de prazo mensal.”168

Nas questões privadas o impulso era dado através das queixas.

Curiosidade: As queixas eram escritas em tabuinhas cobertas com cera quente.

Uma peculiaridade da queixa era que a mesma só podia ser proposta mediante caucionamento.

Na obra As Nuvens de Aristófanes, o autor informa: “Antes de apresentar a queixa por escrito ao tribunal, depositando a respectiva caução, o demandante devia citar pessoalmente o demandado, em presença de testemunhas”.169

Percebe-se também neste relato que não havia funcionário oficial nem tampouco serviço postal para efetuar a citação do acusado/réu/promovido/demandado/reclamado, quem fazia era o próprio autor da ação.

O promovido sempre era informado do inteiro teor da acusação/ação antes do julgamento, para preparar sua defesa.

Antes do julgamento havia dois procedimentos. O inquérito preliminar, que consistia na investigação dos magistrados sobre o caso denunciado - que poderia incluir o interrogatório (erotesis) do acusado antes do julgamento - e a audiência preliminar entre o autor e o promovido com vistas de conciliação.

Stone relata que Sócrates compareceu ao tribunal para ser interrogado durante a fase de inquérito preliminar: “Sócrates no pórtico do basileus archons, ou rei-magistrado, para onde fora convocado para o inquérito preliminar ao julgamento”.170

A audiência preliminar era chamada de anakrisis.

Segundo Daremberg e Saglio, a anakrisis era o “nome através do qual os atenienses designavam a fase do processo durante a qual o magistrado instruía a ação e reunia todos os elementos decisórios que deveriam ser produzidos perante o tribunal”.171

Durante essa etapa o magistrado procedia o exame de admissibilidade da ação, observando a lexis, escrito com nome das partes, breve exposição dos fatos, o objeto da disputa e a designação das testemunhas que presenciaram o fato. No exame de admissão o magistrado avaliava se o acusador tinha legitimidade para interpor a demanda; se o acusado tinha capacidade jurídica para se defender; se a lexis cumpria as formalidades e se ele era o magistrado competente para conhecer e julgar o caso.

Curiosidade: Havia no Direito Processual Grego a figura da reconvenção.

Curiosidade 2: A ordem do dia era fixada nas paredes externas do tribunal e havia um arauto responsável para chamar as partes no horário de seus processo, uma espécie de pregão.

Antes da audiência preliminar ou do julgamento, as partes elaboravam suas defesas para exporem durante os procedimentos em frente aos jurados ou magistrado. O rito processual grego era um verdadeiro exercício de Retórica e persuasão, vencendo aquele que mais se destacava.

Durante os discursos uma ampulheta chamada clepsidrye, controlava os tempos de ambas as partes.

O processo romano também possuía ritualística parecida, conforme relata de Gordon Thomas:

Elas haviam sido instaladas para controlar os discursos dos advogados que eram pagos por hora. Os relógios controlavam o tempo permitindo ao acusador, que tinha duas horas para apresentar o caso. Os advogados de defesa tinham uma hora a mais. Para ofensas graves – o assassinato de um romano por outro, ou judeus julgados por insurreição – era permitido à acusação seis horas para apresentar o caso, enquanto a defesa tinha nove horas para refutar as evidências.”172


Complemento:

A primeira fala era a do acusador e em seguida ao do acusado. Tinham o tempo limitado pelo Presidente, havia a réplica (duplicatio) e a audiência podia preosseguir em dias sucessivos. As provas eram dívidas em: per tabulas, per testes e per quaestiones. Tabulas eram as provas documentais; per testes eram as testemunhais e a per quaestiones eram as demais provas admitidas em juízo.173

No processo grego Aristóteles confirma a existência de relógios para marcar o tempo das partes: “Tem-se clepsidras munidas de tubos de escoamento, nas quais se despeja a água proporcionalmente ao que o debate dos processos exigir”.174

As provas no processo grego eram chamadas de atekhnoi.

Uma idiossincrasia muito marcante no Processo Grego dava-se perante os direitos das partes envolvidas na querela. Por exemplo: ninguém era obrigado a falar, depor, assumir etc. se não estivesse isso explicito em lei, situação esta, presente no Brasil homenageada pelo princípio da liberdade pública que garante que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei (art. 5º caput e II, CF/88).

Franco Massara relata acontecimento baseado nestas premissas: “Responde meu caro, responde-me: a lei te obriga a responder-me!”. Durante o discurso de Sócrates em seu julgamento.

E em outro momento do julgamento, ele mesmo se defende de uma acusação: “nenhuma lei diz que eu tenho de dar conta disso aqui”.175

Duas provas cabais de que a lei preceituava as obrigações e deveres. Num primeiro momento ele assevera que a lei obriga o seu acusador a responder-lhe, em outro momento ele alega que não há lei que lhe obrigue a dar conta daquilo que ele não sabe.

O processo grego findava-se com a sentença, pois em seu ordenamento jurídico não há previsão para processos de execuções.

A execução é particular, cabendo a cada um, buscar os termos da sentença.

No procedimento do Júri (Tribunal dos Heliastas) o julgamento podia ocorrer em duas etapas. A primeira votava-se a favor da condenação ou da absolvição, e a segunda uma vez vencido o voto pela condenação, fazia-se uma segunda votação a respeito da pena.

A pena geralmente era escolhida pelo réu.

Stone afirma que “segundo a lei ateniense, o júri não poderia escolher a pena, sendo obrigado a escolher ou a que era proposta pela acusação ou a sugerida pela defesa.”176

Massara complementa:

Segundo a lei ateniense, depois da votação dos heliastas ter declarado o réu culpado este tinha a possibilidade de se atribuir uma pena motivando-a. A pena pedida pelo acusador era já conhecida desde o início porque estava indicado no documento de acusação. Os juízes tinham portanto de escolher entre as duas penas, a do acusador e a que se auto-atribuísse o réu, e não tinham poder para aplicar uma terceira.”177


No caso de Sócrates, como era praxe, o mesmo após a condenação foi convidado a fixar sua pena. Os acusadores haviam pedido a pena de morte. Sócrates poderia se salvar facilmente, bastava propor uma multa ou um castigo restritivo de direitos. Sua condenação havia sido dada por apenas 60 votos a favor da condenação, mais da metade acreditava em sua inocência, isso era o básico para propor uma sanção pecuniária e se livrar da morte. Os amigos ainda tentaram convencer Sócrates a propor uma multa. Só que o maior filósofo que já caminhou entre a Terra jamais fazia concessões contrárias a si mesmo. Pensou e asseverou: se eu propuser uma multa a mim, estarei assumindo que fiz algo que não fiz. Seria culpar minha consciência que além de está tranquila, é inocente.

Como um irônico, chegou a propor que o Estado o mantivesse a partir daquele dia.

Massara chama a atenção que “habitualmente se o réu era hábil a atribuir-se uma pena que parecesse oportuna e conveniente obtinha-a sem dificuldade. Os atenienses eram emotivos como todos os povos mediterrâneos; a ira esfriava com o reconhecimento da culpa pelo réu, e era rapidamente substituída pela compaixão e piedade”.178

Mas a proposta de Sócrates não era oportuna nem conveniente, tampouco conseguiu compaixão e piedade, ao contrário, amealhou para si, mais raiva e ódio. Na segunda votação Sócrates foi condenado a pena de morte.

O processo grego também tinha aspectos atuais como recessos forenses, feriados, duração do processo, custas, entre outros atributos modernos.

O julgamento podia durar um dia, e começava de manhã muito cedo.

Curiosidade: Os gregos, como mais tarde os romanos e em geral os povos da antiguidade, costumavam levantar-se com o nascer do sol, mais ou menos, seis da manhã, e entre as sete e oito já estavam trabalhando e enchendo as praças.

A sentença do processo deveria sair antes do pôr-do-sol, mas havia casos em que encerrava-se à primeira etapa ao lusco-fusco, para no outro dia bem cedo retomar as atividades.

Após a emenda constitucional número 45 editada em 2004, o ordenamento jurídico brasileiro passou a conviver com o famigerado princípio da razoável duração do processo. Em plagas gregas tal fundamento já existia, é o que demonstramos a seguir.

Aristóteles cita os processos mensais, que deveriam durar no máximo um mês:

São processos de prazo mensal: o não-pagamento de dote devido, o não-pagamento de empréstimos a juros de uma dracma, o empréstimo de capital para abrir um negócio no mercado; e ainda os casos atinentes à agressão, à cotização, a sociedades, a escravos, a animais de tiros e a negócios bancários.”179

E Ilias Arnaoutoglou180 nos apresenta uma lei que coibia a procrastinação de procedimentos processuais:

não se deve atrapalhar os magistrados quando recebem testemunhos, têm oitiva preliminares, decide os casos mensais, registram juramentos, fazem inquéritos [...]181

Havia dias de recesso forense e de feriados onde era terminantemente proibido cumprir as decisões judiciais por meio de execuções.

Era considerado recesso forense, e portanto, não podia haver julgamentos ou decisões, os dias em que Atenas embarcava tripulação à Ilha de Delos, por conta de festival lá ocorrido anualmente. O recesso só terminava com a volta do navio.

Zeferino Rocha comenta “enquanto durassem as comemorações da festa de Apolo em Delos e o navio não retornasse a Atenas, porto donde partira, nenhum condenado poderia ser executado na cidade, para que esta não fosse manchada”.

E informa: “Assim, Sócrates teve de esperar na prisão, aproximadamente um mês, antes de beber a cicuta”182

Curiosidade: O navio era enviado todos os anos para comemorar a vitória de Teseu sobre o Minotauro, o terrível monstro que habitava o labirinto de Creta.

João Cruz Costa na nota do tradutor no livro Platão – os Pensadores, leciona:

A Peregrinação a Delos é um simples culto ao deus Apolo e à deusa Ártemis. A lenda é a seguinte: Androgeu, filho do afamado rei Minos de Creta, visitara Atenas e tomara parte nos jogos ginásticos; fora superior a todos, despertando assim a inveja dos atenienses, que o mataram. Seu pai, então, para vingar a morte do filho, declarou guerra aos atenienses, vencendo-os, e estabelecendo como condição de paz que os vencidos enviassem periodicamente 7 moços e 7 moças a Creta. Estes jovens iriam servir de alimento ao monstro Minotauro que vivia no labirinto do Fauno em Creta, palácio fabuloso cuja saída ninguém conseguira encontrar. Por muito tempo os atenienses enviaram rapazes e moças, até que Teseu, herdeiro do trono, voluntariamente entrou no no número de vítimas sorteadas, a fim de pôr termo a esse sacrifício periódico. Teseu conquistou Ariadne, que lhe deu um novelo de lã vermelha e, assim, entrando no labirinto, atou ele uma ponta do novelo numa pedra da entrada e, enquanto avançava, o desenrolava, ficando desta forma com o caminho do regresso assegurado. Conseguiu assim matar o terrível Minotauro e retornar com seus companheiros salvos para a pátria”.


E havia dias de feriados comuns.

Sobre isto, comenta Fustel de Coulanges: “Feriados, são dias nefastos para sempre, não se faziam reuniões, não se julgava, e ficava suspensa toda a vida pública.183

Curiosidade: Os gregos chamavam esses dias de hemerai apóphrades.

Por fim, Arnaldo Godoy faz um máxime resumo de toda a ritualística processual grega:

No dia marcado, as partes apresentavam-se perante o juiz, o qual, desde logo, determinava o pagamento das custas do processo (prytanéia); qualquer que fosse o resultado, as custas pertenceriam ao Estado. A parte que perdia a causa deveria reembolsar a parte contrária com a quantia que ela havia pago. O juiz recebia a queixa e o réu podia apresentar a defesa por escrito (antigraphé). O juiz designava dia para instrução e inquirição das testemunhas. Assim que as testemunhas se apresentavam, perguntava-se: Quem deseja contestá-las? As partes pessoalmente interrogavam e os depoimentos constavam em ata (gramnatêion). E escravos depunham sob tortura. As partes falavam, pessoalmente ou por seus logógrafos ou síndicos. O tempo era marcado pela clepsidra, espécie de relógio de água. Os jurados usavam discos para votar, os jetons. Os discos de trave maciça indicavam absolvição e os outros condenação. Nas dikais as próprias partes executavam a sentença.”184

Curiosidade: O Poder Judiciário grego trabalhava por volta de 300 dias no ano.

Curiosidade 2: As custas eram devidas, pois delas saiam o salário dos magistrados.

Encerramos neste ponto mais um capítulo sobre o Direito Grego e o Direito Processual Grego e suas formalidades. Esperamos que o leitor tenha se abastecido de diversas informações a fim de auxiliá-lo no próximo capítulo que tratará o Julgamento de Sócrates perante o Tribunal Grego e seu sistema jurídico.


1GAGARIN, Michael. Early Greek Law. Califórnia: 1989.

2DARESTE, Rodolphe. Nouvelles Études d'Histoire do Droit. Paris: 1902, p. 60

3PAOLI, Ugo Enrico. Studi sul Processo Attico. Padova: Cedam, 1993, p. 4-5

4ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Grécia Antiga. São Paulo: Odysseus, 2003, p. XIII.

5MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e a Aplicação do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 2009.

6CERQUEIRA, Fábio Vergara. As origens do Direito Ocidental na Pólis Grega. Mar. 2011. Disponível em <http://www.tjrs.jus.br/export/poder_judiciario/historia/memorial_do_poder_judiciario/memorial_judiciario_gaucho/revista_justica_e_historia/issn_1676-5834/v2n3/doc/04-Fabio.PDF>. Acesso em: 22 mar. 2011

7CRETELLA JÚNIOR, José. Introdução ao Estudo do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 215

8GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução à Ciência do Direito. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1983, p. 307

9REIS, Clayton. Dano Moral. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 15

10CRUZ E TUCCI, José Rogério. Lições de História do Processo Civil Romano. São Paulo: RT, 2009, p. 29

11ARIAS. José. Manual de Derecho Romano. Buenos Aires: Guilherme Kraft Ltda. 1949, p. 60

12PINHEIRO, Ralph Lopes e BEKHOR, Helena Goldenzon. 1000 Perguntas História do Direito. Rio de Janeiro: Thex, 1997, p. 50

13GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009

14FOIGNET, René. Manuel Élémentaire de Droit Romain. Paris: Rousseau et Cie Éditeurs, 1944

15BRASIELLO, Ugo. Lineamenti di Storia del Diritto Romano. Roma: Bulzoni Editore, 1972

16VILLEY, Michel. Direito Romano. Porto: Rés-Editora, Tradução de Fernando Couto.

17BEVILÁCQUA, Clóvis. Spengler e o Direito Romano. São Paulo: RT, 1934

18MOMMSEN, Thomas. História de Roma. Rio de Janeiro, Delta, 1962, tradução de Antônio Olinto, p. 113-114

19Associação Brasileira de Bibliófilos

20COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 210-211

21Ibid, 2005, p. 208

22RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 86

23STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 71

24XENOFONTE. Memoráveis IV, Sao Paulo: Abril Cultural, 1980, p. 147

25Se tomarmos o vocábulo “Nomos” como sendo a expressão vernacular de lei, em uma sociedade que tem deuses que ditam as “Nomos”, temos então uma teonomia.

26RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 42

27BAGNOLI, Vicente et al. História do Direito. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 33

28ARISTÓTELES. A Política. 1.2.15-16 (Barker,7)

29HUXLEY, Aldous. Admirável Mundo Novo. São Paulo: Globo, 2010, p. 59

30STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 44

31RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 86

32CÍCERO. Dos Deveres. São Paulo: Martin Claret, 2008, p. 120

33ROCHA, Zeferino. A Morte de Sócrates. São Paulo: Escuta, 2001, p. 102

34Ibid, 2001, p. 103

35GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2008, p. 226

36ROCHA, Zeferino. A Morte de Sócrates. São Paulo: Escuta, 2001, p. 116

37ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Grécia Antiga. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 104

38Ibid, 2003, p. 101

39STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 117

40MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 157

41XENOFONTE. Memoráveis IV. Sao Paulo: Abril Cultural, 1974, p. 146

42STONE. Isidor. F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 155

43RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010.

44MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 28

45ARISTÓTELES. A Constituição de Atenas. IV:VI:X:XII.4

46Ibid, p. 29

47MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. São Paulo: Martin Claret, 2008, p. 67

48COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 339

49LAÉRCIO, Diógenes. Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres. Brasília: UnB, 1977.

50ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2005, p. 80

51ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2005, p. 155

52Trechos que não estavam em bom estado na pedra talhada.

53Ibid, 2005, p. 39

54Ibid, 2005, p. 79

55RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 57

56ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2005, p. 152

57MILLET, Paul. Lending and Borrowing in Ancient Athens. New York: Cambridge University Press, 1994, p. 179

58ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2005, p. 155

59STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 203

60Ibid, 2005, p. 87-88

61GASTALDI, Viviana. Direito Penal na Grécia Antiga. Florianópolis: Boiteux, 2006, p. 19

62BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 34

63STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 152

64Ibid, 2005, p. 76

65MORA, Carlos de Miguel. Considerações sobre a justiça criminal no mundo greco-romano. Aveiro, Portugal, 2005

66GASTALDI, Viviana. Direito Penal na Grécia Antiga. Florianópolis: Boiteux, 2006, p. 26

67RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 94

68MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 148

69GASTALDI, Viviana. Direito Penal na Grécia Antiga. Florianópolis: Boiteux, 2006, p. 94

70Vingança da vingança. Familiares da vítima vingavam-se do infrator, e depois os familiares do infrator vingavam-se dos familiares da primeira vitima e assim ia se sucedendo, gerando uma carnificina total.

71MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 23

72Impostores

73XENOFONTE. Memoráveis III, Sao Paulo: Abril Cultural, 1980, p. 91

74LEAL, Rogério. Direitos Humanos no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 22

75RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 94

76FINLEY, Moses. Democracia Antiga e Moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1988, p. 99

77STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 227

78GALLO, Rodrigo. A Crueldade Democrática. São Paulo: Revista Leituras da História, Ed. Escala, 2007

79ROSTOVTZEFF, M. História da Grécia. São Paulo: Zahar Editores, 1960, p. 35

80Doutor em filosofia política pela Universidade de São Paulo (USP)

81ASSIS, Olney Queiroz, KUMPEL, Vitor Frederico, SPAOLONZI, Ana Elisa. História da Cultura Jurídica O Direito Na Grécia. São Paulo: Método, 2010, p. 48

82Crimes de impiedade. Explicaremos com mais nitidez no subcapítulo Direito Processual Grego

83BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 56

84FERRI, Enrico. Discursos Forense: Defesas Penais. São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 14

85MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 163

86Ato de jogar a primeira gota da bebida no chão em homenagem aos deuses

87PLATAO. Fédon. Sao Paulo: Nova Cultural, 1974, p. 125

88Ibid, 2007, p. 52

89Teoria Délia: delegação das cidades gregas às festas solenes no Templo de Apolo de Delos.

90XENOFONTE. Memoráveis IV, Sao Paulo: Abril Cultural, 1980, p. 157

91ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 110

92GASTALDI, Viviana. Direito Penal na Grécia Antiga. Florianópolis: Boiteux, 2006, p. 88

93Ibid, 2006, p. 91

94ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 20

95A legislação brasileira também contemplou essa situação. Vide art. 1556 e 1557 do Código Civil e art. 236 do Código Penal.

96Ibid, 2003, p. 20

97MURSTEIN,Bernard. Amor Sexo e Casamento através dos Tempos. Tomo I. São Paulo: Arte Nova, 1977, p. 74

98CORRAL, José Luis. O Número de Deus. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003, p. 360-361

99COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 52

100COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2004, p. 52

101ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 16-17

102MARTINS, Ives Gandra da Silva. A Cultura dos Juristas (Formação Jurídica) Coord. José Renato Nalini. p. 114

103CÍCERO. Dos Deveres. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 108

104Ibid, 2007, p. 109

105ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 15

106ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 102

107Ibid, 2003, p. 41

108ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 141

109ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 141-144

110 Ibid, 2003, p. 65-66

111 ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 47

112 ASSIS, Olney Queiroz, KUMPEL, Vitor Frederico, SPAOLONZI, Ana Elisa. Historia da Cultura Jurídica O Direito na Grécia. São Paulo: Método, 2010, p. 139

113 Direito de todos se manifestarem igualmente na Assembleia ou em qualquer território grego

114 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 174

115 Ibid, 2003, p. 106

116 ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 108-109

117 STONE, Isidor. F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 34

118 Ibid, 2007, p. 64

119 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 357

120 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 187

121 ROCHA, Zefeino. A Morte de Sócrates. São Paulo: Escuta, 2001, p. 66

122 Ibid, 2007, p. 64-65

123 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 223

124 Ibid, 2009, p. 223

125 ROCHA, Zefeino. A Morte de Sócrates. São Paulo: Escuta, 2001, p. 66

126 Ibid, 2009, p. 223

127 O papel de fiscal da lei era protagonizado pelo povo.

128 O art. 301 do Código de Processo Penal Brasileiro também prevê esse comportamento: “Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.”

129 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 181-182

130 RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a Luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 60-61

131ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 66

132 ARISTÓTELES. Ética à Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2010, p. 43

133 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2007.

134 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 219

135 Samuel Pufendorf (8 de janeiro de 1632 - 13 de outubro de 1694) foi um jurista alemão que ensinou que a vontade do Estado é a soma das vontades individuais que o constituem e que tal associação explica o Estado. Seus escritos influenciaram Montesquieu e Blackstone

136 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 171

137 SÓCRATES. Socrates Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1975, p. XXI

138 Subcapítulo 8

139 ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Grécia Antiga. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 91

140 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 221

141 MEINARDUS, Otto F. A. St. Paul in Greece. Atenas: Lycabettus Press, 1997

142 ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Grécia Antiga. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 91

143 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 179

144 Seção judiciária. Ex: Comarca de Fortaleza; Comarca de Sobral; Comarca de Campinas etc.

145 ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Grécia Antiga. São Paulo: Odysseys, 2003, p. 166

146 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 222

147 MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 22

148 Lycon, the Third Acusser Lycon, University Press, 1938.

149 ASSIS, Olney. História da Cultura Jurídica: O Direito na Grécia. São Paulo: Método, 2010, p. 102

150 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 222

151 HARVEY, Paul. Dicionário Oxford de Literatura Clássica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987, p. 369

152 RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Dever do Advogado – Rui Barbosa. Brasília: Consulex, 2010.

153 MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 134

154 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 217

155 Ibid, 2005, p. 217

156 PLATÃO. A República. São Paulo: Martin Claret, 2003, p. 250

157 ROCHA, Zeferino. A Morte de Sócrates. São Paulo: Dimensão, 2001, p. 72

158 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 222

159 ARISTÓTELES. Constituição de Atenas. 52, I

160 PLATÃO. Fédon. São Paulo: Abril Cultural, 1975, p. 90

161 MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 148

162 Ibid, 1960, p. 162

163 MOSSÉ, Claude. O Processo de Sócrates. Rio de Janeiro: Zahar, 1991, p. 113

164 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 39

165 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 144

166 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 225

167 COHEN, David. Law, Violence and Comunity in Classical Athens. New York: Cambridge University Press, 1994, p. 19

168 ARISTÓTELES. A Constituição de Atenas. São Paulo: Martin Claret, 2009, p. 105

169 ARISTÓFANES. As Nuvens. São Paulo: Abril Cultural, 1975, p. 213

170 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 179

171 DAREMBERG, Charles, SAGLIO, Edmond. Dictionnaire des antiquités grecques et romaines. Paris: Hachete, 1919.

172 THOMAS, Gordon. O Julgamento de Jesus: Um relato jornalístico sobre a vida e a inevitável crucificação de Jesus Cristo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2007, p. 103

173 RIBEIRO, Roberto Victor Pereira. O Julgamento de Jesus Cristo sob a Luz do Direito. São Paulo: Pillares, 2010, p. 96

174 ARISTÓTELES. A Constituição de Atenas. São Paulo: Martin Claret, 2009, p. 129

175 MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 103

176 STONE, Isidor F. O Julgamento de Sócrates. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 223

177 MASSARA, Franco. Os Grandes Julgamentos: Sócrates. Lisboa: Otto Pierre Edicoes, 1960, p. 135

178 Ibid, 1960, p. 138

179 ARISTÓTELES. A Constituição de Atenas. São Paulo: Martin Claret, 2009, p. 105

180 ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Grécia Antiga. São Paulo: Odysseys, 2003, p. 111

181 Entendemos que a lei prosseguia, mas o fragmento que chegou até nós não continuava.

182 ROCHA, Zeferino. A Morte de Sócrates. São Paulo: Escuta, 2001, p. 70

183 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 180

184 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Grego & Historiografia Jurídica. Curitiba: Juruá, 2009, p. 225

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