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A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS SOB O PRISMA DA OBRA LITERÁRIA VIGIAR E PUNIR


Autoria:

Camila Carvalho Rabelo


Estudante do Curso de Direito da Faculdade AGES, Estagiária do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe.

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Texto enviado ao JurisWay em 04/08/2011.

Última edição/atualização em 09/08/2011.



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A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS SOB O PRISMA DA OBRA LITERÁRIA VIGIAR E PUNIR

 

Camila Carvalho Rabelo[1]

 

RESUMO

 

O presente artigo propõe uma análise entre a obra de Michel Foucault “Vigiar e Punir” e sua contextualização na atualidade. Visa também compreender os procedimentos preparatórios para a punição e sua evolução, bem como vislumbrar a prevalência ou inexistência dos princípios inerentes à dignidade do ser humano no liame entre a acusação até as execuções das penas.

PALAVRAS-CHAVE: Direito Natural; Estado de Direito; Liberdades Individuais; Punição; Prisão; Principio da Isonomia.

 

I – INTRODUÇÃO

 

O devido processo legal é preceito constitucional ínsito no art. 5º, inciso LIV da Carta Magna vigente.[2] Neste diapasão, é premente para que um delinqüente venha ser punido pelo Estado Juiz, ocorra a sua submissão aos jus persequendi, seja qual for o regime político adotado, sob pena de ferir de morte o Estado Democrático de Direito. O homem nasce livre e possuidor do livre arbítrio, podendo dele dispor e atinar para o rumo que julgar adequado aos seus interesses.[3]   Porém, por vezes acaba cometendo condutas que lesionam o direito alheio, o que legitima a punição estatal.

 

II - PRINCIPIOS PROCESSUAIS PENAIS E AS PENAS

 

A obra Vigiar e Punir do historiador Michel Foucault, retrata um período da história ancorada nos séculos XVII e XVIII, atinando para o direito que tem o Estado de rechaçar a pratica de crimes, condenando os delinqüentes ao suplicio. Mesmo sendo este um dos mais horrendos métodos punitivos utilizados na época, era a forma estatal de disseminar o exemplo aterrorizador por toda sociedade, e assim inibir a reprodução dos atos delituosos. Para execrar o corpo do apenado, o Estado se valia de um processo que ocorria de forma sigilosa e inquisitória, relegando o acusado a sorte das sessões de tortura que culminavam geralmente em confissão do crime, o que aos olhos contemporâneos é método asqueroso e constitucionalmente ilegal.

O desvirtuamento da conduta humana social e legalmente aceitável, enseja a atuação da jurisdição estatal a fim de apurar e punir tal comportamento. Para tanto, a ato cogente do Estado terá que ser norteado por princípios inerentes à própria condição de ser humano, tais como: a liberdade, a dignidade e a proteção, sem os quais não se alcançará o intento primordial da justiça, que é garantir os direitos dos homens. Assim, o jus persequendi exercido na aurora do devido processo legal carecia da observância dos aludidos princípios, posto que, em que pese à legitimidade daquele Estado opressor, os homens eram julgados e apenados sem levar em consideração as liberdades intrínsecas aos indivíduos por conta da força do direito natural.

Destarte, o contexto social que situa a obra de Foucault é próprio de governos totalitários,[4] o que explica a exposição pública das punições dos delinqüentes, assim como de um processo hermético que atende a interesses dos governantes em manipular os procedimentos e assim exercer a autoridade de que necessita para pacificar a sociedade da forma que lhes conviesse. Esta percepção se concretiza com a absoluta ausência de princípios como o da liberdade, da dignidade, da ampla defesa e do contraditório nos processos em que se condena a qualquer custo, aqueles que destoavam das leis vigentes.

O processo penal contemporâneo é calcado em pilares que se estribam na observância dos princípios acima referidos e em cominação de penas ajustadas à dimensão do injusto penal imputado ao acusado. Assim, ressalvadas as peculiaridades de cada contexto histórico, é notório que o direito processual penal, da mesma forma que outros mecanismos de controle social, se coadunam com as culturas e demandas sociais de cada tempo. Desta forma, depreende-se da obra de Foucault a sua inquietação quanto à forma de punição do Estado que despreza a gênese da vida humana, qual seja, a liberdade.

 

III - EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PUNIR

 

No que tange a evolução das formas de punir do Estado, Michel Foucault em sua obra deixa além de uma retrospectiva histórica dos métodos de punição, outros que atinam para uma melhora no sistema penal, levantando questionamentos de como seria o ideal de punição e prisões, esses que realmente trariam soluções em vez de medos ou mortes desnecessárias.

Desde os primórdios da humanidade que o fator "punição" existe. É a forma mais simples e direta de coordenar e tornar harmoniosa a convivência do corpo social. Barbáries foram cometidas ao longo dos tempos em nome da paz e do equilíbrio dos interesses sociais. Foucault na obra em epígrafe aborda a questão do desenvolvimento histórico da instituição prisão, desde o seu nascimento até a sua atual aplicação. A partir do século XVIII que se dá início a todo um movimento de mudança dos métodos de suplício medievais, a denominada "Economia do castigo",[5] um arranjo de sofrimentos mais sutis, porém muito mais eficientes. É iniciada uma verdadeira prospecção sobre como fazer sofrer "humanamente", é criada a tecnologia do sofrimento. O corpo sai das duras penas físicas e adentra no universo da coação e da privação, da obrigação e das interdições.

Nessa fase observa uma silhueta tênue do que hoje constitui o principio da dignidade humana, pois a base do castigo ao psíquico denotava uma preservação do martírio ao corpo e conseqüente alívio do sofrimento físico. É no início do século XIX que finalmente desaparece por completo o espetáculo da punição física, "não mais o corpo suplicado, e sim a alma".[6] O criminoso agora pode evoluir, modificar-se, tudo visando o seu controle absoluto. Já no final do século XIX chega-se a conclusão de que alguém pode ser louco e não criminoso, logo, tratado e não punido. Nos dias atuais os presídios e os hospícios em nada diferenciam daqueles do final do século XIX, posto que ambos atuam enquanto exímios controladores de comportamento, submetendo os seu detentos às mesmas dificuldades e até aos mesmo suplícios, contrariando flagrantemente o principio supra mencionado, o qual é orientador dos textos constitucionais de todas nações em que o regime político é a democracia.

 

IV - PRINCÍPIO DA ISONOMIA DA PENA

 

Assim, um sistema penal deve ser concebido como um instrumento para gerir diferencialmente as ilegalidades, não para suprimi-las a todas, posto ser dever do Estado Juiz conformar o principio da isonomia a todos indistintamente. Na análise de Foucault o castigo somente será eficaz se passar à idéia ao corpo social da desvantagem de se cometer o crime, assim o potencial delinqüente não cometeria nenhum crime por temer severamente a pena.[7] A pena ainda deverá ser transparente, atendendo ao moderno principio da publicidade dos atos processuais, para que todos possam presidir o seu resultado. A reeducação também deve estar presente, retirar-lhe a liberdade para que ele mesmo veja o quanto é importante respeitar o próximo. A pena deve progredir, de acordo com o crime e com o comportamento do preso, estimulando-o a mudança.[8] Neste diapasão, encontra-se na prisão a forma de punir ideal.

 

V - A PRISÃO DISSONANTE DOS PRINCÍPIOS

 

Dentre todas as formas de punir a prisão é a mais “justa”. Ela consegue agrupar todos os elementos essenciais ao poder punitivo, iguala, nivela, dosa a culpa de acordo com o tempo, reduz o indivíduo despersonalizando-o. configura-se no  castigo por excelência. Ela priva a liberdade e ao mesmo tempo disciplina de forma constante, está sempre presente. Até hoje não se encontrou outra forma de punir, dentro do Estado Democrático de Direito, que seja mais eficaz que a prisão. Ocorre que as distorções sócio-econômicas reinantes nas sociedades modernas, acabam por arremessar para as prisões os delinqüentes que estão situados nas classes sociais menos favorecidas, visto que estes são desprovidos dos recursos necessários para fomentar uma defesa processual que o absolva ou mesmo que postergue o feito até seu exaurimento pelo tempo da forma que se assiste dioturnamente nas sedes de comarcas e tribunais na medida em que os réus são afortunados. Basta recorrer à lembrança recente referente ao caso do banqueiro Daniel Dantas e as liminares de Hábeas Corpus em seu favor deferidas com pressa descomunal pelo presidente da Egrégia Corte de Justiça do nosso país. Daí inferir-se que de justa a prisão nada tem, posto segregar apenas os homens desigualados socialmente e hipossuficientes economicamente. É fato que não se poderá culpar apenas o instrumento “prisão” por essa anomalia social, más pensar numa modificação no regime político que enalteça o significado de “homem” e que seja capaz de estreitar as desigualdades existentes, pos somente assim poderá a lei ser de fato isonômica e a justiça de verdade justa, fazendo prevalecer o principio da dignidade da pessoa humana, estribo fundamental para a segurança jurídica do nosso ordenamento.

 

VI – CONCLUSÃO

De todo o exposto, resta claro que o processo penal se constitui no instrumento pelo qual o Estado se legitima a punir os que praticam conduta diversa dos dispositivos legais. Depreende-se que no decorrer da historia do direito processual, os princípios garantidores dos direitos humanos, tais quais hoje concebemos, jamais foram observados nos certames processuais penais que culminaram em sentença, dado a predeterminação de cada contexto histórico, exceto aqueles que legitimavam a ação do Estado. Infere-se que no processo penal, as desigualdades oriundas da pirâmide social implicam na inobservância dos princípios garantidores dos direitos individuais daqueles que se situam na base da referida pirâmide, ferindo de forma letal a orientação precípua do Estado Democrático de Direito. 

 

 

REFERÊNCIA

 

 

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008 - 288p.

 

BRASIL, Constituição da República Federativa do. Vade Mecum – São Paulo: Rideel, 2009.



[1] Acadêmica do curso de Direito do 10 º período da Faculdade AGES.

[2] BRASIL, Constituição da República Federativa do. “Garantia Constitucional do direito a um processo justo, dentro dos ditames do Estado Democrático de Direito.

[3] Menção a Thomas Hobbes, “Leviatã”.

[4] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 23.

[5] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 36.

[6] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 38.

[7] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 45.

[8] FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: o nascimento da prisão. Tradução Raquel Ramalhete. 35. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 46.

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