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SEMIOLOGIA DO MITO NO DIREITO PENAL


Autoria:

Jose Roberto Cassamassimo


Prof. de Direito Penal faculdade Uniesp Diadema - espcialista em Direio Penal - Escola Paulista da Magistratura, concluindo (orientação) Mestrado em Direito Difusos e Coletivos -Universidade Unimes - Santos funcionário Público há 24 anos, nos quadros da Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo. Experiência de seis anos na docência em graduação de direito.

envie um e-mail para este autor

Resumo:

Este trabalho pretende reunir e esclarecer conceitos e concepções sobre o que é Mito. Além de conceituar o termo, pretende-se aqui também buscar entender sua dinâmica. Como surge, como se propaga, como se estabelece na sociedade.

Texto enviado ao JurisWay em 19/05/2011.

Última edição/atualização em 07/07/2011.



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                        UNIVERSIDADE METROPOLITANA DE SANTOS - UNIMES

                                                   JOSE ROBERTO CASSAMASSIMO

SEMIOLOGIA DO MITO NO DIREITO PENAL

MESTRADO EM DIREITO

UNIMES/SANTOS

2011

2

JOSE ROBERTO CASSAMASSIMO

SEMIOLOGIA DO MITO NO DIREITO PENAL

MESTRADO EM DIREITO

Monografia apresentada à banca

examinadora da Faculdade de Direito da

UNIMES – Universidade Metropolitana de

Santos, como exigência parcial para conclusão

de módulo Curso de Filosofia do Direito sob a

orientação do professor Doutor Roberto

Oliveira

UNIMES/SANTOS

2011

3

Banca Examinadora

___________________________________

___________________________________

___________________________________

4

5

RESUMO

Este trabalho pretende reunir e esclarecer conceitos e concepções sobre o que é Mito. Além de conceituar o termo, pretende-se aqui também buscar entender sua dinâmica. Como surge, como se propaga, como se estabelece na sociedade. Pretendemos demonstrar como se cria um mito, como reconhecêlo, identificá-lo para não ser manipulado pelas intenções de quem o ropaga, mas saber usá-lo quando necessário sem se deixar contaminar por seu propósito.

Este trabalho também objetiva abordar uma discussão sobre um  dos mitos mais conhecidos mundialmente (O Mito da Caverna de Platão) comparando-o com um dos filmes mais polêmicos da primeira década do século XXI (Matrix).

As ponderações deste trabalho são apenas informativas e para compreensão e não pretendem aqui discutir ou abordar ideologias.

Palavras-chave: mito, manipulação, persuasão, necessidade humana, narrativa, semiologia, semiótica, analogia.

6

ABSTRACT

This work wants to combine and explain about Myth`s concepts, so conceptualize the term. We want search understand its dynamic. How does, how it is spread, how its is established in society. We intend to demonstrate how to create a myth how to recognize it, identify it and do not be manipulated by intentions who created it. But use its when if you need without to be contaminated by its purpose.

This work also aims approach a discussion about of the most popular myths in worldwide: The Myth of the Cave (by Plato) comparing it with the most controversial movie of the beginning of the twenty-first century: Matrix.

The weights of this work are just informational and comprehension. And do not meant to discuss or approach ideologies.

Keywords: myth, manipulation, persuasion, human needs,

narrative, semiotics, analogy.

7

INTRODUÇÃO

O Homem, como ser racional, dotado de múltiplas inteligências: a Inteligência algorítmica, a inteligência artística e, entre muitas outras a inteligência emocional, desde os primórdios, sempre se questionou a respeito de questões existenciais. Mesmo com todo o seu poder de descoberta na ciência, sempre existiram questões inexplicáveis para a ciência, questões que perturbam o mais racional dos homens, vazios que, nem a natureza, nem a razão conseguem preencher.

Essa necessidade, esse vazio que todos já sentiram alguma vez ou sentem por vezes é integrante da própria natureza humana  que, por sua característica única que a difere dos outros seres vivos, sente a necessidade de algo mais além das explicações simplificadas e demasiadas racionais da ciência: a raça humana tem uma necessidade natural, herdada do DNA mais pré-historico possível, da espiritualidade, de explicações que transcendem a matéria.

Para preencher esta lacuna, sempre existiram os Mitos que procuram explicar ou, pelo menos consolar a sociedade das  questões existenciais cuja ciência não dá conta de explicar ou, simplesmente não é aceita com bons olhos pela sociedade que quer mais do que a explicação lógica, quer o porquê dos fenômenos, quer algo transcendente.

Os mitos surgiram desta necessidade humana e até hoje, exercem influência tão poderosa sobre as mentes humanas que, embora muitos já descartem e até admitam, sem enlouquecerem, explicações mais lógicas a respeito de determinados  assuntos, há os que preferem continuar na alienação, por se sentirem mais confortáveis nesse patamar.

Saber lidar com essa temática não é tarefa fácil, o advogado tem de ser extremamente profissional e procurar não misturar suas 8 convicções pessoais com seu trabalho e, mais do que isso também tem de saber colocar-se no lugar das pessoas envolvidas no processo junto com ele, entender quando um mito exerce forte influência sobre pessoas determinantes em um processo.

O presente trabalho tem a finalidade de esclarecer o que é “MITO”. Cada pessoa tem uma idéia e uma interpretação, e para que isto fique bem claro, e para quem ler também entenda, procuramos mostrar com bastante detalhes o seu significado. Através de várias pesquisas feitas, a partir do dicionário e de materiais que tratam do assunto, descrevemos em cinco capítulos e com

vários exemplos e afirmações, o significado e o emprego do conceito.

O Mito nada mais é do que uma criação feita pelo homem, sobre um determinado assunto. Pode ser explicado pela Ciência, ou através de assuntos reais onde podemos compreender o uso desta palavra. Esta palavra vem escrita em diversos textos diferentes e em cada um tem sua significação podendo ser entendido como um termo que traduz ou represente algo, e que nós o entendemos e absorvemos. A seguir explicaremos passo a passo como podemos reconhecer o Mito e como compreende-lo para não pensarmos que Mito é uma palavra forte ou fora da realidade, mas que faz parte da nossa cultura.

9

SUMÁRIO

CAPÍTULO I .................................................................................................. 11

1.2.SURGIMENTO ................................................................................................ 14

1.3.SEMIOLOGIA ................................................................................................. 15

1.4.FUNÇÃO DO MITO .......................................................................................... 16

1.5.MANIPULAÇÃO DO HOMEM PELO MITO ........................................................... 18

CAPÍTULO II ............................................................................................... 18

2.1.PERSUADIR E CONVENCER ............................................................................ 19

2.2. MITO E UTOPIA ............................................................................................. 21

2.3. ANALOGIA.................................................................................................... 23

2.4. OPINIÃO PÚBLLICA ....................................................................................... 24

CAPÍTULO III . ............................................................................................. 25

A MANIPULAÇÃO DO HOMEM ATRAVÉS DA LINGUAGEM ....................... 26

3.1.O QUE SIGNIFICA MANIPULAR? ...................................................................... 26

3.2.QUEM MANIPULA? ......................................................................................... 27

3.3.PARA QUE SE MANIPULA? ............................................................................. 28

3.4.COMO SE MANIPULA? .................................................................................... 29

3.4.1.Os termos: .................................................................................................. 30

3.4.2.Os esquemas mentais: ................................................................................. 30

3.4.3.As abordagens (planteamientos) estratégias: .................................................. 31

3.4.4.Os procedimentos estratégicos: .................................................................... 31

CAPÍTULO IV ............................................................................................... 34

SEMIÓTICA E DIREITO PENAL ..................................................................... 34

4.1. DEFINIÇÃO: .................................................................................................. 34

4.2.DIREITO E INTERPRETAÇÃO ........................................................................... 35

4.3. O ÂNGULO SEMIÓTICO DA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO ....................................... 36

CAPÍTULO V ................................................................................................ 39

10

CONCLUSÃO .............................................................................................. 45

BIBLIOGRAFIA: .......................................................................................... 47

11

CAPÍTULO I

1.1. CONCEITO

Para introduzir o conceito de Mito aqui em nosso trabalho,recorremos primeiro aos dicionários e, a partir desses tentaremos

interpretar o conceito.O Aurélio tem uma definição bem extensa do que pode vir a ser Mito. Vejamos:

“[Do gr. Mythos, ‘fábula’, pelo lat.

mythu.]

Substantivo masculino.

1. Narrativa dos tempos fabulosos ou heróicos. 2. Narrativa na qual aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana, etc. 3. Representação de fatos ou personagens reais, exagerada pela imaginação popular, pela tradição, etc. 4. Pessoa ou fato assim representado ou concebido: Para muitos, Rui Barbosa é um mito. [Sin. (relativo à pessoa), nesta acepção: monstro sagrado (q. v.).] 5. Idéia falsa, sem correspondente na realidade: As dívidas surgidas no inventário demonstram que a sua fortuna era um mito. 6. Representação (passada ou futura) de um estádio ideal da humanidade: O mito da Idade do Ouro. 7. Imagem simplificada de pessoa ou de acontecimento, não raro ilusória, elaborada ou aceita pelos grupos humanos, e que representa 12 significativo papel em seu comportamento.8. Coisa inacreditável, fantasiosa, irreal; utopia: A perfeição absoluta é um mito. 9. Antrop. Narrativa de significação simbólica,transmitida de geração em geração e considerada verdadeira ou autêntica dentro de um grupo, tendo ger. a forma de um relato sobre a origem de determinado fenômeno, instituição, etc., e pelo qual se formula uma explicação da ordem natural

e social e de aspectos da condição humana. 10. Filos. Forma de pensamento oposta à do pensamento lógico e científico.

Mito da caverna. 1. Filos. “Aquele com que Platão (v. platonismo), no começo do livro sétimo da República, figura o processo pelo qual a alma passa da ignorância.”

1 Bem não nos prenderemos a todos os conceitos apresentados aqui, somente àqueles que poderão ser úteis mais adiante para a nossa defesa de Mito pode ser uma “narrativa em que aparecem seres e acontecimentos imaginários, que simbolizam forças da natureza, aspectos da vida humana” ou também pode “representar fatos ou personagens reais exagerados pela imaginação e pela tradição humanas”. Bem então quer dizer que o Mito nasce das conversas populares e é repassado de geração a geração. Mesmo tratando-se de uma idéia absolutamente absurda, trata-se de um discurso em que o povo concebe como idéia ou conceito verdadeiro.

Como o item 7 da conceituação acima, ratificamos a defesa dessa idéia, pois o mito é “Imagem simplificada de pessoa ou de

acontecimento, não raro ilusória, elaborada ou aceita pelos grupos humanos, e que representa significativo papel em seu comportamento”. Desta forma, acreditamos poder concluir que, Desta forma, acreditamos 1 Dicionário Aurélio. Mito. 2004. 13 poder concluir que, antes de tudo o mito é uma ideia aceita pela humanidade, que mesmo quando parece uma história complemente

fantasiosa, tem um recado oculto em sua mensagem: a famosa “moral da história”.

Porém, o próprio Aurélio também define Mito como “ideia falsa, sem correspondente na realidade” e “forma de pensamento oposta à do pensamento lógico e científico”, portanto, mito não se trata de uma história real, mas uma comparação a um fato que pode ser real, para que se tire dessa narrativa um conceito. Mas todos concordamos que a diferença entre o Mito e o pensamento lógico é tão sutil, que é quase imperceptível, por isso, poucos conseguem decifrar, captar o Mito por trás de um discurso.

Vejamos outra definição para o termo, agora da coleção Larousse Cultural:

1. MITO s.m. (Do grego Mythos, palavra expressa, discurso, fábula (…). Relato ou narrativa de origem remota e significação simbólica (…) alegoria filosófica (…). Representação de fatos ou personagens reais exagerados pela imaginação popular e

tomados como modelo ou exemplo (…); 2. Presente em todas as culturas, os mitos situam-se entre a razão e a fé, mas são

considerados sagrados. Os principais tipos de mito referem-se à origem dos deuses, do mundo e ao fim das coisas. Também há mitos que procuram explicar a origem da sociedade, a posição de um povo em relação aos demais, o pecado original, etc. (…). (Enciclopédia Larousse Cultural) 2

2 Coleção Larousse Cultural. Mito, 1988.

14

Percebemos que a conceituação no item 1 não é muito diferente do que explica o Aurélio, a diferença é que está mais simplificada, porém, o item 2, que é o que nos interessa, difere um pouco do Aurélio por posicionar o Mito entre a razão e a fé. Sabemos que a razão e a fé são duas esferas antagônicas, a primeira prega que só o que pode ter comprovação científica existe verdadeiramente, a segunda, prega o acreditar naquilo que não se pode ver, tocar, que não há prova material de sua existência. O Mito está entre esses dois e o que isso quer dizer? Vamos tentar entender, de uma vez por todas afinal, o que é mito.

O Mito é uma narrativa simplificada, que pode estar baseada em fatos ou pessoas, é admitido pela sociedade como uma comparação do real com fundo moral que também é quase unanimemente acreditado pela sociedade.

O Mito não é uma fala qualquer, mas é um sistema de comunicação, uma mensagem; O Mito não é um objeto, um conceito ou

uma ideia e sim o modo de significação, uma forma. Finalizamos aqui a definição do que entendemos por conceito de

Mito.

1.2. SURGIMENTO

Os primeiros Mitos de que se tem registro histórico são as histórias bíblicas que relatam desde o surgimento da raça humana, do próprio planeta até mesmo prevêem como será a extinção desta. É a chamada Mitologia Cristã. Trata-se de acontecimentos importantes na história mitológica que são aceitas (com variações) por muitos cristãos. Exemplo: o Alcorão explica o surgimento da raça humana, faz referências ao Jardim do Éden, ao povo judeu, ao próprio messias (Jesus Cristo), aos profetas, tais como conhecemos, porém há variações quando comparamo-lo com a Bíblia (livro mais conhecido nos países 15 americanos e europeus que têm forte influência da Igreja Católica Românica.

Os mitos surgiram da necessidade do homem justificar fenômenos como o crescimento das plantas, as chuvas, os trovões, etc. Foi a primeira maneira encontrada pelo homem para explicar a realidade; Tudo que ocorria aqui na Terra estava intimamente ligado ao que acontecia no mundo dos deuses. Dessa maneira, secas, epidemias e outras coisas ruins eram reflexo de que as forças do mal triunfavam sobre as do bem e o inverso ocorria quando havia fartura e riqueza; Por volta de 700 a.C. Homero registrou por escrito boa parte da mitologia grega; Na medida em que um relato conseguia um milagre, estabelecia-se um mito que, na maioria das vezes servia como controle social (...). Segundo Barthes, o mito é uma fala, um relato, tido como verdadeiro porque tem por objetivo a justificação de um fato analisado e interpretado.

1.3. SEMIOLOGIA

Semiologia é a ciência que estuda as significações, as relações entre significado e significante (...) significado é conceito;

Mito é um Sistema Semiológico, é uma metalinguagem. Um segundo sistema semiológico, uma segunda língua.Reflitamos sobre a seguinte imagem:

Um soldado negro, vestido em um uniforme militar, fazendo a saudação militar, com os olhos erguidos direcionados à bandeira francesa? (...) Como poderíamos interpretar o Mito nesta imagem? (...) O Mito seria o 16 significado da imagem? (O que poderia significar esta imagem?) ou a imagem seria o próprio Mito? 3 Essa imagem pode ser a construção de um mito importantíssimo e muito influenciador: o mito de que a sociedade francesa não faz acepção de pessoas, acolhe e luta pelas classes desprivilegiadas, que é um país de todos. Que, embora tenha sua imponência, seu poderio militar, guerreia por “causas justas” a favor dos que já são oprimidos.

De fato, o saber contido no conceito mítico é um saber confuso, constituído por associações (...) ilimitadas;4 A imagem é lançada, a interpretação fica por conta de quem a absorve, a reação esperada é conquistar adeptos voluntários da causa, a dominação das mentes se faz por meio do mito criado por trás dessa  construção.

O mito não esconde nada; tem como função deformar e não fazer desaparecer; O mito não é mentira, nem confissão, é uma

inflexão; Quanto à significação mítica, não é nunca completamente arbitrária, é sempre em parte motivada, contém fatalmente uma parte de analogia.6

1.4. FUNÇÃO DO MITO

Acreditamos não haver forma melhor de definir a função do que utilizarmos as palavras de Barthes:

3 Barthes, 2009, p. 138

4 Barthes, 2009, p. 141

5 Barthes, 2009, p. 141

6 Barthes, 2009, p. 147

17

Transformar um sentido em forma. Isto é, o mito é sempre um roubo de linguagem. Eu roubo o negro que faz a saudação militar, a baixa do preço das frutas na estação, não para transformá-los em exemplos ou símbolos, mas para, através deles, naturalizar o Império, o Governo.8 A Semiologia ensinou-nos que a função do mito é transformar uma intenção histórica em natureza, uma contingência em eternidade. Ora, este processo é o próprio processo da ideologia burguesa.10 Não é acidentalmente que ocorre a deserção do nome burguesia pela própria burguesia, que procura, por meio da imagem do soldado negro saudando a bandeira, suprimir a existência de diferenças entre burguesia e proletários.

E da mesma forma que a ideologia burguesa se define pela deserção do nome burguês, o mito é constituído pela eliminação da qualidade histórica das coisas, nele, as coisas perdem a lembrança de sua produção,12 Em outras palavras, nunca lembramos quando, como, onde e porque um mito surgiu, mas ele existe, simplesmente existe.

A função do mito não é, primordialmente, explicar a realidade, mas acomodar e tranqüilizar o homem em um mundo assustador. Para o

filósofo romeno Mircea Eliade (2002) uma das funções do mito é fixar

modelos exemplares de todos os ritos e de todas as atividades humanas

significativas.

O que entendemos ser importante ter bem esclarecido no trecho

acima é quanto ao objetivo final do Mito. O que importa ao lançar um

Mito, não é que se acredite na veracidade da história a ser contada, pois,

8 Barthes, 2009, p. 152

9 Barthes, 2009, p. 152

10 Barthes, 2009, p. 162

11 Barthes, 2009, p. 162

12 Barthes, 2009, p. 163

13 Barthes, 2009, p. 163

18

com certeza alguns acreditarão e outros não, mas o que interessa é o

que o Mito atinge: a consciência das pessoas. Mesmo àqueles que não

acreditam piamente no que ouvem, é incutido na consciência dessas

pessoas um preceito ou conceito sobre o que se quer inserir nos

pensamentos. De fato, não ocorreu o que o mito relatou. Porém, de

alguma forma, o relato mítico corresponde à realidade, ou por

inferências, situações que podem chegar bem próximas dos relatos

míticos.

1.5. MANIPULAÇÃO DO HOMEM PELO MITO

Relembrando... Qual a função do mito? Explicar, organizar e

compensar.

Em nossa sociedade moderna, muitos comportamentos míticos

ainda aparecem aos nossos olhos, não que isto se trate de uma

sobrevivência da mentalidade antiga, mas devido a alguns aspectos e

funções do mito, os quais fazem parte do ser humano.

As estruturas míticas estão fortemente presentes nas imagens e

nos comportamentos que são impostos às pessoas através da mídia (...).

As estruturas míticas estão também fortemente presentes nas

imagens e nos comportamentos que são impostos às pessoas através da

mídia;

19

CAPÍTULO II

2.1. PERSUADIR E CONVENCER

Aqui pretendemos fazer a distinção entre persuadir e convencer

e ligar persuasão ao Mito.

Em um primeiro momento tentaremos entender que tanto um

conceito (persuadir) quanto o outro (convencer) tratam de conceitos

relacionados à arte da argumentação.

Segundo Perelman et all, convencer trata-se de conseguir

influenciar os outros para que façam o que você quer naquele momento,

é um comportamento momentâneo, porém não internalizado dentro do

outro e, esse comportamento pode mudar a partir do momento em que

este outro repensa sobre o que ocorreu ou sobre o que foi convencido a

fazer. Podemos citar aqui algumas propagandas publicitárias que

convencem os consumidores em um primeiro momento, mas não

significa que estes consumidores se tornarão clientes fidelizados.

Persuadir é algo mais profundo, é mais do convencer por um

determinado período de tempo. É conseguir influenciar o outro a ponto

deste internalizar aquela ideia. Podemos citar aqui as campanhas

publicitárias que visam mudança de hábitos, de comportamento, neste

caso, o consumidor não compra apenas o produto, mas a idéia, o

conceito, muda seus hábitos, estilo de vida, internaliza aquele conceito.

Embora não estejamos falando necessariamente de

consumismo, para explanar sobre a diferença entre convencer e

persuadir, não encontramos forma melhor de exemplificar a diferença

entre os conceitos. Para ratificar o que estamos tentando transpor,

utilizarei as palavras de Perelman et all:

20

Para quem se preocupa com o resultado,

persuadir é mais do que convencer, pois a

convicção não passa da primeira fase que leva à

ação. Para Rousseau, nada adianta convencer

uma criança “se não sabe persuadi-la”. (...)

Segundo Dumas, na persuasão, o indivíduo se

contenta com razões afetivas e pessoais sendo a

persuasão em geral “sofística”. Mas ele não

especifica em que essa prova afetiva diferiria

tecnicamente de uma prova objetiva.14

Qual a ligação que podemos fazer entre persuasão e mito? Se

persuasão está diretamente ligada a razões afetivas e pessoais, o mito,

de certa forma não foge dessa prerrogativa. Se o que se pretende com o

mito é difundir um conceito, uma idéia, ratificar uma idéia, a utilização do

mito na tarefa de persuadir pode ser muito útil. Pois ambos dependem da

internalização afetiva e pessoal para existirem e subsistirem. Ao mesmo

tempo que não podemos desconsiderar certos mitos cristalizados os

quais não podemos retirar das mentes humanas, ou fazemos destes

nossos aliados, ou nosso argumento e nossa tentativa de persuasão

estará fadada ao insucesso.

E para fechar nosso conceito de persuasão, Celeste dos Santos

faz uma ressalva interessante acerca do termo aplicado ao conceito

jurídico:

A persuasão é a idéia nuclear de

argumentação retórica. Prova disso é que a

retórica jurídica é também denominada de lógica

da persuasão.

A lógica jurídica difere da lógica formal,

pois a primeira contém um elemento que não se

encontra na segunda: a persuasão. Ela fiscaliza o

14 Perelman, 1999, p.30

21

ingresso na profissão e na missão jurídica,

orientando na arte de persuadir. Em síntese, a

lógica jurídica atual tem como principal

instrumento a persuasão.15

2.2. MITO E UTOPIA

Acreditamos ser muito importante a definição a respeito da relação

entre utopia e mito a que faz J.B.H:

“A utopia é a antevisão de um projeto e o mito é

um “sucedâneo da realidade, que consola o homem

daquilo que ele não tem: seu objetivo é esconder a

verdade das coisas, é alienar o homem”. E prossegue, “o

mito nasce da fantasia descomprometida com a única

finalidade de compensar uma insatisfação vaga,

inconsciente”. 16

E Celeste dos Santos complementa:

Quando se efetua a correlação entre pensamento

e realidade, o número não corresponde integralmente ao

fenômeno, de tal forma que inúmeras conjeturas são

feitas na busca da tradução exata da realidade. Por isso

que a projeção da realidade feita por muitos filósofos são

denominadas utopias, ou mesmo mitos.17

Em nossa concepção, a utopia seria um sonho tão perfeito, que

impossível de ser realizado, tal a natureza de sua perfeição, que exigiria

de tudo e todos a desindividualização do ser, das coisas, dos fenômenos,

já que o perfeito para mim pode não ser tão perfeito para o outro. A

descaracterização da natureza humana. O mito, por sua vez, consola

esse desejo impossível e improvável, criando concepções, que podem

parecer um desejo único, uma mentalidade, um conceito unificado.

15 SANTOS, 1995, p. 66

16 SANTOS, 1995, p. 43

17 SANTOS, 1995, p. 43

22

Um exemplo bastante pertinente é o do Mito Democrático

referenciado por Castro. O mito democrático seria uma espécie de

pensamento comum em que, segregada a aristocracia, difunde-se um

pensamento político em que todo o povo tem o poder de decisão política,

tem a oportunidade de mudar sua atual condição econômica (ascensão

de classe, o que não era possível na monarquia). Analisemos o seguinte

texto do parágrafo único da Constituição Brasileira de 1988:

“Todo poder emana do povo, que o exerce por

meio de representantes eleitos ou diretamente, nos

termos desta Constituição.18

Conforme as palavras de Castro:

Na prática, verificamos que o signo da democracia

é o sufrágio universal. O povo elege os governantes ou

personificam a máxima instituição política.19

E complementa com a citação de Maurice Duverger:

“a ideia de que todos poderão participar no

governo é um absurdo (...) mesmo na mais democrática

das democracias, não é o povo que governa por si

próprio; os governantes reais constituem uma categoria

de pessoas, pouco numerosa e distinta da massa. Todo

governo é oligárquico” (Apud Gurvitch, 1964:15) 20

Para exemplificar a fala acima, basta lembrarmos-nos dos

aumentos salariais aprovados no Congresso para deputados e

senadores... Outro exemplo latente é a questão da liberação do porte de

armas de fogo. Embora quase por unanimidade, o povo brasileiro votou

não ao desarmamento, se estudarmos atentamente o Estatuto,

percebemos que, de certa forma, a decisão não foi respeitada, pois é

quase impossível para um cidadão comum conseguir um porte de arma.

18 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm

19 CASTRO, 2001, p. 185

20 CASTRO. 2001, p. 186

23

Logo percebemos nos dois exemplos que nem sempre as decisões

emanam do povo fechando aqui nossa interpretação sobre Mito e Utopia,

deixando claro, aqui que não trata-se de Mito X Utopia, mas uma relação

de complementaridade entre os dois conceitos.

2.3. ANALOGIA

Raciocinar por analogia é possibilitar a formulação de uma

hipótese que seria verificada por indução. Em outras palavras o

raciocínio por analogia é o conhecimento sistematizado que está sendo

adquirido, somado às experiências vividas anteriormente, às crenças e

convicções do indivíduo.

Neste sentido, alguns mitos estão tão presentes em nossa cultura,

que talvez nem saibamos distinguir esses mitos de fatos, mas esses

estão tão enraizados em nossas concepções que não é nada estranho

fazer analogias de conhecimentos sistematizados novos adquiridos com

conceitos adquiridos por meio de mitos.

E saber conduzir o ouvinte a esse tipo de analogia é trunfo para

poucos. Com certeza, o objetivo da persuasão seria alcançado em seu

grau máximo.

No Direito, por exemplo, seria aplicar a um caso não previsto de

modo direto por uma norma jurídica, uma norma prevista para uma

hipótese distinta, mas semelhante ao caso concreto. Os requisitos para a

aplicação judicial da analogia é a existência de anomia, a semelhança do

caso em tela com a norma, mediante o estudo científico na legislação

vigente eratio legis, ou seja, análise do bem jurídico tutelado.

A analogia não é permitida no ramo do Direito Penal, salvo para

beneficiar o réu; tampouco em matéria tributária para a criação de novos

tributos.

24

É forma primordial para o preenchimento das lacunas no

ordenamento jurídico, também sendo conhecida como autointegração,

pois é realizada com os próprios recursos do sistema legislativo.

2.4. OPINIÃO PÚBLLICA

“Falando em opinião pública, não podemos pensar em

unanimidade, nem mesmo em maioria, mas em comportamento coletivo

favorável ou não a uma pessoa, a um produto, a uma idéia” 21, a um mito.

Muitos podem até não concordar, mas formar a opinião pública não é

somente conquistar seguidores e adeptos, é institucionalizar, é cravar na

história a sua ideologia. Isso com certeza pode ser feito através de um

mito, do lançamento de um conceito por meio da criação de um mito.

Para melhor externarmos o que estamos tentando expor, recorreremos a

um exemplo ainda latente em nossas memórias. Vamos ao mito “Lula”.

Não é apenas uma pessoa que vemos quando recorremos a essa figura,

não é a história de um indivíduo, mas muito vêem a sua história de vida

por meio dele. Não é apenas a ideologia de um partido que se difundiu,

mas a sociedade absorveu como a sua ideologia que está sendo

propagada ao mundo. O mito criado é o homem simples, que teve

poucas oportunidades, que não desistiu e que, mesmo que não seja a

pura verdade, o mito foi construído a partir da imagem de um bom

homem, trabalhador, honesto e, principalmente que não mudou seu

caráter com a ascensão e não se esqueceu dos seus. Terminar dois

mandatos deixando somente com impressões positivas, apesar das

inúmeras tentativas de ofuscarem sua imagem é o exemplo mais perfeito

e contemporâneo da criação de um mito. Um mito que dividiu opiniões,

mas até aqueles que não acreditam no relato, na narrativa propriamente

divulgada, concordam com o seu simbolismo, isso é o mito criado por

meio da opinião pública.

21 CASTRO, 2001, p. 166.

25

Conforme as palavras de Castro:

O que ocorre no plano intelectual e

intergrupal faz-se presente nos fenômenos de

massa caracterizados como “mecanismos do

comportamento coletivo”. E aí que germina a

opinião pública. Ou ainda melhor, explorando

esses mecanismos, as classes dominantes criam

ou sustentam valores (por meio de mitos) que se

mostram favoráveis à manutenção de uma

estrutura que lhes mostre propícia.22

(...) A opinião pública forma-se no processo

interativo, pelas ações institucionais, pela

circulação de idéias pela propaganda.

As ações institucionais integram o

processo educativo que transmite a cultura

dominante (...). Para impor o “arbitrário cultural” as

instituições utilizam da violência simbólica (...) os

meios de comunicação de massa, pela maneira

como difundem as informações promovem um

modo de pensar, uma forma de consciência.23

E os próprios meios de comunicação lançam mão da criação de mitos

para atingir esse objetivo. No cenário político, podemos inferir esse

conhecimento ao pensarmos sobre o que ocorreu nesta última eleição

presidencial. Em um cenário político e econômico favorável, o Brasil se

destacando internacionalmente com a conquista para sediar a Copa do Mundo

e Olimpíadas, a maior parte da população aprovou a gestão dos últimos anos,

projetos sociais que distribuem renda e o Mito criado: o melhor presidente que

o Brasil teve dos últimos tempos. Lula deixa a cadeira da presidência da

República para se tornar um mito, não somente pelo cenário político e

econômico favorável, mas pela particular história de vida que, aliada a todos

esses fatores e conquistas que fazem não só ele sentir orgulho, mas toda uma

nação ser empática e este orgulho.

22 CASTRO, 2001, p. 167

23 CASTRO, 2001, p. 169

26

CAPÍTULO III

A MANIPULAÇÃO DO HOMEM ATRAVÉS DA LINGUAGEM

3.1. O QUE SIGNIFICA MANIPULAR?

O equivalente mais comum de manipular é o vocábulo manejar.

Porém, encontramos outros equivalentes que servem melhor à nossa

proposta que é controlar, influenciar indevidamente e até mesmo, o

termo “usar” serve muito bem ao nosso propósito.

O significado que queremos para o termo é aquele relacionado à

dominação de uma pessoa por outra: dominadores e dominados.

Manipular, neste sentido é o mesmo que dominar as mentes das

pessoas.

Conforme Quintás:

Esta redução ilegítima das pessoas a

objetos é a meta de sadismo. Ser sádico não

significa ser cruel, como geralmente se pensa.

Implica em tratar uma pessoa de uma forma que a

rebaixa de condição. Este rebaixamento pode

realizar-se através da crueldade ou através da

ternura erótica. Quando, ainda em tempos

recentes, introduzia-se um grupo numeroso de

prisioneiros num vagão de trem como se fossem

embrulhos, e os faziam viajar durante dias e

noites, o que se pretendia não era tanto fazê-los

sofrer, mas aviltá-los. Sendo tratados como meros

objetos, em condições subumanas, acabavam

considerando-se mutuamente seres objetos e

repelentes. Tal consideração os impedia de

27

unirem-se e formar estruturas sólidas que

poderiam gerar uma atitude de resistência.

Reduzir uma pessoa à condição de objeto para

dominá-la sem restrições é uma prática

manipuladora sádica. Já a carícia erótica reduz a

pessoas ao corpo, a mero objeto de prazer. É

reducionista, e, nessa mesma medida, sádica,

ainda que pareça terna. A carícia pode ser de dois

tipos: erótica e pessoal. Para compreender o que,

a rigor, o erotismo é, recordemos que, segundo a

pesquisa ética contemporânea, o amor conjugal

apresenta quatro aspectos ou ingredientes.24

3.2. QUEM MANIPULA?

Manipula aquele que quer vencer-nos sem

convencer-nos, seduzir-nos para que aceitemos o que

nos oferece sem dar-nos razões. O manipulador não fala

à nossa inteligência, não respeita nossa liberdade; atua

astutamente sobre nossos centros de decisão a fim de

arrastar-nos a tomar as decisões que favorecem seus

propósitos.25

Existem vários exemplos e formas diferentes de manipulação. Há a

manipulação por meio da religião. Embora já se tenha revelado muito

sobre o poder de alienação das religiões, ainda constitui um poderoso

instrumento de manipulação, pois se vale da necessidade que o Homem

tem de buscar/ter espiritualidade e entender questões existenciais as

quais a ciência não alcança.

Outro exemplo de manipulação é a forma como Hitler convenceu

os alemães a exterminarem os judeus. Ele usou a vaidade o ego alemão,

24 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM.

25 Idem

28

elevando-os à categoria de raça perfeita e arrastou multidões a

defenderem seus propósitos. Este exemplo é bem pertinente. O próprio

Hitler, a não ser simbolicamente, não foi quem executou as mortes, pois

ele manipulou toda uma nação e convenceu-na a fazer o que ele queria,

mas não usou a força para isso, não se impôs, convenceu de que seus

propósitos eram legítimos. Podemos até mesmo citar que, de certa

forma, Hitler aproveitou-se de um fato extraordinário em que sofreu um

atentado (uma bomba que explodiu a apenas 2 metros dele e não o

atingiu) e criou o mito, de que a “Providência” estava a seu favor para

convencer a todos de que o próprio Deus estaria a favor de seus atos

nazista, justificando-os.

Outra forma de manipulação, que também se aproveita do mito

para legitimá-la é a difusão/invasão da cultura americana, principalmente

nos países subdesenvolvidos. Existem vários mitos criados, mas a

maioria pretende, por meio da imagem de que a América é a terra da

liberdade, da prosperidade, a manipulação por meio do conceito de que

“Os Estados Unidos” são o melhor exemplo a ser seguido e respeitado,

pois apesar de sua “generosidade”, seu poder de fogo é inigualável.

3.3. PARA QUE SE MANIPULA?

Para dominar, para conseguir o que se quer que os outros façam

sem, no entanto, lançar mão de meio que esta pessoa perceba que está

agindo conforme a vontade do outro. Sem que esta pessoa esteja agindo

de forma consciente de que não agindo por vontade própria.

A manipulação corresponde, em geral, à vontade

de dominar pessoas e grupos em algum aspecto da vida

e dirigir sua conduta. A manipulação comercial quer

converter-nos em clientes, com o simples objetivo de que

29

adquiramos um determinado produto, compremos

entradas para certos espetáculos, nos associemos ao

clube tal... O manipulador ideólogo pretende modelar o

espírito de pessoas e povos a fim de adquirir domínio

sobre eles de forma rápida, contundente, massiva e fácil.

Como é possível dominar um povo desta forma?

Reduzindo-o de comunidade a massa.

Ao carecer de coesão interna, a massa é

facilmente dominável e manipulável pelos sequiosos do

poder. Isso explica que a primeira preocupação de todo

tirano tanto nas ditaduras como nas democracias, já que

em ambos os sistemas políticos existem pessoas

desejosas de vencer sem necessidade de convencer seja

a de privar as pessoas, na maior medida possível, da

capacidade criadora. Tal despojamento se leva a cabo

mediante as táticas de persuasão dolosa que a

manipulação mobiliza.26

3.4. COMO SE MANIPULA?

Numa democracia as coisas não são fáceis para o

tirano. Ele quer dominar o povo, e deve fazê-lo de forma

dolosa para que o povo não perceba, pois, numa

democracia, o que os governantes prometem é, antes de

tudo, liberdade. Nas ditaduras de promete eficácia à

custa das liberdades. Nas democracias se prometem

níveis nunca alcançados de liberdade ainda que à custa

da eficácia. Que meios um tirano tema sua disposição

para submeter o povo enquanto o convence de que é

mais livre do que nunca?27

Esse meio é a linguagem. A linguagem é o maior

dom que o homem possui, mas também, o mais

26 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM

27 Idem

30

arriscado. É ambivalente: a linguagem pode ser terna ou

cruel, amável ou displicente, difusora da verdade ou

propagadora da mentira. A linguagem oferece

possibilidades para em comum, descobrir a verdade, e

proporciona recursos para tergiversar as coisas e semear

a confusão. Basta conhecer tais recursos e manejá-los

habilmente, e uma pessoa pouco preparada, mas astuta

pode dominar facilmente as pessoas e povos inteiros se

estes não estiverem de sobreaviso. Para compreender o

poder sedutor da linguagem manipuladora, devemos

estudar quatro pontos: os termos, o esquemas, as

propostas e os procedimentos.28

3.4.1. Os termos:

A linguagem cria palavras e em cada época da

história algumas delas adquirem um prestígio especial de

forma que ninguém ousa questioná-la. São palavras

“talismã” que parecem condensar em si tudo que há de

excelente na vida humana.29

3.4.2. Os esquemas mentais:

Do mau uso dos termos decorre uma

interpretação errônea dos esquemas que articulam nossa

vida mental. Quando pensamos, falamos e escrevemos,

estamos sendo guiados por certos pares de termos:

liberdade-norma, dentro-fora, autonomia-heteronomia...

Se pensarmos estes esquemas são dilemas, de forma

que devamos escolher entre um ou outro dos termos que

os constituem, não poderemos realizar nenhuma

atividade criativa na vida. A criatividade é sempre dual.

Se penso que o que está fora de mim é diferente,

distante, externo e estranho a mim, não posso colaborar

28 28 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM

29 Idem

31

com aquilo que me rodeia e anulo minha capacidade

criativa em todos os níveis.30

3.4.3. As abordagens (planteamientos) estratégias:

Com os termos da linguagem se propõem

(planteamiento) as grandes questões da vida. Devemos ter o

máximo cuidado com o que se propõe (Planteamientos).31

Se você aceita uma proposta (Planteamiento), vai ter que

ir para onde o levem. Desde a infância deveríamos estar

acostumados a discernir quando uma proposta é autêntica e

quando é falsa. Nos últimos tempos as coisas são mal

colocadas, com a finalidade estratégica de dominar o povo,

temas tão graves como o divórcio, o aborto, o amor humano, a

eutanásia... Quase sempre são abordados de forma sentimental,

como se apenas tratassem de resolver problemas agudos de

certas pessoas. Para comover o povo, apresentam-se cifras

exageradas de matrimônios dissolvidos, de abortos clandestinos,

realizados em condições desumanas... Tais cifras são um ardil

do manipulador. O Dr. B. Nathanson, diretor da maior clínica

abortista dos EUA, manifestou que foi ele e sua equipe que

inventaram a cifra de 800.000 abortos por ano em seu país. E

ficavam surpresos ao ver que a opinião pública engolia o dado e

o propagava com total ingenuidade. Hoje, convertido à defesa da

vida, sente vergonha e tal fraude e recomenda vivamente que

não se aceitem as cifras apresentadas para apoiar certas

campanhas.33

3.4.4. Os procedimentos estratégicos:

30 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM

31 Idem

32 Idem

33 Idem

32

Há diversos meios para dominar o povo sem que este se repare.

Não precisamos, necessariamente mentir para manipular, mas usar

artifícios convincentes que nem sempre correspondem à realidade, mas

não trata-se de mentiras inventadas, propriamente dizendo. E aqui,

novamente, voltamos a inserir o mito. Como já dissemos, o Mito não é

necessariamente uma mentira, mas também não corresponde à verdade.

É uma ideia, um conceito, que pode servir muito a este propósito. Vamos

ao exemplo prático de Quintão:

Três pessoas falam mal de uma Quarta, e eu conto a

esta exatamente o que me disseram, mas altero um pouco a

linguagem. Em vez de dizer que tais pessoas concretas

disseram isso, digo que é o pessoal que anda falando. Passo do

particular ao coletivo. Com isso não só infundo medo a essa

pessoa mas também angústia, que é um sentimento muito mais

difuso e penoso. O medo é um temor ante algo adverso que nos

enfrenta de maneira aberta e nos permite tomar medidas. A

angústia é um medo envolvente. Você não sabe a que recorrer.

Onde está “o pessoal” que te atacou com maledicências?”O

pessoal” é uma realidade anônima, envolvente, como neblina

que nos envolve. Sentimo-nos angustiados.

Tal angústia é provocada pelo fenômeno sociológico do

boato, que parece ser tão poderoso quanto covarde devido a seu

anonimato. “Andam dizendo tal ministro praticou um desvio de

verbas”. Mas quem anda dizendo isso? “O pessoal, ou seja,

ninguém em concreto e potencialmente todos”.

Outra forma tortuosa, sinuosa, sub-reptícia, de vencer o

povo sem preocupar-se em convencê-lo é a de repetir uma e

outra vez, através dos meios de comunicação, idéias ou imagens

carregadas de intenção ideológica. Não se entra em questões,

não se demonstra nada, não se vai ao fundo dos problemas.

Simplesmente lançam-se chavões, fazem-se afirmações

33

contundentes, propagam-se slogans na forma de sentenças

carregadas de sabedoria. Este bombardeio diário modela a

opinião pública, porque as pessoas acabam tomando o que se

afirma como o que todos pensam, como aquilo de que todos

falam, como o que se usa, o atual, o normal que faz norma e se

impõe.34

34 http://www.scribd.com/doc/6835629/Alfonso-Lopez-Quintas-A-MANIPULACAO-DO-HOMEM-ATRAVES-DA-LINGUAGEM

34

CAPÍTULO IV

SEMIÓTICA E DIREITO PENAL

4.1. DEFINIÇÃO:

A Semiótica (do grego semeiotiké ou “a arte dos sinais”) é a ciência

geral dos signos e da semiose, que estuda todos os fenômenos culturais

como fossem sistemas sígnicos, isto é, sistemas de significação.

Ocupa-se do estudo do processo de significação ou representação,

na natureza e na cultura, do conceito ou da idéia.

Em oposição à lingüística, que se restringe ao estudo dos signos

lingüísticos, ou seja, do sistema sígnico da linguagem verbal, esta ciência

tem por objeto qualquer sistema sígnico - artes visuais, fotografia,

cinema, música, culinária, vestuário, gestos, religião, etc.

Como exemplos de outros sinais, podemos ainda citar, a tiara do

papa, a coroa e o cetro do rei, a mitra e o anel do bispo, etc. O que

caracteriza todos esses objetos enquanto sinais é o serem artefatos com

finalidade de significarem algo. Conhecer esses objetos como sinais é

conhecer seu significado. De contrário perdem toda a dimensão de sinal.

Os sinais deste tipo mais importantes são os sinais lingüísticos.

Ou seja, um signo (sinal), consiste de:

Um conceito – ou seja, o significado (signifié)

Uma imagem sonora – ou seja, o significante (signifiant), ou forma

fonológica em termos generativos.

O signo (sinal) linguístico pode ser desmembrado em duas faces: o

significante, que é a parte concreta do signo, como com os sons ou letras

35

e perceptível através dos sentidos e o significado, que é a idéia formada,

a imagem que se tem em mente.

4.2. DIREITO E INTERPRETAÇÃO

A interpretação do Direito é tarefa incessante daquele que cuida das

relações humanas postas diante de normas jurídicas. A interpretação

jurídica é um ofício indissociável de qualquer sujeito que lida com o

Direito e tem por objeto de estudo o Direito positivo. O objeto da

interpretação jurídica são as normas jurídicas e a conduta humana só o é

na medida em que é determinada nas normas jurídicas como

pressuposto ou conseqüência.

As normas jurídicas são bem culturais, obra da construção do

homem organizado em sociedade, porque equivalem a uma alteração

que o homem traça à sua própria cultura, limitando a liberdade inerente à

natureza humana, o que se instrumentaliza por meio de um arcabouço

formal que contém uma valoração de conduta e que visa a seu

disciplinamento.

Sob a perspectiva dogmática, o Direito pode ser entendido como

um corpo de linguagem.

LÓGICA JURÍDICA – linguagem simbólica – (unívoca)

TEORIA GERAL DO DIREITO – linguagem científica (plurissignificativa)

CIÊNCIA DO DIREITO – linguagem científica (plurissignificativa)

DIREITO POSITIVO – linguagem técnica (plurissignificativa)

RELAÇÕES HUMANAS – linguagem natural (plurissignificativa)

Apesar de ciência do Direito e interpretação jurídica possuírem o

mesmo objeto de estudo, o Direito Positivo, o ato interpretativo não se

36

perfaz completamente com a sistematização deste e se revela uma

atividade de cunho especialmente filosófico. A interpretação filosófica do

Direito:

Supera a mecanização da utilização indiscriminada e criteriosa dos

processos ou técnicas de operação da interpretação, os métodos

hermenêuticos (gramatical, lógico, histórico/sociológico,

teleológico/axiológico);

Supera uma atitude puramente cognitiva, característica de quem

faz Ciência do Direito. Quem interpreta o faz com o fim de decidir

conflitos intersubjetivos e tem como foco a aplicação de um significado

que a norma emana a um caso particular da realidade;

Localiza o intérprete, quando das investigações que realiza pela

prática do ato interpretativo, como construtor de sentido por meio de uma

dialética intensa de argumentos formulados ao longo de todo histórico

desse sujeito conhecedor (pré compreensão).

4.3. O ÂNGULO SEMIÓTICO DA INTERPRETAÇÃO DO DIREITO

O signo é uma entidade lógica dotada de suporte físico

correspondente à matéria concreta pela qual se exterioriza, um

significado, que é o seu equivalente no mundo exterior e uma

significação,que é a idéia ou noção que se elabora mentalmente do

objeto representado.

Quanto ao significado, tomando o Direito como um corpo de

linguagem, este não se restringe ao texto da lei, mas a todo estudo que

tem por temática o fenômeno jurídico exteriorizado por normas jurídicas

que se constitui de signos, os quais se prestam a empreender certa

comunicação entre os indivíduos que às normas se submetem.

No contexto da constituição do Direito em um corpo de linguagem,

a Semiótica jurídica se apresenta como uma dessas ciências porque

37

interpretar é atribuir certo sentido a um signo que provém de um emissor

(no caso da lei – o legislador) e dirige-se aos receptores (os indivíduos

subordinados ao ordenamento jurídico), veiculando uma informação,

empreendendo uma comunicação:

Se concebermos a interpretação do Direito como operação de

caráter lingüístico, deveremos descrevê-la como um processo intelectivo

através (sic) do qual, partindo de fórmulas lingüísticas contidas nos atos

normativos, alcançamos a determinação de seu conteúdo normativo:

caminhamos dos significantes (os enunciados) aos significados.

A semiótica jurídica percebe na estruturação lingüístico-formal da

norma jurídica a produção e a apresentação do fenômeno jurídico na

forma de signos. O ato complexo da interpretação jurídica que tem como

objeto o Direito Positivo propõe uma postura filosófica para a

interpretação do Direito que considere os campos semântico, sintático e

pragmático da norma jurídica como se dá em qualquer na análise de

textos sob a perspectiva da semiótica.

O sujeito-intérprete deve interpretar para aplicar o direito, deve ter

como objetivo final de sua atividade um ato decisório de escolher qual

dentre as várias interpretações possíveis é a mais adequada para

solucionar um conflito intersubjetivo. Esta é uma tarefa de cunho

eminentemente pragmático.

Para a semiótica, a interpretação seria um ato integrante de um

processo de formação de um discurso que tem como objetivo a solução

de conflitos, atribuindo certo sentido a um signo que provém de um

emissor (lei/legislador) e se dirige aos receptores (órgãos do Estado e os

indivíduos subordinados às prescrições do ordenamento jurídico),

veiculando uma informação.

38

Propõem-se como metodologia hábil a decidir os conflitos por meio

da interpretação, o relacionamento do estudo da semiótica jurídica. Esse

estudo com marcante conteúdo filosófico equivale a:

I. Estudar o caminho de positivação dos valores que a

sociedade quer ver realizados e sua entrada e saída no

universo das práticas jurídicas;

II. Descrever o sistema jurídico-operacional de realização

desses valores, que reside na análise da formalização da

linguagem do Direito, fazendo separar as estruturas

encobertas pelos valores revelados pelo conteúdo das

proposições jurídicas;

Inquirir sobre a maneira pela qual o Direito, entendido como

produção textual compele comportamentos homogêneos, instituindo

valores, ao se apreender o fenômeno jurídico em sua estrutura regular de

apresentação, os signos.

39

CAPÍTULO V

5.1. O MITO DA CAVERNA

O Mito da Caverna, a princípio apresenta-se como uma metáfora

narrada por Platão também chamada de Alegoria da caverna, e

encontra-se na obra intitulada A República (livro VII) em que um grupo de

pessoas é aprisionado dentro de uma caverna. Trata-se da

exemplificação de como podemos nos libertar da condição de escuridão

que nos aprisiona através da luz da verdade.

5.1.1. Mito da caverna

Imaginemos um muro bem alto separando

o mundo externo e uma caverna. Na caverna

existe uma fresta por onde passa um feixe de luz

exterior. No interior da caverna permanecem

seres humanos, que nasceram e cresceram ali.

Ficam de costas para a entrada,

acorrentados, sem poder locomover-se, forçados

a olhar somente a parede do fundo da caverna,

onde são projetadas sombras de outros homens

que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira.

Pelas paredes da caverna também ecoam os sons

que vem de fora, de modo que os prisioneiros,

associando-os, com certa razão, às sombras,

pensam ser eles as falas das mesmas. Desse

modo, os prisioneiros julgam que essas sombras

sejam a realidade.

Imagine que um dos prisioneiros consiga

se libertar e, aos poucos, vá se movendo e

40

avance na direção do muro e o escale,

enfrentando com dificuldade os obstáculos que

encontre e saia da caverna, descobrindo não

apenas que as sombras eram feitas por homens

como eles, e mais além todo o mundo e a

natureza.

Caso ele decida voltar à caverna para

revelar aos seus antigos companheiros a situação

extremamente enganosa em que se encontram,

correrá, segundo Platão, sérios riscos - desde o

simples ser ignorado até, caso consigam, ser

agarrado e morto por eles, que o tomaram por

louco e inventor de mentiras.35

5.2. A CONDIÇÃO HUMANA

Platão viu a maioria da humanidade condenada a uma infeliz

condição. Imaginou todos presos desde a infância no fundo de uma

caverna, imobilizados, obrigados pelas correntes que os atavam a

olharem sempre a parede em frente. O que veriam então? Supondo a

seguir que existissem algumas pessoas, uns prisioneiros, carregando

para lá para cá, sobre suas cabeças, estatuetas de homens, de animais,

vasos, bacias e outros vasilhames, por detrás do muro onde os demais

estavam encadeados, havendo ainda uma escassa iluminação vindo do

fundo do subterrâneo, disse que os habitantes daquele triste lugar só

poderiam enxergar o bruxuleio das sombras daqueles objetos, surgindo e

se desfazendo diante deles. Era assim que viviam os homens, concluiu

ele. Acreditavam que as imagens fantasmagóricas que apareciam aos

seus olhos (que Platão chama de ídolos) eram verdadeiras, tomando o

espectro pela realidade. A sua existência era inteiramente dominada pela

alienação.

35 http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna

41

Com essa metáfora Platão quis mostrar que é sempre doloroso

chegar-se ao conhecimento, tendo-se que percorrer caminhos bem

definidos para alcançá-lo, pois romper com a inércia da alienação requer

sacrifícios. A primeira etapa a ser atingida é a da opinião, quando o

indivíduo que ergueu-se das profundezas da caverna tem o seu primeiro

contanto com as novas e imprecisas imagens exteriores. Ai então ele

atingirá o conhecimento. Essa busca não se limita a descobrir a verdade

dos objetos, mas algo bem mais superior: chegar à contemplação das

idéias morais que regem a sociedade.

5.3. MITO DA CAVERNA E FILME MATRIX

Um exemplo de alusão ao mito de caverna é o filme matriz, pois

trata-se de uma versão moderna, ou melhor, futurista dessa narrativa.

Ambos são alegorias. Consideramos providencial a discussão que

Barison propõe a respeito do assunto:

Os objetos no interior da caverna correspondem

no filme à realidade virtual, que são imagens fornecidas à

mente passiva dos homens adormecidos, dos quais é

subtraída energia para as máquinas.

As sombras desses objetos, as imagens das

imagens ou simulacros, seriam uma realidade virtual

dentro da realidade virtual, ou seja, um programa de

computador dentro de outro. Neo, o personagem central

do filme, é um hacker que produzia programas. Numa

das cenas iniciais do filme, um grupo de jovens vai à casa

de Neo para buscar um disquete com um desses

programas. Neo pega esse disquete de dentro de uma

caixinha (disfarçada de livro) rotulada como “simulacros”.

O despertar (a saída da caverna) representa a

passagem da passividade à atividade mental. Afinal,

estamos frente a um filme de ação em que toda atividade

física representa atividade mental que, fraca de início, vai

42

crescendo à medida que se exercita (ou se exerce). Esse

movimento da mente depende da curiosidade, da busca

de algo para além do dado imediato da realidade

empírica. No filme, a curiosidade é representada por

“seguir o coelho branco”, em referência à Alice no País

das Maravilhas.

Ao despertar, Neo, como o homem da caverna

ofuscado pela luz, tem dificuldade em enxergar, reclama

que os olhos doem (curiosamente, no filme, ao contrário

do mito de Platão, a realidade virtual é clara e colorida –

embora meio esverdeada – e o real escuro e cinzento).

Após tratamento inicial para permitir que seus

sentidos e músculos, antes inativos, passem a funcionar,

a mente de Neo é carregada com grande número de

programas, ou seja, de informações. O operador fica

impressionado com a capacidade de Neo de reter

informações: trata-se de uma memória privilegiada.

Mesmo assim, a reação de Neo no início desse processo

é de dor. Mas, pela sua expressão quando responde ao

operador se quer mais – quero! – percebemos que o

processo é também prazeroso e que a mente de Neo é

ávida por informações.

Entretanto, esse processo é ainda um

aprendizado passivo e o conhecimento assim adquirido

não funciona. Neo pensa que sabe lutar, mas Morfeus vai

lhe mostrar que não, que sem ação mental seu

conhecimento sobre luta não é efetivo, não funciona na

prática. Ele observa que é diferente conhecer o caminho

e trilhar esse caminho. É preciso, portanto, um exercício

inicial numa realidade virtual para treino. Dar o primeiro

salto não é fácil e ninguém consegue na primeira

tentativa.

Mais de uma vez, Morfeus diz a Neo que ele pode

conduzi-lo até a porta, mas que cabe a Neo atravessá-la.

No processo de aprendizado, o aluno pode ser conduzido

43

pela apresentação de informações, raciocínios e

exercícios, mas ninguém pode produzir entendimento no

outro. A atividade mental depende do esforço da própria

mente.

Vencida a dificuldade inicial, cada salto, cada

nova conquista, aumenta a capacidade de agir de modo

cada vez mais eficaz. A produção ativa de conhecimentos

torna o intelecto cada vez mais forte para conceber novas

idéias.

O último modo de conhecimento corresponde, no

filme, a conhecer o código do real, isto é, perceber

simultaneamente o conjunto de comandos do programa

que produzem a realidade empírica. Os companheiros de

Neo conseguem, quando fora da Matrix, ler o código e

saber pela leitura o que nela se passa. Também o

conhecimento que têm permite que consigam agir com

mais competência quando submetidos às regras da

Matrix, quando entram no sistema. Mas eles não são

capazes, estando dentro da Matrix, de ler o código e

dependem de ser instruídos por alguém de fora.

Quando compreende sua realidade anterior, diz

Platão, o liberto sente-se feliz com a mudança e deplora

a situação dos demais. Para libertar os outros homens, é

preciso voltar à caverna, ou à realidade virtual, pois é a

única forma de estabelecer relações com eles. Como

quando se volta da luz para a escuridão, quem já esteve

fora tem dificuldade de ver no escuro, não se adapta bem

à condição anterior e é hostilizado e ridicularizado por

seus antigos companheiros. Esses não entendem o que o

liberto quer dizer e podem até considerá-lo perigoso e

tentar eliminá-lo: transformam-se em “agentes” de defesa

do sistema.

É mais fácil, ou menos difícil, compreender a

realidade quando estamos de fora, quando não estamos

submetidos às imagens e envolvidos pelas emoções que

44

elas geram. Compreender a realidade, ler o código que a

compõe, percebendo o processo que a produz, estando

sujeito às sensações empíricas, não é para qualquer um.

Na cena final, Neo, depois de todo o trabalho de

fortalecimento da mente por que passou, consegue

finalmente ler o código estando no interior da realidade

virtual. Com isso, consegue transformar o real, ou seja,

agir sobre o programa, sobre o processo de produção do

real e modificá-lo.36

Entendemos com a discussão acima que não basta entender a

realidade e, voltando à nossa Introdução onde afirmamos que lidar com o

Mito não é tarefa simples, ratificamos tudo o que foi dito aqui, desde o

fato de que, aqueles que conseguem enxergar além do mito não podem

simplesmente querer ou tentar “abrir” as mentes das pessoas até mesmo

ao fato de as pessoas estarem confortáveis na alienação, logo, serão

resistentes ao desconhecido, porque mesmo sabendo que pode ser

gratificante, pode ser perigoso e ainda há o risco de o resultado não ser o

esperado.

Nem todos querem compreender a realidade, viver na alienação

pode ser uma opção. E ainda há os que, mesmo conhecendo a

realidade, preferem voltar à alienação como é o caso do personagem

Cypher, que entrega os amigos Morpheus, Neo e Trinity em troca de

voltar à Matrix. Em outras palavras, ele não quer sair da zona de

conforto.

36 http://webensino.unicamp.br/disciplinas/velhos/16638::apoio::1::caverna.htm

45

CONCLUSÃO

Concluímos que, além de estar presente nas culturas, não importa

o quão modernas sejam, o mito poderá ter valor temporal, atemporal,

espaço-temporal, espacial. Temporal porque poderá ter valor, ou

influenciará determinado povo em determinada época; atemporal, porque

mesmo com variações e com adeptos e não adeptos, poderá atravessar

as linhas históricas sem sofrer alterações, sendo acreditado exatamente

como foi criado, como é o caso das histórias bíblicas para alguns grupos

específicos; espaço-temporal porque pode surtir seu efeito apenas em

determinada cultura/povo e em espaço delimitado de tempo (exemplo: a

soberania e imponência americana iniciou-se na Segunda Guerra

Mundial e pode estar chegando ao fim) e; por fim, espacial, mesmo

perdurando por centenas de séculos, terá seu efeito somente em

determinadas culturas ou povos (exemplo: mitos na cultura indígena que

só atingem essa população, mas sobrevivem até hoje ou os mitos

presentes nas culturas muçulmanas que só pertence e só produz efeito

nessa população específica).

Entendemos também que, todos os humanos em algum momento

de sua vida são influenciados por um mito, seja acreditando no relato do

mito, seja pelo simples fato de se deixar influenciar pela ideia central

embutida, pelo significado, pelo recado deixado por meio da narrativa.

Acordamos que, se o mito está presente desde os primórdios até

os dias atuais na cultura humana, têm forte domínio sobre a coletividade,

e sobre a opinião pública e que, mais importante do que provar a mentira

ou a verdade é conseguir trazer para si ou fazer com que a opinião

pública esteja de acordo com a idéia a ser difundida. Que para isso, tanto

podemos utilizar o mito como aliado, como o fato de desconsiderar seu

46

potencial poderá colocar todo um trabalho argumentativo a perder. Saber

distinguir o mito é muito importante para o cientista, principalmente o

cientista jurídico, mas ignorá-lo por completo ou ignorar que o povo a

quem nos referimos é fortemente influenciado por conceitos morais,

convicções ideológicas construídas por meio de mitos, poderá ser o

infortúnio de muitos que precisam trabalhar com persuasão, que

precisam convencer outras pessoas de sua verdade.

Concordamos também que a formação da opinião pública pode ser

construída por meio da criação de mitos e que seu poder de influenciar e

levar multidões a uma ideologia é inevitável, em certos casos.

Concluímos que, o importante não é desmitificar, mas saber usar o

próprio mito a favor de seus objetivos. Que, em um julgamento por

exemplo, não adianta querer convencer pessoas convictas por

determinados, não há tempo para isso, que mais importante do que

tentar desalienar alguém é usar aquelas convicções a seu favor. Que a

questão aqui não é tentar convencer ninguém de que tal conceito ou

idéia não passa de mito, pois esse tipo de consciência não muda da noite

para o dia, portanto não devemos nos ater à tentativa de conscientizar

sobre a falsa ideologia em determinado mito, mas aproveitar essa

imagem e transformar o seu discurso de forma que pareça estar de

acordo com as convicções desta pessoa de modo a trazê-la para si.

E, por fim, temos a convicção de que, considerar todos esses

aspectos pode conduzir-nos ao sucesso quando sabemos utilizar essas

prerrogativas a nosso favor diante da necessidade de persuadir.

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BIBLIOGRAFIA:

BARTHES, Roland. Tradução de Rita Buongermino, Pedro de Souza e Rejane Janowitzer.

Mitologias. 4ª Ed. – Rio de Janeiro: Difel, 2009;

CASTRO, Celso A. Pinheiro de. Sociologia Aplicada ao Direito. São Paulo: Atlas, 2001;

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Paulo: Editora Positivo, 2004;

FIDALGO, Antonio. Semiótica geral. Universidade de Beira Interior Covilhã, - Google acadêmico

- grupo 8, 1999.

LAROUSSE CULTURAL, Grande Enciclopédia. São Paulo: Circulo do Livro, vol. 20, 1988;

PERELMAN, Chaïm & OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tradução de Maria Ermantina Galvão.

Tratado da Argumentação: a nova retórica. 1ª Ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1999;

SANTOS, Celeste Leite dos. Persuasão e Verdade: o Sistema Lega em Fermentação. 1ª Ed. –

São Paulo: Cultural Paulista, 1995;

Sites:

www.absbemiótica.cjb.net/portal

www.pucsp.br/pos /cos

www.serg.inf.puc-rio.br/

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Comentários e Opiniões

1) Luciene (12/06/2012 às 00:00:12) IP: 201.95.200.115
valeu professor tenho muito orgulho de ser sua aluna no curso de Direito na faculdade uniep ...


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