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Texto enviado ao JurisWay em 01/08/2011.
Última edição/atualização em 02/08/2011.
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POR QUE PUNIR?
A lei 7.210/84 disciplina no ordenamento jurídico pátrio a execução penal.
Consiste o objeto da execução penal em aplicar corretamente os mandamentos existentes na sentença penal que se destinam a prevenir e reprimir delitos. Consiste, ainda, finalidade da execução penal a reinserção social do apenado.
Trata-se de atividade complexa que se desenvolve nos planos jurisdicional e administrativo, posto envolver o direito substancial (direito penal), direito processual penal e o direito penitenciário.
Para bem entender a finalidade da execução, faz-se mister analisar sucintamente as teorias da pena, quais sejam, a teoria absoluta (também chamada retributiva) e a teoria relativa (também chamada utilitarista) e a teoria mista (ou eclética).
Para as teorias absolutas, a pena parte da exigência de justiça e deve fundar-se na retribuição do mal do crime com o mal da pena. A pena é, pois, um fim em si mesma, um dever do Estado de punir para corroborar o controle necessariamente exercido sobre a sociedade.
A partir do iluminismo a teoria absoluta passou a ser combatida pelos ideais iluministas, os quais tiveram como expoente a doutrina de Beccaria, para quem a pena deveria ser a justa resposta à desobediência ao ordenamento imposto. A retribuição deveria nutrir-se da culpabilidade do agente, respondendo ele com uma pena proporcional ao delito cometido.
Segundo BICUDO (2010, p. 35):
A punição, efetuada por parte do soberano a atos considerados por lei como crimes, não deve ser um ato de vingança, mas tem por finalidade o restabelecimento da paz social e evitar que esta seja novamente turbada por novos atos criminosos.
Para Beccaria, a preocupação primordial residia na busca pela paz social, em como os homens poderiam reunir-se em sociedade, sem instaurar-se a guerra entre eles. Adota, ainda, o iluminista o princípio da presunção de inocência, segundo o qual o homem só poderá ser declarado culpado após a expedição de sentença condenatória. Justifica tal princípio a concessão de proteção obrigatória do Estado aos jurisdicionados. Só justificaria a exclusão desta proteção o descumprimento do pacto social ocorrido quando do cometimento do delito.
Denunciava Beccaria que muitas vezes as penas extrapolavam osdelitos e, verdadeiros e cruéis exageros, não raramente, marcaram de dolo a história jurídicauniversal. Entretanto, como o próprio autorconcordava, a punição, para o infrator da lei, énecessária, desde que suficiente à reprovação. Vê-se, pois, que Beccaria não se limitava a reconhecer caráter utilitarista apara a pena e sim, também, dotar-lhe de face humanística.
O mais expressivo representante do caráter utilitarista da pena foi Bentham, para quem o direito é tido como valor, cujas elaborações tem por objetivo a realização humana. Segundo BICUDO, (Op. cit., p. 88) “O delito, portanto, não se configura em função de um pecado praticado ou de uma falta moral, mas será definido de acordo com a dor que determinada ação causa”.
A pena passa, então, a não mais ser considerada condição expiatória e passa a ser dotada de caráter utilitarista. Serve, pois, como um meio para a obtenção de fins úteis, fins preventivos (dividindo-se em prevenção geral e específica), fundamentando-se na sua necessidade para sobrevivência do grupo social.
A teoria mista inaugura um novo vértice para a pena, no tocante aos seus objetivos, uma vez que passa a ter um caráter retributivo, aliado ao caráter preventivo. Busca-se então instituir uma política criminal humanista, lastreado na ideia de que a sociedade só estará segura à medida que proporcionar a adequação do condenado ao meio social, através da ressocialização que atua diretamente na diminuição da reincidência penal.
A tendência moderna esta, pois, aliada à ideia de que a pena deve humanizar, além de punir.
Por um lado, espera-se uma resposta firme do Estado contra a criminalidade crescente, por outro lado, a moderna teoria penal disciplina as teses garantistas, com o intuito de propor um modelo penal que limite a atuação do poder punitivo estatal.
O direito penal, assim concebido, não deve descuidar de proteger os direitos de toda e qualquer pessoa humana, sem olvidar que o apenado, apesar do cometimento do delito não perde o seu caráter de pessoa humana, merecedora da tutela protetiva estatal, evitando a aplicação de penas injustas e arbitrárias.
Na lição de Mirabete, (2007, p. 41):
Tem o Estado o direito de executar a pena, e os limites desse direito são traçados pelos termos da sentença condenatória, devendo o sentenciado submeter-se a ela. A esse dever corresponde o direito do condenado de não sofrer, ou seja, de não ter de cumprir outra pena, qualitativa ou quantitativamente divers da sentença.
A execução da pena não pode suprimir do apenado nenhum direito além daquele que fora restrito pela sentença condenatória, pois a inobservância de quaisquer desses direitos significaria imposição de pena superior à condenação.
A Lei da execução penal, ao impedir o excesso na execução penal, passa a assegurar a dignidade e humanidade da execução, permitindo aos apenados o desenvolvimento no sentido da reinserção social.
Posto isto, vê-se que a Lei de Execução Penal é, sem dúvida, uma dasnormas de maior grau de excelência do ordenamento jurídico brasileiro. Mesmo tendo sidoeditada em meados da década de 80 do século XX, consequentemente anteriormente à própriaConstituição Federal de 1988, trouxe inovações esplendidas com uma atualidade indiscutível.
Ademais, além dos direitos expressamente previstos na Lei de Execuções Penais, são assegurados aos presos os princípios implícitos e decorrentes da ordem constitucional. Em havendo violação dos mesmos, impõe-se a intervenção do juiz das execuções.
Contudo, é bem verdade, que o sistema prisional nacional ainda não conseguiu adequar-se aseus elementos basilares, e, o que hoje se contempla é um grande contraste entre o quedescreve a citada lei e o que se observa na prática.
A escalada de violência está cada vez mais trilhando uma linha ascendente e ininterrupta. As formas tradicionais de controle social não têm conseguido deter esta, quetalvez seja, a maior mazela que aflige a sociedade contemporânea. Mesmo com todo odesenvolvimento científico atual, mesmo com toda a evolução do pensamento humano emesmo quando a humanidade atinge o ápice do desenvolvimento cultural, não se temconseguido encontrar solução, ou pelo menos a amenização do problema da segurançapública com a consequente diminuição da violência.
Surgem então, os que pregam uma maior rigidez do ordenamento jurídico, no que se
refere, à composição de leis mais severas. Mas, estas leis já existem. Qualquer análisecriteriosa demonstrará, que em matéria de Direito Penal, a Legislação brasileira é bastantesevera, e as penas impostas àqueles que cometem crimes não são tão brandas, como alguém
possa imaginar.Outros se levantam e fazem apologias ao endurecimento da polícia repressiva. O queem parte é necessário, mas tal atitude é apenas um ‘remédio paliativo’ para um mal de causastão profundas.[1]
Os mais sensatos sabem que a resolução de qualquer problema está no combate àscausas e não nos efeitos. As questões abordadas neste artigo, não estão apenas delimitadasna esfera governamental, mas muito mais em níveis de convivência familiar e social. Antes demedidas puramente repressivas, faz-se necessário, que medidas sócio-educativas sejam tomadas, tanto para que mais pessoas atinjam os mais altos níveis de desenvolvimento moral,
quanto que a influência dos fatores sociais seja cada vez mais benéfica na formação dosindivíduos e consequentemente da sociedade.
Em crítica a este sistema punitista retributivo, MIRABETE apud Bitencourt (Op. cit., p. 26) elucida:
A ressocialização não pode ser conseguida em uma instituição como a prisão. Os centros de execução penal, as penitenciárias, tendem a converter-se num microcosmos no qual se reproduzem e se agravam as graves contradições que existem no sistema social exterior. (...) A pena privativa de liberdade não ressocializa, pelo contrário, estigmatiza o recluso, impedindo a sua plena reinserção ao meio social.
Porém não se deve olvidar que o caráter preventivo geral da pena é atingido através da imposição do medo da sanção sobre a sociedade em geral.
Deste modo, crime e castigo são institutos que andarão de mãos dadas, ainda por muitos séculos na história da humanidade, não podendo ser completamente desvinculada a sanção penal do medo da punição, sob pena de desvirtuar-se o necessário controle exercido sobre os indivíduos.
Outrossim convém a observação feita por MOLINA (2006, p. 97):
O direito penal representa, também, tão-somente um dos meios os sistemas normativos existentes [...] e que a pena significa uma opção dentre muitas existentes para sancionar a conduta desviada. Mas é inegável que o Direito Penal simboliza o sistema normativo mais formalizado, com uma estrutura mais racional e com o mais elevado grau de divisão do trabalho e de especialidade funcional dentre todos os sistemas normativos.
Conclui-se, pois, que o direito penal, visto como forma de exercer controle sobre os indivíduos, deve estar afinado com um modelo social que promova políticas públicas que minimizem a desigualdade social, sob a pena de tornar-se o sistema penal um meio de segregação sempre dos mesmos sujeitos, aqueles excluídos da sociedade econômica globalizada.
REFERENCIAS
BICUDO, Tatiana Viggiani. Por que Punir? São Paulo: Saraiva, 2010.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. 34. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2007.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
MARCÃO, Renato. Execução penal: ideal normativo e realidade prática. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2763, 24 jan. 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/18336/execucao-penal-ideal-normativo-e-realidade-pratica>. Acesso em: 19 maio 2011.
MOLINA, Antonio Garcia-Pablos de.; GOMES, Luiz Flávio Gomes. Criminologia. 5. ed. São Paulo: Editora RT, 2006.
VADE MECUM. Lei 7.210/84. São Paulo: Saraiva, 2009.
[1]PESSOA, Altemar Tavares. Execução penal: abordagem psicocientífica dos seus objetivos.Disponível em:http://br.monografias.com/trabalhos-pdf902/execucao-penal/execucao-penal.pdf. Acesso em: 18 de maio de 2011.
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