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Resumo:
Este trabalho pretende reunir e esclarecer conceitos e concepções sobre o que é Mito. Além de conceituar o termo, pretende-se aqui
também buscar entender sua dinâmica. Como surge, como se propaga, como se estabelece na sociedade.
Texto enviado ao JurisWay em 19/05/2011.
Última edição/atualização em 07/07/2011.
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UNIVERSIDADE METROPOLITANA DE SANTOS - UNIMES
JOSE ROBERTO CASSAMASSIMO
SEMIOLOGIA DO MITO NO DIREITO PENAL
MESTRADO EM DIREITO
UNIMES/SANTOS
2011
2
JOSE ROBERTO CASSAMASSIMO
SEMIOLOGIA DO MITO NO DIREITO PENAL
MESTRADO EM DIREITO
Monografia apresentada à banca
examinadora da Faculdade de Direito da
UNIMES – Universidade Metropolitana de
Santos, como exigência parcial para conclusão
de módulo Curso de Filosofia do Direito sob a
orientação do professor Doutor Roberto
Oliveira
UNIMES/SANTOS
2011
3
Banca Examinadora
___________________________________
___________________________________
___________________________________
4
5
RESUMO
Este trabalho pretende reunir e esclarecer conceitos e concepções sobre o que é Mito. Além de conceituar o termo, pretende-se aqui também buscar entender sua dinâmica. Como surge, como se propaga, como se estabelece na sociedade. Pretendemos demonstrar como se cria um mito, como reconhecêlo, identificá-lo para não ser manipulado pelas intenções de quem o ropaga, mas saber usá-lo quando necessário sem se deixar contaminar por seu propósito.
Este trabalho também objetiva abordar uma discussão sobre um dos mitos mais conhecidos mundialmente (O Mito da Caverna de Platão) comparando-o com um dos filmes mais polêmicos da primeira década do século XXI (Matrix).
As ponderações deste trabalho são apenas informativas e para compreensão e não pretendem aqui discutir ou abordar ideologias.
Palavras-chave: mito, manipulação, persuasão, necessidade humana, narrativa, semiologia, semiótica, analogia.
6
ABSTRACT
This work wants to combine and explain about Myth`s concepts, so conceptualize the term. We want search understand its dynamic. How does, how it is spread, how its is established in society. We intend to demonstrate how to create a myth how to recognize it, identify it and do not be manipulated by intentions who created it. But use its when if you need without to be contaminated by its purpose.
This work also aims approach a discussion about of the most popular myths in worldwide: The Myth of the Cave (by Plato) comparing it with the most controversial movie of the beginning of the twenty-first century: Matrix.
The weights of this work are just informational and comprehension. And do not meant to discuss or approach ideologies.
Keywords: myth, manipulation, persuasion, human needs,
narrative, semiotics, analogy.
7
INTRODUÇÃO
O Homem, como ser racional, dotado de múltiplas inteligências: a Inteligência algorítmica, a inteligência artística e, entre muitas outras a inteligência emocional, desde os primórdios, sempre se questionou a respeito de questões existenciais. Mesmo com todo o seu poder de descoberta na ciência, sempre existiram questões inexplicáveis para a ciência, questões que perturbam o mais racional dos homens, vazios que, nem a natureza, nem a razão conseguem preencher.
Essa necessidade, esse vazio que todos já sentiram alguma vez ou sentem por vezes é integrante da própria natureza humana que, por sua característica única que a difere dos outros seres vivos, sente a necessidade de algo mais além das explicações simplificadas e demasiadas racionais da ciência: a raça humana tem uma necessidade natural, herdada do DNA mais pré-historico possível, da espiritualidade, de explicações que transcendem a matéria.
Para preencher esta lacuna, sempre existiram os Mitos que procuram explicar ou, pelo menos consolar a sociedade das questões existenciais cuja ciência não dá conta de explicar ou, simplesmente não é aceita com bons olhos pela sociedade que quer mais do que a explicação lógica, quer o porquê dos fenômenos, quer algo transcendente.
Os mitos surgiram desta necessidade humana e até hoje, exercem influência tão poderosa sobre as mentes humanas que, embora muitos já descartem e até admitam, sem enlouquecerem, explicações mais lógicas a respeito de determinados assuntos, há os que preferem continuar na alienação, por se sentirem mais confortáveis nesse patamar.
Saber lidar com essa temática não é tarefa fácil, o advogado tem de ser extremamente profissional e procurar não misturar suas 8 convicções pessoais com seu trabalho e, mais do que isso também tem de saber colocar-se no lugar das pessoas envolvidas no processo junto com ele, entender quando um mito exerce forte influência sobre pessoas determinantes em um processo.
O presente trabalho tem a finalidade de esclarecer o que é “MITO”. Cada pessoa tem uma idéia e uma interpretação, e para que isto fique bem claro, e para quem ler também entenda, procuramos mostrar com bastante detalhes o seu significado. Através de várias pesquisas feitas, a partir do dicionário e de materiais que tratam do assunto, descrevemos em cinco capítulos e com
vários exemplos e afirmações, o significado e o emprego do conceito.
O Mito nada mais é do que uma criação feita pelo homem, sobre um determinado assunto. Pode ser explicado pela Ciência, ou através de assuntos reais onde podemos compreender o uso desta palavra. Esta palavra vem escrita em diversos textos diferentes e em cada um tem sua significação podendo ser entendido como um termo que traduz ou represente algo, e que nós o entendemos e absorvemos. A seguir explicaremos passo a passo como podemos reconhecer o Mito e como compreende-lo para não pensarmos que Mito é uma palavra forte ou fora da realidade, mas que faz parte da nossa cultura.
9
SUMÁRIO
CAPÍTULO I .................................................................................................. 11
1.2.SURGIMENTO ................................................................................................ 14
1.3.SEMIOLOGIA ................................................................................................. 15
1.4.FUNÇÃO DO MITO .......................................................................................... 16
1.5.MANIPULAÇÃO DO HOMEM PELO MITO ........................................................... 18
CAPÍTULO II ............................................................................................... 18
2.1.PERSUADIR E CONVENCER ............................................................................ 19
2.2. MITO E UTOPIA ............................................................................................. 21
2.3. ANALOGIA.................................................................................................... 23
2.4. OPINIÃO PÚBLLICA ....................................................................................... 24
CAPÍTULO III . ............................................................................................. 25
A MANIPULAÇÃO DO HOMEM ATRAVÉS DA LINGUAGEM ....................... 26
3.1.O QUE SIGNIFICA MANIPULAR? ...................................................................... 26
3.2.QUEM MANIPULA? ......................................................................................... 27
3.3.PARA QUE SE MANIPULA? ............................................................................. 28
3.4.COMO SE MANIPULA? .................................................................................... 29
3.4.1.Os termos: .................................................................................................. 30
3.4.2.Os esquemas mentais: ................................................................................. 30
3.4.3.As abordagens (planteamientos) estratégias: .................................................. 31
3.4.4.Os procedimentos estratégicos: .................................................................... 31
CAPÍTULO IV ............................................................................................... 34
SEMIÓTICA E DIREITO PENAL ..................................................................... 34
4.1. DEFINIÇÃO: .................................................................................................. 34
4.2.DIREITO E INTERPRETAÇÃO ........................................................................... 35
4.3. O ÂNGULO SEMIÓTICO DA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO ....................................... 36
CAPÍTULO V ................................................................................................ 39
10
CONCLUSÃO .............................................................................................. 45
BIBLIOGRAFIA: .......................................................................................... 47
11
CAPÍTULO I
1.1. CONCEITO
Para introduzir o conceito de Mito aqui em nosso trabalho,recorremos primeiro aos dicionários e, a partir desses tentaremos
interpretar o conceito.O Aurélio tem uma definição bem extensa do que pode vir a ser Mito. Vejamos:
“[Do gr. Mythos, ‘fábula’, pelo lat.
mythu.]
Substantivo masculino.
1. Narrativa dos tempos fabulosos ou heróicos. 2. Narrativa na qual aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc. 3. Representação de fatos ou personagens reais, exagerada pela imaginação popular, pela tradição, etc. 4. Pessoa ou fato assim representado ou concebido: Para muitos, Rui Barbosa é um mito. [Sin. (relativo à pessoa), nesta acepção: monstro sagrado (q. v.).] 5. Idéia falsa, sem correspondente na realidade: As dívidas surgidas no inventário demonstram que a sua fortuna era um mito. 6. Representação (passada ou futura) de um estádio ideal da humanidade: O mito da Idade do Ouro. 7. Imagem simplificada de pessoa ou de acontecimento, não raro ilusória, elaborada ou aceita pelos grupos humanos, e que representa 12 significativo papel em seu comportamento.8. Coisa inacreditável, fantasiosa, irreal; utopia: A perfeição absoluta é um mito. 9. Antrop. Narrativa de significação simbólica,transmitida de geração em geração e considerada verdadeira ou autêntica dentro de um grupo, tendo ger. a forma de um relato sobre a origem de determinado fenômeno, instituição, etc., e pelo qual se formula uma explicação da ordem natural
e social e de aspectos da condição humana. 10. Filos. Forma de pensamento oposta à do pensamento lógico e científico.
Mito da caverna. 1. Filos. “Aquele com que Platão (v. platonismo), no começo do livro sétimo da República, figura o processo pelo qual a alma passa da ignorância.”
1 Bem não nos prenderemos a todos os conceitos apresentados aqui, somente àqueles que poderão ser úteis mais adiante para a nossa defesa de Mito pode ser uma “narrativa em que aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana” ou também pode “representar fatos ou personagens reais exagerados pela imaginação e pela tradição humanas”. Bem então quer dizer que o Mito nasce das conversas populares e é repassado de geração a geração. Mesmo tratando-se de uma idéia absolutamente absurda, trata-se de um discurso em que o povo concebe como idéia ou conceito verdadeiro.
Como o item 7 da conceituação acima, ratificamos a defesa dessa idéia, pois o mito é “Imagem simplificada de pessoa ou de
acontecimento, não raro ilusória, elaborada ou aceita pelos grupos humanos, e que representa significativo papel em seu comportamento”. Desta forma, acreditamos poder concluir que, Desta forma, acreditamos 1 Dicionário Aurélio. Mito. 2004. 13 poder concluir que, antes de tudo o mito é uma ideia aceita pela humanidade, que mesmo quando parece uma história complemente
fantasiosa, tem um recado oculto em sua mensagem: a famosa “moral da história”.
Porém, o próprio Aurélio também define Mito como “ideia falsa, sem correspondente na realidade” e “forma de pensamento oposta à do pensamento lógico e científico”, portanto, mito não se trata de uma história real, mas uma comparação a um fato que pode ser real, para que se tire dessa narrativa um conceito. Mas todos concordamos que a diferença entre o Mito e o pensamento lógico é tão sutil, que é quase imperceptível, por isso, poucos conseguem decifrar, captar o Mito por trás de um discurso.
Vejamos outra definição para o termo, agora da coleção Larousse Cultural:
1. MITO s.m. (Do grego Mythos, palavra expressa, discurso, fábula (…). Relato ou narrativa de origem remota e significação simbólica (…) alegoria filosófica (…). Representação de fatos ou personagens reais exagerados pela imaginação popular e
tomados como modelo ou exemplo (…); 2. Presente em todas as culturas, os mitos situam-se entre a razão e a fé, mas são
considerados sagrados. Os principais tipos de mito referem-se à origem dos deuses, do mundo e ao fim das coisas. Também há mitos que procuram explicar a origem da sociedade, a posição de um povo em relação aos demais, o pecado original, etc. (…). (Enciclopédia Larousse Cultural) 2
2 Coleção Larousse Cultural. Mito, 1988.
14
Percebemos que a conceituação no item 1 não é muito diferente
O Mito é uma narrativa simplificada, que pode estar baseada em fatos ou pessoas, é admitido pela sociedade como uma comparação do real com fundo moral que também é quase unanimemente acreditado pela sociedade.
O Mito não é uma fala qualquer, mas é um sistema de comunicação, uma mensagem; O Mito não é um objeto, um conceito ou
uma ideia e sim o modo de significação, uma forma. Finalizamos aqui a definição do que entendemos por conceito de
Mito.
1.2. SURGIMENTO
Os primeiros Mitos de que se tem registro histórico são as histórias bíblicas que relatam desde o surgimento da raça humana, do próprio planeta até mesmo prevêem como será a extinção desta. É a chamada Mitologia Cristã. Trata-se de acontecimentos importantes na história mitológica que são aceitas (com variações) por muitos cristãos. Exemplo: o Alcorão explica o surgimento da raça humana, faz referências ao Jardim do Éden, ao povo judeu, ao próprio messias (Jesus Cristo), aos profetas, tais como conhecemos, porém há variações quando comparamo-lo com a Bíblia (livro mais conhecido nos países 15 americanos e europeus que têm forte influência da Igreja Católica Românica.
Os mitos surgiram da necessidade do homem justificar fenômenos como o crescimento das plantas, as chuvas, os trovões, etc. Foi a primeira maneira encontrada pelo homem para explicar a realidade; Tudo que ocorria aqui na Terra estava intimamente ligado ao que acontecia no mundo dos deuses. Dessa maneira, secas, epidemias e outras coisas ruins eram reflexo de que as forças do mal triunfavam sobre as do bem e o inverso ocorria quando havia fartura e riqueza; Por volta de 700 a.C. Homero registrou por escrito boa parte da mitologia grega; Na medida em que um relato conseguia um milagre, estabelecia-se um mito que, na maioria das vezes servia como controle social (...). Segundo Barthes, o mito é uma fala, um relato, tido como verdadeiro porque tem por objetivo a justificação de um fato analisado e interpretado.
1.3. SEMIOLOGIA
Semiologia é a ciência que estuda as significações, as relações entre significado e significante (...) significado é conceito;
Mito é um Sistema Semiológico, é uma metalinguagem. Um segundo sistema semiológico, uma segunda língua.Reflitamos sobre a seguinte imagem:
Um soldado negro, vestido em um uniforme militar, fazendo a saudação militar, com os olhos erguidos direcionados à bandeira francesa? (...) Como poderíamos interpretar o Mito nesta imagem? (...) O Mito seria o 16 significado da imagem? (O que poderia significar esta imagem?) ou a imagem seria o próprio Mito? 3 Essa imagem pode ser a construção de um mito importantíssimo e muito influenciador: o mito de que a sociedade francesa não faz acepção de pessoas, acolhe e luta pelas classes desprivilegiadas, que é um país de todos. Que, embora tenha sua imponência, seu poderio militar, guerreia por “causas justas” a favor dos que já são oprimidos.
De fato, o saber contido no conceito mítico é um saber confuso, constituído por associações (...) ilimitadas;4 A imagem é lançada, a interpretação fica por conta de quem a absorve, a reação esperada é conquistar adeptos voluntários da causa, a dominação das mentes se faz por meio do mito criado por trás dessa construção.
O mito não esconde nada; tem como função deformar e não fazer desaparecer; O mito não é mentira, nem confissão, é uma
inflexão; Quanto à significação mítica, não é nunca completamente arbitrária, é sempre em parte motivada, contém fatalmente uma parte de analogia.6
1.4. FUNÇÃO DO MITO
Acreditamos não haver forma melhor de definir a função do que utilizarmos as palavras de Barthes:
3 Barthes, 2009, p. 138
4 Barthes, 2009, p. 141
5 Barthes, 2009, p. 141
6 Barthes, 2009, p. 147
17
Transformar um sentido em forma. Isto é, o mito é sempre um roubo de linguagem. Eu roubo o negro que faz a saudação militar, a baixa do preço das frutas na estação, não para transformá-los em exemplos ou símbolos, mas para, através deles, naturalizar o Império, o Governo.8 A Semiologia ensinou-nos que a função do mito é transformar uma intenção histórica em natureza, uma contingência em eternidade. Ora, este processo é o próprio processo da ideologia burguesa.10 Não é acidentalmente que ocorre a deserção do nome burguesia pela própria burguesia, que procura, por meio da imagem do soldado negro saudando a bandeira, suprimir a existência de diferenças entre burguesia e proletários.
E da mesma forma que a ideologia burguesa se define pela deserção do nome burguês, o mito é constituído pela eliminação da qualidade histórica das coisas, nele, as coisas perdem a lembrança de sua produção,12 Em outras palavras, nunca lembramos quando, como, onde e porque um mito surgiu, mas ele existe, simplesmente existe.
A função do mito não é, primordialmente, explicar a realidade, mas acomodar e tranqüilizar o homem em um mundo assustador. Para o
filósofo romeno Mircea Eliade (2002) uma das funções do mito é fixar
modelos exemplares de todos os ritos e de todas as atividades humanas
significativas.
O que entendemos ser importante ter bem esclarecido no trecho
acima é quanto ao objetivo final do Mito. O que importa ao lançar um
Mito, não é que se acredite na veracidade da história a ser contada, pois,
8 Barthes, 2009, p. 152
9 Barthes, 2009, p. 152
10 Barthes, 2009, p. 162
11 Barthes, 2009, p. 162
12 Barthes, 2009, p. 163
13 Barthes, 2009, p. 163
18
com certeza alguns acreditarão e outros não, mas o que interessa é o
que o Mito atinge: a consciência das pessoas. Mesmo àqueles que não
acreditam piamente no que ouvem, é incutido na consciência dessas
pessoas um preceito ou conceito sobre o que se quer inserir nos
pensamentos. De fato, não ocorreu o que o mito relatou. Porém, de
alguma forma, o relato mítico corresponde à realidade, ou por
inferências, situações que podem chegar bem próximas dos relatos
míticos.
1.5. MANIPULAÇÃO DO HOMEM PELO MITO
Relembrando... Qual a função do mito? Explicar, organizar e
compensar.
Em nossa sociedade moderna, muitos comportamentos míticos
ainda aparecem aos nossos olhos, não que isto se trate de uma
sobrevivência da mentalidade antiga, mas devido a alguns aspectos e
funções do mito, os quais fazem parte do ser humano.
As estruturas míticas estão fortemente presentes nas imagens e
nos comportamentos que são impostos às pessoas através da mídia (...).
As estruturas míticas estão também fortemente presentes nas
imagens e nos comportamentos que são impostos às pessoas através da
mídia;
19
CAPÍTULO II
2.1. PERSUADIR E CONVENCER
Aqui pretendemos fazer a distinção entre persuadir e convencer
e ligar persuasão ao Mito.
Em um primeiro momento tentaremos entender que tanto um
conceito (persuadir) quanto o outro (convencer) tratam de conceitos
relacionados à arte da argumentação.
Segundo Perelman et all, convencer trata-se de conseguir
influenciar os outros para que façam o que você quer naquele momento,
é um comportamento momentâneo, porém não internalizado dentro do
outro e, esse comportamento pode mudar a partir do momento em que
este outro repensa sobre o que ocorreu ou sobre o que foi convencido a
fazer. Podemos citar aqui algumas propagandas publicitárias que
convencem os consumidores em um primeiro momento, mas não
significa que estes consumidores se tornarão clientes fidelizados.
Persuadir é algo mais profundo, é mais do convencer por um
determinado período de tempo. É conseguir influenciar o outro a ponto
deste internalizar aquela ideia. Podemos citar aqui as campanhas
publicitárias que visam mudança de hábitos, de comportamento, neste
caso, o consumidor não compra apenas o produto, mas a idéia, o
conceito, muda seus hábitos, estilo de vida, internaliza aquele conceito.
Embora não estejamos falando necessariamente de
consumismo, para explanar sobre a diferença entre convencer e
persuadir, não encontramos forma melhor de exemplificar a diferença
entre os conceitos. Para ratificar o que estamos tentando transpor,
utilizarei as palavras de Perelman et all:
20
Para quem se preocupa com o resultado,
persuadir é mais do que convencer, pois a
convicção não passa da primeira fase que leva à
ação. Para Rousseau, nada adianta convencer
uma criança “se não sabe persuadi-la”. (...)
Segundo Dumas, na persuasão, o indivíduo se
contenta com razões afetivas e pessoais sendo a
persuasão em geral “sofística”. Mas ele não
especifica em que essa prova afetiva diferiria
tecnicamente de uma prova objetiva.14
Qual a ligação que podemos fazer entre persuasão e mito? Se
persuasão está diretamente ligada a razões afetivas e pessoais, o mito,
de certa forma não foge dessa prerrogativa. Se o que se pretende com o
mito é difundir um conceito, uma idéia, ratificar uma idéia, a utilização do
mito na tarefa de persuadir pode ser muito útil. Pois ambos dependem da
internalização afetiva e pessoal para existirem e subsistirem. Ao mesmo
tempo que não podemos desconsiderar certos mitos cristalizados os
quais não podemos retirar das mentes humanas, ou fazemos destes
nossos aliados, ou nosso argumento e nossa tentativa de persuasão
estará fadada ao insucesso.
E para fechar nosso conceito de persuasão, Celeste dos Santos
faz uma ressalva interessante acerca do termo aplicado ao conceito
jurídico:
A persuasão é a idéia nuclear de
argumentação retórica. Prova disso é que a
retórica jurídica é também denominada de lógica
da persuasão.
A lógica jurídica difere da lógica formal,
pois a primeira contém um elemento que não se
encontra na segunda: a persuasão. Ela fiscaliza o
14 Perelman, 1999, p.30
21
ingresso na profissão e na missão jurídica,
orientando na arte de persuadir. Em síntese, a
lógica jurídica atual tem como principal
instrumento a persuasão.15
2.2. MITO E UTOPIA
Acreditamos ser muito importante a definição a respeito da relação
entre utopia e mito a que faz J.B.H:
“A utopia é a antevisão de um projeto e o mito é
um “sucedâneo da realidade, que consola o homem
daquilo que ele não tem: seu objetivo é esconder a
verdade das coisas, é alienar o homem”. E prossegue, “o
mito nasce da fantasia descomprometida com a única
finalidade de compensar uma insatisfação vaga,
inconsciente”. 16
E Celeste dos Santos complementa:
Quando se efetua a correlação entre pensamento
e realidade, o número não corresponde integralmente ao
fenômeno, de tal forma que inúmeras conjeturas são
feitas na busca da tradução exata da realidade. Por isso
que a projeção da realidade feita por muitos filósofos são
denominadas utopias, ou mesmo mitos.17
Em nossa concepção, a utopia seria um sonho tão perfeito, que
impossível de ser realizado, tal a natureza de sua perfeição, que exigiria
de tudo e todos a desindividualização do ser, das coisas, dos fenômenos,
já que o perfeito para mim pode não ser tão perfeito para o outro. A
descaracterização da natureza humana. O mito, por sua vez, consola
esse desejo impossível e improvável, criando concepções, que podem
parecer um desejo único, uma mentalidade, um conceito unificado.
15 SANTOS, 1995, p. 66
16 SANTOS, 1995, p. 43
17 SANTOS, 1995, p. 43
22
Um exemplo bastante pertinente é o do Mito Democrático
referenciado por Castro. O mito democrático seria uma espécie de
pensamento comum em que, segregada a aristocracia, difunde-se um
pensamento político em que todo o povo tem o poder de decisão política,
tem a oportunidade de mudar sua atual condição econômica (ascensão
de classe, o que não era possível na monarquia). Analisemos o seguinte
texto do parágrafo único da Constituição Brasileira de 1988:
“Todo poder emana do povo, que o exerce por
meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição.” 18
Conforme as palavras de Castro:
Na prática, verificamos que o signo da democracia
é o sufrágio universal. O povo elege os governantes ou
personificam a máxima instituição política.19
E complementa com a citação de Maurice Duverger:
“a ideia de que todos poderão participar no
governo é um absurdo (...) mesmo na mais democrática
das democracias, não é o povo que governa por si
próprio; os governantes reais constituem uma categoria
de pessoas, pouco numerosa e distinta da massa. Todo
governo é oligárquico” (Apud Gurvitch, 1964:15) 20
Para exemplificar a fala acima, basta lembrarmos-nos dos
aumentos salariais aprovados no Congresso para deputados e
senadores... Outro exemplo latente é a questão da liberação do porte de
armas de fogo. Embora quase por unanimidade, o povo brasileiro votou
não ao desarmamento, se estudarmos atentamente o Estatuto,
percebemos que, de certa forma, a decisão não foi respeitada, pois é
quase impossível para um cidadão comum conseguir um porte de arma.
18 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm
19 CASTRO, 2001, p. 185
20 CASTRO. 2001, p. 186
23
Logo percebemos nos dois exemplos que nem sempre as decisões
emanam do povo fechando aqui nossa interpretação sobre Mito e Utopia,
deixando claro, aqui que não trata-se de Mito X Utopia, mas uma relação
de complementaridade entre os dois conceitos.
2.3. ANALOGIA
Raciocinar por analogia é possibilitar a formulação de uma
hipótese que seria verificada por indução. Em outras palavras o
raciocínio por analogia é o conhecimento sistematizado que está sendo
adquirido, somado às experiências vividas anteriormente, às crenças e
convicções do indivíduo.
Neste sentido, alguns mitos estão tão presentes em nossa cultura,
que talvez nem saibamos distinguir esses mitos de fatos, mas esses
estão tão enraizados em nossas concepções que não é nada estranho
fazer analogias de conhecimentos sistematizados novos adquiridos com
conceitos adquiridos por meio de mitos.
E saber conduzir o ouvinte a esse tipo de analogia é trunfo para
poucos. Com certeza, o objetivo da persuasão seria alcançado em seu
grau máximo.
No Direito, por exemplo, seria aplicar a um caso não previsto de
modo direto por uma norma jurídica, uma norma prevista para uma
hipótese distinta, mas semelhante ao caso concreto. Os requisitos para a
aplicação judicial da analogia é a existência de anomia, a semelhança do
caso em tela com a norma, mediante o estudo científico na legislação
vigente eratio legis, ou seja, análise do bem jurídico tutelado.
A analogia não é permitida no ramo do Direito Penal, salvo para
beneficiar o réu; tampouco em matéria tributária para a criação de novos
tributos.
24
É forma primordial para o preenchimento das lacunas no
ordenamento jurídico, também sendo conhecida como autointegração,
pois é realizada com os próprios recursos do sistema legislativo.
2.4. OPINIÃO PÚBLLICA
“Falando em opinião pública, não podemos pensar em
unanimidade, nem mesmo em maioria, mas em comportamento coletivo
favorável ou não a uma pessoa, a um produto, a uma idéia” 21, a um mito.
Muitos podem até não concordar, mas formar a opinião pública não é
somente conquistar seguidores e adeptos, é institucionalizar, é cravar na
história a sua ideologia. Isso com certeza pode ser feito através de um
mito, do lançamento de um conceito por meio da criação de um mito.
Para melhor externarmos o que estamos tentando expor, recorreremos a
um exemplo ainda latente em nossas memórias. Vamos ao mito “Lula”.
Não é apenas uma pessoa que vemos quando recorremos a essa figura,
não é a história de um indivíduo, mas muito vêem a sua história de vida
por meio dele. Não é apenas a ideologia de um partido que se difundiu,
mas a sociedade absorveu como a sua ideologia que está sendo
propagada ao mundo. O mito criado é o homem simples, que teve
poucas oportunidades, que não desistiu e que, mesmo que não seja a
pura verdade, o mito foi construído a partir da imagem de um bom
homem, trabalhador, honesto e, principalmente que não mudou seu
caráter com a ascensão e não se esqueceu dos seus. Terminar dois
mandatos deixando somente com impressões positivas, apesar das
inúmeras tentativas de ofuscarem sua imagem é o exemplo mais perfeito
e contemporâneo da criação de um mito. Um mito que dividiu opiniões,
mas até aqueles que não acreditam no relato, na narrativa propriamente
divulgada, concordam com o seu simbolismo, isso é o mito criado por
meio da opinião pública.
21 CASTRO, 2001, p. 166.
25
Conforme as palavras de Castro:
O que ocorre no plano intelectual e
intergrupal faz-se presente nos fenômenos de
massa caracterizados como “mecanismos do
comportamento coletivo”. E aí que germina a
opinião pública. Ou ainda melhor, explorando
esses mecanismos, as classes dominantes criam
ou sustentam valores (por meio de mitos) que se
mostram favoráveis à manutenção de uma
estrutura que lhes mostre propícia.22
(...) A opinião pública forma-se no processo
interativo, pelas ações institucionais, pela
circulação de idéias pela propaganda.
As ações institucionais integram o
processo educativo que transmite a cultura
dominante (...). Para impor o “arbitrário cultural” as
instituições utilizam da violência simbólica (...) os
meios de comunicação de massa, pela maneira
como difundem as informações promovem um
modo de pensar, uma forma de consciência.23
E os próprios meios de comunicação lançam mão da criação de mitos
para atingir esse objetivo. No cenário político, podemos inferir esse
conhecimento ao pensarmos sobre o que ocorreu nesta última eleição
presidencial. Em um cenário político e econômico favorável, o Brasil se
destacando internacionalmente com a conquista para sediar a Copa do Mundo
e Olimpíadas, a maior parte da população aprovou a gestão dos últimos anos,
projetos sociais que distribuem renda e o Mito criado: o melhor presidente que
o Brasil teve dos últimos tempos. Lula deixa a cadeira da presidência da
República para se tornar um mito, não somente pelo cenário político e
econômico favorável, mas pela particular história de vida que, aliada a todos
esses fatores e conquistas que fazem não só ele sentir orgulho, mas toda uma
nação ser empática e este orgulho.
22 CASTRO, 2001, p. 167
23 CASTRO, 2001, p. 169
26
CAPÍTULO III
A MANIPULAÇÃO DO HOMEM ATRAVÉS DA LINGUAGEM
3.1. O QUE SIGNIFICA MANIPULAR?
O equivalente mais comum de manipular é o vocábulo manejar.
Porém, encontramos outros equivalentes que servem melhor à nossa
proposta que é controlar, influenciar indevidamente e até mesmo, o
termo “usar” serve muito bem ao nosso propósito.
O significado que queremos para o termo é aquele relacionado à
dominação de uma pessoa por outra: dominadores e dominados.
Manipular, neste sentido é o mesmo que dominar as mentes das
pessoas.
Conforme Quintás:
Esta redução ilegítima das pessoas a
objetos é a meta de sadismo. Ser sádico não
significa ser cruel, como geralmente se pensa.
Implica em tratar uma pessoa de uma forma que a
rebaixa de condição. Este rebaixamento pode
realizar-se através da crueldade ou através da
ternura erótica. Quando, ainda em tempos
recentes, introduzia-se um grupo numeroso de
prisioneiros num vagão de trem como se fossem
embrulhos, e os faziam viajar durante dias e
noites, o que se pretendia não era tanto fazê-los
sofrer, mas aviltá-los. Sendo tratados como meros
objetos, em condições subumanas, acabavam
considerando-se mutuamente seres objetos e
repelentes. Tal consideração os impedia de
27
unirem-se e formar estruturas sólidas que
poderiam gerar uma atitude de resistência.
Reduzir uma pessoa à condição de objeto para
dominá-la sem restrições é uma prática
manipuladora sádica. Já a carícia erótica reduz a
pessoas ao corpo, a mero objeto de prazer. É
reducionista, e, nessa mesma medida, sádica,
ainda que pareça terna. A carícia pode ser de dois
tipos: erótica e pessoal. Para compreender o que,
a rigor, o erotismo é, recordemos que, segundo a
pesquisa ética contemporânea, o amor conjugal
apresenta quatro aspectos ou ingredientes.24
3.2. QUEM MANIPULA?
Manipula aquele que quer vencer-nos sem
convencer-nos, seduzir-nos para que aceitemos o que
nos oferece sem dar-nos razões. O manipulador não fala
à nossa inteligência, não respeita nossa liberdade; atua
astutamente sobre nossos centros de decisão a fim de
arrastar-nos a tomar as decisões que favorecem seus
propósitos.25
Existem vários exemplos e formas diferentes de manipulação. Há a
manipulação por meio da religião. Embora já se tenha revelado muito
sobre o poder de alienação das religiões, ainda constitui um poderoso
instrumento de manipulação, pois se vale da necessidade que o Homem
tem de buscar/ter espiritualidade e entender questões existenciais as
quais a ciência não alcança.
Outro exemplo de manipulação é a forma como Hitler convenceu
os alemães a exterminarem os judeus. Ele usou a vaidade o ego alemão,
24 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM.
25 Idem
28
elevando-os à categoria de raça perfeita e arrastou multidões a
defenderem seus propósitos. Este exemplo é bem pertinente. O próprio
Hitler, a não ser simbolicamente, não foi quem executou as mortes, pois
ele manipulou toda uma nação e convenceu-na a fazer o que ele queria,
mas não usou a força para isso, não se impôs, convenceu de que seus
propósitos eram legítimos. Podemos até mesmo citar que, de certa
forma, Hitler aproveitou-se de um fato extraordinário em que sofreu um
atentado (uma bomba que explodiu a apenas 2 metros dele e não o
atingiu) e criou o mito, de que a “Providência” estava a seu favor para
convencer a todos de que o próprio Deus estaria a favor de seus atos
nazista, justificando-os.
Outra forma de manipulação, que também se aproveita do mito
para legitimá-la é a difusão/invasão da cultura americana, principalmente
nos países subdesenvolvidos. Existem vários mitos criados, mas a
maioria pretende, por meio da imagem de que a América é a terra da
liberdade, da prosperidade, a manipulação por meio do conceito de que
“Os Estados Unidos” são o melhor exemplo a ser seguido e respeitado,
pois apesar de sua “generosidade”, seu poder de fogo é inigualável.
3.3. PARA QUE SE MANIPULA?
Para dominar, para conseguir o que se quer que os outros façam
sem, no entanto, lançar mão de meio que esta pessoa perceba que está
agindo conforme a vontade do outro. Sem que esta pessoa esteja agindo
de forma consciente de que não agindo por vontade própria.
A manipulação corresponde, em geral, à vontade
de dominar pessoas e grupos em algum aspecto da vida
e dirigir sua conduta. A manipulação comercial quer
converter-nos em clientes, com o simples objetivo de que
29
adquiramos um determinado produto, compremos
entradas para certos espetáculos, nos associemos ao
clube tal... O manipulador ideólogo pretende modelar o
espírito de pessoas e povos a fim de adquirir domínio
sobre eles de forma rápida, contundente, massiva e fácil.
Como é possível dominar um povo desta forma?
Reduzindo-o de comunidade a massa.
Ao carecer de coesão interna, a massa é
facilmente dominável e manipulável pelos sequiosos do
poder. Isso explica que a primeira preocupação de todo
tirano tanto nas ditaduras como nas democracias, já que
em ambos os sistemas políticos existem pessoas
desejosas de vencer sem necessidade de convencer seja
a de privar as pessoas, na maior medida possível, da
capacidade criadora. Tal despojamento se leva a cabo
mediante as táticas de persuasão dolosa que a
manipulação mobiliza.26
3.4. COMO SE MANIPULA?
Numa democracia as coisas não são fáceis para o
tirano. Ele quer dominar o povo, e deve fazê-lo de forma
dolosa para que o povo não perceba, pois, numa
democracia, o que os governantes prometem é, antes de
tudo, liberdade. Nas ditaduras de promete eficácia à
custa das liberdades. Nas democracias se prometem
níveis nunca alcançados de liberdade ainda que à custa
da eficácia. Que meios um tirano tema sua disposição
para submeter o povo enquanto o convence de que é
mais livre do que nunca?27
Esse meio é a linguagem. A linguagem é o maior
dom que o homem possui, mas também, o mais
26 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM
27 Idem
30
arriscado. É ambivalente: a linguagem pode ser terna ou
cruel, amável ou displicente, difusora da verdade ou
propagadora da mentira. A linguagem oferece
possibilidades para em comum, descobrir a verdade, e
proporciona recursos para tergiversar as coisas e semear
a confusão. Basta conhecer tais recursos e manejá-los
habilmente, e uma pessoa pouco preparada, mas astuta
pode dominar facilmente as pessoas e povos inteiros se
estes não estiverem de sobreaviso. Para compreender o
poder sedutor da linguagem manipuladora, devemos
estudar quatro pontos: os termos, o esquemas, as
propostas e os procedimentos.28
3.4.1. Os termos:
A linguagem cria palavras e em cada época da
história algumas delas adquirem um prestígio especial de
forma que ninguém ousa questioná-la. São palavras
“talismã” que parecem condensar em si tudo que há de
excelente na vida humana.29
3.4.2. Os esquemas mentais:
Do mau uso dos termos decorre uma
interpretação errônea dos esquemas que articulam nossa
vida mental. Quando pensamos, falamos e escrevemos,
estamos sendo guiados por certos pares de termos:
liberdade-norma, dentro-fora, autonomia-heteronomia...
Se pensarmos estes esquemas são dilemas, de forma
que devamos escolher entre um ou outro dos termos que
os constituem, não poderemos realizar nenhuma
atividade criativa na vida. A criatividade é sempre dual.
Se penso que o que está fora de mim é diferente,
distante, externo e estranho a mim, não posso colaborar
28 28 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM
29 Idem
31
com aquilo que me rodeia e anulo minha capacidade
criativa em todos os níveis.30
3.4.3. As abordagens (planteamientos) estratégias:
Com os termos da linguagem se propõem
(planteamiento) as grandes questões da vida. Devemos ter o
máximo cuidado com o que se propõe (Planteamientos).31
Se você aceita uma proposta (Planteamiento), vai ter que
ir para onde o levem. Desde a infância deveríamos estar
acostumados a discernir quando uma proposta é autêntica e
quando é falsa. Nos últimos tempos as coisas são mal
colocadas, com a finalidade estratégica de dominar o povo,
temas tão graves como o divórcio, o aborto, o amor humano, a
eutanásia... Quase sempre são abordados de forma sentimental,
como se apenas tratassem de resolver problemas agudos de
certas pessoas. Para comover o povo, apresentam-se cifras
exageradas de matrimônios dissolvidos, de abortos clandestinos,
realizados em condições desumanas... Tais cifras são um ardil
do manipulador. O Dr. B. Nathanson, diretor da maior clínica
abortista dos EUA, manifestou que foi ele e sua equipe que
inventaram a cifra de 800.000 abortos por ano em seu país. E
ficavam surpresos ao ver que a opinião pública engolia o dado e
o propagava com total ingenuidade. Hoje, convertido à defesa da
vida, sente vergonha e tal fraude e recomenda vivamente que
não se aceitem as cifras apresentadas para apoiar certas
campanhas.33
3.4.4. Os procedimentos estratégicos:
30 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM
31 Idem
32 Idem
33 Idem
32
Há diversos meios para dominar o povo sem que este se repare.
Não precisamos, necessariamente mentir para manipular, mas usar
artifícios convincentes que nem sempre correspondem à realidade, mas
não trata-se de mentiras inventadas, propriamente dizendo. E aqui,
novamente, voltamos a inserir o mito. Como já dissemos, o Mito não é
necessariamente uma mentira, mas também não corresponde à verdade.
É uma ideia, um conceito, que pode servir muito a este propósito. Vamos
ao exemplo prático de Quintão:
Três pessoas falam mal de uma Quarta, e eu conto a
esta exatamente o que me disseram, mas altero um pouco a
linguagem. Em vez de dizer que tais pessoas concretas
disseram isso, digo que é o pessoal que anda falando. Passo do
particular ao coletivo. Com isso não só infundo medo a essa
pessoa mas também angústia, que é um sentimento muito mais
difuso e penoso. O medo é um temor ante algo adverso que nos
enfrenta de maneira aberta e nos permite tomar medidas. A
angústia é um medo envolvente. Você não sabe a que recorrer.
Onde está “o pessoal” que te atacou com maledicências?”O
pessoal” é uma realidade anônima, envolvente, como neblina
que nos envolve. Sentimo-nos angustiados.
Tal angústia é provocada pelo fenômeno sociológico do
boato, que parece ser tão poderoso quanto covarde devido a seu
anonimato. “Andam dizendo tal ministro praticou um desvio de
verbas”. Mas quem anda dizendo isso? “O pessoal, ou seja,
ninguém em concreto e potencialmente todos”.
Outra forma tortuosa, sinuosa, sub-reptícia, de vencer o
povo sem preocupar-se em convencê-lo é a de repetir uma e
outra vez, através dos meios de comunicação, idéias ou imagens
carregadas de intenção ideológica. Não se entra em questões,
não se demonstra nada, não se vai ao fundo dos problemas.
Simplesmente lançam-se chavões, fazem-se afirmações
33
contundentes, propagam-se slogans na forma de sentenças
carregadas de sabedoria. Este bombardeio diário modela a
opinião pública, porque as pessoas acabam tomando o que se
afirma como o que todos pensam, como aquilo de que todos
falam, como o que se usa, o atual, o normal que faz norma e se
impõe.34
34 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM
34
CAPÍTULO IV
SEMIÓTICA E DIREITO PENAL
4.1. DEFINIÇÃO:
A Semiótica (do grego semeiotiké ou “a arte dos sinais”) é a ciência
geral dos signos e da semiose, que estuda todos os fenômenos culturais
como fossem sistemas sígnicos, isto é, sistemas de significação.
Ocupa-se do estudo do processo de significação ou representação,
na natureza e na cultura, do conceito ou da idéia.
Em oposição à lingüística, que se restringe ao estudo dos signos
lingüísticos, ou seja, do sistema sígnico da linguagem verbal, esta ciência
tem por objeto qualquer sistema sígnico - artes visuais, fotografia,
cinema, música, culinária, vestuário, gestos, religião, etc.
Como exemplos de outros sinais, podemos ainda citar, a tiara do
papa, a coroa e o cetro do rei, a mitra e o anel do bispo, etc. O que
caracteriza todos esses objetos enquanto sinais é o serem artefatos com
finalidade de significarem algo. Conhecer esses objetos como sinais é
conhecer seu significado. De contrário perdem toda a dimensão de sinal.
Os sinais deste tipo mais importantes são os sinais lingüísticos.
Ou seja, um signo (sinal), consiste de:
Um conceito – ou seja, o significado (signifié)
Uma imagem sonora – ou seja, o significante (signifiant), ou forma
fonológica em termos generativos.
O signo (sinal) linguístico pode ser desmembrado em duas faces: o
significante, que é a parte concreta do signo, como com os sons ou letras
35
e perceptível através dos sentidos e o significado, que é a idéia formada,
a imagem que se tem em mente.
4.2. DIREITO E INTERPRETAÇÃO
A interpretação do Direito é tarefa incessante daquele que cuida das
relações humanas postas diante de normas jurídicas. A interpretação
jurídica é um ofício indissociável de qualquer sujeito que lida com o
Direito e tem por objeto de estudo o Direito positivo. O objeto da
interpretação jurídica são as normas jurídicas e a conduta humana só o é
na medida em que é determinada nas normas jurídicas como
pressuposto ou conseqüência.
As normas jurídicas são bem culturais, obra da construção do
homem organizado em sociedade, porque equivalem a uma alteração
que o homem traça à sua própria cultura, limitando a liberdade inerente à
natureza humana, o que se instrumentaliza por meio de um arcabouço
formal que contém uma valoração de conduta e que visa a seu
disciplinamento.
Sob a perspectiva dogmática, o Direito pode ser entendido como
um corpo de linguagem.
LÓGICA JURÍDICA – linguagem simbólica – (unívoca)
TEORIA GERAL DO DIREITO – linguagem científica (plurissignificativa)
CIÊNCIA DO DIREITO – linguagem científica (plurissignificativa)
DIREITO POSITIVO – linguagem técnica (plurissignificativa)
RELAÇÕES HUMANAS – linguagem natural (plurissignificativa)
Apesar de ciência do Direito e interpretação jurídica possuírem o
mesmo objeto de estudo, o Direito Positivo, o ato interpretativo não se
36
perfaz completamente com a sistematização deste e se revela uma
atividade de cunho especialmente filosófico. A interpretação filosófica do
Direito:
Supera a mecanização da utilização indiscriminada e criteriosa dos
processos ou técnicas de operação da interpretação, os métodos
hermenêuticos (gramatical, lógico, histórico/sociológico,
teleológico/axiológico);
Supera uma atitude puramente cognitiva, característica de quem
faz Ciência do Direito. Quem interpreta o faz com o fim de decidir
conflitos intersubjetivos e tem como foco a aplicação de um significado
que a norma emana a um caso particular da realidade;
Localiza o intérprete, quando das investigações que realiza pela
prática do ato interpretativo, como construtor de sentido por meio de uma
dialética intensa de argumentos formulados ao longo de todo histórico
desse sujeito conhecedor (pré compreensão).
4.3. O ÂNGULO SEMIÓTICO DA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO
O signo é uma entidade lógica dotada de suporte físico
correspondente à matéria concreta pela qual se exterioriza, um
significado, que é o seu equivalente no mundo exterior e uma
significação,que é a idéia ou noção que se elabora mentalmente do
objeto representado.
Quanto ao significado, tomando o Direito como um corpo de
linguagem, este não se restringe ao texto da lei, mas a todo estudo que
tem por temática o fenômeno jurídico exteriorizado por normas jurídicas
que se constitui de signos, os quais se prestam a empreender certa
comunicação entre os indivíduos que às normas se submetem.
No contexto da constituição do Direito em um corpo de linguagem,
a Semiótica jurídica se apresenta como uma dessas ciências porque
37
interpretar é atribuir certo sentido a um signo que provém de um emissor
(no caso da lei – o legislador) e dirige-se aos receptores (os indivíduos
subordinados ao ordenamento jurídico), veiculando uma informação,
empreendendo uma comunicação:
Se concebermos a interpretação do Direito como operação de
caráter lingüístico, deveremos descrevê-la como um processo intelectivo
através (sic) do qual, partindo de fórmulas lingüísticas contidas nos atos
normativos, alcançamos a determinação de seu conteúdo normativo:
caminhamos dos significantes (os enunciados) aos significados.
A semiótica jurídica percebe na estruturação lingüístico-formal da
norma jurídica a produção e a apresentação do fenômeno jurídico na
forma de signos. O ato complexo da interpretação jurídica que tem como
objeto o Direito Positivo propõe uma postura filosófica para a
interpretação do Direito que considere os campos semântico, sintático e
pragmático da norma jurídica como se dá em qualquer na análise de
textos sob a perspectiva da semiótica.
O sujeito-intérprete deve interpretar para aplicar o direito, deve ter
como objetivo final de sua atividade um ato decisório de escolher qual
dentre as várias interpretações possíveis é a mais adequada para
solucionar um conflito intersubjetivo. Esta é uma tarefa de cunho
eminentemente pragmático.
Para a semiótica, a interpretação seria um ato integrante de um
processo de formação de um discurso que tem como objetivo a solução
de conflitos, atribuindo certo sentido a um signo que provém de um
emissor (lei/legislador) e se dirige aos receptores (órgãos do Estado e os
indivíduos subordinados às prescrições do ordenamento jurídico),
veiculando uma informação.
38
Propõem-se como metodologia hábil a decidir os conflitos por meio
da interpretação, o relacionamento do estudo da semiótica jurídica. Esse
estudo com marcante conteúdo filosófico equivale a:
I. Estudar o caminho de positivação dos valores que a
sociedade quer ver realizados e sua entrada e saída no
universo das práticas jurídicas;
II. Descrever o sistema jurídico-operacional de realização
desses valores, que reside na análise da formalização da
linguagem do Direito, fazendo separar as estruturas
encobertas pelos valores revelados pelo conteúdo das
proposições jurídicas;
Inquirir sobre a maneira pela qual o Direito, entendido como
produção textual compele comportamentos homogêneos, instituindo
valores, ao se apreender o fenômeno jurídico em sua estrutura regular de
apresentação, os signos.
39
CAPÍTULO V
5.1. O MITO DA CAVERNA
O Mito da Caverna, a princípio apresenta-se como uma metáfora
narrada por Platão também chamada de Alegoria da caverna, e
encontra-se na obra intitulada A República (livro VII) em que um grupo de
pessoas é aprisionado dentro de uma caverna. Trata-se da
exemplificação de como podemos nos libertar da condição de escuridão
que nos aprisiona através da luz da verdade.
5.1.1. Mito da caverna
Imaginemos um muro bem alto separando
o mundo externo e uma caverna. Na caverna
existe uma fresta por onde passa um feixe de luz
exterior. No interior da caverna permanecem
seres humanos, que nasceram e cresceram ali.
Ficam de costas para a entrada,
acorrentados, sem poder locomover-se, forçados
a olhar somente a parede do fundo da caverna,
onde são projetadas sombras de outros homens
que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira.
Pelas paredes da caverna também ecoam os sons
que vem de fora, de modo que os prisioneiros,
associando-os, com certa razão, às sombras,
pensam ser eles as falas das mesmas. Desse
modo, os prisioneiros julgam que essas sombras
sejam a realidade.
Imagine que um dos prisioneiros consiga
se libertar e, aos poucos, vá se movendo e
40
avance na direção do muro e o escale,
enfrentando com dificuldade os obstáculos que
encontre e saia da caverna, descobrindo não
apenas que as sombras eram feitas por homens
como eles, e mais além todo o mundo e a
natureza.
Caso ele decida voltar à caverna para
revelar aos seus antigos companheiros a situação
extremamente enganosa em que se encontram,
correrá, segundo Platão, sérios riscos - desde o
simples ser ignorado até, caso consigam, ser
agarrado e morto por eles, que o tomaram por
louco e inventor de mentiras.35
5.2. A CONDIÇÃO HUMANA
Platão viu a maioria da humanidade condenada a uma infeliz
condição. Imaginou todos presos desde a infância no fundo de uma
caverna, imobilizados, obrigados pelas correntes que os atavam a
olharem sempre a parede em frente. O que veriam então? Supondo a
seguir que existissem algumas pessoas, uns prisioneiros, carregando
para lá para cá, sobre suas cabeças, estatuetas de homens, de animais,
vasos, bacias e outros vasilhames, por detrás do muro onde os demais
estavam encadeados, havendo ainda uma escassa iluminação vindo do
fundo do subterrâneo, disse que os habitantes daquele triste lugar só
poderiam enxergar o bruxuleio das sombras daqueles objetos, surgindo e
se desfazendo diante deles. Era assim que viviam os homens, concluiu
ele. Acreditavam que as imagens fantasmagóricas que apareciam aos
seus olhos (que Platão chama de ídolos) eram verdadeiras, tomando o
espectro pela realidade. A sua existência era inteiramente dominada pela
alienação.
35 http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna
41
Com essa metáfora Platão quis mostrar que é sempre doloroso
chegar-se ao conhecimento, tendo-se que percorrer caminhos bem
definidos para alcançá-lo, pois romper com a inércia da alienação requer
sacrifícios. A primeira etapa a ser atingida é a da opinião, quando o
indivíduo que ergueu-se das profundezas da caverna tem o seu primeiro
contanto com as novas e imprecisas imagens exteriores. Ai então ele
atingirá o conhecimento. Essa busca não se limita a descobrir a verdade
dos objetos, mas algo bem mais superior: chegar à contemplação das
idéias morais que regem a sociedade.
5.3. MITO DA CAVERNA E FILME MATRIX
Um exemplo de alusão ao mito de caverna é o filme matriz, pois
trata-se de uma versão moderna, ou melhor, futurista dessa narrativa.
Ambos são alegorias. Consideramos providencial a discussão que
Barison propõe a respeito do assunto:
Os objetos no interior da caverna correspondem
no filme à realidade virtual, que são imagens fornecidas à
mente passiva dos homens adormecidos, dos quais é
subtraída energia para as máquinas.
As sombras desses objetos, as imagens das
imagens ou simulacros, seriam uma realidade virtual
dentro da realidade virtual, ou seja, um programa de
computador dentro de outro. Neo, o personagem central
do filme, é um hacker que produzia programas. Numa
das cenas iniciais do filme, um grupo de jovens vai à casa
de Neo para buscar um disquete com um desses
programas. Neo pega esse disquete de dentro de uma
caixinha (disfarçada de livro) rotulada como “simulacros”.
O despertar (a saída da caverna) representa a
passagem da passividade à atividade mental. Afinal,
estamos frente a um filme de ação em que toda atividade
física representa atividade mental que, fraca de início, vai
42
crescendo à medida que se exercita (ou se exerce). Esse
movimento da mente depende da curiosidade, da busca
de algo para além do dado imediato da realidade
empírica. No filme, a curiosidade é representada por
“seguir o coelho branco”, em referência à Alice no País
das Maravilhas.
Ao despertar, Neo, como o homem da caverna
ofuscado pela luz, tem dificuldade em enxergar, reclama
que os olhos doem (curiosamente, no filme, ao contrário
do mito de Platão, a realidade virtual é clara e colorida –
embora meio esverdeada – e o real escuro e cinzento).
Após tratamento inicial para permitir que seus
sentidos e músculos, antes inativos, passem a funcionar,
a mente de Neo é carregada com grande número de
programas, ou seja, de informações. O operador fica
impressionado com a capacidade de Neo de reter
informações: trata-se de uma memória privilegiada.
Mesmo assim, a reação de Neo no início desse processo
é de dor. Mas, pela sua expressão quando responde ao
operador se quer mais – quero! – percebemos que o
processo é também prazeroso e que a mente de Neo é
ávida por informações.
Entretanto, esse processo é ainda um
aprendizado passivo e o conhecimento assim adquirido
não funciona. Neo pensa que sabe lutar, mas Morfeus vai
lhe mostrar que não, que sem ação mental seu
conhecimento sobre luta não é efetivo, não funciona na
prática. Ele observa que é diferente conhecer o caminho
e trilhar esse caminho. É preciso, portanto, um exercício
inicial numa realidade virtual para treino. Dar o primeiro
salto não é fácil e ninguém consegue na primeira
tentativa.
Mais de uma vez, Morfeus diz a Neo que ele pode
conduzi-lo até a porta, mas que cabe a Neo atravessá-la.
No processo de aprendizado, o aluno pode ser conduzido
43
pela apresentação de informações, raciocínios e
exercícios, mas ninguém pode produzir entendimento no
outro. A atividade mental depende do esforço da própria
mente.
Vencida a dificuldade inicial, cada salto, cada
nova conquista, aumenta a capacidade de agir de modo
cada vez mais eficaz. A produção ativa de conhecimentos
torna o intelecto cada vez mais forte para conceber novas
idéias.
O último modo de conhecimento corresponde, no
filme, a conhecer o código do real, isto é, perceber
simultaneamente o conjunto de comandos do programa
que produzem a realidade empírica. Os companheiros de
Neo conseguem, quando fora da Matrix, ler o código e
saber pela leitura o que nela se passa. Também o
conhecimento que têm permite que consigam agir com
mais competência quando submetidos às regras da
Matrix, quando entram no sistema. Mas eles não são
capazes, estando dentro da Matrix, de ler o código e
dependem de ser instruídos por alguém de fora.
Quando compreende sua realidade anterior, diz
Platão, o liberto sente-se feliz com a mudança e deplora
a situação dos demais. Para libertar os outros homens, é
preciso voltar à caverna, ou à realidade virtual, pois é a
única forma de estabelecer relações com eles. Como
quando se volta da luz para a escuridão, quem já esteve
fora tem dificuldade de ver no escuro, não se adapta bem
à condição anterior e é hostilizado e ridicularizado por
seus antigos companheiros. Esses não entendem o que o
liberto quer dizer e podem até considerá-lo perigoso e
tentar eliminá-lo: transformam-se em “agentes” de defesa
do sistema.
É mais fácil, ou menos difícil, compreender a
realidade quando estamos de fora, quando não estamos
submetidos às imagens e envolvidos pelas emoções que
44
elas geram. Compreender a realidade, ler o código que a
compõe, percebendo o processo que a produz, estando
sujeito às sensações empíricas, não é para qualquer um.
Na cena final, Neo, depois de todo o trabalho de
fortalecimento da mente por que passou, consegue
finalmente ler o código estando no interior da realidade
virtual. Com isso, consegue transformar o real, ou seja,
agir sobre o programa, sobre o processo de produção do
real e modificá-lo.36
Entendemos com a discussão acima que não basta entender a
realidade e, voltando à nossa Introdução onde afirmamos que lidar com o
Mito não é tarefa simples, ratificamos tudo o que foi dito aqui, desde o
fato de que, aqueles que conseguem enxergar além do mito não podem
simplesmente querer ou tentar “abrir” as mentes das pessoas até mesmo
ao fato de as pessoas estarem confortáveis na alienação, logo, serão
resistentes ao desconhecido, porque mesmo sabendo que pode ser
gratificante, pode ser perigoso e ainda há o risco de o resultado não ser o
esperado.
Nem todos querem compreender a realidade, viver na alienação
pode ser uma opção. E ainda há os que, mesmo conhecendo a
realidade, preferem voltar à alienação como é o caso do personagem
Cypher, que entrega os amigos Morpheus, Neo e Trinity em troca de
voltar à Matrix. Em outras palavras, ele não quer sair da zona de
conforto.
36 http://webensino.unicamp.br/disciplinas/velhos/16638::apoio::1::caverna.htm
45
CONCLUSÃO
Concluímos que, além de estar presente nas culturas, não importa
o quão modernas sejam, o mito poderá ter valor temporal, atemporal,
espaço-temporal, espacial. Temporal porque poderá ter valor, ou
influenciará determinado povo em determinada época; atemporal, porque
mesmo com variações e com adeptos e não adeptos, poderá atravessar
as linhas históricas sem sofrer alterações, sendo acreditado exatamente
como foi criado, como é o caso das histórias bíblicas para alguns grupos
específicos; espaço-temporal porque pode surtir seu efeito apenas em
determinada cultura/povo e em espaço delimitado de tempo (exemplo: a
soberania e imponência americana iniciou-se na Segunda Guerra
Mundial e pode estar chegando ao fim) e; por fim, espacial, mesmo
perdurando por centenas de séculos, terá seu efeito somente em
determinadas culturas ou povos (exemplo: mitos na cultura indígena que
só atingem essa população, mas sobrevivem até hoje ou os mitos
presentes nas culturas muçulmanas que só pertence e só produz efeito
nessa população específica).
Entendemos também que, todos os humanos em algum momento
de sua vida são influenciados por um mito, seja acreditando no relato do
mito, seja pelo simples fato de se deixar influenciar pela ideia central
embutida, pelo significado, pelo recado deixado por meio da narrativa.
Acordamos que, se o mito está presente desde os primórdios até
os dias atuais na cultura humana, têm forte domínio sobre a coletividade,
e sobre a opinião pública e que, mais importante do que provar a mentira
ou a verdade é conseguir trazer para si ou fazer com que a opinião
pública esteja de acordo com a idéia a ser difundida. Que para isso, tanto
podemos utilizar o mito como aliado, como o fato de desconsiderar seu
46
potencial poderá colocar todo um trabalho argumentativo a perder. Saber
distinguir o mito é muito importante para o cientista, principalmente o
cientista jurídico, mas ignorá-lo por completo ou ignorar que o povo a
quem nos referimos é fortemente influenciado por conceitos morais,
convicções ideológicas construídas por meio de mitos, poderá ser o
infortúnio de muitos que precisam trabalhar com persuasão, que
precisam convencer outras pessoas de sua verdade.
Concordamos também que a formação da opinião pública pode ser
construída por meio da criação de mitos e que seu poder de influenciar e
levar multidões a uma ideologia é inevitável, em certos casos.
Concluímos que, o importante não é desmitificar, mas saber usar o
próprio mito a favor de seus objetivos. Que, em um julgamento por
exemplo, não adianta querer convencer pessoas convictas por
determinados, não há tempo para isso, que mais importante do que
tentar desalienar alguém é usar aquelas convicções a seu favor. Que a
questão aqui não é tentar convencer ninguém de que tal conceito ou
idéia não passa de mito, pois esse tipo de consciência não muda da noite
para o dia, portanto não devemos nos ater à tentativa de conscientizar
sobre a falsa ideologia em determinado mito, mas aproveitar essa
imagem e transformar o seu discurso de forma que pareça estar de
acordo com as convicções desta pessoa de modo a trazê-la para si.
E, por fim, temos a convicção de que, considerar todos esses
aspectos pode conduzir-nos ao sucesso quando sabemos utilizar essas
prerrogativas a nosso favor diante da necessidade de persuadir.
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BIBLIOGRAFIA:
BARTHES, Roland. Tradução de Rita Buongermino, Pedro de Souza e Rejane Janowitzer.
Mitologias. 4ª Ed. – Rio de Janeiro: Difel, 2009;
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http://www.pucsp.br/pos/co/cepe/semiótica/semiótica.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna
http://webensino.unicamp.br/disciplinas/velhos/16638::apoio::1::caverna.htm
Comentários e Opiniões
1) Luciene (12/06/2012 às 00:00:12) valeu professor tenho muito orgulho de ser sua aluna no curso de Direito na faculdade uniep ... | |
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