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Resumo:
Com a evidente discriminação e violência contra as mulheres o Estado interveio através da Lei 11.340/06 - Lei "Maria da Penha" .
Texto enviado ao JurisWay em 18/11/2013.
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LEI 11.340/06
A Lei 11.340/06, tão conhecida como a Lei Maria da Penha, ganhou este nome em homenagem à Maria da Penha Maia Fernandes, que por vinte anos lutou perante a justiça brasileira para ver seu agressor preso.
Maria da Penha é biofarmacêutica cearense, e foi casada com o professor universitário Marco Antonio Herredia Viveros. Em 1983 Maria da Penha sofreu a primeira tentativa de assassinato, quando levou um tiro nas costas enquanto dormia. Viveros foi encontrado na cozinha, gritando por socorro, alegando que tinham sido atacados por assaltantes e que o disparo foi realizado por um deles. Desta primeira tentativa, Maria da Penha saiu paraplégica.
A segunda tentativa de homicídio aconteceu meses depois, quando Viveros empurrou Maria da Penha da cadeira de rodas e como se não bastasse ainda tentou eletrocuta-la no chuveiro.
Apesar da investigação ter começado em junho do mesmo ano, a denúncia só foi apresentada pelo Ministério Público em setembro do ano seguinte e o primeiro julgamento só acorreu 8 anos após os crimes. Demonstrando a falha do nosso Judiciário, bem como a precariedade das leis de proteção à mulher.
Em 1991, os advogados de Viveros conseguiram anular o julgamento. Já em 1996, Viveros foi julgado culpado e condenado há dez anos de reclusão mas conseguiu recorrer.
Contudo, após 15 anos de luta por Maria da Penha e pressões de diversas ONGs nacionais e com o conhecimento internacional, a justiça brasileira ainda não havia dado decisão ao caso, nem qualquer justificativa para a demora. O Brasil tanto é signatário da Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial Sobre a Mulher, Pequim, 1995 como da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, Belém do Pará, (1995).
Com a ajuda de ONGs, Maria da Penha conseguiu enviar o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), que, pela primeira vez, acatou uma denúncia de violência doméstica. Foi aberto um processo para averiguação do caso especificado e Viveiro só foi preso em 2002, para cumprir apenas dois anos de prisão.
O processo da OEA também condenou o Brasil por negligência e omissão em relação à violência doméstica.
Uma das punições foi a “recomendação” para que fosse criada uma legislação adequada a esse tipo de violência.
Um conjunto de entidades então reuniram-se para definir um anteprojeto de lei definindo formas de violência doméstica e familiar contra as mulheres e estabelecendo mecanismos para prevenir e reduzir este tipo de violência, como também prestar assistência às vítimas.
Gerando, desta forma, a criação da lei 11.340/06, fazendo com que a violência contra a mulher deixe de ser tratada com um crime de menor potencial ofensivo.
A lei também acaba com as penas pagas em cestas básicas ou multas, além de englobar, além da violência física e sexual, também a violência psicológica, a violência patrimonial e o assédio moral.
De acordo com Hermann a Lei Maria da Penha firma seu objetivo em:
“Criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. “
A Lei 11.340/2006 transformou o ordenamento jurídico brasileiro no concernente à aplicação efetiva do direito da mulher, expressando o necessário respeito aos direitos humanos das mulheres.
Uma das novidades trazidas pela Lei 11.340/06 foi a inaplicabilidade da lei 9.099/95 nos casos de violência domestica contra a mulher.
Art. 41: “Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.” (grifo e sublinhado nosso)
Fato este de grande relevância que gerou o acórdão do STF, a saber:
“VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – ARTIGO 41 DA LEI Nº 11.340/06 – ALCANCE. O preceito do artigo 41 da Lei nº 11.340/06 alcança toda e qualquer prática delituosa contra a mulher, até mesmo quando consubstancia contravenção penal, como é a relativa a vias de fato. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA – ARTIGO 41 DA LEI Nº 11.340/06 – AFASTAMENTO DA LEI Nº 9.099/95 – CONSTITUCIONALIDADE. Ante a opção político-normativa prevista no artigo 98, inciso I, e a proteção versada no artigo 226, § 8º, ambos da Constituição Federal, surge harmônico com esta última o afastamento peremptório da Lei nº 9.099/95 – mediante o artigo 41 da Lei nº 11.340/06 – no processo-crime a revelar violência contra a mulher.Decisão:O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, indeferiu a ordem de habeas corpus. Votou o Presidente, Ministro Cezar Peluso. Ausente, neste julgamento, o Senhor Ministro Celso de Mello. Falaram, pelo paciente, o Dr. João Alberto Simões Pires Franco, Defensor Público Federal e, pelo Minstério Público Federal, a Vice-Procuradora-Geral da República, Dra. Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira. Plenário, 24.03.2011. HC 106212 STF Relator: Ministro Marco Aurélio.”
Segundo o ministro Marco Aurélio, a constitucionalidade do artigo 41 dá concretude, entre outros, ao artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, que dispõe que “O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.
Entretanto, segundo ele, é preciso que haja ações afirmativas para que a lei formal se transforme em lei material. Por isso, ele defendeu a inserção diária, nos meios de comunicação, de mensagens afirmativas contra a violência da mulher e de fortalecimento da família.[1]
O ministro Ricardo Lewandowski disse que o legislador, ao votar o artigo 41 da Lei Maria da Penha, disse claramente que o crime de violência doméstica contra a mulher é de maior poder ofensivo.
Por seu turno, o ministro Joaquim Barbosa concordou com o argumento de que a Lei Maria da Penha buscou proteger e fomentar o desenvolvimento do núcleo familiar sem violência, sem submissão da mulher, contribuindo para restituir sua liberdade, assim acabando com o poder patriarcal do homem em casa.
O ministro Ayres Britto definiu como “constitucionalismo fraterno” a filosofia de remoção de preconceitos contida na Constituição Federal de 1988, citando os artigos 3º e 5º da CF.
E o ministro Gilmar Mendes, ao também votar com o relator, considerou “legítimo este experimento institucional”, representado pela Lei Maria da Penha. Segundo ele, a violência doméstica contra a mulher “decorre de deplorável situação de domínio”, provocada, geralmente, pela dependência econômica da mulher.
Vale ressaltar, como reforço desta argumentação, que o anteprojeto da Lei 11.340/06 previa, no texto original a aplicação da Lei 9.099/95, com a vigência de alguns artigos, de maneira mais gravosa, proibindo, entre outras benefícios, a prestação pecuniária e “doação de cesta básica”. [2]
O texto final que vigora na Lei 11.340/06 afastou, por completo a aplicação da Lei 9.099/95. Assim, por absoluta lógica de interpretação, temos que a vontade do legislador foi bastante clara no sentido de afastar totalmente a Lei 9.099/95, por ter se manifestado totalmente ineficaz no combate à violência doméstica.
MEDIDAS PROTETIVAS
Dentro das medidas protetivas de urgência elencadas no artigo 23 da Lei 11.340/06, o juiz encaminha a ofendida e seus dependentes a programas de proteção ou de atendimento para a recuperação da ofendida e de seus dependentes; após o transtorno causado pelo agressor, determina o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens e a guarda dos filhos e alimentos e determina a separação de corpos, afim de proteger o bem e a dignidade da pessoa humana da mulher .
Para a concessão da medida protetiva, enquanto medida cautelar, são imprescindíveis a existência do fumus boni iuris - ter o direito do que se está pedindo e do periculum in mora - risco da demora na concessão da medida.
Para garantir a execução das medidas protetivas de urgência, tem-se como hipótese, a prisão, o juiz deve fundamentar essa medida cautelar pessoal, sendo indispensável a satisfação dos requisitos tais como prova do crime e indícios suficientes de autoria, descrito no artigo 312 do CPP.
A prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória é sempre uma medida cautelar, sendo necessário que não se perca de vista os resultados finais do processo, que em último caso, é a sua definição de ser.
Diante de tal fato o artigo 45 determina que o magistrado permita tratamento ao agressor com comparecimento a programas de recuperação e reeducação, não deixando de inserir a regra do artigo 152, parágrafo único, da Lei de Execução Penal:
Art. 152: “Nos casos de violência doméstica conta a mulher, o juiz poderá determina o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação”.
Sabe-se, no entanto, que tal medida não é adotada em sua totalidade em nosso ordenamento como deveria ser.
O juiz poderá determinar as seguintes medidas protetivas para a vítima.
Art.23: “I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;IV - determinar a separação de corpos.”
As medidas protetivas tem como foco proteger e diminuir os efeitos causados pela violência sofrida.
CONCLUSÃO
A violência domestica atinge um elevado número de vítimas e vem crescendo a cada dia, mas o fator mais assustador dos dados apresentados foi que apenas 1/3 das vítimas se manifestam a denunciar seus agressores. Gerando, contudo, um número muito maior do que os divulgados.
Um aspecto importante que foi abordado, é que a violência de gênero, por ocorrer em regra dentro do ambiente doméstico e familiar, é o primeiro tipo de violência que o ser humano tem contado de maneira direta, situação que, certamente, influenciará nas formas de condutas externas de seus agentes, seja agressor ou vítima.
A intervenção do Estado nas relações domésticas e familiares de violência é essencial, inclusive para a superação de boa parte das ocorrências exteriores no ambiente familiar e doméstico.
A violência doméstica é a origem da violência que assusta a todos. Quem convive com a violência, muitas vezes, até mesmo antes de nascer e durante a infância, acha tudo muito natural, o uso da força física, visto que para essa pessoa a violência é normal.
Com a evidente discriminação e violência contra as mulheres o Estado interveio através da Lei 11.340/06 – Lei “Maria da Penha” para coibir os diversos tipos de violência, fazendo então, com que as mulheres se sentissem mais seguras, resgatando a cidadania e a dignidade que na maioria das vezes, sofrem caladas.
O juiz do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, tem, à sua disposição, instrumentos processuais suficientes para proporcionar integral proteção às vítimas dessa violência.
Era imprescindível a implementação de medidas com o fim de resgatar, em essência, a cidadania e a dignidade da mulher!
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