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Lei 12.403/11 - Liberdade como regra, prisão como exceção


Autoria:

Filipe Maia Broeto Nunes


Advogado Integrante da Banca do Escritório de Advocacia Valber Melo Advogados Associados. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Cuiabá. Pós-Graduando em Processo Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - FDUC/PT em parceria com o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM. Pós-Graduando em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG. Membro da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas - ABRACRIM e Membro Associado do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM.

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Resumo:

Abordar-se-ão, ainda que de forma sucinta, alguns aspectos gerais relacionados às modificações introduzidas pela Lei 12.403/11.

Texto enviado ao JurisWay em 06/05/2015.

Última edição/atualização em 14/05/2015.



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Lei 12.403/11 - Liberdade como regra, prisão como exceção

Filipe Maia Broeto Nunes

Com o advento da Lei 12.403/11 – “Lei das Prisões” –, que modificou importantes dispositivos do Código de Processo Penal, é possível perceber considerável avanço, por parte do legislador, no que concerne às prisões provisórias. Em simples palavras, é correto afirmar que houve mais avanços que retrocessos.

Apresentando uma proposta mais alinhada à Carta Magna, o legislador prestigiou em maior grau o princípio da não-culpabilidade – ou, para alguns, presunção de inocência –, excepcionando o encarceramento do acusado antes do transito em julgado da sentença penal condenatória (art. 5º, LVII, CF).

Nesse sentido, no intento de dar efetividade aos princípios basilares de um Estado Constitucional e Democrático de Direito, diz-se que, hoje, a prisão provisória deve ser tida como ultima ratio da extrema ratio. Assim, segundo assevera Guilherme de Souza Nucci, “deve-se ressaltar constituir a liberdade a regra, no Brasil; a prisão a exceção. ”[1]  Destarte, consoante o novo regramento legal, há que se seguir uma ordem lógica no que tange às prisões, dando-se preferência às cautelares diversas ao cárcere.

Se para alguns vem consagrado no Texto Maior o princípio da presunção de inocência, para outros, o que o Constituinte visou resguardar no núcleo duro intangível da Carta Política foi o princípio da não-culpabilidade. Contudo, a bem da verdade, qualquer que seja a interpretação dada a referido preceito, uma consequência em comum é possível de ser extraída: enquanto a sentença não estiver preclusa na via recursal, não há falar-se em culpado.

Em virtude das garantias processuais arduamente conquistadas é que hoje, ao menos em tese, se tem um processo criminal constitucional. Assim, no iter procedimental, somente após a colheita de provas e demais providências necessárias, prolatada uma sentença e tornada “imutável” por força da coisa julgada, seria correta a aplicação da prisão-sanção.

Nessa senda, entende-se que o processo é escalonado: primeiro, investiga-se, angariam-se provas, faz-se a instrução; e, somente depois, formada a cognição, o magistrado prolata a decisão. Segundo, esgotada a via recursal e mantida a condenação, passa-se, então, à execução da reprimenda.

Em linhas gerais, em obediência à mens legislatoris, o processo deveria seguir esse curso. Acontece, todavia, que tendo por escopo assegurar a ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou, ainda, a aplicação da lei penal, o legislador autorizou que se prendesse cautelarmente o acusado, (312, CPP).

Nesse diapasão, entende-se como possível, ainda que como medida extrema, prender-se alguém – não culpado –, quando presentes as exigências legais (312,CPP). Valendo-se, ainda, das palavras de Nucci, é possível concluir que “em caráter excepcional, buscando-se assegurar o curso do processo, sem qualquer deturpação, além de propiciar, em situações específicas, segurança à sociedade, pode-se decretar a prisão cautelar. ”[2]

 Não obstante as ponderações supracitadas, o que se pode perceber atualmente, é que quando os processos ganham contornos midiáticos, a prisão provisória perde o seu sentido de existir, deixando de ser a extrema ratio da ultima ratio. Explica-se: não raras vezes, tendo em mira a amplitude de certos casos, recorre-se à prisão de forma escusa, simbólica, visando dar à sociedade uma rápida, conquanto falsa resposta.

Diante disso é que muitas vozes fortes do mundo jurídico vêm criticando a inversão da ordem natural das coisas em processos dessa natureza – midiáticos. Ora, se o caso fica “famoso”, o julgador, pressionado pelo clamor público, sente-se intimidado, invertendo o caminhar do processo e tolhendo, por consectário, as garantias processuais constitucionais do acusado. 

Em recente entrevista, o Ministro Marco Aurélio, com a sapiência que lhe é peculiar, fez uma dura crítica à atuação do judiciário brasileiro. Segundo ele, “ao invés de apurar-se para prender, prende-se para apurar”.[3]

Entendendo-se, desta sorte, a prisão provisória como exceção e não regra, é que o legislador, quando da inovação legislativa levada a efeito por intermédio da Lei 12.403/11, pôs à disposição do juiz, no o art. 319, CPP, (nove) medidas cautelares diversas da prisão, a saber:

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

IX - monitoração eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

Nessa senda, somente haveria de se mandar o acusado ao cárcere quando não fossem cabíveis as medidas cautelares diversas da prisão, ou seja, em casos extremamente excepcionais – característica da “ultima ratio da extrema ratio”. Hoje, ressalte-se, a regra é a liberdade; a prisão, por sua vez, a exceção!

Não é outro o posicionamento dos tribunais pátrios, que, de forma acertada, visando dar efetividade à sistemática introduzida pela Lei 12.403/11, têm se mostrado favoráveis à excepcionalidade do encarceramento cautelar.

Nesse aspecto, confira-se:

Com o advento da Lei 12.403/2011, o poder judiciário passou a contar com mecanismos diversificados para a preservação da ordem pública e da efetividade de suas decisões, traduzidos no elenco de outras medidas cautelares, que podem substituir a ordem prisional, oferecendo soluções mais adequadas ao caso concreto. (HC 0044260-46.2012.8.19.0000-MG, 1ª Câm. Crim., rel. Antônio Jayme Boente, 27.08.2012).

Outrossim:

Com o advento da Lei 12.403/11, a prisão preventiva é a última cautelar a ser aplicada. Antes dela, devem ser verificadas a necessidade e a adequação das medidas cautelares alternativas à prisão preventiva. Portanto, a prisão preventiva ocupa o último patamar da cautelaridade, na perspectiva de sua excepcionalidade, cabível quando não incidirem outras medidas cautelares (art. 319, CPP). O artigo 282, § 6º é claro: a prisão preventiva será aplicada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar. Não se decreta a prisão preventiva para depois buscar alternativas. Após, verificado que não é o caso de manter o sujeito em liberdade sem nenhuma restrição (primeira opção), há que ser averiguada a adequação e necessidade das medidas cautelares alternativas ao recolhumento ao cárcere (segunda opção). Somente quando nenhuma dessas for viável ao caso concreto é que resta a possibilidade de decretação da prisão processual. (HC 70049556533-RS, 3ª. Câm. Crim., rel. Nereu José Giacomolli, 09.08.2012). (Sem grifo no original)

            Resta claro, pois, consoante a mens legislatoris referendada pelos tribunais pátrios, que somente em casos extremos é que o magistrado, verificando a real necessidade da medida, pautado nas peculiaridades do caso concreto, optará pela via da segregação provisória.

Posto, ainda que de forma sucinta, o lado prodígio da mudança, fazem-se necessários alguns breves comentários acerca dos erros praticados pelo legislador. Assim, não obstante as festejadas inovações, referida Lei pecou por trazer, no rol das hipóteses autorizativas da prisão provisória, expressões genéricas, vagas, imprecisas, indeterminadas. Não é sem razão, como se verá mais adiante, que a doutrina traça críticas contundentes a esse respeito.

Veja-se, por exemplo, o que preleciona Pacelli, em seu curso de Processo Penal:

[...] prisão preventiva para ordem pública, tema dos mais controvertidos nos tribunais e mesmo na doutrina. Por que razão a nova Lei nº 12.403/11, em pleno século XXI, resolveu insistir em manter esdrúxula expressão? [...] A expressão ordem pública, todavia, é de dificílima definição. Pode prestar-se a justificar um perigoso controle da vida social, no ponto em que se arrima na noção de ordem, e pública, sem qualquer referência ao que seja efetivamente desordem.[4]

            Como bem verificado por Pacelli, o legislador, de forma reprovável, estabeleceu uma expressão lacônica sobremaneira. Ora, partindo-se da dialeticidade da vida, só é possível saber, por exemplo, o que é quente, porque se sabe o que é frio; sabe-se que algo é feio, porquanto se conhece o belo.

Contudo, pergunta-se: como saber, com base em critérios legais, o que é a ordem, se eles não dispõem o que é desordem? Em resumo, o texto legal não se preocupou em explicar o que é ordem, para efeitos de decretação da prisão preventiva; tampouco possibilitou, ainda que a contrario sensu, um parâmetro razoável para se buscar uma interpretação adequada.

Não se pode, dessarte, relegar ao alvedrio hermenêutico do intérprete questões deste quilate – prisões –, porquanto o que está em jogo, aqui, é o status libertatis­ do acusado, até então, por força de princípios constitucionais, tido por não-culpado.

Nada obstante trazer essas graves falhas gramaticais, deve-se ressaltar, ainda, que essa atecnia legislativa causa maior prejuízo quando se trata de casos rumorosos, que, por sua natureza, são amplamente divulgados mídia. É que aqui, muitas vezes por força da opinião pública, mesmo não sendo casos de decretação de prisão processual, o magistrado, intimidado pelo clamor do povo, se vê obrigado a dar uma pseudo-resposta à sociedade.

Entrementes, deve-se ressaltar que, em matéria de prisão cautelar, o objetivo não é acalmar o afã da sociedade; não é, tampouco, servir como termômetro de eficiência do judiciário. Deve ser tal medida, como dita alhures, utilizada somente na hipótese de ineficiência das cautelares diversas da prisão, tendo-se como critérios os legais, jamais os midiáticos como infelizmente tem-se visto hodiernamente.

Repise-se, por derradeiro, que a prisão é a exceção, a liberdade é a regra! Somente se optará pelo segregamento processual quando as medidas cautelares diversas da prisão não forem o bastante às exigências do caso concreto.

 

 



[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 29.

[2] NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade. 4. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 29.

[3] http://www.conjur.com.br/2015-fev-08/agora-brasil-prende-depois-apurar-marco-aurelio. Acessado em 06/05/15, às 00h22min.

[4] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 16. ed. atual. de acordo com as leis nº 12.403, 12.432, 12.461, 12.483 e 12.529, todas de 2011, e Lei Complementar nº 140, de 8 de dezembro de 2011. São Paulo: Atlas, 2012, p. 548.

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