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Resumo:
Sem dúvidas é profunda e palpitante a discussão sobre descriminalizar ou não o aborto. Tal discussão costuma ser tratada sob duas óticas: positiva e negativa, bem e mal. Para os que entendem como positivo a abolição do aborto, ...
Texto enviado ao JurisWay em 11/11/2009.
Última edição/atualização em 07/04/2010.
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Sem dúvidas é profunda e palpitante a discussão sobre descriminalizar ou não o aborto. Tal discussão costuma ser tratada sob duas óticas: positiva e negativa, bem e mal. Para os que entendem como positivo a abolição do aborto, os principais argumentos são as estatísticas de que, mesmo criminalizado, o aborto continua acontecendo em larga escala. Para os que o vêem pelo lado negativo, a defesa da vida é o argumento principal. O que parece mais sensato. Embora entendamos que descriminalizar não está diretamente ligado a aceitação moral da prática do aborto.
No Brasil, a prática do aborto tem permissão legal em casos de estupro e quando a vida da gestante está em risco. No primeiro caso, o legislador permite a prática do aborto, dando a gestante o direito de escolher pela interrupção ou não da gestação. Em casos de violência sexual, os danos psicológicos são, na maior parte dos casos, irreparáveis.
Quando a vida da gestante está sob risco, o dispositivo penal autoriza a interrupção da gravidez, por entender que o bem jurídico mais relevante é a vida da gestante. No entanto, em casos diversos, a interrupção da gravidez constitui crime, mesmo no caso de feto com má formação, que se quer tem expectativa de vida.
Parece haver um paradoxo no que diz respeito ao bem mais relevante tutelado pelo ordenamento jurídico brasileiro, onde para preservar a saúde psíquica da gestante, em situações de estupro, se permite o aborto sentimental, mesmo sendo o feto dotado de toda capacidade de desenvolvimento intra e extra-uterino. Mas permanecer com um feto com má formação, no caso de anencefalia, não afeta a saúde mental da gestante? Certamente que sim. Tal decisão deverá ser principalmente da gestante, ela deve ter o direito de decidir se interrompe ou não a gestação.
Com efeito, o tipo penal não tem tido eficácia, abortos continuam acontecendo e quem deixa de praticá-los, não o faz com receio de ser preso e condenado ou responder a uma ação penal, mas por outras razões (morais, religiosas, etc). O problema talvez esteja na falta de eficácia da norma. Mas descriminalizar totalmente é concordar com eliminação prematuramente de um ser vivente, com total expectativa de vida.
Ao invés de pensarmos em abolir o crime, poderíamos pensar numa reforma do dispositivo penal que trata do aborto. Existem algumas situações em que a interrupção da gravidez se faz necessária, como em casos de má-formação fetal, de fetos anencéfalos, por exemplo. Neste caso não se trata de aborto e sim de uma interrupção de gravidez de feto que se quer tem expectativa de vida, e tal interrupção por não ser protegida por lei, o enquadramento é de que é um ilícito penal.
Apesar de concordarmos que o tipo penal referente ao aborto não tem tido aplicação ampla no ordenamento jurídico brasileiro, não é razoável concordar com sua abolição, por entender uma afronta ao direito à vida. Abolir o crime poderá até diminuir a mortalidade materna, mas as vidas intra-uterinas estarão sendo ceifadas.
Destarte, pensemos na atuação da lei penal para casos específicos, como um magistralmente trazido por Rogério Greco, no Curso de Direito Penal – Parte Geral:
“Muito comum no Brasil, principalmente na modalidade do auto-aborto, é o chamado aborto econômico. A gestante que se encontra grávida por mais uma vez, dada sua falta de conhecimento na utilização de meios contraceptivos, ou mesmo diante de sua impossibilidade de adquiri-los, em decorrência de sua condição de miserabilidade, resolve interromper a gravidez, eliminando o produto da concepção, causando a sua morte.
Não encontramos, nesses casos, qualquer causa de justificação ou mesmo de exculpação que tenha por finalidade afastar a ilicitude ou a culpabilidade daquela que atuou impelida por essa motivação econômica.
Aníbal Bruno, com peculiar brilhantismo, diz: “a justificação da morte do feto pela consideração das vicissitudes financeiras da mulher contém em si muito individualismo e egoísmo, sinal da progressiva materialização das forças que orientam a cultura moderna, corresponde ainda a um pensamento de desvalorização da vida do feto em face do Direito Penal e da proteção que este lhe concede, desvalorização que contrasta com a idéia de que a vida humana é bem jurídico fundamental, origem e suporte dos demais bens individuais e sociais”.
Caso a agente, que vive numa situação completa de exclusão social, abandonada pelo Estado, que não lhe fornece meios suficientes para que possa trabalhar e cuidar dos seus filhos, engravide, mesmo com todas as dificuldades que lhe sejam impostas, deverá, ainda sim, levar adiante a gravidez. A sua opção não está em causar a morte do feto, ou seja, de uma vida em desenvolvimento, em razão de não poder mantê-lo após o seu nascimento. A sua opção, nesse caso, infelizmente, será entregá-lo para fins de adoção, que é um minus em relação à conduta extrema de causar a morte de um ser, mesmo que ainda em formação.”(g/n)
Não entendo que o aborto seja tão somente problema de saúde pública e não do Direito Penal. Não posso pensar no princípio da intervenção mínima ou no minimalismo penal, para este caso. Essa idéia de associar o aborto a um fato mínimo, que não deve ser tratado pela via penal é preocupante. Abortar não é um dano causado apenas na gestante, sobretudo é profligar uma vida. “Abortar sem razão alguma; abortar por que não é o momento certo para ter filhos; abortar por que o método anticonceptivo falhou, etc.” Não consigo ver isso como questão de saúde pública e/ou como um mínimo penal capaz de ser prestigiado pelo instituto do Abolitio Criminis.
*Ivis Melo de Souza é acadêmico em direito, pela Faculdade de Sergipe (FaSe)
Comentários e Opiniões
1) Edinelma Sousa. Estudante De Direito.castanhal-pa (08/03/2010 às 23:24:09) A discussão sobre o aborto é de extrema importância, considerando que este tema envolve muita pluraridade, no que diz respeito a religião, pessoas que optaram por praticá-lo, outras que ignoram, o ordenamento jurídico tem sua idéia formada e assim sucessivamente... ou seja, chegar ao ponto x da questão é bem complicado, mas considero que o texto acima relatado está bem coerente e sem dúvida apresenta informações muito interessantes sobre o aborto. Parabéns... | |
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