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Direito Romano


Autoria:

Roberto Victor Pereira Ribeiro


Graduado em Direito Publico Pós-graduado em Direito Processual Pesquisador de Ciências das Religiões, Teologia, Parapsicologia Membro da Associação Brasileira de Bibliófilos Membro da Associação Brasileira dos Advogados Advogado

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Texto enviado ao JurisWay em 08/08/2011.

Última edição/atualização em 09/08/2011.



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DIREITO ROMANO


O império romano até os dias atuais é cultuado como uma das mais belas organizações sociais que já existiram no mundo. O romano possuía uma idiossincrasia muito marcante. O povo conseguiu se destacar em diversas atuações. Conforme mencionado antes, é notório que o povo de Judah nos deu a religião, o povo da Grécia nos ofertou as Artes, mas o romano nos presenteou com as leis e o modelo de perfeição jurídica. Os grandes causídicos eram romanos. Os grandes juízes eram romanos. Os grandes tribunos eram romanos. Abordaremos, preliminarmente, uma breve narrativa histórica da população romana. Veremos algumas de suas conquistas, vitórias, organização, bem como suas particularidades religiosas, sociais, econômicas, etc..


Aspectos Históricos


A origem de Roma é permeada por duas lendas. Os antigos ligavam dois grandes ciclos de lendas ao nascimento de Roma. Difundiu-se a lenda de Enéias, o troiano fugitivo que veio estabelecer-se no Lácio (séc. XII a.C.) e fundou Lavínia, de onde Roma nasceria depois. Porém a mais conhecida das lendas é atribuída a Rômulo e Remo. Rômulo é conhecido como o fundador de Roma (753 a.C.). Tal evento se consolidou, quando Rômulo traçou ao redor do Palatino, uma das “sete” colinas, consideradas o sulco sagrado e primeiro contorno urbano. Rômulo é considerado pela História como o primeiro Rei de Roma e como tendo se transformado no Deus Quirino ou Quirites, passando a ser o protetor de todos os romanos. Roma teve seu período de Realeza, depois passou a ser República, até chegar a ser Império. Foi neste regime que a nação mais se destacou, deixando seu nome cravado para sempre nos anais da História.

No período da Realeza, Roma adotou o Direito Quiritário (Direito arcaico). Na religiosidade o romano da época da realeza possuía um Deus no interior de suas casas, não saía de casa com o pé esquerdo; só cortava o cabelo na lua cheia e fazia inscrições nas paredes da casa para que os deuses protegessem o patrimônio. Nas questões públicas os cargos eram nomeados de acordo com a vontade dos deuses.

Os romanos se dividiam entre patrícios, clientes, plebeus e escravos.

Os patrícios eram conhecidos como descendentes de Rômulo e só eles possuíam o status civitatis, ou seja, cidadania romana.

Os clientes eram estrangeiros que viviam sob a custódia dos patrícios. Eram protegidos e dependentes totais dos cidadãos romanos (patrícios). Não podiam cultuar os mesmo deuses dos romanos e não podiam ser detentores de cidadania romana.

Os plebeus eram estrangeiros vindos de regiões distantes. Trabalhavam habilidosamente no comércio, na agricultura e no artesanato. Residiam fora da cidade, em um bairro fechado localizado nas encostas dos montes em casas que se chamavam insulae. Eram considerados desprezíveis, pois não tinham religião, proteção da lei, empatia da sociedade e não se agrupavam em famílias.

Roma teve sete reis no período monárquico: Rômulo, Numa Pompílio, Túlio Hostílio, Anco Márcio, Lúcio Tarquínio Prisco, Sérvio Túlio e Lúcio Tarquínio, o soberbo.

Roma evoluiu e chegou ao período denominado de República. Nesta época o Estado adotou o Direito Pretoriano ou Direito das Gentes. A República se diluiu após a revolta dos patrícios com o monarca que havia beneficiado os plebeus com direitos. Este rei chamava-se Tarquínio, o soberbo, e foi deposto pelo poder patrício.

Neste regime de governo foram criados institutos importantes para o crescimento e organização social. O instituto da magistratura foi criado para cuidar dos assuntos de interesse da República. Eram magistrados: os Cônsules, Pretores, Censores, Edis (“vereadores”) e os Questores. Esses cargos tinham como funções, cuidar das legiões romanas, apreciar litígios, fazer recenseamentos, zelar pelos costumes da população através de um policiamento ostensivo, proteger o erário, etc.

Nesta época também se desenvolveu o Senado Romano. Tal instituição era composta de senadores oriundos dos patrícios, e eram escolhidos pelos magistrados. Já no fim do período Republicano os plebeus também podiam assentar no Senado e fazer uso da palavra nos votos. O Senado tinha como atribuições: controlar as finanças, administrar as províncias, negociar com povos estrangeiros, ratificar leis votadas pelas assembléias populares, etc.

O Estado evoluía e com ele os seus regimes políticos também avançavam. Eis que surge o Império. Neste governo adotava-se o Direito Romano Jurisprudencial.

O Império sucedeu à República de Roma. Augusto reorganizou o território, acabando com a corrupção e a extorsão que haviam caracterizado a gestão anterior.

Esse majestoso império se constituía de 54 províncias e, depois do ano 27 a.C., passou a ser dividido em províncias senatoriais e imperiais. As províncias senatoriais eram reguladas pelo Senado, enquanto as demais eram controladas pelo Imperador. Nas províncias imperiais o Imperador era representado pelos legatti Augusti propraetore, nomeados pelo Imperador por um período que variava entre 3 e 5 anos. Era costume se nomear senadores que tivessem exercido a pretura ou o consulado. As províncias senatoriais (publicae provinciae) eram regidas por pró-cônsules, escolhidos através de sorteio entre os senadores que tivessem exercido a pretura ou o consulado pelo menos por 5 anos.

No quesito militar, Roma possuía um exército muito voraz. O império todo era assistido por um contingente bélico jovem, dividido em 25 legiões (cada legião contava com 5.620 homens) e de tropas auxiliares, coortes de infantes e alas de cavalaria, cujos efetivos eram mais ou menos iguais ao das legiões. Somando tudo, o império romano contava com 350.000 homens, fora os exércitos fornecidos pelos reis aliados. Era muito difícil Roma entrar numa guerra e não sair vitoriosa.

A população romana podia ser catalogada em 50 a 80 milhões de habitantes. As cidades mais importantes eram Roma que possuía 1 milhão, Alexandria 1 milhão e Antioquia 500 mil. O império romano não se tratava de uma unidade monolítica, pelo contrário, havia muitas diferenças étnicas, urbanas, religiosas, jurídicas, etc.

Roma dividia seu povo entre os cidadãos e os estrangeiros. Os primeiros tinham privilégios, os segundos dependiam da etnia de origem para obterem maiores respaldos. Os escravos não eram considerados pessoas. Não havia existência jurídica e humana para um escravo. Só muito tempo depois, com ajuda de várias correntes filosóficas, passaram a admitir o escravo como um ser humano. Os escravos especializados (cozinheiros, médicos, secretários) possuíam outra condição e tinham grande valor comercial, eram bem tratados e muitas vezes conseguiam ser libertos.

A economia romana era, basicamente, composta da agricultura, culturas de vinhas, cereais e legumes. Era pouco usada a pecuária para efeitos de corte e alimentação, porém, eram muito usados os couros e o meio de transporte por animais.

Roma estabelecia vários recenseamentos para verificar a capacidade econômica de cada indivíduo pertencente ao reino. Após os censos eram feitos os cálculos para descrever a quantia que cada um devia recolher. Neste momento passa a existir o cobrador de imposto (o evangelista Mateus era um) que ficava em postos de coleta no centro das cidades. Geralmente os cobradores não eram romanos.

A ocupação romana na região judaica já foi explicada no capítulo anterior. Mas é pertinente que se comente determinados comportamentos romanos em face do povo judeu. O governo central romano derrama especiais atenções ao presidente do Grande Conselho (Sinédrio), o Sumo Sacerdote, Caifás. O cargo de Sumo Sacerdote era nomeado pelo império romano que também possuía poderes para demitir o supremo sacerdote. As vestimentas suntuosas que o Sumo Sacerdote usava eram de propriedade romana e ficavam na fortaleza Antônia, sede do governo romano e casa do Governador. Entretanto, é altamente respeitado o sentimento religioso dos judeus. Tanto que não se via nenhuma efígie do imperador em terras judaicas, e os que tentaram violar isso foram devidamente responsabilizados. Pilatos, conforme veremos adiante foi um dos que tentaram violar esse respeito à religião judaica.

No aspecto religioso os romanos eram pagãos e creditavam ao Imperador o título de Deus. Também era muito difundida a filosofia dos estóicos. Tal filosofia foi fundada em Atenas por volta de 300 a.C., o estoicismo teve amplo valor especial para a cultura romana desde 150 a.C., até por volta de 200 a.C. Os estóicos pregavam que a base para se decidir entre o certo e o errado deve ser encontrada na natureza. Todos comungavam com o pensamento de que há uma justiça universal, ou uma lei natural que nos rege. Tal cultura enriqueceu muito os romanos com lições racionais, inclusive em celeumas jurídicas.

No quesito Justiça e Direito o império romano era o zênite na época. Nesta situação César Vidal em sua obra leciona: “Roma não deseja que ninguém, nem mesmo um bárbaro, se veja privado do direito processual de defesa.”1

Encerramos essa breve abordagem histórica do Estado de Roma, passando agora para os comentários acerca do Direito Romano.


Direito Romano


É o Direito que figurou em Roma desde a sua fundação até a morte do Imperador que ordenou sua codificação. O Direito Romano possui fundamentos teóricos divididos entre Filosofia e História e questionamentos práticos baseados nas instituições jurídicas, no vocabulário jurídico, nos processos legislativos e na hermenêutica jurídica. Os estudiosos do Direito Romano enumeram três notáveis características para o ordenamento legal: o positivismo, o conservadorismo e o individualismo. Os conceitos básicos para a compreensão do Direito Romano foram incluídos em seis: jus, fas, jutistia, aequitas, jurisprudentia e juris praecepta..

O Jus era regido pelas normas religiosas que possuíam àquela época força de lei. O Jus possuía a Norma Agendi (Direito Objetivo) e a Facultas Agendi (Direito Subjetivo).

O Fas provém do Direito falado dos Deuses. Seriam normas legais faladas pelos Deuses e transmitidas aos sacerdotes e pitonisas. O Fas é o Direito falado, dito, revelado pela divindade que influenciava o Direito público e privado.

A Justitia era a vontade firme e perdurável de dar a cada um o seu Direito. No campo do Direito, praticar a justiça é encontrar-se perfeito.

A Aequitas era uma justiça baseada na igualdade material. Depois de uma evolução passou a ser vista como uma tríade: igualdade, proporcionalidade e caridade. Significa justiça ideal ao caso concreto.

Rodrigo Freitas Palma, em sua obra, menciona que Jesus aplicava a Aequitas: “Jesus [...] chegando, inclusive, a assumir uma postura jurídica amparada no que os romanos chamaram de Aequitas.2.

Na visão de José Cretella Junior essa Aequitas tinha uma força especial já que “pela equidade tempera-se o rigor do Direito, abranda-se a impessoalidade do texto legal”.3

A Jurisprudentia era a prudência (conhecimento e previsão das coisas que devem ser desejadas e das que devem ser evitadas) ou ciência do Direito. Era a decisão constante e uniforme dos tribunais.

E por fim, os Júris Praeceptas, que seriam os princípios gerais do Direito.

Nos Júris Praeceptas4, três figuravam como muita força: Honeste Vivere – viver honestamente, Alterum nom laedere – não lesar a ninguém e Suum cuique tribuere – Dar a cada um o que é seu.

Na organização do Direito Romano inclui-se a legislação escrita e a Jus non scriptum baseada em costumes. A codificação escrita abrange: as leis propostas pelo magistrado ou sancionada pelo Senado, os plebiscitos, os éditos preparados pelos magistrados, as decisões dos senadores e as constituições imperiais da época.

As leis mais importantes foram: A lei das XII Tábuas instituída em 449 a.C., Digesto – Pandecta – enciclopédia, que foi elaborada de 530 a 533 d.C., as Institutas feitas em 533 d.C., as novelas criadas entre 535 a 536 d.C.. Essas últimas fazendo parte da obra máxima do Direito Romano, o Corpus Juris Civile.

Na visão de Rodrigo Freitas Palma, a máxima do Direito Romano encontra-se no Digesto e materializa-se na expressão: “Dar a cada um o que lhe é devido”.5

Cezar Roberto Bitencourt apregoa em sua obra que “O primeiro Código Romano escrito foi a Lei das XII Tábuas, contendo ainda as normas do Talião e da composição, que resultou da luta entre patrícios e plebeus. Essa lei inicia o período dos diplomas legais”.6

O mesmo Bitencourt prossegue em sua opinião lecionando “O Direito Romano oferece o ciclo jurídico completo, constituindo até hoje a maior fonte originária de inúmeros institutos jurídicos. Roma é tida como a síntese da sociedade antiga, representando um elo entre o mundo antigo e o mundo moderno”.7

Na época do enfoque principal desta obra, a época em que viveu Cristo, o poder jurisdicional era depositado nas mãos do governador por transmissão do Imperador. O governador passou a ter o chamado ius gladii, ou seja, o poder da vida e da morte.

Quem tomava assento na governança no período do julgamento era Pilatos.

Pôncio Pilatos foi governador da Judéia entre 26 a 37 d.C.. Foi o responsável pela coleta de impostos e de taxas que eram usadas para atender as necessidades locais e para serem enviadas a Roma. Inclusive, certa vez foi acusado pela turba judaica de ter se apropriado ilegalmente do tesouro do Templo. A história narra que, certa vez, sem dinheiro em caixa, Pilatos havia mandado soldados saquearem o Templo para roubar o tesouro com o fim de construir um aqueduto para a cidade de Jerusalém. Pilatos era muito mal visto pelos judeus devido a seus atos de crueldade e traição. Numa ocasião mandou soldados romanos se vestirem de judeus e espalhou-os na multidão judia. A um comando só, todos os soldados golpearam e massacraram centenas de judeus despreparados. Filon, historiador, descreve Pilatos como arrogante, orgulhoso e irônico. Em sua obra “Legatio ad Gaium”, Filon narra um episódio de afronta de Pilatos em relação aos costumes religiosos judeus, e acrescenta dizendo que neste episódio Pilatos havia sido inflexível e intransigente. Ressaltou ainda que Pilatos costumava mandar executar prisioneiros sem nenhum processo formal, somente para saciar sua crueldade e intolerância. Totalmente diferente dos relatos Evangélicos que lemos. Nos Evangelhos encontramos um Pilatos paciente, compreensivo, cortês, contemporizador, etc.

Marcus J. Borg e John Dominic Crossan atestam que Pilatos era governador de Iduméia, da Judéia e da Samaria.8

E este era Pilatos, um dos carrascos judiciais de Cristo. Prossigamos, discorrendo sobre o Direito da época.

O Direito principal de nosso estudo talvez seja o Direito Penal Romano já que este foi o Direito responsável pelo Julgamento de Jesus Cristo, tema principal desta obra.

Neste aspecto, de antemão, podemos afirmar que o Direito Penal Romano contribuiu decisivamente para a produção da ciência Penal, principalmente com a criação de princípios penais sobre o erro, a culpa ou o dolo (bonus e malus), imputabilidade, coação irresistível, agravantes, atenuantes e legítima defesa.

Há de se ressaltar, também, que o Direito Romano não sistematizou seus institutos penais. Cada caso era julgado de acordo com sua particularidade.

Na esfera específica do Direito Penal, após a época primitiva de caráter essencialmente religioso, houve uma preocupação de laicizar o sistema coativo, punindo o infrator com respaldo no interesse individual ou público. As infrações passaram a ser divididas em crimes públicos (crimina pública) e privados (delicta privata).

Os primeiros executavam-se em atos atentatórios à segurança interna ou externa do Estado Romano e, por isso, deveria exercer a coação contra o infrator. Com o decurso dos tempos, os demais atos passaram à classe de crimes públicos, como é o tipo do homicídio, precipuamente sancionado pelos familiares da vítima sob a denominação. As penas eram severas, como de morte ou deportação. Os crimes privados se sujeitavam à repressão do ofendido ou de seus familiares e eram julgados pela justiça civil.

As penas mais conhecidas eram:

Supplicium: Havia uma execução do delinqüente.

Damnum: Pagamento em pecúnia.

Poena: Pagamento em dinheiro quando o delito era de lesões.

Há de se comentar que o Paterfamiliae não só atuava nos Direitos de Família como também em questões criminais quando estavam envolvidos seus familiares.

No supplicium figuravam as execuções por timpanamento, laceração das carnes, flammis tradi (entregar as chamas), ad bestias (condenação às feras), culleum (submersão em um saco), patibulo adfigatur (forca) e a tão famigerada crucificação.

Pedimos vênia, caro leitor, para tecer algumas considerações sobre a pena da crucificação.

A crucificação conhecida como o tormento da crucifagium era muito difundida na antiguidade. Existem relatos dessa pena sob várias formas entre os numerosos povos do mundo antigo, até mesmo entre os gregos. A crucificação em primeira medida era usada como punição política e militar. Já entre os Catargineses e os Persas a punição era imposta basicamente aos altos oficiais e comandantes, bem como a rebeldes. Os romanos aplicavam-na diretamente às classes inferiores, aos escravos, criminosos violentos e infratores envolvidos com sedição. A crucificação era sempre precedida por torturas e açoites.

Kurt A. Speidel explica como era a peça da cruz: “A cruz reúne duas traves: uma longitudinal e outra transversal. É o horizontal que se une ao vertical. E o corporal e o espiritual, o terreno e o celeste que se harmonizam na unidade”.9

O mesmo Kurt A. Speidel traz uma informação histórica sobre a crucificação entre os persas:


Cabe aos persas a triste fama de terem sido os primeiros a executar a pena da crucificação em grande escala. Quando conquistou Babilônia, Dário arrasou suas muralhas, despedaçou-lhe as portas e mandou crucificar os principais da cidade. O historiador Heródoto fala de cerca de três mil pessoas. Os persas, aliás, inventaram o processo de crucifixão também por razões religiosas. Não queriam que a terra fosse contaminada com o cadáver de um criminoso, pois, afinal, a terra era consagrada ao seu Deus Ahura Mazda.10


Alexandre Magno (o grande), herói e conquistador do mundo antigo, mandou crucificar milhares de prisioneiros.

Josefo fala em suas antiguidades judaicas sobre a crucificação de dois mil homens em 4. E.C. em Jerusalém.

Thomas Gordon relata um pouco da prática romana de crucificação comentando: “A prática romana considerava que parte da penalidade de crucificação incluía a total degradação da vítima; a única concessão era que as mulheres eram crucificadas com a face voltada para a cruz – contudo, elas também eram deixadas completamente nuas.”.11

Marcus J. Borg e John Dominic Crossan atestam que somente o Império Romano crucificava à época de Jesus, e somente a imputava a quem cometesse o crime de negar a autoridade imperial.12

A inescruprulosidade de alguns romanos era tamanha que, certa vez, o Imperador Cláudio externou que gostaria de presenciar uma crucificação, da qual só escutava como sendo o meio mais eficaz de execução. Um dia muitos condenados foram crucificados diante dele, depois de olhar por várias horas, Cláudio perdeu a paciência e mandou matar todos.

O Juiz da suprema corte de Israel, Haim Cohn, faz um breve resumo histórico das crucificações romanas:

No ano 4. a.C., o governador romano Varo ordenou que dois mil combatentes da resistência judia fossem crucificados nas montanhas de Jerusalém. [...] O imperador Tibério Alexandre sentenciou Jacó e Simão, filhos de Judas, o galileu, a morte por crucificação; pouco anos depois uma segunda crucificação em massa de zelotas foi ordenada pelo governador Quadratus. Depois veio Félix, que superou seus predecessores crucificando não apenas rebeldes e zelotas, mas também qualquer cidadão suspeito de colaborar com eles. Félix sucedeu a Quadratus e, num só dia, mandou crucificar 3.600 judeus ou matá-los a caminho da cruz. O Imperador Tito mandou que os prisioneiros feitos durante o cerco de Jerusalém fossem crucificados nas muralhas da cidade e, dias depois, 500 morreram desse modo.13


Haim Cohn via a crucificação dessa maneira: “Cruz representava a miserável humanidade reduzida ao último grau de impotência, sofrimento e degradação.”14

Após a crucificação e a morte do condenado o seu corpo permanecia lá até ser decomposto por aves ou animais que alcançavam as cruzes mais baixas. Descer um corpo após a morte era um privilégio que exigia súplica, influência ou propina. Das milhares de pessoas que foram condenadas na época do domínio romanolix, que superou seus predecessores crucificando n Quadratus. depois tes da resistencia cidade. apenas um esqueleto foi encontrado. Era de um judeu de 20 anos, chamado Yehohanan, filho de Hagkol.

A sanção penal para os romanos tinha um caráter retributivo, exemplar e era excelente nas prevenções. O Direito Romano evoluiu para um nível técnico-profissional suficiente para distinguir os elementos subjetivos da infração (dolo ou culpa), pode-se dizer que houve aí uma contribuição para os conceitos de crimes dolosos e culposos.

O Direito Romano agiu com vanguarda na situação de inimputabilidade. Os romanos entendiam que um doente mental ou os menores não podiam ser capazes de agir com culpabilidade.

Os crimes na prescrição romana variavam entre delitos e quase-delitos. Os delitos começaram a ser punidos no início da história romana através da vingança privada, o Estado não punia o infrator, pois quem punia era um membro da família do ofendido. Após esse período semi-selvagem a punição passou a ser efetuada pela Composição Voluntária, que era o ressarcimento do mal através de indenização pecuniária. O ofendido possuía uma faculdade de escolher entre a indenização ou a Lei de Talião (olho por olho, dente por dente).

O Estado vislumbrou um descontrole nas punições e tomou o controle das repressões, passando a ser o interventor de aplicação das penas. Com a Lei das XII Tábuas houve uma fixação das penas para cada delito.

As espécies de delitos eram:

Delitos Públicos: Lesão a interesse público, ofensa à comunidade e à paz pública, traição, homicídio, falso testemunho, incêndio proposital e roubo de plantações no período noturno.

Os delitos públicos eram julgados por tribunais especiais cujos membros eram nomeados pelas assembléias populares ou pelo Senado.

Delitos Privados: Atos que ofendiam aos particulares na sua honra ou patrimônio, furto, apropriação indébita.

As modalidades de furto se dividiam em: Manifestum (em flagrante delito), a mão armada e o furtum nec manifestum (sem flagrante). A ação penal do furto era a actio furti.

Havia também a modalidade de rapina (furto qualificado).

Os demais crimes de Direito Privado eram: dano, injúria, violência, dolo e fraude contra credores.

Havia tipificação para os “quase-delitos”. Os quase-delitos eram atos que causavam prejuízos a uma pessoa mesmo sem intenção do autor. Exemplos de quase-delitos consagrados pela doutrina são: processos mal julgados, objetos atirados em via pública e objetos suspensos sobre o lar de outro.

A sanção prisional raramente era usada pelos romanos, Jerome Murphy-O’Connor em sua obra faz um relato histórico sobre tal modalidade sancional:


A lei romana não continha nenhum dispositivo para uma condenação à prisão; a detenção não era usada como castigo. Os indivíduos eram tirados de circulação por períodos mais longos ou mais curtos, sendo deportados. Eram mantidos presos em duas situações: enquanto estavam sob investigação ou, depois de pronunciada a sentença de morte, enquanto aguardavam a execução. [...] na prática, claro, a detenção podia se prolongar por um tempo enorme.15


Roma possuía diversas peculiaridades jurídicas. Se fôssemos adentrar profundamente em todas, precisaríamos de um trabalho bem mais prolongado e doutrinário. Mostraremos algumas das mais curiosas.

O Estado romano, já com a tutela da Igreja Apostólica Romana através de seu Rei Clóvis, promulgou uma lei dando asilo territorial a infratores. Seria uma espécie de abrigo em embaixadas conforme vemos em Direito Penal e Direito Internacional.

O tratado C. de Clercq, et, CCSL, 148A, na primeira parte do tratado em seu item primeiro leciona:

Referente a assassinos, adúlteros e ladrões refugiarem-se em uma igreja, decidimos que o que os cânones eclesiásticos decretaram e a Lei romana determinou deve ser seguido; não deve ser permitido que sejam removidos a força da igreja, da capela ou da habitação do bispo; não devem ser entregues, exceto sob juramento feitos sobre os Evangelhos que eles não serão mortos, mutilados ou punidos de alguma forma.


Roma nesta situação se posiciona totalmente a favor do Devido Processo Legal, princípio este, mais do que importante para a ciência do Direito.

O Direito Penal Romano possuía um instrumento para viabilizar suas demandas. Trata-se do Direito Processual Penal Romano, um verdadeiro instrumento de veiculação do Direito material penal.

Neste aspecto o Direito Processual estabelecia fundamentos:

Havia proibição de intentar duas ações ao mesmo tempo;

Impedimentos ao testemunho de parentes cognatos ou afins;

Exigência de designação do lugar e da hora do crime;

Em alguns casos prisão preventiva do acusador.

Este último dispositivo servia para garantir a veracidade das acusações.

O procedimento do processo era público, contraditório e oral.

O processo se iniciava com a propositura de acusação pelo cidadão romano. Em regra podia ser qualquer cidadão romano, mas em alguns casos somente o ofendido. O acusador deveria oferecer o libelo narrando a delatio criminis submetendo-se ao juízo mediante juramento. O órgão julgador recebia a denúncia e guardava o libelo no erário público colocando o nome do acusado em uma tábua no rol dos culpados. Após essas formalidades o acusado deveria se apresentar discretamente sem barba e cabelos incultos. Se em um ano o acusado não se apresentasse por contumácia seus bens eram todos confiscados.

Quando se apresentava era interrogado sobre a acusação. Se houvesse confissão o processo ali terminava, havia um confesso réu convicto. Se não houvesse confissão o pretor determinava a volta do acusado e do acusador em dia logo designado, com tempo suficiente para a colheita de provas, via de regra 30 dias, prazo que podia ser dilatado de acordo com o caso.

Na data marcada compunha-se o órgão julgador e eram sorteados os iudices iurati. Podia haver uma recusa tanto da parte do acusador como da parte do acusado em relação aos juízes sorteados.

A primeira fala era a do acusador e em seguida a do acusado. Tinham o tempo limitado pelo presidente, havia a réplica (duplicatio) e a audiência podia prosseguir em dias sucessivos. As provas eram divididas em: per tabulas, per testes e per quaestiones.

Tabulas eram as provas documentais; per testes eram as provas testemunhais e a per quaestiones eram as demais provas admitidas em juízo. Essas demais provas podiam ser a confissão espontânea ou obtida mediante tortura (só para escravos e homens sem importância jurídica).

No desenrolar das peças orais tanto de defesa como de acusação, o presidente sem manifestar sua opinião reunia os iuratis para efetuarem a votação. Nos primórdios eles votavam oralmente, mas depois passaram a votar nas supra tabellas.

A (absolvição) C (condenação) ou NL (non liquet), assim era a votação nas tabelas de cada jurado. A non liquet era o voto por um prosseguimento da colheita de provas, para uma discussão mais ampla.

Na apuração dos votos era revelado se era Condenação (Jure videtur fecisse), Absolvição (Non videtur fecisse) ou alagarmento da instrução (Amplius cognoscendum). Decididos, passava-se à execução do julgado; em caso de absolvição o acusador era processado e punido por extra ordinem.

Da sentença cabia a appelatio para o órgão superior.

Vejamos se o julgamento de Jesus seguiu estes passos codificados no Direito Processual Romano.


Após o vergonhoso julgamento ocorrido no Sinédrio judeu, amarraram Jesus e o trouxeram à presença de Pilatos.

Antes se faz mister comentar que o Direito Penal Romano exigia um indiciamento criminal formal antes que uma pessoa fosse detida. Ao que sabemos nenhuma ordem foi expedida contra Jesus para legalizar sua prisão.

Mateus relata em seu Evangelho que “ao romper do dia, todos os principais sacerdotes e os anciões do povo entraram em consenso contra Jesus, para o matarem; e, amarrando-o, levaram-no e o entregaram a Pilatos”.16

Pilatos então começou o interrogatório:

Pilatos o interrogou: És tu o rei dos judeus? Respondeu Jesus: Tu o dizes. Então, os principais sacerdotes o acusavam de muitas coisas. Tornou Pilatos a interrogá-lo: Nada respondes? Vê quantas acusações te fazem! Jesus, porém, não respondeu palavra, a ponto de Pilatos muito se admirar”.17

Neste aspecto o Evangelho de João não está consoante com Marcos e Mateus. No Evangelho de João há uma conversa bastante demorada entre Pilatos e Jesus, inclusive chegando Jesus, até responder e dialogar acerca de mistérios com Pilatos.

Mais quais seriam as acusações contra Jesus?

Precipuamente foram três:

  1. Acusaram Jesus de incitar o povo Judeu, proibindo de pagar imposto a César;

  2. Acusaram-no de se autodenominar Rei;

  3. Acusaram de ser agitador do povo começando suas atividades pela Galiléia até chegar em Jerusalém.

Esta terceira acusação influenciou Pilatos a tentar uma evasiva de tal Julgamento. Na opinião dele havia um conflito de competência derivado da ratione loci, em razão do lugar. Diante disso ele o remeteu a Herodes, rei da Galiléia para que este sentenciasse em sua jurisdição. Herodes era um esforçado escorraçador do banditismo daquela região e, em razão dessa atuação, às vezes merecia prestigio dos romanos.

Le Camus comenta que era um expediente comum para homens políticos enviarem acusados do Fórum aprehensionis para o Fórum originis, ou de domicílio. Na visão de Le Camus a autoridade que se comportava assim tinha vantagens tais como escapar de um processo complicado e inoportuno.

Lucas nos mostra dessa forma:

Ele alvoroça o povo, ensinando por toda a Judéia, desde a Galiléia, onde começou, até aqui. Tendo Pilatos ouvido isto, perguntou se aquele homem era Galileu. Ao saber que era da jurisdição de Herodes, estando este, naqueles dias, em Jerusalém, lho remeteu”.18

Herodes recebeu Jesus, fez algumas perguntas, insultou-o, mandou seus soldados colocarem uma túnica púrpura em Jesus e mandou-o de volta para Pilatos.

Pilatos conforme observamos nos Evangelhos fez esta tentativa de declarar incompetência, tentou também que os próprios judeus o julgassem com suas leis como lemos em João: 18,31; e, ainda tentou o privilegium paschale. Vemos nos Evangelhos uma faceta de Pilatos totalmente diferente das que encontramos na História.

O privilégio pascal era uma indulgência dada pelo governador a um preso. Segundo Gordon Thomas: “Tanto na lei romana quanto na judaica havia bases claras para permitir uma anistia por ocasião de uma grande festa. Os romanos tinham herdado o costume dos gregos, e o aperfeiçoaram em dois tipos de perdão. Havia a indulgentia.”.19

Nos perdões romanos também figurava o abolitio, um perdão concedido antes que fosse dada uma sentença romana.

O tratado Pesahim permitia que na Páscoa fosse libertado um prisioneiro tanto da custódia judaica quanto romana.

Haim Cohn discorre confirmando tal permissão: “encontramos no Direito Romano, com os últimos imperadores, o costume de perdoar criminosos (indulgentia criminum) na festa de Pessach”.20

Pilatos tentou, mas a multidão bradou que queria Jesus crucificado. A Bíblia narra que Pilatos perguntou a turba se eles queriam soltar Barrabás ou Jesus, e a multidão ensandecida escolheu a Barrabás, um homicida cruel para ser solto e clamavam pela crucificação de Jesus.

Segundo o Evangelho de João, Pilatos não aceitava a idéia de apenar Jesus. Após as tentativas de fugir da responsabilidade jurisdicional, tentar o indulto da Páscoa, Pilatos fez uma última tentativa de não se envolver na questão contra Jesus. João narra: “Eis que eu vo-lo trago aqui fora, para saberdes que eu não encontro nele motivo algum de condenação [...] Tomai-o e crucificai-o! Eu não encontro nele motivo algum de condenação”.21

A última cartada de Pilatos não logrou êxito e esse se viu acuado pela multidão para sentenciar Jesus a pior condenação daquelas épocas.

Eis que surge a mais nefasta e cruel acusação contra Jesus. Acusaram Jesus de renegar a César e de propagar a revolta contra o império romano, além de se nomear Rei do povo de Israel.

Tal acusação consistia no crime de perduellio, delito contra a segurança do Estado ou contra a ordem pública, que era sumariamente reprimido desde a época de Túlio Hostilio. Tal crime era preconizado nas XII tábuas e a sanção era a morte. Essa acusação era gravíssima aos olhos de Roma. Era chamado de omnium accusationum complementum. O historiador Tácito relata que um pouco antes da época de Cristo, Tibério deu um exemplo de rigor condenando Antistio de Macedônia, por tal crime.

Pilatos a primeiro ato não ia dar atenção a tal acusação, porém os acusadores ameaçaram formalizar uma denúncia contra Pilatos a Roma alegando que Pilatos permitia que ridicularizassem César e o Império Romano. Diante de tal ameaça, Pilatos não viu outra posição senão recuar e escutar mais calmamente às acusações.

Neste aspecto concorda Louis Waller que Pilatos acatou a denúncia e se predispôs a averiguar a culpabilidade de Jesus. Na sua obra escrita em inglês Louis Waller sentencia: Acredito que Jesus foi levado a fatídica condenação na cruz, em razão de um decreto de Augusto, datado do ano 8 a.C., a Lex Julia Maiestati. Esta lei considerava crime atroz e punível com a morte a reivindicação monárquica por qualquer habitante localizado nos territórios romanos. O delito era visto como muito grave, um ato de traição. Assim sendo a famosa inscrição Titulus no alto da cruz é a maior prova de tal punição.22

Pilatos então decide analisar o julgamento com mais afinco e cuidado.

Pilatos inicia o procedimento formal. Os julgamentos ocorriam no praetorium privadamente com a presença dos apparitores. O local em que se davam os atos era chamado de secretarium, só confirmando o fator secreto que se davam os julgamentos. Este recinto era separado de outras partes do prédio por uma parede ou uma cortina chamada velum, aberta sempre que alguém era convidado a vir depor no julgamento. No decorrer do procedimento ela permanecia constantemente fechada.

A primeira providência de Pilatos foi continuar o interrogatório com Jesus. Mais uma vez voltou ao lithostrotos e gritou a multidão que não via crime nenhum naquele homem. Mas a horda ali faminta de violência clamava em alto som: Crucifica-o, crucifica-o.

Consoante o evangelista Lucas vemos: “De fato, nada achei contra ele para condená-lo à morte; portanto, depois de o castigar, soltá-lo-ei”.23

Como pode alguém mandar outro para ser torturado quando sabia da inocência deste acusado? Pilatos assim procedeu.

O primeiro castigo aplicado a Jesus foi a flagelação. Há de se ressaltar que o estudo do Direito Romano nos ensina que somente os escravos e homens sem capacidade jurídica eram torturados. Nessa premissa confirma Cesare Beccaria: “os legisladores de Roma, que apenas mandavam à tortura os escravos, espécies de homem sem qualquer direito e sem participação nenhuma nas vantagens da sociedade civil”.24

A tortura romana era efetuada com uma vara pequena que possuía cordinhas de couro com pedacinhos de ossos de animais nas pontas. O desejo era rasgar a pele do torturado causando-lhe dor pelos milhares de ferimentos, a maioria nas costas.

Gordon Thomas explica de forma criteriosa como ocorria a tortura:


Um prisioneiro teria suas vestes rasgadas, e seria preso nu por meio de grilhões à parte inferior e superior, de tal forma que seu corpo ficaria arcado contra o poste. O prisioneiro era então chicoteado com um flagelo, tiras de couro que tinham na ponta um pedaço de metal ou osso de animal; sob a lei romana, tanto a face quanto os genitais podiam ser também atingidos. Havia também o açoite até a morte, em que um homem era cortado até os ossos e deixado com seus retalhos pendurados e as vísceras espalhadas no chão. Júlio César decretara que o açoite era demasiadamente cruel para que um soldado italiano o administrasse; a equipe de Pilatos incluía dois conscritos sírios que realizavam a tarefa.25


Assim acontecia a flagelação romana.

Gordon Thomas persiste na mesma linha e informa:


Cada um deles [conscritos] segurava um flagellum, feito de tiras de couro mergulhadas em salmoura, e um flagrum, cujas correias eram cheias de pedaços de osso e pequenas esferas de metal com superfícies pontiagudas. A escolha do instrumento era prerrogativa do comandante da guarnição, ao lado do poste. Os ladrões tinham sido brutalizados com o flagellum. Para Jesus ele ordenou o flagrum.26


Os ladrões citados por Gordon eram Dimas e Gestas, ladrões que foram crucificados ao lado de Jesus.

Gordon Thomas ainda relata que: “Um dos conscritos apanhou um balde de água misturada com sal e a espargiu sobre Jesus; a salmoura ardida era uma forma rotineira de despertar a vítima e ajudar a aumentar o sangramento”.27

Quando Pilatos avisou que iria torturar Jesus e logo após o soltaria, ele estava criando um costume facilitador para os governadores. Em 62 d.C., em Jerusalém o procurador Albinus mandou torturar friamente um homem chamado Jesus, filho de Ananias. Esse Jesus era um humilde agricultor e logo após a sua puberdade começou a profetizar em público, causando assim um alvoroço àquela época. Vamberto Morais informa em sua obra o teor da penalidade imposta a Jesus “e diz Josephus que ele foi fustigado até aparecerem os ossos. A cada golpe do látego ele gritava “Ai ai Jerusalém”. Albinus o interrogou repetidamente, mas também esse Jesus guardou absoluto silêncio. O procurador tomando-o como louco, mandou-o soltar”.28

Pilatos gostaria de ter feito o mesmo, mas a multidão sanguinolenta não se conteve e acurralou-o fazendo com que Jesus Cristo fosse crucificado.

Cesare Beccaria comenta:


A partir do momento em que o juiz se faz mais severo do que a lei, ele se torna injusto, pois aumenta um novo castigo ao que já está prefixado. Depreende-se que nenhum magistrado pode, mesmo sob o pretexto do bem público, aumentar a pena pronunciada contra o crime de um cidadão.”29 (grifo nosso)


Pilatos foi covarde traindo a si mesmo. Ele já havia dito várias vezes que não percebia crime nenhum em Jesus. Tentou soltá-lo em duas oportunidades e na última apenou um inocente com a tortura achando que ia libertá-lo depois, vão sonho, mera vontade.

Ele fez isso com um homem que possuía boa conduta, e tinha uma reputação invejável. Era muito virtuoso e sábio, detinha com certeza um conhecimento elevado. Essas são as palavras de Josefo se referindo a Jesus de Nazaré, uma verdadeira folha corrida de benesses e bons costumes.

Para completar Pilatos permitiu toda essa patuléia e sentenciou Jesus em pleno feriado nacional do povo judeu. Isso era um absurdo jurídico, senão, vejamos: “O feriado é um dia nefasto; não se faziam reuniões, não se julgava, e ficava toda suspensa a vida pública.”30

Fílon relata em sua obra histórica que os governadores tinham duas condições em feriados nacionais quando o assunto era crucificação. As duas opções eram: ou adiavam a crucificação, sem anular a sentença condenatória ou permitiam que após a crucificação o acusado fosse enterrado. Fílon prossegue relatando que tal propósito dessas condições era manter a santificação do feriado. O feriado então para o acusado era um curto adiamento de sua pena, mesmo que não fosse um perdão permanente.

Pilatos, após várias petições de José de Arimatéia, permitiu que Jesus fosse enterrado no sepulcro particular da família de José. Perguntamo-nos então: Pilatos permitiu porque foi humano e caridoso? Ou ele apenas cumpriu uma ordenação consuetudinária?

Voltando aos atos judiciais proferidos por Pilatos, percebemos que ele, mesmo observando a inocência de Jesus, condenou-o a pior morte da antiguidade.

Mesmo tentando quatro evasivas: quis transferir a responsabilidade para Herodes, depois tentou soltar Jesus pelo privilegium paschale, prosseguiu propondo a multidão só flagelá-lo e depois libertá-lo, chegando a última que foi a famosa lavagem das mãos, Pilatos subiu ao Lithostrotos e decretou: “íbis ad crucem!”.

Pilatos decretou uma pena que até mesmo para Roma era hedionda e cruel.

Tácito narra um debate caloroso ocorrido no Senado Romano a respeito das penas. Um Senador protestou veementemente contra a aplicação de penas violentas, argumentando que não era isso que devia merecer um criminoso depravado. Dizia ainda que um governo esclarecido e que um Senado imaculado não podiam concordar com carrascos, cruzes e cordas, e, que tais condutas deveriam ser abolidas e previstas nas leis quando e como deviam ser cumpridas, sem crueldade e sem desonrar a geração.

O Professor S.G.F. Brandon31 parece não compreender que Pilatos fez tal monstruosidade: Foi espantoso o comportamento de Pilatos ao condenar à morte uma pessoa que ele sabia ser inocente, ao libertar um lutador popular da resistência provavelmente um Zelota (Barrabás) que tinha acabado de mostrar o quanto era perigoso.

Nada e nem ninguém entenderia as atitudes de Pilatos, ora inocentando, ora condenando a um homem que só sabia curvar a cerviz diante de sua resplandecência parda.

Alguns historiadores alegam que Pilatos se perdeu porque em determinado momento percebeu que podia acabar com todos os lucros de impostos que fluía para seu comando, o que era excelente aos olhos do Imperador em Roma. Com isso negou a si mesmo para não perder a pompa e o status de poderoso.

Pilatos anulou o princípio mater dos julgamentos romanos: NEMINI MORTEM IRROGARE, QUAMVIS PESSIMA MERITO.32

Jesus não teve a justiça a seu lado em seus julgamentos, não sabemos por quê. Talvez por propósitos que nossa compreensão nunca irá entender. O que sabemos e compreendemos é que houve um verdadeiro EQUÍVOCO JUDICIAL e que Jesus saiu do pretório romano acompanhado de seu exactor mortis e mais três soldados, carregando sua cruz, aquela que viria a ser o objeto mais venerado do mundo cristão.

Jesus sobreviveu por seis horas na Cruz.

O que descrevemos não se encontra somente nos quatro Evangelhos, mas, também, nos livros descartados pelos primeiros pais da Igreja nos concílios de Nicéia e Calcedônia. Todas essas fontes sugerem que os acontecimentos ocorreram amplamente da forma que demonstramos.


1 VIDAL, César. O testamento de Pedro. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2005, p. 36

2 PALMA, Rodrigo Freitas. O julgamento de Jesus Cristo: Aspectos histórico-juridicos. Curitiba: Juruá, 2006, p. 38

3 CRETELLA JR.,José. Curso de Direito Romano. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 36-37

4 Preceitos do Direito Romano

5PALMA, Rodrigo Freitas, Op. Cit,2006, p. 30.

6 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal: Parte Geral, Vol. I., 7ºed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 283.

7 Ibid.2002, p. 214.

8 BORG, Marcus J. et al. A última semana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007, p. 16.

9 SPEIDEL, Kurt A. O julgamento de Pilatos. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 10

10 Ibid. 1979, p. 120

11 THOMAS, Gordon. O julgamento de Jesus: Um relato jornalístico sobre a vida e a inevitável crucificação de Jesus Cristo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2007, p. 318.

12 BORG, Marcus J. et al. A ultima semana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2007, p. 44.

13 COHN, Haim. O julgamento e a morte de Jesus. Rio de Janeiro: Imago, 1994, p. 238.

14 Ibid, 1994, p. 243

15 MURPHY-O’CONNOR, Jerome. Paulo: Biografia Critica. São Paulo: Loyola, 2000, p. 188-189

16 Mateus 27, 1-2.

17 Marcos 15, 2-5.

18 Lucas 23, 5-7.

19 THOMAS, Gordon. O julgamento de Jesus: Um relato jornalístico sobre a vida e a inevitável crucificação de Jesus Cristo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2007, p. 303.

20 COHN, Haim. O julgamento e a morte de Jesus. Rio de Janeiro: Imago, 1994, p. 187.

21 SPEIDEL, Kurt A. O julgamento de Pilatos. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 104.

22 WALLER, Louis. The Trial and Death of Jesus. Disponível em: <www.jcrelations.net/em/?id=837> . Acesso em: 06 set. 2005 p. 3

23 Lucas 23, 22

24 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 42.

25 THOMAS, Gordon. O julgamento de Jesus: Um relato jornalístico sobre a vida e a inevitável crucificação de Jesus Cristo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2007, p. 278.

26 Ibid.,2007, p. 308.

27 THOMAS, Gordon. O julgamento de Jesus: Um relato jornalístico sobre a vida e a inevitável crucificação de Jesus Cristo. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2007, p. 310

28 MORAIS, Vamberto. O mistério de Jesus: Cristo à luz da Religião comparada e da História. São Paulo: Ibrasa, 1990, p. 269.

29 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Martin Claret, 2007, p. 20.

30 COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 179.

31 BRANDON, S.F.G. The Trial of Jesus of Nazareth. EUA: East Tennessee University, 1957.

32 “Não condenar ninguém a morte, nem mesmo pelo pior delito.”

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