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"JUS POSTULANDI" NA JUSTIÇA DO TRABALHO


Autoria:

Luis Fernando Araujo Reis


Advogado na cidade de Itatiba - SP, formado pela Faculdade de Direito do Sul de Minas.

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Texto enviado ao JurisWay em 06/07/2010.



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1.      INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho tem por objetivo debater sobre o “Jus Postulandi” na Justiça do Trabalho, de forma geral, sem adentrar em questões sobre a quem especificamente se deve tal prestação jurídica, propondo até mesmo soluções para tal assunto que se mostra controverso por atingir diretamente garantias constitucionais fundamentais de quem faz uso da Justiça do Trabalho e até mesmo afetar a classe trabalhista dos advogados.

Este estudo não visa defender os interesses de qualquer classe trabalhista que seja, mas, sim, o direito de propor ação e se defender de tal ação, independente se quem faz uso da Justiça do Trabalho, seja pessoa física (empregado/empregador) ou pessoa jurídica (empregador).

Entendemos que ambas as partes, para que tenham condições de igualdade na Justiça, necessitam da correta assessoria de profissional especializado para que não se vejam prejudicados na demanda por falta de conhecimento das peculiaridades que o processo do trabalho apresenta.

A idéia surgiu quando, ao assistir a uma audiência trabalhista, onde compareceu empregado e empregador sem assistência jurídica, discutindo uma dispensa por justa causa, o empregado, por falta de orientação e conhecimento do Direito, acabou por aceitar um acordo onde, independente de valores, aceitou a justa causa que, eventualmente poderia ter sido afastada.

Do nosso ponto de vista, o juiz buscou esclarecer ao empregado as implicações de sua decisão, porém, reforçamos, pela falta de orientação profissional de um advogado, ou defensor, no acordo, o empregado aceitou


a justa causa, fazendo com o que o julgador, pelo seu dever de não julgar fora do pedido e, pelo seu dever de imparcialidade acatasse o acordo.

O caso terminou em acordo, mas vislumbremos que, se prosseguisse normalmente, teria este empregado condições de se defender, recorrer ou até mesmo contestar qualquer tipo de alegação? Saberia ele de quem era o ônus da prova (ou até mesmo o que é ônus da prova)? Dentre outras questões que podem ser levantadas. Invertendo os pólos, questionamos também se, caso o empregado fosse profissional estudado, ou até mesmo instruído por algum advogado, mesmo não o acompanhando, saberia o empregador como produzir provas? De forma mais ampla, saberia ele como se defender?

Como supracitado, abordaremos o tema de forma geral, com uma breve base histórica sobre o surgimento do “Jus Postulandi” na Justiça do Trabalho brasileira, passando por sua discussão de constitucionalidade e até onde é benéfica a quem dela faz uso, finalmente vislumbrando possibilidades ou opções que poderiam contribuir para a Justiça do Trabalho cumprir sua finalidade de tratar os desiguais de forma desigual, fazendo assim a Justiça na forma mais pura da palavra.

 

2. DO DIREITO DO TRABALHO

2.1 A lide e o processo

 

Na vida humana e, principalmente a vivida em sociedade, é impossível que não haja conflitos de interesses entre os cidadãos, causando as lides que o Estado via de regra não permite que sejam auto-tuteladas, para tanto, o comportamento humano foi normatizado, estabelecendo-se regras, normas de conduta que impõem como cada pessoa deve agir ou, deixar de agir.

Com a criação de tais normas fez-se necessário a criação de institutos que fossem capazes de fiscalizar e aplicar, muitas vezes coercitivamente as normas ditadas. O Estado, por sua vez, para sua melhor organização, dividiu seus poderes em atividade administrativa, legislativa e judiciária, sendo a administrativa a que cuida dos serviços públicos e está ligada ao poder executivo, a legislativa cria de forma abstrata e genérica as normas de conduta que formam o direito objetivo, sendo parte do Poder Legislativo e, por fim, a jurisdição que faz parte ao poder Judiciário, que visa à pacificação das lides a ele apresentadas.

Para que o Poder Judiciário pudesse apreciar as lides a ele apresentadas, foi criado o processo, cuja eficácia também depende de normas jurídicas, formando o direito processual que se divide em trabalhista, civil, administrativo, entre outros.

Por sua vez, para Humberto Theodoro Júnior o processo é:

 

 “A prática de uma série de atos que formam o procedimento judicial (isto é, a forma de agir em juízo), e cujo conteúdo sistemático é o processo”[1].

 

Ainda, para a correta e devida prestação jurisdicional, deve o Estado, através do processo, realizar a Justiça. Para melhor entendimento, conceituamos a jurisdição, como sendo uma atividade realizada pelo Estado cujo poder emana de sua soberania e tem por função prestar a tutela jurisdicional como atividade seqüencial de atos processuais, cuja finalidade é apresentar uma sentença que resolva o litígio, decidindo de forma definitiva o mérito.

Já o procedimento é conceituado por Elpídio Donizetti como:

 

“O modus faciendi, o rito, o caminho trilhado pelos sujeitos do processo. Enquanto o processo constitui o instrumento para a realização da justiça, o procedimento constitui o instrumento do processo, a sua exteriorização” [2]

 

Ou seja, é forma, o rito pelo qual o processo é conduzido até o fim a que se destina, que é a sentença material, o meio pelo qual o Estado diz o direito.

Destarte, processo e procedimento são elementos distintos, sendo o primeiro, elemento material, objetivo, tratando do direito que foi ferido e se requer, independente neste momento se a parte realmente o tem ou não. O segundo é um elemento subjetivo, determinado pela forma pela qual o processo será conduzido, forma esta que será resultado dos atos tanto das partes como do Estado.

Notadamente são estes os elementos representantes de toda a base fundamental da função jurisdicional.

 

2.2 A Justiça do Trabalho

 

Para iniciarmos o estudo do “Jus Postulandi” na Justiça do Trabalho, é interessante antes nos situarmos historicamente, onde houve o início do trabalho e suas conseqüentes lides.

Analisando a história, podemos verificar seu início com o trabalho escravo, sendo considerado que o homem livre, os da sociedade, que dirigiam as coisas da cidade, a estes não era dado trabalhar, mas sim cuidar dos negócios apenas com as palavras, o que não era considerado uma forma de trabalho. Todo o trabalho braçal era feito por escravos, que eram considerados como coisa.

Tal entendimento iniciou-se com a criação do mundo, uma vez que o trabalho era considerado desonroso. Porém, em Roma, por volta de 284 a.C., houve uma mudança na forma de contratação da mão-de-obra, com as pessoas alugando suas energias ou resultado de trabalho em troca de pagamento. Posteriormente, surge o Feudalismo onde o Sr. Feudal, além de trabalho, oferecia também proteção a seus servos que não eram livres e trabalhavam em troca de tal proteção.

Em outro momento, surgem as corporações de ofício que tinham sua formação composta pelo mestre, que era quem dominava toda a técnica de determinado trabalho, o companheiro, que já tinha conhecimento sobre o ofício e recebia salário do mestre, mas, para se tornar mestre, deveria passar por uma prova, comprovando sua capacidade e os aprendizes que, em geral, eram pessoas entre 12 e 14 anos que pagavam para que os mestres os ensinassem o ofício.

No ano de 1791, com a Revolução Francesa, houve o fim das corporações de ofício e, logo após, com a revolução industrial, o trabalho foi transformado em emprego, com os trabalhadores passando a trabalhar em troca de salários.

Com a revolução industrial, o homem começou a ser substituído pela máquina, passando a ter que aprender a operar o equipamento para que pudesse se manter no mercado de trabalho, porém, com isso os empregadores, os exploravam e passaram a contratar mulheres e menores para fazer os trabalhos, já que os faziam por mais tempo e com salários muito mais baixos. Diante de tal situação de exploração, o Estado, reconhecendo a desigualdade de poder existente entre patrão e empregado se viu obrigado a intervir nas relações trabalhistas, visando o bem-estar social e as melhorias nas condições de trabalho.

É a partir do término da primeira guerra mundial que as Constituições dos países começam a tratar do direito do trabalho, iniciando pela do México em 1917, posteriormente pela de Weimar de 1919, no mesmo ano, surgindo o Tratado de Versailles e a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) expedindo convenções e recomendações visando proteger as relações entre empregados e empregadores.

Em 1927, na Itália surge a Cartal Del Lavoro, instituindo um sistema corporativista-facista com o Estado interferindo nas relações entre pessoas, determinando o que seria melhor para cada um e a produção nacional, modelo este que foi adotado por outros países como Portugal, Espanha e Brasil.

No Brasil, haviam leis ordinárias que tratavam do trabalho, tais como  as da organização dos sindicatos rurais (1903) e urbanos (1907), profissões e trabalhos das mulheres (1932), salário mínimo (1936), Justiça do Trabalho (1939), etc. Em 1/05/1943, com o decreto-lei nº 5.452, foi aprovada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que reuniu as leis esparsas existentes na época, não sendo um código. Nas Constituições de 1946 e 1967 ocorreram importantes inovações nas proteções trabalhistas tais como a participação dos trabalhadores nos lucros, o repouso semanal remunerado, o direito de greve, entre outros, porém, importante vitória para o Direito do Trabalho ocorreu com o a Constituição de 1988 que do seu artigo 7 a 11 trata os direitos trabalhistas como Direitos sociais e Garantias Fundamentais.

 

2.3 Dos Princípios

 

Princípio nos dá a noção de início, começo de algo, origem. Porém, no direito processual, seu significado vai muito mais além, tem o sentido de fundamento inspirador das normas e, nesse sentido, afirma Sérgio Pinto Martins que:

 

“Para o Direito, o princípio é o seu fundamento, a base que irá informar e inspirar as normas jurídicas” [3].

 

Complementando com as lições de Miguel Reale afirmando que:

 

“Princípios são verdades fundantes de um sistema de conhecimento, admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da praxis” [4].

 

Para o Direito, estas são as definições ideais de princípio, tendo em vista não serem as únicas possíveis.

Nos princípios podemos verificar toda a base do ordenamento jurídico, tanto a fundamental como filosófica, estando por vezes explícita a sua descrição. Em outras, os princípios estão implícitos nas normas, sendo eles ditados pela doutrina, de forma a direcionar toda a lei para que assim, conforme preceituado no art. 4º da Lei de Introdução do Código Civil, nenhum caso deixe de ser decidido sob a alegação de falta de lei que o regulamente.

É importante que seja esclarecida a diferença entre regras e princípios que são gêneros das normas. Ambos contidos no ordenamento jurídico, no caso dos princípios, algumas vezes de forma implícita e outras de forma explícita. Verifica-se que as principais diferenças são quantitativas, sendo as principais: a) as normas são mais gerais que as regras; b) os princípios, por sua característica de norma fundamental, são a base para o ordenamento jurídico; c) os princípios têm por característica indicar conotações éticas, políticas e sociais do sistema; d) os princípios são normas indiretas e de ampla aplicação. Portanto, os princípios têm maior abrangência que as regras, por serem mais gerais.

Neste sentido afirma Robert Alexy que:

 

“Princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização, que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e que a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais, mas também jurídicas. [...]. De outro lado, as regras são normas que só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então deve-se fazer exatamente o que ela exige, nem mais nem menos. Portanto, as regras contêm determinações no âmbito do fático e juridicamente possível” [5].

 

Já de forma mais concisa, nos ensina a Professora Ada Pellegrini Grinover que:

 

“Atribui-se extraordinária relevância a certos princípios que não se prendem a técnica ou a dogmáticas jurídicas, trazendo em si seríssimas conotações éticas, sociais e políticas, valendo como algo externo ao sistema processual e servindo-lhe de sustentáculo legitimador” [6].

 

Destarte, em conseqüência, os princípios se iniciam a partir de quatro regras conhecidas como “princípios informativos”, a saber: o princípio lógico, o princípio jurídico, o princípio político e o princípio econômico, surgindo a partir deles os demais.

Até o presente momento, tratamos dos princípios gerais do ordenamento jurídico brasileiro, pois esta é a base fundamental de qualquer especialidade do direito. Quanto ao Direito do Trabalho, sendo uma especialidade surgida a partir do Direito Civil, podemos citar alguns princípios que são comuns a ambos, tais como: a) o direito de petição aos poderes públicos, ou seja, ao judiciário (art. 5º XXXIV); b) garantia ao devido processo legal (art. 5º LIV); c) garantia ao contraditório e ampla defesa (art. 5º LV); d) direito ao juiz natural (art. 5º XXXV); e) inadmissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º LVI); f) direito à celeridade do processo (art. 5º LXXVIII), além dos princípios da publicidade e da fundamentação das decisões prescritos no artigo 93, IX, todos estes, descritos na Constituição Federal.

No parágrafo anterior não esgotamos todos os princípios, sendo que citamos apenas alguns a título de exemplo. Aproveitamos para destacar que a doutrina, a fim de facilitar o estudo, divide os princípios em dois grupos que são: o dos princípios fundamentais do direito, onde estão os princípios da imparcialidade, do interesse público, do devido processo legal, da inafastabilidade da função jurisdicional, da verdade processual, da ampla defesa e da coisa julgada; o segundo grupo é denominado como o dos princípios fundamentais do procedimento, contido nele os princípios da oralidade, da valorização da prova, do dispositivo, do impulso oficial, da eventualidade, da boa-fé e da lealdade processual, da humanização da justiça, da economia processual, do ônus da prova, da concentração, do duplo grau de jurisdição, e da fundamentação da sentença.

Reafirmamos que tais princípios elencados são gerais, aplicados tanto na Justiça Civil como na Justiça do Trabalho, sendo estes fundamentais e garantidores do perfeito andamento do processo, como forma de garantia da justiça. Porém, quando estudamos a Justiça do Trabalho, podemos perceber que além dos princípios já relatados, ela tem os seus próprios, que correspondem especificamente a sua forma de atuação que trata os desiguais de forma desigual, visando assim dar equilíbrio às partes, buscando a justiça, sobretudo uma justiça social, levando-se em conta que em geral, a Justiça Trabalhista trata sempre de verbas alimentares, do sustento das pessoas e suas respectivas famílias.

 

2.4 Os princípios do Direito do Trabalho

 

Como anteriormente citado, o Direito do Trabalho atua de forma distinta dos demais, sendo esta uma Justiça Especializada que trata desigualmente empregados e empregadores, em busca da justiça, que pode-se entender como sendo uma justiça social, devido a sua natureza.

Ao analisamos as lides trabalhistas, fica clara a diferença entre empregados e empregadores, sendo o empregado a parte mais fraca da lide e, com a finalidade de igualar as partes, a Justiça do Trabalho trata os desiguais de forma desigual, através de princípios exclusivos e a criação de normas e regras que garantam a maior proximidade de igualdade entre as partes.

Na doutrina há grande divergência sobre quais seriam os princípios do Direito do Trabalho, principalmente por cada autor enumerar quantias desiguais e incompatíveis de princípios. Porém, seguimos o entendimento do professor Sérgio Pinto Martins que diz serem os princípios divididos em:

 

“(a) reais: protecionista, simplificação de procedimentos, jurisdição normativa e despersonalização do empregador; (b) ideais: ultra ou extra petição, iniciativa de oficio e coletivização das ações” [7].

 

2.5 O princípio da proteção do trabalhador

 

Como princípio da proteção do trabalhador, destacamos o princípio do “in dubio pro operario” onde, sempre que houver dúvida sobre algum ponto no litígio ou na relação direta patrão-empregado, a decisão tomada deverá favorecer ao empregado, tendo em vista ser ele a parte mais fraca.

Há ainda a regra da norma mais favorável, determinando que, existindo mais de uma norma aplicável ao caso, deverá ser aplicada a que seja mais benéfica ao empregado, independente da existência de critérios de hierarquia de normas.

Por fim, há a regra da condição mais benéfica que protege os direitos adquiridos do trabalhador, impedindo que a aplicação de novas normas possa trazer prejuízos a ele.

Entendemos que estas duas regras apenas tratam de elementos fundantes do princípio do “in dubio pro operario”, sendo assim gênero deste.

Ressalte-se ainda que tal princípio não é exclusivo da Justiça brasileira e, visa fazer com que o empregado que é a parte mais fraca se torne a mais forte, de forma a trazer igualdade no processo, com vias de se alcançar justiça.

 

3. DO ESTADO

3.1 A obrigação de se prestar assistência judiciária gratuita.

 

Entendemos que a obrigação do Estado de prestar a assistência judiciária gratuita está diretamente relacionada ao acesso à justiça, de forma que para que o cidadão desprovido de recursos financeiros suficientes para movimentar uma lide também tenha acesso ao judiciário a fim de solucionar seus conflitos.

A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XXXIV, alínea “a” preconiza que:

 

“São a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”

 

Ainda no artigo 5º, inciso LXXIV diz que:

 

“O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”

 

Porém, o que podemos notar na prática é que há um grande óbice a isto.

O impedimento para o acesso à justiça não está relacionado apenas ao pagamento de custas processuais, mas sim, na necessidade que a parte encontra de ter um defensor, talvez um advogado, que na


impossibilidade de pagá-lo, deve o Estado fornecer tal proteção, através das Defensorias Públicas. Porém, em especial na Justiça do Trabalho, o trabalhador não pode contar com tal órgão e, a fim de demonstrar fácil acesso, a lei instituiu o “jus postulandi” como forma de solução a este óbice, mas, se esquece que não basta somente o cidadão ter acesso, ele deve ter como lutar por seus direitos e, isto só pode ocorrer de forma técnica.

Assim, faz-se claro que o dever constitucional de acesso à justiça é mais amplo do que simplesmente facilitar a postulação, devendo fornecer meio para que a pessoa litigue.

 

3.2 O estatuto da OAB

 

A OAB vem buscando formatar a indispensabilidade do advogado na representação judicial desde o seu anterior estatuto de 1963 (lei n. 4.215 de 27 de abril de 1963), dizendo em seu artigo n. 68 que:

 

“No seu ministério privado o advogado presta serviço público, constituindo, com os juízes e membros do Ministério Público, elemento indispensável à administração da Justiça”.

 

Porém, só atingiu o status de indispensável com a publicação da lei n. 8.906 de 04 de Julho de 1994, o atual estatuto da OAB, declarando expressamente em seu artigo primeiro que:

 

“art. 1 – São atividades privativas da advocacia:


I – a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos Juizados Especiais.

II – as atividades de consultoria, assessoria e direções jurídicas”.

 

Não parando por aí, dizendo ainda que:

 

§2º - Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados”.

 

Em síntese, para toda a atividade de postulação e constituição de pessoas jurídicas, deve obrigatoriamente a parte ser representada por um advogado, sendo ele o único detentor deste direito e ministério.

 

3.3 A decisão do STF e a doutrina

 

Diante do expresso no artigo 1º do estatuto da OAB, somado ao artigo 133 da Constituição Federal de 1988 que estatui que:

 

“O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”

 

Houve grande discussão sobre a obrigatoriedade da representação por advogado, por tratar-se de garantia constitucional, regulamentada por lei (o Estatuto da OAB), sendo assim, o princípio do “jus postulandi” seria


inconstitucional e, os artigos 791 e 839 da CLT não teriam sido recepcionados pela nova constituição.

Porém, a solução a esta controvérsia ocorreu após uma sentença dada pelo STF ao processo de Habeas Corpus nº 67.390-2 PR onde a parte argüiu a prescrição do processo pela falta de capacidade postulatória da parte que não se utilizou de advogado, porém, os ministros do STF, por unanimidade, entenderam não haver incompatibilidade entre os artigos, sendo assim pacífica a possibilidade de postulação sem advogado, não só na Justiça do Trabalho, mas também nos casos do credor na ação de alimentos, de declaração judicial da nacionalidade brasileira, no juizado de pequenas causas e no pedido de revisão criminal, além, do habeas corpus.

Citamos a decisão do STF quanto ao habeas corpus 67.390-2 PR:

 

HABEAS CORPUS. CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PACIENTE E IMPETRANTE. INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 133 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A constitucionalização do princípio geral já constante do artigo 68 da lei 4.215/63, e princípio que diz respeito à advocacia como instituição, não lhe deu caráter diverso do que ele já tinha, e, assim, não revogou, por incompatibilidade, as normas legais existentes que permitem – como sucede no Habeas Corpus – que, nos casos previstos expressamente, exerça as funções de advogado quem não preencha as condições necessárias para a atividade profissional da advocacia. – Não ocorrência, no caso, da prescrição alegada. – Não é o Habeas Corpus meio idôneo para o reexame aprofundado das provas, para verificar-se se foram, ou não, insuficientes para a condenação. Habeas Corpus conhecido, mas indeferido.


Ainda em consonância com o STF, a Justiça do Trabalho, também por maioria, entende ser possível sim o “jus postulandi”, ficando claro tal posicionamento com a resolução do Ministro Marcelo Pimentel do TST que no RR 32943/91.2, diz que:

 

“A Constituição Federal não exclui o “jus postulandi” na justiça do trabalho”.

 

Ainda, reforçando a jurisprudência, há doutrinadores que tem o mesmo entendimento, conforme verificamos abaixo:

SÉRGIO PINTO MARTINS defende que:

 

“Não vai ser qualquer profissional que se interessará em postular em juízo a defesa de pequenas causas ou de empregados que pretendem anulação de advertência ou suspensão, por não representarem aspecto pecuniário, o que importa que aquelas pessoas irão ficar sem direito de acesso ao judiciário, pois os sindicatos muitas vezes não querem prestar serviços a quem não é seu associado, apesar de terem de fazê-lo, e a Procuradoria do Estado normalmente está sobrecarregada e não tem condições de prestar a assistência judiciária gratuita a todos os interessados” [8].

 

No mesmo sentido afirma WAGNER D. GIGLIO dizendo que:

 

“A faculdade de requerer sem a intermediação de advogado, outorgada às partes, visou principalmente poupar-lhes os gastos com honorários, considerando,


como regra, a insuficiência econômica do trabalhador. Seriam justificados, assim, os entraves ao bom andamento processual causados pela atuação pessoal das partes, geralmente leigas em Direito, sem auxilio de advogado” [9].

 

Destarte, fica claro que a corrente dominante dos juristas entende ser totalmente legal que as partes, tanto reclamante como reclamado postulem em juízo, sem serem representados por advogado.

Por outro lado, apesar de ser admirável a atitude do legislador ao permitir e possibilitar o acesso à Justiça sem a representação de advogado, para outra parte dos doutrinadores parece ser esta uma forma de lide temerária, principalmente quando analisados os aspectos atuais da sociedade e da própria Justiça do Trabalho que com seu aumento de competência deixou de tratar apenas das relações de emprego, onde a discussão era restrita a empregado e empregador e, passou a tratar também das relações de trabalho, onde via de regra não existem estas figuras e, se existem, não são de fácil identificação.

Em consonância com este entendimento, MAURO SCHIAVI afirma que:

 

“Com a EC 45/04 e a vinda de outras ações para a Justiça do Trabalho que não são oriundas da relação de emprego, não mais se justifica a existência do “jus postulandi”, até mesmo pelo fato da complexidade das relações jurídicas que decorrem da relação de emprego” [10].

 

Seguindo a mesma linha de pensamento, RENATO SARAIVA, defende que:


“O “jus postulandi” da parte é restrito às demandas que envolvam relação de emprego. Logo, em caso de ação trabalhista concernente à relação de trabalho não subordinado, as partes deverão estar representadas por advogados” [11].

 

Destarte, verificamos ser esta uma discussão que está longe de seu fim, chegando a entender alguns posicionamentos como o do professor Renato Saraiva como posição intermediária, defendendo em partes a existência do “jus postulandi”.

 

4. DO ADVOGADO

4.1 O desenvolvimento da advocacia

 

Desde a antiguidade a advocacia já era exercida, segundo dados históricos retirados de um fragmento do Código de Manu, os sábios em leis poderiam defender os necessitados perante autoridades e tribunais, apresentando seus argumentos e fundamentos.

A Grécia foi quem difundiu a atividade da advocacia com seus grandes oradores.

Na Roma antiga, os patrícios tinham o monopólio da atividade de advocacia, por serem os únicos a ter acesso ao direito. A lei das XII tábuas, por volta de 450 a.C. abre a atividade advocatícia também para os leigos e plebeus.

Quanto à criação da Ordem dos Advogados, alguns a atribuem ao Imperador Justino, obrigando no século VI a registrar todos que fossem advogar, e, para a concessão do registro, deveria atender a alguns requisitos como advogar honestamente, ser aprovado em exame de jurisprudência, defender quem o pretor designasse em caso de necessidade, ter boa reputação, não pactuar quota litis e, não abandonar a defesa se aceita.

Outros, por sua vez, atribuem à França a criação da ordem, porém, este foi o início da regulamentação da advocacia.

No Brasil, a atividade advocatícia surgiu como reflexo das Ordenações Filipinas, adotadas por Portugal que estabelecia que só poderiam advogar aqueles que cursassem oito anos do curso jurídico, porém, pela dificuldade em se deslocarem do Brasil até Coimbra, os cursos de Direito criados tinha muito mais a função de criar quadros dirigentes, revelando vocações políticas.

Somente em 1930, com a criação da OAB, é que houve a regulamentação da profissão, exigindo formação universitária, mas, os primeiros estatutos excluíram a advocacia extrajudicial e o advogado assalariado. Somente com o estatuto de 1994 é que foi definido o seu alcance e indispensabilidade, passando a ser reconhecida como prática profissional de postulação nos órgãos do Poder Judiciário.

 

4.2 A função do advogado

 

O advogado tem a especial função de facilitar o acesso à justiça, intermediando a prestação jurisdicional entre a parte, o juiz e o Estado. É dele a tarefa de corretamente informar e demonstrar ao Juiz a ordem e forma de acontecimento dos fatos, visando estar o mais próximo possível da realidade, para que o juiz, com o correto entendimento possa então julgar e, ao final prolatar uma sentença que seja a mais justa para as partes envolvidas.

Não basta a este profissional apenas levar a conhecimento do juiz / Estado o caso ocorrido, mas, depende dele também a interpretação das normas.

Para a Professora Ada Pellegrini Grinover o advogado é:

 

“O profissional legalmente habilitado a orientar, aconselhar e representar seus clientes, bem como defender-lhes os direitos e interesses em juízo ou fora dele” [12].

 

Neste sentido, o advogado, ao contrário do juiz, deve agir com total parcialidade, de forma a defender os interesses de seu cliente, porém, devemos ressaltar que a atividade do advogado não consiste somente em estar em juízo defendendo seu cliente, mas, está também no trabalho preventivo, de assessoria, de forma a evitar as lides.

Historicamente, o advogado sempre foi reconhecido como um profissional liberal preso ao cliente pelo vinculo contratual do mandato e da locação de serviço, porém, atualmente, com as mudanças ocorridas no ordenamento jurídico, entre elas a criação do “jus postulandi” que dispensa a necessidade de advogado nas lides, passou-se a reconhecer a atividade do advogado como sendo de caráter público e os contratos entre advogado e cliente como sendo contratos de direito público, ou seja, novamente fazendo uso das palavras da professora Ada Pellegrini, o advogado pratica o “exercício privado de função pública e social”[13].

Lembramos também que advogado não é só a pessoa particular que presta serviço a terceiros na postulação em juízo, pois, são também advogados aqueles que militam nos órgãos públicos da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, Distrito Federal e Municípios, além das entidades de administração indireta e fundacional.


Em suma, o advogado, independente se em atuação pública ou privada, tem por função colaborar com o desenvolvimento da justiça, seja promovendo ações, prevenindo os litígios ou interpretando as normas.

 

4.3 Da indispensabilidade do advogado.

 

Desde a antiguidade o advogado sempre esteve presente nas causas em que havia a necessidade de defender alguém, assim como sempre houve quem acusasse e quem julgasse. Remetemos à Grécia antiga, onde os sofistas com seu poder de persuasão eram contratados pra defenderem quem estivesse em meio a julgamento, em vias de ser condenado, tal papel de defensor, nada mais era que atitude semelhante a do advogado atualmente, porém, na época não levavam tal titulo.

No decorrer da história, o advogado sempre foi uma figura muito marcada, sofrendo até mesmo ameaças contra seu trabalho, como ocorreu com Frederico “O Grande” que os classificava como sanguessugas e venenosos répteis, prometendo a forca a eles e, Napoleão ameaçando cortar a língua daqueles que se colocassem contra o governo, ou seja, todos os grandes ditadores conhecem o poder que um advogado tem.

Em defesa do advogado, Francisco Vani Bemfica diz:

 

“O advogado é um profissional importante. Sem ele, diga-se que não há justiça; sem justiça, diga-se que não há direito; sem direito, diga-se que não há Estado” [14].

 

No Brasil, o advogado só conseguiu seu pleno reconhecimento e da importância que tem na postulação na justiça com a Constituição de 1988, onde no artigo 133 trata de sua indispensabilidade.

Esta afirmação e garantia da indispensabilidade, também expressa no Estatuto da OAB (Lei 8.906/94) em seu artigo 1º, trouxeram junto uma grande discussão no âmbito da Justiça do Trabalho, já que foi diretamente contra o art. 791 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que garante aos empregados e empregadores o direito de postularem em juízo sem o auxílio de procurador judicial.

Porém, esta discussão foi pacificada pela jurisprudência que manteve o artigo 791 a CLT garantindo o “jus postulandi”, assim como é garantido nos juizados especiais e na impetração de Habeas Corpus.

Ainda que garantido o “jus postulandi” ele é restrito, não podendo a parte impetrar recursos contra o TST ou até mesmo (caso consiga chegar) ao STF sem o auxilio de advogado, o que nos remete à garantia da indispensabilidade deste profissional.

 

5. O “JUS POSTULANDI”

5.1 – O instituto do “Jus Postulandi”

 

O “jus postulandi” é a capacidade postulatória das partes que na maioria das instâncias judiciais só pode ocorrer através da representação por advogado ou, como no caso da Justiça Penal há a representação pela Defensoria Pública.

Na Justiça do Trabalho, em comum com o Juizado de Pequenas Causas, o próprio cidadão pode postular sem a representação de advogado, destacando que este direito é inerente a ambas as partes, tanto para reclamante como reclamado.

Tal garantia está preceituada no art. 791 da CLT, in verbis:

 

“Art. 791 – Os empregados e empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a justiça do trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final.”

 

Esta garantia foi fortemente questionada quando promulgada a Constituição Federal de 1988 que em seu artigo 133 diz, in verbis:

 

“Art.133 – O advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”

 

A questão era, se a Carta Magna diz que o advogado é indispensável para a postulação em juízo, então seria inconstitucional o artigo 791 da CLT quando diz que “os empregados e empregadores poderão reclamar pessoalmente na Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final”, não tendo sido ele recepcionado pela nova Constituição, porém, no TST a jurisprudência é pacífica em dizer que o “jus postulandi” foi sim recepcionado pela Constituição, de forma que o art. 133 da CF não impõe o monopólio da assistência judiciária aos advogados.

Não queremos nos ater somente à figura dos advogados, pois conforme nosso entendimento a garantia constitucional constante do art. 5º, XXXV, onde diz que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, não se limita a dizer que somente os advogados têm capacidade postulatória, indica também uma obrigação do Estado de prestar tanto a assistência como prover os meios para que o cidadão tenha acesso à prestação jurisdicional.

Podemos observar que o Estado dispõe de alguns recursos para facilitar o acesso à justiça, tais como o Ministério Público cuja atividade está prevista no artigo 129 da Constituição Federal que de modo geral tem por escopo zelar pelas causas de interesse público, também há a Defensoria Pública cuja finalidade é representar as pessoas que comprovadamente não tem condições financeiras de pleitear seus direitos em juízo, porém, este atende somente aos casos criminais, cíveis, familiares, os Juizados Especiais e Delegacia da Mulher.

Conforme citado acima, na Justiça do Trabalho não há a figura do Defensor Público a fim de defender os menos favorecidos financeiramente, porém, se tomarmos o preceituado no artigo 134 da CF, entendemos que haveria obrigatoriedade de tal prestação jurisdicional também na Justiça do Trabalho.

 

“Art. 134 CF – A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.”

 

Como forma de suprir tal lacuna, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) em seu artigo 791, parágrafo 1º traz a possibilidade de o empregado ou empregador que desejar seja representado pelo sindicato de sua categoria, preceito este reforçado no artigo 839 da mesma CLT. Regulamentando os artigos supracitados, a lei 5.584/70 nos artigos 14 e 18 garantem ao trabalhador a assistência pelo sindicato da classe, mesmo que o obreiro não seja associado, porém, traz algumas restrições, tais como receber salário inferior ou igual ao dobro do mínimo legal ou, comprovando que mesmo recebendo mais, ao demandar, sua situação econômica será prejudicada, comprometendo o sustento próprio ou da família.

Apimentando um pouco mais a discussão sobre a obrigatoriedade de assistência veio o Estatuto da OAB (lei 8.906/94) em seu artigo primeiro dizer que com exceção do habeas corpus todas as demais postulações em juízo são privativas dos advogados, porém, ainda este artigo não achou guarida e a jurisprudência se mantém dizendo ser legal o “Jus Postulandi”, garantindo assim o acesso à justiça para os menos favorecidos financeiramente.

Entendemos que a Constituição foi certeira em garantir o acesso à justiça para todos, mais ainda foi correta a jurisprudência em manter o artigo 791 da CLT, permitindo que cada um postule em nome próprio, sem a necessidade de representação por advogado, mas, questionamos até onde há segurança em tal forma de acesso à justiça.

O questionamento surge quando analisamos o artigo 791 da CLT que diz que os empregados e empregadores poderão postular pessoalmente na Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final, porém, este final é limitado até o recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), sendo que a partir daí deverá o reclamante ou reclamado contar obrigatoriamente com a assistência de advogado.

Em 2004, surge a Emenda Constitucional (EC) 45, ampliando a responsabilidade da Justiça do Trabalho, que passa a responder também pelas controvérsias provenientes das relações de trabalho, em seu art. 114 diz:

 

"Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II - as ações que envolvam exercício do direito de greve;

III - as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV - os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V - os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI - as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII - as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII - a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX - outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.”

 

Tal dispositivo da lei inicia nova discussão sobre o “Jus Postulandi”, pois tal mudança aumenta a complexidade das relações jurídicas, fazendo assim necessário o auxilio de advogado, posição esta defendida por Mauro Schiavi:

 

“Com a EC n. 45/04 e a vinda de outras ações para a Justiça do Trabalho que não são oriundas da relação de emprego, não mais se justifica a existência do “jus postulandi”, até mesmo pelo fato da complexidade das relações jurídicas que decorrem da relação de emprego” [15]

 

Em consonância com a afirmação do Dr. Mauro Schiavi, entendemos ser temerária a lide sem a assistência de advogado em especial pela grande importância que a Justiça do Trabalho vem adquirindo na solução de lides não só de emprego, mas também de trabalho, que por serem mais complexas dependem não apenas da vontade da parte de demandar, mas de conhecimento técnico que a auxilie na demanda a fim de que obtenha êxito.

 

6. A VIABILIDADE DO “JUS POSTULANDI”

 

Com o item anterior, buscamos a fundamentação legal da existência do “jus postulandi”, porém, sem discutir sua limitação que pode até mesmo ser prejudicial a quem faz uso dele, dependendo da discussão levantada em juízo, se de cunho pecuniário ou moral, como entendemos ser o caso de uma dispensa por justa causa.

Em acordo com a maioria da doutrina e da jurisprudência, entendemos ser o “jus postulandi” um grande avanço na justiça, dando maior amplitude a todos quantos necessitarem da prestação judiciária, por facilitar o acesso dos menos providos financeiramente, mas, para que se chegue a um recurso de revista no TST ou até mesmo, indo mais além, para que o processo chegue ao STF, antes, na primeira instância, deve ter havido o pré-questionamento da matéria, ítem este que para um leigo em Direito, alguém que não tenha passado pela academia e que não tenha o conhecimento necessário ou convívio diário em tribunais não terá condições de fazê-lo, sem contar que na grande maioria das vezes pode ocorrer que o demandante não tenha nem mesmo conhecimento sobre o que é pré-questionamento ou até mesmo saiba que isto exista.

Outros itens que não podem passar despercebidos são os referentes a provas e prazos. É sabido que na Justiça do Trabalho, Cível, Penal e todas as demais estas são questões primordiais e que podem tanto fazer com que a parte ganhe a lide ou a perca.

Levemos em conta um empregado que foi demitido por justa causa, sendo alegado que violou segredo da empresa, conforme art. 482, g da CLT, postula fazendo uso do “Jus Postulandi”, contra a justa causa que incontestavelmente não existiu, pede também os seus demais direitos. A questão está em até onde conseguirá esta pessoa provar a inexistência da justa causa, saberia ele como fazer (ou produzir) tal prova? Saberia ele quem tem o ônus da prova? Saberia ele como fazer (ou até mesmo se existe) o pré-questionamento para que eventualmente e se necessário for seja enviado recurso e seja discutido no TST? Conheceria ele os prazos e momentos corretos para produzir as provas e todas as alegações que devem ser feitas tanto por ele quanto pela parte contrária?

São questões que, principalmente por se tratar de valores que se entende serem para o sustento próprio ou da família do trabalhador, a justiça deve ser feita da forma mais acertada possível já que não conseguindo provar suficientemente ou perdendo algum prazo ficaria sua lide comprometida, deixando de receber aquilo que é devido a ele.

Como este trabalho não tem a intenção de proteger nenhuma das partes, também levantamos a questão quanto ao empregador que se utiliza do “jus postulandi”, o que via de regra são os pequenos e médios empresários que fazem uso, muitas vezes por ter seu orçamento apertado e não tendo condições de contratar advogados para darem assessoria e orientá-los de forma a evitar a lide ou até mesmo não tem condições de contratar advogado nem mesmo para causas especificas.

Para estes, também formulamos as mesmas perguntas, em uma lide onde o empregado tenha agido de má-fé e postulado contra a empresa, saberia esta como produzir as provas necessárias para se defender? Saberia ela quem tem o ônus da prova? Saberia como produzir os pré-questionamentos necessários para um futuro recurso ao TST?

Talvez não, o que prejudicaria a lide, podendo levar este empregador a perder toda ou parcialmente a ação na justiça e ter de pagar por coisas as quais não devia ao empregado. Vamos dar como exemplo, um empregador que por falta de conhecimento a talvez por uma orientação errada de seu contador não saiba como provar o recolhimento do FGTS do empregado, sendo assim condenado a depositar novamente tal valor. Dependendo deste valor e da empresa, pode ser este o ponto definitivo e determinante de seu fechamento, sua falência.

São pontos que devem ser analisados com cautela uma vez que o empregado depende do emprego para que tenha rendimentos e garanta seu sustento, sendo assim, deve-se ter cuidados com as empresas a fim de que não diminua a oferta de emprego e, da mesma forma, as empresas dependem dos empregados para que consigam gerar lucros e obter rendimentos, tendo condições de pagar o salário a eles, devendo também ter cuidados para com os empregados a fim de que tenham seus direitos corretamente cumpridos e não lhes falte o salário a fim de que tenham uma vida digna.

A garantia dos direitos de ambos só serão devidamente respeitados e cumpridos com a correta prestação jurisdicional, tendo em vista ser impossível que se acabe com as lides, por ser este um sentimento, algo inerente ao ser humano.

Entendemos que a correta prestação jurisdicional só ocorre quando as partes são assistidas por pessoas, que sejam advogados particulares ou de sindicatos, Promotores, Defensores Públicos ou até mesmo estudantes de Direito, estagiários, que tenham conhecimento das peculiaridades do processo, sabendo como produzir provas, quando fazer alegações, quais alegações fazer, ou seja, agir de forma técnica e especializada a fim de que os princípios da justiça sejam devidamente alcançados e o processo corra com celeridade e tenha condições de, se necessário for, chegar a recurso no TST e quem sabe até o STF sem sustos para as partes tendo seus recursos recusados por falta de requisitos necessários.

Entendemos que os critérios para o “jus postulandi” devem ser revistos, não se prendendo apenas ao valor pecuniário da lide, valor este que também deve ser reduzido para efeitos do “jus postulandi”, mas também ser incluso como critério o fato da justa causa, uma vez que se trata de defesa da moral ou até mesmo da honra da pessoa que talvez por não conseguir provar a improcedência de tal acusação, se veja para sempre marcado com tal tipo de dispensa, o que coloca sua credibilidade em dúvida, até mesmo ocasionando a dificuldade para sua recolocação no mercado de trabalho, prejudicando assim o sustento seu e de sua família.

 

7. CONCLUSÃO

 

Com este estudo, pretendemos analisar o “jus postulandi” na Justiça do Trabalho observando os posicionamentos existentes, tanto favoráveis quanto contrários, de forma a verificarmos a viabilidade de sua manutenção, principalmente em função da garantia constitucional de acesso à Justiça, consagrado no artigo 5º, inciso LXXIV, da Carta Magna.

Entendemos ser inviável a manutenção de tal garantia, pois a Constituição Federal garante “assistência jurídica integral e gratuita aos que provarem insuficiência de recursos”. Destarte, tal artigo deixa claro que, além do acesso à justiça, a obrigação do Estado é de dar assistência ao reclamante que provar insuficiência de recursos, sendo assim o “jus postulandi” é uma forma de o Estado se eximir desta obrigação, alegando ser esta a melhor e mais constitucional garantia de acesso à justiça.

Com tal afirmação, fica demonstrado que o “jus postulandi” aumenta ainda mais a desigualdade entre as partes, principalmente na Justiça do Trabalho, onde o empregador é sempre a parte mais forte.

A garantia de assistência jurídica tem a principal função de não deixar o litigante à sua própria sorte, não podendo ser o “jus postulandi” uma forma de o Estado se eximir de sua obrigação constitucional de prestar assistência judiciária gratuita aos pobres.

Destarte, o “jus postulandi” não pode continuar a ser utilizado como causador de risco de a parte menos favorecida (o empregado) acabar não alcançando o seu direito por falta de técnica jurídica. Por outro lado, pode-se alterar a característica do “jus postulandi”, passando este a ser um direito de postulação apenas para as discussões que não envolvam valores pecuniários, como assuntos que envolvam valores morais, podendo até mesmo ser destacado da Justiça do Trabalho, passando a ser discutido nos sindicatos, que funcionariam como câmaras de arbitragem.

Ao nosso entender, esta seria uma forma de desafogar o Judiciário e evitar que os desfavorecidos financeiramente sofram com as mazelas do Direito, deixando muitas vezes de receber o que é seu por direito, pelo simples motivo de não saberem como provar, devido à falta de assistência de profissional da área.

 

8. BIBLIOGRAFIA

 

LEITE,Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 7ª edição. São Paulo: LTR, 2009.

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LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 4ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2008.

DONIZETTI, Elpidio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 9ª Edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris. 2008.

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MATINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 24ª Edição. São Paulo: Atlas, 2008.

MATINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 29ª Edição. São Paulo: Atlas, 2009.

PEREIRA, Caio Mario da Silva, atualizadora, MORAES, Maria Celina Bodin de. Instituições de Direito Civil. Vol. 1. 22ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

GRINOVER, Ada Pellegrini, CINTRA, Antonio Carlos de Araujo, DINAMARCO, Candido Rangel. Teoria Geral do Processo. 22ª Edição. São Paulo: Malheiros. 2006.

GALUPPO, Marcelo Campos. Princípios jurídicos e a solução de seus conflitos – A contribuição da obra de Alexy. Revista da Faculdade Mineira de Direito. Belo Horizonte, V.1, n.2, p.137, 2º semestre de 1998.

SCHIAVI. Mauro. Manual de direito processual do trabalho. 2ª Edição. São Paulo: LTR, 2009.

SARAIVA, Renato. Curso de direito processual do trabalho. 4ª Edição. São Paulo: Método, 2007.



[1] Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, p. 52.

[2] Elpídio Donizetti, Curso Didático de Direito Processual Civil, p. 38.

[3] Sérgio Pinto Martins, Direito Processual do Trabalho, p.37.

[4] Miguel Reale, Lições Preliminares de Direito, p. 285.

[5] Robert Alexy, Teoria de La Argumentación Juridica, apud, Marcelo Campos Galuppo, Princípios jurídicos e a solução de seus conflitos – A contribuição da obra de Alexy, p.137.

[6] Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araujo Cintra, Candido Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, p. 56.

[7] Sérgio Pinto Martins, Direito Processual do Trabalho, p. 40-41.

[8] Sérgio Pinto Martins, Direito Processual do Trabalho, p. 186.

[9] Wagner D. Giglio, Cláudia Giglio Veltri Correa, Direito Processual do Trabalho, p. 122.

[10] Mauro Schiavi, Manual de direito processual do trabalho, p. 256.

[11] Renato Saraiva. Curso de direito processual do trabalho, p. 40.

[12] Ada Pellegrini Grinover, Antonio Carlos de Araujo Cintra, Candido Rangel Dinamarco. Teoria Geral do Processo, p. 237.

[13] Ibidem, mesma página.

[14] Francisco Vani Bemfica, O Juiz, O Promotor e o Advogado – Seus Poderes e Deveres, p.80.

[15] Mauro Schiavi, Manual de Direito Processual do Trabalho, p.256.

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