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Direito ao Esquecimento X Direito a Liberdade de Expressão


Autoria:

Sandra Mara Dobjenski


Advogada. Especialista em Direito Penal e Criminologia - Uninter - Bacharel em Direito- Faculdade Curitibana. Licenciada em Pedagogia pela Faculdade Bagozzi. Especialista em Direito Educacional. Pesquisadora. Autora de artigos jurídicos.

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Resumo:

O direito ao esquecimento não possui tratamento expresso na Constituição Federal, sua previsão legal é amparada nos direitos e garantias fundamentais, como uma forma de proteção.

Texto enviado ao JurisWay em 26/04/2024.



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DIREITO AO ESQUECIMENTO X LIBERDADE DE EXPRESSÃO – UMA ANÁLISE FRENTE AOS CASOS DE GRANDE REPERCUSSÃO

DOBJENSKI, Sandra Mara[1]

Resumo

O direito ao esquecimento não possui tratamento expresso na Constituição Federal, sua previsão legal é amparada nos direitos e garantias fundamentais, como uma forma de proteção àquele que já se encontra fora das dependências prisionais, de forma a garantir a ressocialização após o cumprimento da pena. Ganhou notoriedade através do Enunciado 531/2013, do Conselho de Justiça Federal. Sua fundamentação se baseia no princípio da dignidade da pessoa humana e nos direitos da personalidade, à imagem, à honra, à vida privada e à intimidade. Dessa forma, o ponto central desse estudo, é mostrar que apesar de não poder reescrever ou apagar o passado, existe a possibilidade de se regular o uso que se faz de histórias de crimes pretéritos, e fiscalizar o modo e a finalidade que estes fatos são relembrados, para evitar que canais de informação façam uma exploração indevida das desgraças da vida privada, com o simples intuito de satisfazer a curiosidade alheia.

 

INTRODUÇÃO

No que tange ao tema direito ao esquecimento, se faz salientar sobre os problemas vividos pelos agentes com relação a sua busca pelo direito de serem esquecidos, de suas mazelas ficarem em um passado falho remoto. É fato que as pessoas que cometeram delitos almejam que não exista repercussão sobre os casos, a fim de que não interfira em sua ressocialização quando sua pena for devidamente cumprida. Entretanto, principalmente, quando os casos demoram a ser resolvidos, ou são de grande repercussão existem grandes chances de que o esquecimento não seja possível, sobretudo, quando identificado pela mídia, que tende a fomentar ainda mais o cenário e diminuir as chances para que a ressocialização de fato aconteça, tal como entende Santos. (SANTOS, p.30, 2019).

Dessa forma, compreende-se o direito ao esquecimento como parte do princípio da personalidade do agente, que protege sua intimidade com o objetivo de reter a divulgação de informações que aconteceram no passado do indivíduo, de forma que sua vida não passe a ser desentranhada, divulgada e aberta vinte quatro horas por dia nos folhetins midiáticos. Com tal percepção, corrobora o tema 786, de repercussão geral que sustenta que “é incompatível com a Constituição Federal a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social – analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais no âmbito penal e cível[2]."

Em pleno século XXI é fato que a expansão tecnológica trouxe mudanças significativas no que tange a vinculação das informações aos meios de comunicação, de forma a alcançarem mais rapidamente a massa da população, de forma a disseminar um desenfreamento das informações, que são divulgadas sem nenhum filtro e em tempo real, muitas vezes de forma sensacionalista.

Assim, os meios de comunicação se tornam uma ferramenta perigosa para a formação de opiniões e com problemáticas significativas para a sociedade.

Dessa forma, a mídia se tornou um espetáculo moderno para a sociedade, onde o indivíduo, então, passa a figurar como parte desta peça, de forma a sua vida, seu presente, passado e futuro se tornarem enredo de reality show, trazendo consequências, ao agente acusado, culpado e condenado, na forma de se relacionar e interagir.

Muito já se tem discutido sobre a influência da mídia nos processos penais, inquéritos policiais, e Tribunais do Júri já que a propagação de informações pode influenciar na possibilidade de defesa e até mesmo impactar na imparcialidade dos julgadores.

Em contrapartida, o Direito ao Esquecimento passa a ter um papel fundamental no ordenamento jurídico, e sua aplicabilidade visa garantir o esquecimento em diversas situações que conflitam com direitos fundamentais de um indivíduo.

Dessa forma o Direito ao Esquecimento acaba por gerar um conflito entre a liberdade de informação e o direito à privacidade.

Assim, diante desse contexto, ante a fragilidade que passa a recobrir tanto os Direitos Fundamentais quanto aqueles ditos como Direitos de Personalidade no novo modelo global, surge a necessidade de afirmar mecanismos de proteção desses direitos frente ao fácil acesso de informações de cunho pessoal na rede.

Para tanto, se faz necessário compreender que o Direito ao Esquecimento é fundamental para que a sociedade consiga oferecer uma nova oportunidade aos indivíduos que transgridem as leis, visto que o oposto a este cenário pode fomentar ainda mais a possibilidade de novos delitos. Mas para que isso ocorra, é necessário que os meios de comunicação passem a ter limites para tratar sobre fatos passados ligados a assuntos particulares dos indivíduos, ou seja, no caso concreto deve preponderar o postulado da dignidade da pessoa humana em detrimento do direito à informação.

1.    DIREITO AO ESQUECIMENTO

Hoje em pleno século XXI, a sociedade da era da inteligência virtual, migrou as relações sociais para o mundo virtual, sendo a sociedade robotizada e alimentada vinte quatro horas por dia, por informações.

Essa nova contemporização da mídia, ao alcance de todos, traz o passado cada vez mais para o presente e, nessa realidade, eles se conectam a todo instante. Relacionado a este fato, surgiu, também, o desejo de apagar algo ou alguma lembrança e, com isso, o direito de esquecer ou ser esquecido.  

Sendo assim, SANTOS, apud Chassot e Figueiredo conceituam Direito do Esquecimento como aquele que emana da solicitação do indivíduo em deixar de ser lembrado por um ato do passado, o qual faça renascer desprazeres não necessários ou que não detenham comum interesse social. (SANTOS, p.26, 2019)[3].

Já para ASPIS o Direito ao Esquecimento nada mais é que o direito de não ser lembrado por algum acontecimento do passado, ainda que este tenha acontecido[4]. Assim, o indivíduo não poderá ser exposto a fatos pretéritos que possam causar danos e prejuízos à sua imagem, fazendo com que as divulgações destes fatos não se perpetuem.

Dessa forma, pode-se compreender Direito ao Esquecimento como o fato de uma pessoa não permitir que um acontecimento, ainda que verídico, que ocorreu em determinado momento da sua vida, continue sendo exposto e que seja permitido acesso por parte do público a essa informação, de maneira a sentir-se invadido em sua privacidade.

A Constituição Federal prevê em seu Art. 5º, X que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. BRASIL, p.28, 2023[5].

O Direito ao Esquecimento precisou ser positivado já que com a era digital se tornou muito difícil sustentar esta ideia, visto que as notícias são em tempo real e geram conteúdo para um enredo de telenovela, de forma a se desenvolverem diversos conflitos entre a liberdade de expressão e o direito a manter intacta a intimidade.

Entretanto, é necessário respaldar que o Direito ao Esquecimento se refere ao princípio da personalidade da pessoa que se liga ao direito à privacidade e à intimidade com o objetivo de reter a divulgação de informações que acontecem na vida pretérita do agente, surgindo dessa forma um conflito entre a liberdade de informação e o direito à privacidade, de maneira que se requer uma equivalência para que não se configure a uma censura prévia.

Sendo que nesta seara a Carta Magna garante o direito de informação, tendo que a liberdade de informar a sociedade é de caráter público, privilegiando o interesse coletivo e abrangendo parte das informações individuais. Direito esse de cunho fundamental, amparado pela Lei de acesso a informações (LAI) – 12527/2011 e pela Lei Geral de Proteção a Dados Pessoais – 13709/2018 que primam pela proteção dos direitos fundamentais da liberdade e da privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade natural.

Dessa forma, qualquer indivíduo tem liberdade de expressão para falar sobre qualquer contexto, entretanto, é importante avaliar quais são os reflexos dessa liberdade e como estas podem se apresentar difíceis para um indivíduo, sobretudo, que busca ressocialização. Neste sentido, cabe destacar que antes de qualquer contexto, é importante que as informações apresentadas precisam ter credibilidade.

É importante entender que além do contexto de que as informações precisem ser verídicas, estas também precisam deixar de ser enaltecidas, a partir do momento em que as pessoas precisam continuar suas vidas sem necessariamente serem constantemente lembradas por um delito que cometeram.    

 

2.    REFLEXOS DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO

A liberdade de expressão é exaltada pela Constituição da República em seu Art. 5º, IV CF/88 que enaltece que é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato e inciso IX que traz que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação independentemente de censura ou licença[6]. BRASIL, p.28, 2023.

Assim compreende-se que o caráter formador de opinião da mídia, destaca-se o seu papel relevante na construção social do crime. Sendo que o público tende a se valer das informações pela mídia transmitidas para construir uma imagem da criminalidade, para modelar suas atitudes e opiniões com base na percepção dessa imagem, de maneira a formularem julgamentos. Entretanto, cabe ressaltar, que ao se utilizarem de uma linguagem espetaculosa para influenciar a opinião pública, contribuem para que os agentes sejam lembrados a qualquer tempo pelo fato que praticaram e o impedem de construírem sua ressocialização.

Assim, com o intento de seduzir o público, a mídia acaba prejulgando as pessoas que são noticiadas.

Dessa forma se faz necessário sustentar que o direito à liberdade de expressão não é absoluto sendo necessário avaliar cada narrativa, em seu conteúdo concreto, afim de identificar até que ponto a mídia, pode apresentar informações de casos que se apresentam junto a sociedade, visto que algumas situações precisam se manter em sigilo para que as pessoas envolvidas consigam conduzir suas vidas dentro da sociedade.

Nesse sentido, o Pacto Internacional da Corte de Direitos Humanos aborda que o Tribunal reiterou que a liberdade de expressão não é um direito absoluto.

 

O Art. 13.2, alínea a, da Convenção, proíbe a censura prévia, também prevê a possibilidade de exigir responsabilidades pelo exercício abusivo deste direito, inclusive para “assegurar o respeito aos direitos e a reputação das demais pessoas. Essas restrições são de natureza excepcional e não devem limitar, para além do estritamente necessário, o pleno exercício da liberdade de expressão e tornar-se um mecanismo direto ou indireto da censura prévia. A este respeito, o Tribunal estabeleceu que se pode impor tais responsabilidades posteriores, na medida em que for afetado o direito à honra e à reputação. [7]

Assim, o desejo é de garantir a reputação das pessoas envolvidas independentemente da situação com as quais estas estiveram envolvidas com relação a conflitos junto à sociedade. Este cenário se torna ainda mais complexo quando o indivíduo que é atacado não cometeu nenhum delito, sendo acusado injustamente, como ocorre em casos denominados de Fake News. Neste sentido, percebe-se que a liberdade de expressão precisa ter limites ao narrar fatos mesmo quando as narrativas são verdadeiras.

3.    CASO DOCA STREET

O mais antigo caso conhecido envolvendo o direito ao esquecimento no Brasil, envolve o assassinato da socialite Ângela Diniz, por seu companheiro Raul Fernando do Amaral Street, mais conhecido como Doca Street, em 1976. Ângela, também conhecida como Pantera Mineira, foi morta com tiros na cabeça no dia 30 de dezembro de 1976, após uma discussão com Doca.

No primeiro julgamento, ocorrido em 1979, Doca Street foi condenado a dois anos de prisão, cumprindo pena em liberdade. A defesa alegou legítima defesa da honra para justificar o motivo do assassinato: Ângela estaria traindo Doca. Retratado com caráter passional, o crime repercutiu bastante na mídia, gerando também um grande debate social.

Em 1981 ele foi submetido a novo julgamento e condenado a 15 anos de prisão em regime fechado, porém obteve a condicional em 1987. Em 2003, 27 anos após o crime, o programa Linha Direta, da Rede Globo, exibiu uma reportagem sobre o caso.

A partir de tal apontamento, é notório se afirmar que com o desenvolvimento das tecnologias e a inserção de informações pessoais em redes sociais, por exemplo, existe uma facilidade muito grande em encontrar dados sobre aqueles que cometem delitos, entretanto, é importante que o poder judiciário se cerque da possibilidade de minimizar impactos que este cenário social vem permitindo.

É fato que a mídia não apenas desenvolve seu papel, entretanto, a mídia e o direito vivem uma relação complexa e controversa, sobretudo, quando aborda casos que precisam ser mantidos em esquecimento, a fim de que aqueles que cometeram os delitos tenham a possibilidade de alcançar uma ressocialização eficaz, com o intuito de ganhar audiência e visibilidade. Neste sentido, BOTTINI (2023) aponta que todos os dias julgados, decisões, sentenças ou manifestações judiciais são escrutinadas pelos jornais, revistas e televisão, sob as mais diversas perspectivas.[8]

BOTTINI (2023) enfatiza ainda que se de um lado, tal interesse fortalece a transparência do Judiciário e o aproxima da população, por outro dá ensejo a possíveis distorções, derivadas de uma análise superficial.[9]

Dessa forma, pode-se enfatizar que em determinados casos, principalmente os de repercussão nacional, os problemas discutidos se tornam complexos, na medida em que mídia tende a influenciar o direito penal em suas decisões e no trato com os envolvidos. Quanto mais a mídia fomenta informações sobre os casos, estes ganham mais repercussão, minimizando as chances de anonimato e a posterior ressocialização do condenado.

Assim em 2005, a Justiça do Rio de Janeiro condenou a TV Globo, produtora do programa Linha Direta, a indenizar em R$ 250 mil Doca Street. O juiz entendeu que houve abuso na produção e divulgação do programa, já que Doca já havia cumprido pena e havia sido reintegrado à sociedade. Em contrapartida a TV Globo alegou que o programa exibia fatos públicos e históricos. Estabelece-se então o conflito entre o Direito à privacidade e o Direito à Informação.

Em 2003 o juiz concedeu liminar para impedir a exibição do programa. A emissora interpôs um agravo de instrumento e a veiculação foi autorizada. É clara a dificuldade da Justiça em avaliar o assunto, já que à princípio a exibição havia sido proibida, porém o julgamento em segunda instância favoreceu a Liberdade de Expressão da emissora.

Cabe salientar que a possibilidade de citar e acompanhar casos de grande repercussão atrelam-se a capacidade de liberdade de expressão, entretanto, é importante entender que impacta na vida do outro de forma plural, visto que aquele que comete delito tem o direito de refazer sua vida, sobretudo, junto à sociedade. Assim, vale a discussão de que de certa maneira a liberdade de expressão é inviável quando não permite que o outro se reconstrua por meio da ressocialização.

 

4.    CHACINA DA CANDELÁRIA

Ocorrida em 1993, a Chacina da Candelária se tornou uma tragédia de repercussão nacional após crianças e adolescentes em situação de rua, que costumavam se abrigar na frente da Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro, foram assassinadas por policiais militares. Os sobreviventes alegaram que ação teria sido uma retaliação por algumas crianças terem quebrado o vidro de uma viatura. Foram sete mortes no total.

Em 2006 o Programa Linha Direta trouxe o caso à tona novamente, citando o nome de Jurandir Gomes de França, que foi apontado como coautor da chacina e ficou preso durante três anos, sendo absolvido depois. Apesar de o Linha Direta ter mostrado que Jurandir havia sido preso injustamente, ele recorreu à Justiça do Rio de Janeiro alegando que a matéria teria reacendido na comunidade onde residia a imagem de chacinador e o ódio social. Em primeira instância o pedido foi indeferido, porém ele apelou e a Justiça então condenou a Rede Globo a pagar uma indenização de R$50 mil. A emissora ainda tentou entrar com um Recurso Especial, mas o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que era possível fazer um resgate histórico sem identificar Jurandir. Esse é um importante marco do reconhecimento do Direito ao Esquecimento no Brasil.

Dessa forma pode compreender-se o Direito ao Esquecimento como um elemento que parte do princípio da personalidade ligado ao direito à privacidade e à intimidade com o objetivo de reter a divulgação de informações que aconteceram no passado, de forma a evitar novas retalhações, e impedir o direito de ressocialização do agente que já pagou sua pena. 

 

5.     CASO XUXA MENEGHEL

A apresentadora Maria da Graça Meneghel, mais conhecida como Xuxa Meneghel, já se envolveu em diversas polêmicas durante sua vida, sendo uma delas sua participação em um filme erótico quando tinha aproximadamente 19 anos de idade. Em Amor Estranho Amor, Xuxa interpretou uma garota de programa que inicia sexualmente um garoto de 12 anos de idade. As controvérsias sobre a filmagem foram tantas, que em 2010 ela moveu uma ação contra o Google para que a empresa removesse das buscas resultados que associassem seu nome à pedofilia e outras práticas criminosas, como “Xuxa pedófila”.

Em decisão de primeiro grau, a Justiça favoreceu a apresentadora, fazendo com que o Google omitisse quaisquer resultados de pesquisa pelos termos “Xuxa pedófila”. Porém, no julgamento de recurso especial, a segunda instância suspendeu a decisão que havia sido tomada à princípio, alegando que “os provedores de pesquisa não podem ser obrigados a eliminar do seu sistema os resultados derivados da busca de determinado termo ou expressão, tampouco os resultados que apontem para uma foto ou texto específico”. (STJ, REsp. Nº 1.316.921 – RJ, 2012, p. 1)[10]

De acordo com LIMA, 2013 p. 5, a 3ª turma do STJ, em 26/06/2012, decidiu que o Google era apenas um facilitador de informação e, portanto, a ação deveria ser movida contra quem veiculou os dados[11]. Xuxa ainda entrou com uma apelação, que teve sua decisão em 02 de maio de 2017. A relatora Valéria Dacheux entendeu que os provedores de pesquisa virtual não podem ser obrigados a eliminar do seu sistema os resultados derivados da busca de determinado termo ou expressão, tampouco os resultados que apontem para uma foto ou texto específico, independentemente da indicação do URL da página onde este estiver inserido. BRASIL (2017)[12].

Assim, é necessário ressaltar que o conflito entre a liberdade de expressão, direito a informação e o direito à privacidade requerem um equilíbrio, de forma que não se configure censura ou violação da privacidade.

Pessoas famosas são constantemente expostas à vexames anteriores ao seu auge e estrelismo, numa tentativa de serem derrubadas do pódio, a mídia faz um verdadeiro reality show de situações antigas, de um passado remoto.

 

6.    CASO DANIELA PEREZ

Passados mais de 30 anos do brutal assassinato de Daniela Perez, seus algozes Guilherme de Pádua e Paula Thomaz ainda são lembrados pela mídia, em verdadeiros roteiros de telenovelas.

A atriz Daniella Perez foi morta em 28 de dezembro de 1992, ao final de um dia de gravação da novela de Corpo e Alma. Seu corpo foi encontrado em um matagal com golpes de tesoura. A investigação concluiu que o crime foi cometido por Guilherme de Pádua e pela sua esposa na época, Paula Thomaz. Guilherme contracenava como par romântico de Daniella na novela, escrita pela mãe da atriz, Glória Perez. No papel de “Bira”, ele interpretava o namorado ciumento de Yasmin (personagem de Daniella). A novela foi exibida pela Rede Globo entre 3 de agosto de 1992 e 5 de março de 1993.

Em 1997, Guilherme foi sentenciado a 19 anos de prisão. Sua condenação foi enquadrada no Artigo 121 § 2º, incisos I e IV do Código Penal, que na época não era considerado hediondo. No entanto, saiu da prisão após cumprir menos de sete anos. Ao completar um terço da pena, o condenado pode requerer a progressão de regime, ou seja, trocar a prisão por um regime mais brando, como o aberto ou semiaberto. Foi o que aconteceu. Como ele já ele já estava preso há quatro anos, quando saiu a sentença, Guilherme pode deixar a prisão em 1999 e passar para o regime aberto. No mesmo ano, Paula Thomaz também conseguiu a liberdade condicional. Em 2001, Guilherme de Pádua recebeu um indulto que diminuiu sua pena em 25%, antecipando o fim da sua condenação para 2007. No entanto, em 2002 ele recebeu outra atenuação de pena que resultou na extinção do seu débito perante a sociedade, de acordo com a Justiça. Ou seja, se a pena original fosse cumprida em sua totalidade, Guilherme só quitaria seu débito em 2012, no entanto a extinção de sua pena aconteceu 10 anos antes do que estava previsto, o que gerou na população a sensação de impunidade.

Em 2002 uma decisão judicial tomada pela Justiça do Rio de Janeiro (7ª Câmara Cível do TJ/RJ) obrigou Guilherme de Pádua e Paula Thomaz a pagarem uma indenização a Glória Perez, mãe de Daniella, e ao marido da atriz, o ator Raul Gazola. Mas segundo o site Ego, o advogado que representava a família da vítima a época dos fatos, salienta que a indenização de 500 salários mínimos vigentes na época do ocorrido nunca fora pago.

Compreende-se a relevância que esse crime teve perante a sociedade brasileira por envolver pessoas públicas que estavam em destaque, já que a novela De Corpo e Alma se passava às 21h, horário de maior audiência da emissora até os dias atuais. Além disso, o caso teve ampla cobertura midiática, o que pode ser explicado por sete dos fatores de noticiabilidade dos elencados, o crime hediondo, a notoriedade da vítima, a proximidade entre vítima e autor, relevância da vítima e sua família, o crime inesperado e o escândalo.

O crime provocou uma indignação generalizada justamente pela motivação torpe, que mobilizou o país de modo que foi capaz de alterar a legislação. Glória Perez, numa época em que a internet era desconhecida pela maior parte da população, conseguiu 1 300 000 assinaturas para incluir o homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos, através de um projeto de iniciativa popular.

Essa atitude de Glória contribuiu para que a lei 8072/90 fosse alterada em setembro de 1994. Mesmo que a vitória tenha sido conquistada com a colocação do homicídio qualificado no rol dos crimes hediondos, a lei não alcançaria Guilherme de Pádua e Paula Thomaz pelo princípio da irretroatividade da lei penal, ou seja, uma lei que não pode ser aplicada a situações anteriores a sua edição com o intuito de prejudicar o réu.

Em 2010, 18 anos após o crime, Glória Perez criou o blog Daniella Perez, com arquivos do processo, com o objetivo de manter a memória da sua filha viva. O blog teve sua última postagem feita em 2012. Além de lembranças da trajetória de Daniella, o blog também aborda os julgamentos dos réus, a sentença de Guilherme de Pádua e a emenda popular que tornou homicídio qualificado um crime hediondo. Em uma das abas do site, o comportamento de Guilherme de Pádua é comparado ao de um psicopata.

Já em 2014, 22 anos após o crime, portais noticiaram que Guilherme de Pádua tinha intenção de mover um processo na Justiça para que o Google “apague tudo o que prejudique sua reputação”.

Em dezembro de 2017, Guilherme de Pádua volta a ser destaque na mídia, após ter se ordenado pastor na Igreja Batista da Lagoinha, em Belo Horizonte. Ele se converteu à religião enquanto ainda estava preso no Rio de Janeiro. Se formou em teologia e assim adquiriu a nova patente. A notícia se espalhou após Juliana Lacerda, então sua esposa, fazer uma postagem em suas redes sociais celebrando a conquista. Dois dias depois, portais publicaram a notícia de que o cantor Naldo, após agredir a esposa, fez retiro espiritual na igreja em que Guilherme de Pádua se ordenou.

Dessa forma, compreende-se que a globalização alterou a lógica do tempo e inverteu a rotina jornalística. A popularidade de um jornal é medida em cliques, em views. E as matérias que atraem esses cliques não são as de interesse público, mas sim, as de interesse do público. Esse tipo de conteúdo, vem com a tentativa de agradar ao público e consequentemente adquirir altos índices de visibilidade e audiência, pois possuem forte apelo sensacionalista e pode até mesmo chegar a ferir o Direito à Privacidade dos indivíduos.

Seja em perfis de Redes Sociais ou em portais noticiosos, milhares de dados, incluindo textos, fotos e vídeos, são disponibilizados continuamente, ao alcance de todos. A longo prazo isso pode se tornar prejudicial, uma vez que, apesar de as matérias jornalísticas estarem inseridas em um contexto específico, a vida das pessoas não para no tempo.

Diante dos assuntos abordados, é fato que a liberdade de imprensa entra em conflito com o direito à privacidade. No caso Guilherme de Pádua, a cobertura da imprensa foi ampla nos anos que se seguiram ao crime, no entanto uma vez que décadas se passaram e ele já quitou sua dívida com a Justiça, também tem o direito de se reinserir na sociedade, assim como os Nardonni e o goleiro Bruno.

É possível se perceber que as notícias informativas dos primeiros anos, referentes a processos judiciais e similares, do caso Daniela Perez, são substituídas por matérias de conteúdo superficial. Além disso, Pádua é citado em diversas matérias que não dizem respeito a ele diretamente, sempre associado com o crime cometido. Também há abusos cometidos em relação a sua imagem, que foi utilizada com intuito de espetacularização.

Para SILVA (2018, p. 63)[13] apud CRUZ e SANTANA quando se trata de crimes, os veículos de comunicação têm o importante papel de não reforçar uma visão do indivíduo que o reduza à infração cometida. O Direito ao Esquecimento é uma importante ferramenta em casos como o de Guilherme de Pádua e tantos outros, pois garante a ressocialização e o direito à privacidade. Dessa forma para a autora o sigilo de informações sobre infrações deve ser resguardado para que o egresso penitenciário possua o direito à dignidade “visto que enquanto durarem as críticas, devido às informações sobre sua condenação, este elemento não terá as mínimas chances de voltar ao convívio social normal”

Assim deve-se compreender que o Direito ao Esquecimento deve ser uma ferramenta que auxilie a liberdade de imprensa e não sirva como uma forma de censura. Para ponderar se uma matéria fere os direitos de personalidade pode ser feita uma avaliação dos seus critérios de noticiabilidade e do propósito que ela tem, se há informação útil ou apenas um interesse em atrair cliques e visualizações, numa perspectiva meramente sensacionalista.

Evidentemente, Pádua teve um grau de exposição midiática muito maior que a maioria das pessoas que cometem atos ilícitos, o que implica também maiores possibilidades de ter sua privacidade violada e uma maior dificuldade em obter o esquecimento. Em situações como esta, Direito ao Esquecimento não significa um impeditivo que se trate sobre o ex-condenado na mídia ou que se deva fingir que o crime jamais aconteceu, mas ponderar em que contexto essa matéria está inserida.

 

7.    CASO RICHTHOFEN

Suzane Von Richthofen, filha do casal Marísia e Manfred von Richthofen arquitetou a morte de seus pais junto a seu namorado e cunhado, de forma brutal, o que ocasionou em uma grande repercussão midiática. O fato ocorreu em 31 de outubro de 2002, mas até os dias atuais gera bastante repercussão, inclusive com o nome de Suzane na mídia constantemente.

A paulista, condenada a 39 anos e 6 meses de reclusão em regime fechado pelo assassinato brutal de seus pais em 2002. Após cumprir 20 anos de sua pena, obteve a progressão de regime fechado para semiaberto e em 2023, obtendo ainda mais uma progressão posterior, dessa vez do semiaberto para o aberto, decisão proferida pela 2ª Vara de Execuções Criminais de Taubaté (SP), já que havia cumprido os requisitos objetivo e subjetivo para a progressão de regime, cumprindo mais 1/6 da pena e graças ao bom comportamento. Desde então, Suzane vem enfrentando desafios relacionados à reintegração à sociedade e à preservação de sua privacidade.  

A mídia vem transformando Suzane em figura pública, sua vida é transmitida como se fosse uma novela que a sociedade acompanha diariamente, isso tudo sem o consentimento da própria interessada.

Para SOUZA SILVA e Da MATA (2023) apud GOMES (2015) sensacionalismo é uma denominação atribuída ao estilo jornalístico que adota uma abordagem parcial na apresentação de eventos e fatos, com o objetivo de provocar reações intensas nos destinatários da mensagem. Esse tipo de jornalismo busca, principalmente, ampliar a audiência de seus veículos, sejam impressos ou televisivos, podendo se manifestar de várias maneiras em uma matéria, seja por meio do título ou chamada, na linguagem empregada pelo repórter, na formatação tipográfica, em imagens ou ilustrações, ou até na seleção de aspectos específicos do acontecimento. [14]

Para os autores ainda as notícias sensacionalistas publicadas e divulgadas exercem poder sobre a opinião pública, de maneira influente e manipuladora, instigando o clamor público, em que prevalece o desejo pela vingança e não pela justiça, de forma a pressionarem muitas vezes os autores do processo, induzindo-os, a cometer injustiças.

É a partir dessa visão de combate aos inimigos criados pela própria mídia que surge a necessidade de se rever as posições e interpretações colocadas pela mídia investigativa, sensacionalista, sendo que o direito à liberdade de expressão não pode se sobrepor ao direito de personalidade.

A afronta à dignidade humana não pode ser aceita sob o pretexto de que, caso seja proibido veicular esse tipo de reportagem assediadora, se estará cerceando a liberdade de imprensa e isso será uma censura. Quando dois direitos entram em rota de colisão, um dos dois deve ceder, então, deve-se analisar a pertinência da matéria que a emissora quer publicar, o que, no caso de condenados, não existe.

É crucial estabelecer critérios rigorosos para divulgar apenas informações pertinentes e relacionadas ao processo, evitando, desse modo, julgamentos morais por parte da sociedade.

Para ROCHA, p.40. 2003 o poder da imprensa é arbitrário e seus danos irreparáveis. O desmentido nunca tem a força. Na Justiça, há um código para dizer o que é crime; na imprensa não há norma para estabelecer o que é notícia, quanto mais ética. No julgamento da imprensa as pessoas são culpadas até a prova em contrário.

É fato que o jornalismo pode ser um agente de mudanças dentro da sociedade, estando ele a favor do cidadão. No entanto, é importante frisar que deixar de veicular uma reportagem de um agente que já cumpriu sua dívida com a justiça, e esta querendo a ressocialização é de certa forma respeitar um direito do sujeito de não ser lembrado coletivamente e não ter sua dignidade maculada bem como sua vida exposta em troca de dinheiro para seus algozes, os programas de TV que o perseguem.

Diante de tais perspectivas, as notícias relacionadas a Suzane não passam de mero entretenimento para o público, criadas com o intuito de aumentar a audiência.

É interessante observar como a mídia se transformou em uma espécie de celebridade devido à sua cobertura incessante. Quando seu nome é mencionado, é quase impossível que alguém não tenha pelo menos alguma noção de sua história.

Suzane ao ter sua vida relatada por Ulisses Campbell, desde o momento do crime até sua prisão, pediu ao judiciário que a publicação fosse impedida de ser lançada.

O pedido foi inicialmente negado em primeira instância pela juíza Larissa Gaspar Tunala, que fundamentou sua decisão com base no direito à liberdade de expressão, citando outros casos de biografias publicadas sem autorização do protagonista. Suzane recorreu, e o pedido também foi negado em segunda instância pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que determina a argumentação do julgamento inicial adequado. O autor do livro afirmou em entrevista ao G1 que o dano irreparável era o crime que ela cometeu, não o livro que retratou o incidente, e que o relato foi uma consequência de suas ações.

Entretanto, vale destacar que o caso SUZANE RICHTHOFEN não pode ser comparado a outras pessoas cujas biografias foram publicadas sem autorização, pois ela não escolheu ser uma figura pública. Portanto, cabe ressaltar que o direito ao esquecimento deve prevalecer sobre o direito à liberdade de expressão, visto que a condição de condenada não anula seus direitos à personalidade.

Dessa forma, pode-se afirmar que quando uma pessoa é condenada, ela não deixa de ter direitos, alguns de seus direitos são suspensos por um tempo proporcional ao fato cometido.

 

Para SANTOS apud CHASSOT e FIGUEIREDO pode-se considerar uma afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana, a possibilidade de reduzir a pessoa à condição de objeto apenas para satisfazer algum interesse imediato, pois não se pode expor a pessoa para a satisfação de mera curiosidade de terceiro, pois se constataria o pleno desrespeito à dignidade da pessoa humana e a não consideração do exercício legítimo da liberdade de expressão. SANTOS, 2019, pág. 43[15]

 

Devido as questões de exclusão social, econômica e cultural, é difícil para essas pessoas se reintegrarem efetivamente, mesmo depois de terem cumprido as suas penas. E a mídia pode tornar essa reintegração ainda mais inatingível ao enfatizar o crime de envolvimento em forma de roteiro novelístico, fazendo com que a pessoa que já cumpriu sua pena continue ainda sendo vista como culpada.

A mídia, muitas vezes, não apenas sensacionaliza os detalhes do crime, mas também pode negligenciar as consequências trágicas para a família das vítimas. Isso é evidente no impacto duradouro sobre o irmão de Suzane, Andreas Albert von Richthofen, cuja vida foi profundamente afetada pelas tragédias familiares.

Para ilustrar o comportamento sensacionalista da mídia desde o acontecimento, por exemplo, no site de notícias Contraponto Digital em uma matéria escrita por Luísa Eller em 2020, é possível ver a capa da revista Época noticiando o caso Suzane, de forma sensacionalista, com a manchete “Matou os pais e depois foi para o motel”, apontando uma perversidade e desvio sexual da acusada. Tal chamada contribui para a construção de narrativas distorcidas que visam desumanizar os envolvidos no caso. 

Assim, nos casos de crimes amplamente divulgados, torna-se imperativa uma análise do direito ao esquecimento não apenas após o cumprimento da pena, mas também durante o período de cumprimento da sentença e até mesmo na fase processual e inquiritorial. Isso se justifica devido à facilidade de acesso à informação na era da internet, onde uma vez que algo é publicado, é praticamente impossível removê-lo da rede. Portanto, o prazo para considerar o direito ao esquecimento deveria começar a contar a partir do momento em que o inquérito é instaurado e o posteriormente o julgamento concluído.

 

CONSIDERÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo analisar a relação entre o Direito ao Esquecimento e a Liberdade de Imprensa, principalmente no atual contexto da internet e do jornalismo em pleno século XXI.

Entende-se, pois, que na época, o assassinato de Daniella Perez foi um crime que sensibilizou a sociedade brasileira por envolver duas pessoas públicas que estavam em evidência, atuando na novela das 21h exibida pela Rede Globo, além de a vítima ser filha da autora. É inegável o interesse público que envolvia o crime quando ocorreu e seus desdobramentos nos primeiros anos. No entanto, uma vez que foi condenado e cumpriu sua pena, Guilherme de Pádua não possui mais nenhuma dívida perante a Justiça.

É notório que até os dias de hoje haja um grande sentimento de impunidade envolvendo o caso. Os indultos e reduções de pena, legais, recebidos por Guilherme de Pádua deixaram transparecer certos mecanismos do sistema penal que provocaram na população a sensação de que a Justiça não estava sendo feita como deveria. Assim, a reação espontânea dos brasileiros que acompanharam o caso é se utilizar da memória como uma espécie de correção pelo “erro” do judiciário, ou seja, uma forma de garantir que a justiça seja feita (com as próprias mãos) para que o crime não fique impune.

A luta de Glória Perez para incluir homicídio qualificado no rol de crimes hediondos foi, e ainda é, um marco memorável na história brasileira. Ainda mais numa época em que a internet não era popular e as informações circulavam de forma mais lenta. Porém é preciso ressaltar que foi de grande ajuda ela ser uma pessoa bastante conhecida e ter acesso a grandes veículos de comunicação. Com base nos critérios de noticiabilidade abordados é difícil imaginar que o crime tivesse a mesma repercussão caso acontecesse com pessoas anônimas, como muitos ocorrem e não se toma conhecimento. Guilherme de Pádua jamais conseguiu se desvencilhar desse marco.

Há um senso comum de que o brasileiro não possui memória. Parece-nos, entretanto, que a memória do brasileiro é seletiva. Esquece facilmente os abusos do passado cometidos contra o povo, os envolvidos em esquemas políticos e logo passa a acreditar novamente em novos rostos contando velhas mentiras. Porém, quando se trata de crimes e criminosos, a memória parece ser bastante ampla pois 30 anos depois ainda há iniciativas para recordar a vítima. Vale ressaltar também que em alguns casos é preciso lembrar, pois é através dessa memória que acontecimentos passados servem como base para criação de leis, como por exemplo o entendimento e a posterior criação da lei do Feminicídio e da lei Maria da Penha.

Levando-se em conta que uma das principais funções da pena é a ressocialização do indivíduo, o mesmo não poder ser duplamente penalizado pelo crime cometido, de acordo com o que prega o Código Penal. Com base nisso, é de fundamental importância que os meios de comunicação não ajam de maneira punitiva, corroborando para a eterna culpabilização do indivíduo, como pode ser observado em alguns momentos no caso de Guilherme de Pádua.

Nem sempre será possível desassociar o crime da vítima ou dos autores, o que é possível é analisar a relevância de divulgar uma informação quando já se passaram décadas do ocorrido.

Lembrar é, de fato, uma função do jornalismo. Assim como é um dever respeitar a privacidade dos indivíduos. Deve-se optar por um caminho no qual a Memória seja mantida. Afinal, é através dela que a sociedade adquire compreensão sobre o passado e pode assim planejar o futuro. Principalmente em um país como o Brasil, que ainda hoje luta para se recuperar de um passado totalitário. Mas também é preciso saber diferenciar a memória coletiva da memória individual. Grandes acontecimentos históricos não podem e nem devem ser esquecidos. No entanto, um indivíduo também não deve permanecer marcado por fatos do passado.

Deve-se sempre ter em conta os critérios de noticiabilidade e o propósito que uma matéria tem. Se há informação útil a ser divulgada, se há interesse público ou apenas um interesse em atrair visualizações. O lucro não pode interferir em uma das principais funções do jornalismo, que é servir ao interesse público. E para servir adequadamente, a matéria deve se pautar na veracidade dos fatos e em uma apuração ética. No entanto, não se deve culpar apenas os veículos pelo sensacionalismo das matérias, afinal há interesse em agradar o público para garantir o lucro e a sobrevivência das empresas. Se há grande produção de matérias com essas caraterísticas, isso pode significar que a demanda por elas ainda seja grande.

Quando uma informação se enquadrar no Direito ao Esquecimento, é papel do veículo comunicacional e do jornalista garantir este direito, respeitando assim o princípio da dignidade da pessoa humana. Na mesma medida, não se pode impor a proibição prévia de informações ou a censura, resguardando-se assim a liberdade de imprensa.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[1] DOBJENSKI, Sandra Mara – Advogada. Pesquisadora em Direito Penal e a relação com a mídia. Especialista em Direito Penal e Processo Penal (UNINTER), Especialista em Direito Penal (UNINTER), Especialista em Direito Penal e Criminologia (UNINTER).

[2] BRASIL, Tribunal de Justiça do Distrito Federal. O direito ao esquecimento e as liberdades de informação e expressão. Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/direito-constitucional/o-direito-ao-esquecimento-e-o-conflito-com-os-direitos-a-liberdade-de-informacao-e-de-expressao. 2024.  Acesso em: 04/04/2024.

[3]SANTOS, Gabriel Souza dos. A mídia e o direito ao esquecimento em crimes de grande repercussão: uma análise do caso Richthofen – Brasília. 2019. Disponível em: https://bdm.unb.br/bitstream/10483/28009/1/2019_GabrielSouzaDosSantos_tcc.pdf.

[4] ASPIS. Mauro Eduardo Vichnevetsky. Direito ao esquecimento. Migalhas. 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/333760/o-direito-ao-esquecimento. 

 

 

[5] AHMAD Nidal, QUARESMA Arnaldo, NEVES Letícia e STÜMER Mauro. Vade Mecum Penal. 12ª edição. Juspodivm. São Paulo. 2023.

[6] AHMAD Nidal, QUARESMA Arnaldo, NEVES Letícia e STÜMER Mauro. Vade Mecum Penal. 12ª edição. Juspodivm. São Paulo. 2023.

[7] BRASIL. DECRETO Nº 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso em: 25/03/2024.

[8] BOTTINI, Pierpaolo. O direito a mídia: uma relação controversa e inevitável. Consultor Jurídico. 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-mar-13/direito-defesa-midia-relacao-controversa-inevitavel/. Acesso em 02/04/2024.

[9] BOTTINI, Pierpaolo. O direito a mídia: uma relação controversa e inevitável. Consultor Jurídico. 2023. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-mar-13/direito-defesa-midia-relacao-controversa-inevitavel/. Acesso em 02/04/2024.

 

[10] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1316921/2012. 2012. Disponível em: https://www.stj.jus.br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/ATC?seq=28224920&tipo=51&nreg=20. Acesso em 15/04/2024.

[11] LIMA, Erick Noleta Kirk Palma. Direito ao esquecimento: discussão europeia e sua repercussão no Brasil. Revista Informação Legislativa. 2013. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/502929. Acesso em: 15/04/2024.

[12] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. 2017. Disponível em: https://www.omci.org.br/jurisprudencia/180/pedido-de-exclusao-generica-de-conteudos/. Acesso em: 15/04/2024.

[13] SILVA, Luana Carmo da. Formas para lembrar, caminhos para esquecer: direito ao esquecimento em tempos de internet. Universidade Federal da Bahia. Salvador. 2018. Disponível em: https://repositorio.ufba.br/bitstream/ri/26006/1/MONOGRAFIA%20-%20Formas%20para%20lembrar%2C%20caminhos%20para%20esquecer%20Direito%20ao%20esquecimento%20em%20tempos%20de%20internet.pdf. Acesso em: 24/04/24.

 

[14] Revista FT. SOUZA SILVA, Alexandre Eduardo Gomes de. Da MATA, Catrine Cadja Índio do Brasil. SUZANE VON RICHTOFFEN tem direito ao esquecimento ou merece ser condenada para sempre? Uma abordagem jurídica sobre a atuação da mídia sobre crimes de grande repercussão e o direito ao esquecimento de ex-detentos. 2023. Disponível em: https://revistaft.com.br/suzane-von-richtoffen-tem-direito-ao-esquecimento-ou-merece-ser-condenada-para-sempre-uma-abordagem-juridica-sobre-a-atuacao-da-midia-sobre-crimes-de-grande-repercussao-e-o-direito-ao-esqu/. Acesso em 26/03/2024.

[15] SANTOS, Gabriel Souza dos. A mídia e o direito ao esquecimento em crimes de grande repercussão: uma análise do caso Richthofen – Brasília. 2019. Disponível em: https://bdm.unb.br/bitstream/10483/28009/1/2019_GabrielSouzaDosSantos_tcc.pdf. Acesso em: 27/03/2024.

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