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ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO


Autoria:

Mario Jorge Rocha De Souza


FORMAÇÃO PROFISSIONAL CURSO SUPERIOR - DIREITO: Universidade Castelo Branco (UCB) Período: 2002 a 2006 ATUALIZAÇÃO PROFISSIONAL PÓS-GRADUAÇÃO / ESPECIALIZAÇÃO LATO SENSU EM GESTÃO E ANÁLISE DE NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS CBEPJUR/CÂNDIDO MENDES

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Resumo:

No presente, se apresentam questões relevantes envolvendo o Assédio Moral na relação de emprego, entre particulares, excluindo-se os entes da Administração Pública. Para isso, foram realizados levantamentos bibliográficos acerca do tema.

Texto enviado ao JurisWay em 27/03/2013.

Última edição/atualização em 04/04/2013.



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INTRODUÇÃO

 

O Direito passa por modificações constantemente, praticamente todos os ramos procuram estabelecer uma perspectiva em conformidade com os direitos humanos, com o Estado Democrático e com a proteção contra todo e qualquer tipo de tirania. Conseqüentemente, na seara do Direito do Trabalho, surgiram novos direitos para os trabalhadores, ocasionando um aumento da competitividade por um melhor relacionamento no mundo laboral.

Essa competitividade contribui enormemente para a prática do Assédio Moral, pois traz consigo opiniões que divergem umas das outras, causando ofensas, humilhações, entre outros atos que caracterizam o Assédio.

O tema Assédio Moral na relação de emprego despertou interesse após leitura de algumas literaturas no campo do Direito do Trabalho. Dentre essas literaturas, destaca-se a pesquisa realizada por Margarida Barreto, publicada no site: www.assediomoral.org.

O Assédio moral na relação de emprego é um tema de grande relevância jurídica, pois significa agressão moral ou psicológica no ambiente de trabalho, sendo concretizado através de condutas antiéticas utilizando escritos, gestos, palavras e atitudes que expõem o empregado a situações vexatórias, humilhantes e constrangedoras, de maneira prolongada, com fim de discriminar e/ou excluir a vítima (empregado) da organização e ambiente do trabalho.

Na visão jurídica, não se têm dúvidas que tal tema importa violação dos deveres contratuais, violando os princípios da boa-fé, respeito, não-discriminação, entre outros. Essa violação gera grandes problemas para o empregado, visto que fere a personalidade e dignidade, gerando problemas de saúde (psicofísicos), desemprego e até suicídio nos casos mais extremos.

Demonstraremos que o Assédio moral pode ser praticado pelo empregador ou chefe, diretor, encarregado (Assédio vertical descendente), por um colega de serviço (Assédio horizontal), ou, ainda, por empregados em relação aos superiores hierárquicos (Assédio vertical ascendente).

O Assédio moral diferentemente do Assédio sexual, previsto no Art. 216-A do Código Penal, não está previsto no ordenamento jurídico brasileiro, fato que não ocorre em outros países que o assunto está difundido e inserido no ordenamento jurídico.

Como o assunto é relativamente novo, há poucos doutrinadores, mas existem profissionais das mais diversas áreas entre elas, por exemplo, médicos do trabalho, juristas, psicólogos, dentre outras; que estão se mobilizando não só com intuito de ajudar as vítimas, mas também mostrar aos empresários como a prática do Assédio traz prejuízos financeiros à própria empresa, em função do afastamento temporário ou definitivo do empregado.

Nessa visão, o Assédio implica grave violação do dever contratual e de outras hipóteses legais previstas no art. 483 da CLT; portanto, o empregado, vítima do Assédio Moral, pode lançar mão da rescisão indireta, além de invocar a estabilidade no emprego no caso de demissão arbitrária, uma vez manifestando problemas de saúde como seqüelas do Assédio.

Outra conseqüência na relação de emprego é no que tange ao dano pessoal que o Assédio Moral gera na pessoa do empregado, posto que viola seus direitos de personalidade, sendo certo que a CF/88 protege a dignidade da pessoa humana e garante a tutela jurídica contra o dano moral, sem prejuízo do dano patrimonial, implicando a responsabilidade do empregador por violação contratual e abuso de poder, bem como a responsabilidade própria ou solidária do empregador (responsabilidade objetiva) por culpa de terceiro ou preposto.

A proposta desse trabalho de conclusão de curso é demonstrar que se houver previsão legal a prática do Assédio será, certamente, coibida. Logo, o trabalhador terá proteção do bem maior, que é a vida, vivida com dignidade.

Espera-se que o referido estudo possa contribuir para que o Assédio Moral seja identificado na relação de emprego e, mais, que suas vítimas denunciem a agressão. Conscientizando os agressores que precisam mudar de conduta, uma vez que todos são seres humanos devendo ser tratados com dignidade.

  

1. ASPECTOS FUNDAMENTAIS DO TRABALHO HUMANO

  

Embora a questão central seja Assédio Moral na relação de emprego e suas implicações, convém tecer algumas considerações a respeito das garantias fundamentais do trabalhador na relação de emprego, ou seja, sua dignidade humana e, conseqüentemente, seus direitos de personalidade e a garantia a um meio ambiente do trabalho sadio.

  

1.1. O TRABALHO E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA DO TRABALHADOR

  

É de conhecimento geral que o trabalho[1] engrandece e dignifica o homem, que dele tira meios materiais e produz bens econômicos indispensáveis à sua subsistência, representando uma necessidade vital e um bem indispensável para a realização pessoal e valorização no seio da família e da sociedade.[2]

O trabalho humano produtivo é essencial para o desenvolvimento econômico, político e social de um País, pois somente através do cumprimento das fases de produção, distribuição e circulação de bens e serviços é que se atinge o progresso e as exigências do mundo globalizado.

A dignidade do trabalhador está direcionada para o trabalho livre e consciente como bem revela sua história e evolução, cuja liberdade de trabalho somente foi conquistada após o surgimento da servidão seguida do corporativismo medieval, culminado com a Revolução Industrial no final do século XVIII e início do século XIX, que deu origem à produção industrial e organização do trabalho voltada para a máquina e especialização do trabalho humano, objetivando a produtividade e lucratividade.[3]

No período da escravidão, o escravo não era reconhecido como pessoa humana, tão menos tinha vontade própria, ou seja, era tratado como reles. Sua força de trabalho era explorada como alvo de lucro, sua relação com seu “senhor” era uma autêntica relação real de domínio, sendo a escravidão considerada uma situação natural de sujeição por toda vida e de transmissão aos descendentes.

O trabalho humano livre e digno é inerente à pessoa humana, constitui princípio universal previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada em 10 de dezembro de 1938, dispondo em seu art. 23º.1.: “Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições eqüitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego”.

Pode-se afirmar que a dignidade humana compreende a liberdade, a igualdade e a fraternidade[4], que são objetivos da Declaração dos Direitos Humanos e princípios basilares que devem dar direção às relações na sociedade. A dignidade humana é considerada ponto central dos direitos fundamentais do cidadão e, segundo Bobbio[5], integra, tal como a vida, o direito natural, não podendo haver qualquer tipo de intervenção, salvo quando visar a garantia e proteção pelo Estado.

A dignidade do trabalhador, como atributo natural e individual, não é quantificável ou substituível, pois a dignidade não tem preço; seu valor é íntimo, absoluto, não se justificando ver o trabalho como meio para satisfação dos interesses capitalistas, considerando o trabalhador como mercadoria descartável do processo produtivo.[6]

A Carta Magna de 1988 deu à dignidade humana a categoria de princípio fundamental, instituindo os chamados direitos e garantias fundamentais que resguardam a dignidade humana, protegendo os atributos inerentes à pessoa humana, tais como a vida, liberdade, igualdade, intimidade, privacidade, trabalho, saúde, educação, propriedade, meio ambiente protegido etc.; não ficando dúvida de que o trabalho é um direito fundamental do trabalhador, bem como a defesa dos direitos de personalidade do empregado; além de pertencer à categoria dos direitos sociais (CF, art. 6º).

Sendo o trabalho fonte de dignidade e promoção social, certamente o desemprego constitui uma agressão à dignidade da pessoa humana, atinge a personalidade, no que diz respeito à sua auto-estima, causando males físicos e psíquicos; enfim, é capaz de colocar em descrédito a gama de direitos sociais conquistados às custas de lutas históricas dos trabalhadores.

Sem dúvida, sendo uma realidade a flexibilização das relações trabalhistas, com total autonomia das partes contratantes no estabelecimento de condições de trabalho, claramente prevalecerá a desigualdade histórica entre o capital, representado pelo empregador, e a força de trabalho, representada pelo empregado, sendo imprescindível a intervenção do Estado-legislador para proteger os direitos fundamentais e mínimos do trabalhador, visando proteger a personalidade e preservação da dignidade da pessoa humana, cuja proteção não se confunde com “superproteção”; logo, em obediência à autonomia privada e coletiva das partes, estariam afastados dessa proteção os direitos contratuais individuais e os direitos coletivos negociáveis.[7]

  

1.2. OS DIREITOS DE PERSONALIDADE

 

1.2.1. Considerações Gerais

 

Os direitos de personalidade[8] dizem respeito aos atributos que definem e individualizam a pessoa, protegendo-a “em seus mais íntimos valores e em suas projeções na sociedade”[9], cujos direitos de personalidade, embora não possuam valor econômico, têm para seu titular valor absoluto e inato, portanto têm como característica a irrenunciabilidade, intransmissibilidade[10] e imprescritibilidade.

Todas as legislações consagram proteção especial aos direitos de personalidade entre os quais podemos compreender: o direito à vida, à integridade física e moral, à liberdade e à vida privada; e que visam preservar e resguardar a dignidade humana de pessoa, tanto que o nosso direito positivo reprime e prevê modos de reação a qualquer conduta que viole os direitos de personalidade, impondo sanção ao transgressor na esfera cível, sem embargo das sanções penais, prevendo a Constituição o direito à indenização por dano moral e/ou material (CF,art. 5º, inc.X).[11]

Nesse sentido dispõe o nosso Código Civil, in verbis:

Art.12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Trata-se de norma perfeitamente aplicável na relação de emprego, tendo em vista o princípio da subsidiariedade (CLT, art. 8º, par. único) e a inexistência de norma específica na legislação consolidada que tutele especificamente os direitos de personalidade do empregado.

Amauri Mascaro Nascimento torna claro que a CLT trata indiretamente da defesa dos direitos de personalidade quando autoriza no art. 483 da CLT o empregado a considerar indiretamente rescindido o contrato de trabalho no caso de ofensa à sua honra ou de sua família, ou, ainda, quando for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo[12].

 

 1.2.2. Respeito aos direitos de personalidade na relação de trabalho

 

 Embora a relação de emprego não deixe de possuir um certo conteúdo patrimonial diante do dever do empregador de pagar salários, tem como elemento primordial a natureza da pessoalidade, ante a prestação pessoal dos serviços e de forma subordinada, sujeitando a pessoa do empregado ao poder de mando do empregador; é razão suficiente para a tutela dos direitos de personalidade do empregado, pois, como pessoa, possui todos atributos da personalidade, que devem ser salvaguardados diante do poder de direção do empregador.[13]

A relação de emprego corresponde a uma relação jurídica contratual, através da qual os signatários, ou seja, empregado e empregador, acordam a prestação de serviços de forma pessoal, não eventual, mediante pagamento de salário e sujeição ao poder de direção do empregador, também denominado dependência ou subordinação.

Trata-se de uma relação contratual de trabalho subordinado, de natureza privada, e, mesmo que o Estado estabeleça normas imperativas que visem tutelar o trabalhador hipossuficiente, não retira a natureza contratual e privada da relação, que está firmado no princípio civilista da autonomia da vontade, que encontra limites nas normas sobre condições mínimas de trabalho digno, face à superioridade econômica do empregador, também denominado dirigismo contratual[14].

A relação pessoal implica a obrigação de prestação de serviços intuitu personae; daí poder afirmar que se trata de obrigação personalíssima e intransmissível, levando a outro elemento característico da relação de emprego, que é a relação de dependência ou subordinação do empregado.[15]

A subordinação se pode dizer é a característica mais marcante da relação de emprego, pois as conceituações de seus sujeitos se referem direta e indiretamente a ela, dispondo que ao empregador cabe o poder de direção, através do qual dirige, controla e fiscaliza a prestação pessoal do trabalho, cabendo ao empregado cumprir as ordens impostas através desse poder.[16]

 

 A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) conceitua empregador e empregado em seus arts. 2º e 3º respectivamente. Ilustrado na colação a seguir:

Art. 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços.

Art. 3º. Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Na doutrina existe conflito quanto ao critério para identificar o tipo de dependência do empregado em relação ao empregador, sendo propostos os critérios da subordinação jurídica, econômica, técnica, social. A doutrina majoritária considera o critério mais aceito o da subordinação jurídica ou da dependência hierárquica, que significa a aceitação passiva e submissão do empregado ao poder de comando e direção do empregador, transferindo ao mesmo sua força de trabalho e poder de direção sobre suas atividades laborais, em troca de salários.[17]

Diante da natureza contratual bilateral e da subordinação jurídica entre empregado e empregador, da qual nasce direitos e obrigações para as partes, constitui obrigação primordial do empregado à prestação de serviço com diligência, boa-fé, sempre respeitando a estrutura organizacional do empregador, sendo que a este incumbe a obrigação de fornecer trabalho e instrumento, pagar salários e demais obrigações acessórias ou complementares, isto é, respeito à dignidade e direitos de personalidade do empregado.[18]

Para o empregador, o respeito à dignidade e aos direitos de personalidade do empregado deve ser considerado como um suporte para a relação obrigacional no contrato de trabalho, e, muito embora a obrigação de pagamento de salário sem atraso seja considerada uma obrigação original do empregador, não menos primordial é a obrigação de preservar, garantir e tutelar os direitos de personalidade do empregado, que constituem extensão dos direitos fundamentais do cidadão.[19]

Logo, o reconhecimento dos direitos de personalidade na relação de trabalho tem como resultado a limitação ao exercício do poder de mando do empregador e a limitação do princípio da autonomia da vontade, devendo organizar o trabalho e destinar ordens de serviço que atendem à devida consideração à dignidade do trabalhador, e, conseqüentemente aos seus direitos de personalidade.[20]

Nesse objetivo, segundo Maria Aparecida, a jurisprudência espanhola tem dado grande relevância ao reconhecimento dos direitos de personalidade nas relações de trabalho, tendo por tese que a celebração do contrato de trabalho não significa perda ou privação dos direitos de personalidade, cuja condição de trabalhador significa o reconhecimento do status de cidadão dentro e fora da empresa, e que o trabalhador, além dos direitos previstos na legislação trabalhista e daqueles oriundos da negociação coletiva, tem os direitos de personalidade como direitos básicos, reconhecidos como direitos fundamentais na Constituição.

Incumbe ao empregador destinar ao empregado tratamento digno, respeitando sua liberdade de trabalho e de pensamento, sua intimidade e vida privada, sua honra e boa fama, praticar a igualdade e não-discriminação, impondo nosso ordenamento jurídico ao empregador a abstenção de práticas que conduzam a ofensas verbais ou físicas, de natureza sexual ou não, bem como a humilhação violadoras dos direitos de personalidade, sob pena de reparar os danos e prejuízos causados.

 

1.3. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO SADIO E QUALIDADE DE VIDA NO EMPREGO

 

 O meio ambiente sadio e equilibrado é primário para garantir a dignidade da pessoa e o desenvolvimento de seus atributos pessoais, intelectuais e morais, constituindo sua preservação e proteção meios para se atingir o objetivo que é a proteção à vida e saúde do trabalhador, referindo-se esta ao aspecto da integridade física e psíquica, e, conseqüentemente, garantir a qualidade de vida de todo cidadão.

A Constituição Federal de 1988 estabelece no art. 225:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

O meio ambiente do trabalho integra o meio ambiente global, sendo certo que a Constituição Federal de 1988, através do art. 225 dispõe sobre o meio ambiente como um todo ao passo que o legislador constituinte, atento à saúde e a qualidade de vida do trabalhador, dispôs que ao Sistema Único de Saúde (SUS), além de outras atribuições, compete “colaborar com a proteção do meio ambiente, nele compreendido a trabalho”[21].

Sem embargo da proteção constitucional ao meio ambiente do trabalho, a CLT também pensa no ambiente do trabalho, do art.155 ao art. 199, prevendo sobre segurança e medicina do trabalho, além de estabelecer disciplina legal protetora através das Normas Regulamentares (Portaria n. 3.214/78), que têm natureza de conteúdo imperativo mínimo e são tuteladas mediante fiscalização do Ministério Público do Trabalho e Emprego, através das Delegacias Regionais do Trabalho, Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), além de outros órgãos que visem a preservação e melhoria do ambiente de trabalho, tais como: Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT), Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO).[22]

O Ministério Público do Trabalho tem legitimidade para intentar Ação Civil Pública para proteger o meio ambiente do trabalho, ante a inobservância dos preceitos voltados para a questão de saúde e segurança do trabalho, até porque se trata de interesse coletivo.

O meio ambiente do trabalho é o local onde o trabalhador passa a maior parte da sua vida, e onde desenvolve seus atributos pessoais e profissionais, contribuindo com a produção, distribuição e circulação de renda, podendo ser conceituado como sendo o conjunto de bens materiais pertencentes à atividade empreendedora, de fim lucrativo ou não, abrangendo a organização da produção e do trabalho como um todo.

Considerando que o meio ambiente do trabalho abrange o trabalho humano, ele deve ser sadio e equilibrado, a fim de defender a vida e saúde do trabalhador.

Nesse sentido, deve o empregador fornecer um ambiente de trabalho sadio, sendo que “a primeira condição que o empregador está obrigado a cumprir é assegurar aos trabalhadores o desenvolvimento das suas atividades em ambiente moral e rodeado de segurança e higiene”[23], devendo cumprir as normas sobre medicina e segurança do trabalho; independentemente, deve estabelecer normas internas e condições de trabalho que assegurem a saúde e integridade física e mental dos trabalhadores, promovendo meios para prevenir qualquer tipo de agressão contra a saúde do trabalhador, além de criar meios para garantir a qualidade de vida do trabalhador.

Quanto à natureza jurídica do meio ambiente do trabalho trata-se de uma garantia fundamental de interesse coletivo, já que consta expressamente no art. 225 da CF que o meio ambiente equilibrado é uma garantia de todos, devendo o Poder Público e a coletividade preservá-lo, sendo dever de cada empregado, do empregador e do próprio Poder Público, a preservação do meio ambiente do trabalho para a sadia qualidade de vida.[24]

Na verdade, pode-se afirmar que o meio ambiente do trabalho ultrapassa o interesse coletivo, para atingir até mesmo o interesse público, pois diz respeito ao bem comum.

Com a transformação do processo de industrialização, surgido com a Revolução Industrial, os movimentos humanistas e a própria intervenção estatal buscaram o reconhecimento e tutela do trabalho como valor humano, tendo como resultado a criação de normas versando sobre condições de trabalho, bem como normas destinadas à saúde e segurança no meio ambiente do trabalho, a fim de atender às exigências da qualidade de vida no trabalho.

Na organização do trabalho voltada para a globalização da produção e força de trabalho, a maior preocupação está na saúde não apenas física, mas especialmente na saúde mental do trabalhador.

Todavia, a saúde mental do trabalhador e a conseqüente qualidade de vida no trabalho ficaram comprometidas com a nova organização de trabalho que, embora de certa forma tenha gerado o benefício da diminuição da força física e conseqüente fadiga física pela repetição e monotonia, passou a utilizar e exigir maior esforço mental, pois o trabalhador tem que se adaptar e ajustar-se à racionalização do trabalho voltada para a tecnologia de ponta.

Na organização atual do trabalho, busca-se a colocação no mercado globalizado, através da competitividade, melhores e grandes resultados com baixo custo, isso tudo às custas da flexibilização, terceirização, novas formas de contratação para quebrar o requisito da continuidade da prestação dos serviços, planos de demissão voluntária; enfim, essa política neoliberal passou a exigir do empregado uma grande carga de tensão no ambiente de trabalho, fruto da precariedade nas condições de trabalho, e pior, das incertezas salariais e insegurança quanto à manutenção do empregado.

Esses fatores e influências afetam negativamente o ambiente de trabalho, influenciando o bem-estar e satisfação do trabalhador, e, claramente afetando sua qualidade de vida no trabalho, ao passo que afeta a saúde mental através do surgimento do stress, ansiedade, depressão, culminando com a degradação e hostilização do ambiente de trabalho, desemprego, enfermidade mental e até mesmo, em casos extremos, o suicídio do trabalhador nos casos mais extremos.

Nesse diapasão, o stress profissional passou a ser considerado um grande vilão para a saúde do trabalhador e para o mundo do trabalho, sendo até mesmo conhecido como mal do século XX, resultado da moderna organização do trabalho com constantes transformações na estrutura e organização do trabalho, pois implica por parte do trabalhador grande esforço de adaptação e ajustamento, devendo revelar-se produtivo, polivalente e adaptável às mudanças organizativas, resultando desgaste emocional, fadiga e stress.

Esse contexto favoreceu o surgimento do Assédio Moral, conhecido também como agressão ou violência moral e silenciosa no ambiente de trabalho, muito embora ainda não tenha previsão específica em nosso ordenamento jurídico, tem grande relevância jurídica ante seu efeito maléfico no ambiente de trabalho, prejudicando a saúde e qualidade de vida do trabalhador, bem como afetando a produtividade e lucratividade da organização empresarial.

 

 

2. ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO

 

 Pode-se afirmar que o Assédio moral nas relações de trabalho é um dos problemas mais sérios enfrentados pela sociedade. Ele é fruto de um conjunto de fatores, tais como a globalização econômica predatória, vislumbradora somente da produção e do lucro, e a atual organização de trabalho, marcada pela competição agressiva e pela opressão dos trabalhadores através do medo e da ameaça. Esse constante clima de terror psicológico gera no empregado assediado moralmente, um sofrimento capaz de atingir diretamente sua saúde física e psicológica, criando uma predisposição ao desenvolvimento de doenças crônicas, cujos resultados o acompanharão por toda a vida.

A atuação do Estado-legislador em regular tais situações é imperativa. E isso se dá através de uma atividade legislativa que preveja medidas protetivas, defendendo os trabalhadores dos malefícios gerados pelo Assédio Moral, garantindo que o exercício de seu trabalho seja devidamente valorizado e sua dignidade, respeitada.

Diante disso, pode-se afirmar que a relevância jurídica do Assédio Moral é cristalina, pois essa prática contamina o ambiente de trabalho, violando a garantia constitucional de um meio ambiente do trabalho sadio e equilibrado, além de violar a dignidade da pessoa humana do empregado, atingindo seus atributos pessoais, ingressando na seara do dano moral; enfim concluí-se que o Assédio Moral viola direitos e garantias fundamentais, tutelados pelo ordenamento jurídico constitucional (CF/88, art. 5º, inciso X).

 

 2.1. Contexto Histórico

  

Pode-se dizer que o Assédio Moral é tão antigo quanto o próprio trabalho. Entretanto, só ganhou relevância nas últimas décadas com a divulgação de pesquisas realizadas na área da Psicologia, desenvolvidas na Europa.

As pesquisas envolvendo a figura do Assédio Moral, antes de serem desenvolvidas na esfera das relações humanas, iniciaram-se, na verdade, no ramo da Biologia, com os estudos do etologista[25] Konrad Lorenz[26].

Na década de 60, uma pesquisa realizada pelo médico sueco Peter-Paul Heinemann[27] analisava o comportamento de crianças reunidas em grupo, dentro do ambiente escolar. Os resultados de tal pesquisa foram muito parecidos com os encontrados por Lorenz, sendo reconhecida a mesma tendência dos animais nas crianças, as crianças demonstraram hostilidade a outra criança nova no espaço. A partir da pesquisa de Heinemann, pioneira em detectar a existência do Assédio Moral nas relações humanas, muitas outras vieram, e trabalhos começaram a ser publicados.

O psicólogo alemão Heinz Leymann analisando o ambiente de trabalho, na década de 80, verificou o mesmo comportamento das pesquisas anteriores.[28] Verificando, assim como nas escolas, que também existia certo nível de violência nas relações de trabalho, sendo rara a violência física.

Após as pesquisas no ramo da Psicologia, o Assédio Moral começou a ganhar atenção de estudiosos de outros ramos da Ciência, dentre eles os doutrinadores do Direito.

No final da década de 90, a psicanalista e vitimóloga francesa Marie-France Hirigoyen lançou um livro que reanimou a discussão acerca do Assédio moral na esfera jurídica. Por conta de esta discussão ter alcançado uma boa amplitude, mais tarde, a autora francesa lançou outra obra chamando a atenção da necessidade de intervenção estatal.[29]

No Brasil pouco se fala, existe uma discussão tímida. As legislações, municipais e estaduais, editadas até hoje, que tratam especificamente do Assédio Moral, têm como alvo a proteção do setor público somente. O que existe são projetos de lei para o tema, mas nada, ainda, significativo na área trabalhista.

  

2.2. CONCEITO

  

No Brasil, em virtude da carência de material jurídico-científico publicado sobre o Assédio Moral, faz-se necessário ter como ponto de orientação às pesquisas desenvolvidas no campo da Psicologia e da Sociologia. É através de pesquisas realizadas, nestes ramos, que se tomam emprestados os elementos caracterizadores do assédio moral, podendo a partir dessa base ousar a construir um conceito jurídico.

Para Heinz Leymann o Assédio moral consiste em um psicoterror[30]. Ocorrendo, este, no ambiente de trabalho por uma comunicação agressiva e não ética direcionada a um indivíduo ou mais. O psicólogo afirma que a continuidade e a longa duração das condutas agressivas acabam resultando em considerável sofrimento mental, psicossomático e social as vítimas do Assédio Moral.[31]

Utilizando-se, do mesmo raciocínio, Marie-France Hirigoyen traça o seguinte conceito para Assédio Moral:

Por assédio moral em um local de trabalho temos que entender toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degredar o ambiente de trabalho.[32]

Sendo estes conceitos da Psicologia, pode-se pegar emprestado alguns elementos necessários para a construção de um conceito jurídico, o qual deve conter o mínimo de subjetividade possível, o que é difícil.

É importante salientar, que para a identificação precisa do Assédio Moral nas relações de emprego é necessária a violação à dignidade do empregado por condutas abusivas desenvolvidas dentro do contexto profissional. O sociólogo italiano Domenico de Masi fornece uma definição própria para a expressão contexto profissional:

Por contexto profissional entendo a atmosfera complexa, o clima psicológico determinado pelo que acontece à nossa volta enquanto trabalhamos, pelo que fazem todos os que nos cercam enquanto desempenhamos os nossos deveres profissionais.[33]

Logo, o Assédio Moral não se limita ao ambiente físico do trabalho. Envolve todo o clima psicológico que possa surgir em razão dessa atividade do trabalhador. Entretanto, é imprescindível que o processo assediador seja praticado durante o exercício do trabalho, não se confundindo com questões pessoais.

Há em todas as pesquisas realizadas a idéia comum de que o Assédio Moral é um fenômeno possuidor de um risco invisível, mas com conseqüências concretas. Sendo o Assédio Moral uma espécie do gênero sofrimento do trabalho, fenômeno bem mais abrangente com origem na organização de trabalho atual.

  

O sofrimento no trabalho possui muitas espécies, sendo a mais interessante a descrita por Christophe Dejours:

Imposição de horário, de ritmo, de formação, de informação, de aprendizagem, de nível de instrução e diploma, de experiência, de rapidez de aquisição de conhecimentos teóricos e práticos e de adaptação à cultura ou à ideologia da empresa, às exigências do mercado, às relações com os clientes, os particulares ou públicos etc.[34]

Além do fator externo, depara-se com um ato perverso que produz, como resultado, um sofrimento no trabalho inevitável. A psicóloga francesa Hirigoyen enumera outro elemento necessário à caracterização do Assédio Moral é a intencionalidade do ato, elemento resultante dessa perversidade, sendo verificado justamente pela repetição e duração no tempo das condutas abusivas. Explica, ainda, a autora o que vêm a ser a perversidade:

A perversidade não provém de uma perturbação psiquiátrica e sim de uma fria racionalidade, combinada a uma incapacidade de considerar os outros como seres humanos. (...) Na empresa, é do encontro do desejo de poder com a perversidade que nascem a violência e a perseguição.[35]

A psicóloga francesa enfatiza como elemento inerente à perversidade a incapacidade do agente assediador em considerar os outros trabalhadores como seres humanos. Essa comprovação induz ao pensamento de que quando uma pessoa não é tratada como ser humano restam apenas duas possibilidades: é tratada como coisa, propriedade de alguém, ou como animal. Sendo, assim, o assediador viola o terceiro princípio fundamental da República Federativa do Brasil elencado no art. 1º da Constituição Federal de 1988, ou seja, a dignidade da pessoa humana.

 

  

A autora Hirigoyen, como citado por Hádassa[36] em sua obra, conta que existem dois fenômenos que ajudam a identificação do desenvolvimento do Assédio Moral no local de trabalho. Sendo o primeiro o abuso de poder, o qual é direto e mais difícil de ser aceito pelos empregados pela forma que se desenvolve, segundo expõe a vitimologa em sua obra:

A agressão, no caso, é clara: é um superior hierárquico que esmaga seus subordinados com seu poder. A pretexto de manter o bom andamento da empresa, tudo se justifica: horários prolongados, que não se podem sequer negociar, sobrecarga de trabalho dito urgente, exigências descabidas.[37]

O segundo fenômeno consiste na manipulação perversa. Que se mostra ser uma maneira insidiosa de assediar um trabalhador. Utilizando-se de meios nem sempre percebidos, como a comunicação hostil, o isolamento, e demais formas, o empregado, vítima, é anestesiado, suportando tudo silenciosamente ou toma por si só medidas para acabar com a situação humilhante. Sendo a vítima responsabilizada pelo agressor por quaisquer conseqüências que possam ocorrer com tal situação. Hirigoyen define manipulação perversa, a saber:

O Assédio nasce como algo inofensivo e propaga-se insidiosamente. Em um primeiro momento, as pessoas envolvidas não querem mostrar-se ofendidas e levam na brincadeira desavenças e maus-tratos. Em seguida, esses ataques vão se multiplicando e a vítima é seguidamente acuada, posta em situação de inferioridade, submetida a manobras hostis e degradantes durante um período maior.[38]

Por esta definição conclui-se que o Assédio Moral desenvolvido sob a forma de manipulação perversa, manifesta-se inicialmente como situações “inofensivas” evoluindo para agressão real. Merecendo maior atenção jurídica essa forma de desenvolvimento do Assédio Moral, até porque o abuso de poder pode ser enquadrado em uma das hipóteses descritas no art. 483 da CLT, que trata da rescisão indireta do contrato de trabalho pelo empregado.

 

Margarida Barreto, primeira a pesquisar o Assédio Moral no Brasil, conceitua Assédio Moral da seguinte forma:

É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e

aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego.[39]

Do conceito acima são retirados outros dois elementos do Assédio Moral, sendo eles a repetição da conduta assediadora e o prolongamento no tempo. Cumpre salientar que é necessária a presença dos elementos supracitados, uma vez que, o Assédio Moral não se confunde com uma agressão isolada.

Juridicamente, cumpre enfatizar que o Assédio Moral viola a dignidade da pessoa humana do trabalhador, fazendo-se necessário sua coibição. Podendo ser conceituado o Assédio moral como sendo um processo composto por agressões repetitivas que se prolongam no tempo, permeado por artifícios psicológicos que atingem a dignidade do empregado, consistindo em humilhações verbais, psicológicas, públicas, tais como isolamento, a não-comunicação ou a comunicação hostil, o que resulta sofrimento ao trabalhador, ocasionando na perda de sua saúde física e psicológica.

  

2.3. DISTINÇÕES E EQUIPARAÇÃO ENTRE ASSÉDIO MORAL E ASSÉDIO SEXUAL

  

É comum existir confusão entra os conceitos de Assédio Moral e Assédio Sexual. Porque ambos os fenômenos apresentam semelhanças consideráveis, a começar pela própria denominação “assédio”.

Pode-se resumir o Assédio Sexual como sendo a situação pela qual a vítima é submetida contra a sua vontade a uma chantagem sexual, sob pena de ser severamente prejudicada em seu ambiente de trabalho, caso não ceda aos caprichos do assediador.

Michal Rubenstein[40] definiu três instrumentos de viabilização do Assédio Sexual:

Conduta física: é a mais ostensiva e ousada, podendo se manifestar através de várias ações, que variam desde o ataque direto à vítima a sutis contatos físicos.

Conduta Verbal: é a mais comum no assédio sexual. Através dela o assediador expressa suas propostas sexuais diretamente ou por intermédio de insinuações veladas, acrescentando, também, as ameaças caso a proposta seja recusada.

Conduta não Verbal: é a menos intuitiva, pois o assediador utiliza-se de ardis e subterfúgios para passar sua mensagem sexual à vítima, tais como: exibição de fotos pornográficas, prática de gestos obscenos, desenho ou imagens de cunho sexual, bilhetes, ou qualquer outra forma que consiga incomodar a vítima em razão da conotação sexual, que possa significar uma proposta libidinosa.

Quando pensamos em Assédio Sexual, a tendência é sempre vislumbrarmos a mulher como vítima e o homem como assediador. Contudo, a questão do Assédio Sexual nas relações de trabalho funciona como uma “via de mão dupla”, tanto o homem quanto a mulher figuram como agentes ativos na agressão. Podendo, ainda, ser caracterizado o Assédio sexual por pessoas do mesmo sexo, envolvendo desejos homossexuais.

  

O Assédio Sexual é previsto no Código Penal Brasileiro, introduzido pela lei nº 10.224 de 15 de maio de 2001, com a seguinte redação:

Art. 216 – A. Constranger, alguém com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.

Pena – detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos.

O legislador restringiu o Assédio Sexual aos envolvidos que possuam entre si uma relação hierárquica que envolva submissão no contexto laboral, uma vez que delimitou o sujeito ativo do delito com as características de ser superior hierárquico ou possuir ascendência profissional.

Com o estudo do Assédio Sexual, podem ser vistos alguns pontos de convergência com o Assédio Moral, são os seguintes:

1.      Relação de superioridade hierárquica entre agressor e vítima;

2.       Constrangimento exercido sobre a vítima: ambos os Assédios caracterizam-se pelo mal-estar causado à vítima, que se sente coagida e temerosa de ser prejudicada profissionalmente.

Em contra partida, o Assédio Moral possui pontos que o separam do Assédio Sexual, a saber:

1.       Para a existência do Assédio Moral é essencial que a conduta ofensiva seja reiterada e habitual, prolongando-se no tempo, constituindo-se em um autêntico processo de agressões. Para que haja o Assédio Sexual somente é necessária a prática de uma conduta expressando os desejos do ofensor e a ameaça à vítima.

2.       O constrangimento vivido pela vítima do Assédio Moral consiste em aos poucos ir depreciando seu íntimo e desajustar sua personalidade, até conduzi-la a um total desequilíbrio. Já o vivido pela vítima do Assédio Sexual consiste em impor propostas sexuais não desejadas, acabando por atingir o íntimo da vítima em razão do temor em ser prejudicada profissionalmente.

3.       No Assédio Moral as condutas são bem presas e interligadas, exercendo um fator de agregação que irá resultar no desequilíbrio final da vítima. Essas condutas são delimitadas pela sutiliza, passando isoladamente quase que despercebidas pelos que estão no mesmo ambiente da vítima. No Assédio Sexual, geralmente, as condutas são mais atiradas e incisivas, sendo facilmente percebidas pelas pessoas que convivem no mesmo ambiente da vítima.

4.       O objetivo final do Assédio Moral é eliminar a vítima do local de trabalho, quer seja através da demissão, quer seja por intermédio de longos períodos de licença médica. Autores defendem que o objetivo seria o do assediador manter a vítima sob o seu controle, satisfazendo, assim, seu espírito sádico, não havendo interesse no afastamento do assediado. No Assédio Sexual o objetivo final é fazer com que o assediado ceda aos desejos sexuais do ofensor, através do temor da vítima de ser prejudicada profissionalmente.

Portanto Assédio Moral e Assédio Sexual são fenômenos bem diferenciados, impulsionadores diferentes e objetivos próprios. Para determinar a responsabilização pelo Assédio moral é importante não confundi-lo com o Assédio Sexual, pois este possui efeitos mais brandos que o psicoterror laboral.

É importante salientar que o Assédio Sexual frustrado é um dos caminhos que levam ao Assédio Moral. Assim, a vítima rejeita energicamente o Assédio Sexual e passa a sofrer como alvo de perseguições contínuas e prolongadas, agora já com o objetivo de levá-la ao desequilíbrio e prejudicá-la profissionalmente, perpetuando-se uma vingança do outrora assediador sexual mal-sucedido.[41] 

 

3. ESPÉCIES DE ASSÉDIO MORAL 

 

O Assédio Moral pode ser classificado em: vertical descendente (superior hierárquico para com seus subordinados); horizontal simples ou coletivo (um ou mais trabalhadores para com um colega de serviço); vertical ascendente (um ou mais assalariados para com um superior hierárquico).

  

3.1. Assédio Moral vertical descendente

  

Esse tipo de assédio Moral é praticado pelo empregador, bem como por qualquer outro superior hierárquico (diretor, gerente, assessor, chefe, supervisor etc.) que possua poder de direção.

O Assédio Moral praticado por superior hierárquico, em regra, tem por objetivo eliminar do ambiente de trabalho o empregado que represente uma ameaça ao superior, no que tange ao seu cargo ou desempenho, também ao empregado que não se adapta, por qualquer fator, à organização produtiva, ou que esteja doente ou debilitado.

Contudo, nem sempre o empregador manifesta o intuito perverso para excluir o empregado do ambiente de trabalho, pois, por insegurança ou até mesmo por ingerência ou desqualificação, os superiores não se valem de boa comunicação e gerência das atividades produtivas, e, objetivando a produtividade para almejar o reconhecimento e manutenção na posição de poder, acabam praticando maus-tratos e humilhações contra os empregados, desestabilizando o ambiente de trabalho, além de representarem um risco para a atividade econômica, uma vez que um dos efeitos do Assédio é a queda da produtividade ou grande empenho do trabalhador que acaba ocasionando o adoecimento e conseqüente afastamento do mesmo.

Objetivando a produtividade, competitividade e satisfação no trabalho os superiores devem estabelecer uma relação simétrica entre custo/beneficio, para que o empregado possa desenvolver sua criatividade e produtividade, pois o empregado, além do nível salarial, objetiva respeito, tratamento digno e a justiça; na falta o ambiente de trabalho se torna impregnado de insatisfação, falta de estimulo e stress profissional.

O Assédio Moral praticado pelo empregador ou superior hierárquico implica em descumprimento do Contrato de Trabalho e total desrespeito à dignidade da pessoa do trabalhador. Logo, tanto o empregador como o superior hierárquico devem se abster dessa prática.

Tendo o empregado como proteção jurídica a rescisão indireta do Contrato de Trabalho, podendo invocar todas as alíneas do art. 483 da CLT, dependendo das formas de Assédio Moral empregadas pelo assediante.

  

3.2. ASSÉDIO MORAL HORIZONTAL

  

Trata-se de Assédio Moral praticado por colega de trabalho; consiste em brincadeiras maldosas, gracejos, piadas, grosserias, gestos obscenos, menosprezos, isolamento etc., podendo resultar dos seguintes fatores: - conflitos interpessoais que provocam dificuldades de convivência por algum motivo pessoal; - competitividade/rivalidade para alcançar destaque, manter-se no cargo ou disputar cargo, ou para obter promoção.

Em relação à competitividade entre empregados, pode ocorrer que o empregador, na intenção de estimular a produtividade, consciente ou inconscientemente, acabe por estimular a competitividade perversa entre colegas de trabalho, ocasionando, por parte dos competidores práticas individuais, que interferem na organização do trabalho, prejudicando o bom relacionamento e coleguismo que devem existir entre os trabalhadores, cooperadores do sistema produtivo.

Inegavelmente o Assédio Moral praticado nessas condições agride os direitos de personalidade e dignidade do empregado assediado, tirando da empresa o espaço de sociabilidade, afeto, solidariedade e companheirismo.

O assediador, como autor material do Assédio, afeta a honra e dignidade da vítima, devendo responder por perdas e danos por sua prática anti-social e ilícita, alem de se sujeitar ao poder de disciplina do empregador que poderá aplicar a sanção mais grave que é a demissão por justa causa (art. 482, “b”, “j” da CLT).[42]

Todavia, a demissão por justa causa do assediador não isenta o empregador de responder por perdas e danos morais, ainda que não tenha conhecimento da agressão psicológica contra seu subordinado, pois o Código adotou a teoria da responsabilidade objetiva para responsabilização do empregador, ou seja, independente de culpa.

  

3.3. ASSÉDIO MORAL VERTICAL ASCENDENTE

  

Esse tipo de Assédio pode ser cometido contra o superior que se excede nos poderes de comando e que adota posturas autoritárias e arrogantes, no intuito de estimular a competitividade e rivalidade, ou até mesmo por cometer atos de ingerência pelo uso abusivo do poder de direção.

Podendo ser ainda que, por insegurança ou inexperiência, o superior não consiga comandar o(s) empregado(s), sendo pressionado ou tendo suas ordens desrespeitadas ou deturpadas, implicando o fortalecimento do(s) assediador(es) para se livrar do superior indesejado.

Assim, por ser uma espécie de violência psicológica, o Assédio Moral acaba se instalando silenciosamente, porém com efeitos visíveis sobre o psiquismo da vítima, que tende a sofrer em silêncio, principalmente no caso do superior hierárquico que, mesmo ferido na sua auto-estima, poderá evitar levar o problema para o proprietário da empresa, temendo ser considerado incompetente para o cargo de chefia e ser obrigado a ocupar cargo de menor responsabilidade, principalmente quando se tratar de cargo de confiança, cuja reversão ao cargo de origem encontra respaldo no parágrafo único, do art. 468, CLT.

Logo, o empregado como obrigação de não-fazer deve evitar a prática de Assédio Moral que tornem o ambiente de trabalho degradante e que firam a dignidade da pessoa humana, configurando o Assédio Moral, em qualquer nível, descumprimento dos deveres impostos na relação contratual trabalhista, sujeitando o subordinado infrator à demissão por justa causa (CLT, art. 482, alíneas “b”, “h”, “j” e “k”); sem prejuízo da reparação por dano moral, o qual é de incumbência do empregador, devido à responsabilidade objetiva do mesmo e com base na culpa in eligendo e in viligando.

 

 

4. DANO MORAL E SUA REPARAÇÃO

  

A expressão “dano” não se prende à diminuição, perda ou prejuízo material ou patrimonial, pois, no Assédio Moral, o dano sofrido pelo assediado é mais amplo, produz prejuízos à profissionalização do trabalhador, à sua saúde física e psíquica, à personalidade, bem como à dignidade moral, atingindo em primeiro lugar o “patrimônio moral” do trabalhador sem afastar a repercussão na esfera patrimonial.

Visando a tutela aos bens jurídicos do cidadão o art. 5º de CF/88, nos incisos V e X prevê a indenização por dano material e moral.

Sendo a relação de emprego um estado de sujeição pessoal, constitui campo fértil para a lesão aos bens jurídicos do trabalhador, notadamente, aos seus direitos de personalidade e respeito à dignidade pessoal e profissional.

Sendo uma relação pessoal, a relação de emprego deve estar pautada no princípio da boa-fé, ou seja, no dever das partes agirem com lealdade, honestidade, sem causar prejuízo ou dano à parte contrária, sob pena de gerar o dever de indenizar os prejuízos causados, sendo importante salientar que, em razão da reciprocidade de direitos e obrigações, ambas as partes devem proceder com boa-fé e evitar o dano; logo, embora o empregado seja mais freqüentemente vítima do dano moral, a sua situação de miserabilidade e a hipossuficiência não retiram a sua condição de sujeito ativo do dano moral e patrimonial em relação ao empregador ou em relação a um colega de serviço, desde que tenha agido com culpa ou dolo.

  

4.1. CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL

  

Segundo Dalmartello, o dano moral corresponde:

(...) a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos; classificando-se, desse modo, de dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação etc.)e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral(dor, tristeza, saudade etc.); dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante etc.) e o dano moral puro (dor, tristeza etc.).[43]

Podemos assegurar que o Assédio Moral é uma espécie do gênero do dano moral, independente da conduta do assediante.

A conduta caracterizadora do Assédio Moral poderá gerar dano moral direto ou puro, ou seja, aquele que viola direito inerente à personalidade do empregado; bem como dano indireto ou reflexivo, ou seja, a conduta ilícita patronal gera de forma indireta prejuízo patrimonial e por via reflexiva um dano moral.

  

4.2. O DANO E O DEVER DE INDENIZAR

  

Pode-se citar como requisitos essenciais do dever de indenizar ou da responsabilidade civil: comportamento antijurídico representado por ação ou omissão, independente de dolo; e o nexo de causalidade entre a conduta comissiva ou omissiva e o dano experimentado.

Diante do art. 186 do CC, verifica-se que o Código Civil adotou a responsabilidade subjetiva, ou seja, o agente causador do dano responderá por perda e danos, desde que tenha agido com dolo ou culpa nas modalidades negligência ou imprudência.

Contudo, ainda prevalece aplicável, nas hipóteses legais permissíveis, a responsabilidade civil sem culpa ou objetiva, ou seja, aquela que gera dever de indenizar independente de culpa, bastando o liame de causalidade entre o dano sofrido e a conduta causadora, estando a responsabilidade civil assentada na teoria do risco.

Presentes os pressupostos da responsabilidade civil, Maria Aparecida Alkimin[44] diz que devemos classificá-la em:

a)Responsabilidade por fato próprio: o agente causador do dano incide na culpa própria, logo, é o responsável direto pela reparação do dano.

b) Responsabilidade por fato ou ato de terceiro.

Na modalidade de responsabilidade por ato próprio, poderíamos considerar a responsabilidade contratual do empregador quando pratica o Assédio e conseqüente dano moral, pois seria fruto do manifesto inadimplemento das obrigações contratuais, logo o inadimplemento contratual, além de produzir o dever trabalhista, produz o dever de reparar o dano moral e material.

Autores civilistas denominam responsabilidade civil extracontratual aquela que gera o dever de indenizar por fato culposo que não tem como base uma relação jurídica contratual entre as partes. Neste caso podendo ser enquadrada a responsabilidade civil do colega de serviço que pratica Assédio moral e conseqüente dano moral à vítima, cuja responsabilidade será extracontratual, muito embora o empregador seja responsabilizado por culpa de terceiro, no caso caracterizando a típica responsabilidade contratual e objetiva.

Na responsabilidade por fato ou ato de terceiro, embora o responsável pela reparação não seja o agente material da conduta ilícita, em face da relação jurídica que o responsável mantém com o agente, torna-se obrigado pela reparação do dano, com base na culpa presumida, típica da responsabilidade objetiva, podendo também fundamentar a responsabilidade do empregador com base na culpa in eligendo (má escolha do empregado) e culpa in vigilando (ausência de vigilância quanto à conduta e procedimento do escolhido).

O Código Civil expressamente prevê a responsabilidade por culpa ou fato de terceiro, consagrando a responsabilidade objetiva, ao dispor que o empregador, ainda que não incida na culpa, responde pelos atos praticados pelos seus empregados ou prepostos (CC, art.933 c/c art.932, inciso III).

Como o empregador delega poderes para dividir os encargos do empreendimento ou por questão de mera comodidade, evitando grandes esforços, sua responsabilidade será mesclada pela responsabilidade por fato de outrem ou por fato próprio, diz José de Aguiar Dias[45].

O Código Civil prevê em seu art. 942, parágrafo único, a responsabilidade solidária entre o agente causador do dano e as pessoas designadas no art. 932, inciso III, do CC; logo o empregado ou preposto causador do dano é responsável solidário juntamente com o empregador, ou seja, a vítima poderá demandar contra todos, ou contra o empregador apenas, tendo este direito de regresso contra o causador do dano, conforme o art. 934, primeira parte, do CC.

O Código Civil consagrou a responsabilidade civil por abuso de direito, disposto no art. 187[46]. Sendo assim, se o empregador excede os limites legais do poder de direção e do legítimo exercício do jus variandi quanto às condições de trabalho, causando dano ao empregado, poderá ser responsabilizado por abuso de direito.

  

4.3. FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO

  

Considerando-se que o Assédio Moral atinge a esfera da dignidade humana e a personalidade do trabalhador, dá origem ao denominado pelo direito italiano dano existencial, concluindo, forçosamente, que será impossível mensurar a intensidade do sofrimento psicológico e, conseqüentemente, estabelecer critérios matemáticos para fixação da indenização.

Ë correta a afirmação de que na reparação do dano moral, o dinheiro não desempenha função de equivalência e sim a função satisfatória e a de sanção.

No caso do dano resultante do Assédio Moral, a questão é mais delicada, pois a vítima busca no trabalho a realização pessoal, profissional e familiar, e toda essa realização o dinheiro não compra.

No tocante ao quantum indenizatório por dano moral, inexiste, na legislação, regras fixando parâmetros para o estabelecimento da indenização, sendo que os julgadores, baseando-se no seu livre e prudente convencimento, sempre se utilizaram do critério da liquidação por arbitramento, como de acordo com os parâmetros instituídos pela lei de imprensa (Lei nº 5.250/67) e pelo Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/62).

O Código Civil dispõe que a indenização mede-se pela extensão do dano (art. 944), trazendo a denominada liquidação na via eqüitativa, ou seja, se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir a indenização equitativamente (art. 944, parágrafo único).

Logo, o juiz dispõe de livre arbítrio para fixar a indenização de acordo com o grau da culpa e outras circunstâncias, por exemplo, a responsabilidade por fato de terceiro, onde o empregador é responsabilizado independentemente da culpa, podendo ser reduzido o quantum do prejuízo para obrigar o agente causador a reparar o dano parcialmente, ainda que o prejuízo seja mais extenso que o valor da condenação.

Já os juizes trabalhistas adotaram o sistema aberto para fixar a indenização por critério subjetivo, com base no livre convencimento, lançando mão da analogia (CLT, art. 8º), e utilizando para a fixação da indenização por dano moral, o critério contido no art. 478, caput, combinado com o art. 479, ambos da Consolidação das Leis do Trabalho.

Certamente, uma situação de assédio moral poderá proporcionar tanto o dano moral como o dano material, quando, por exemplo, além de atingir a dignidade e a personalidade do assediado, acaba por reduzir à condição de desemprego, com flagrante prejuízo econômico e até alimentar para o empregado, vítima do constrangimento, daí que deveremos lançar mão da orientação: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato[47].

Finalizando, é importante assegurar, que o assédio moral por resultar em lesão física e psíquica, constitui-se em ofensa à saúde do assediado, logo, além da reparação do prejuízo moral e, eventualmente, material, o assediante deverá indenizar a vítima das despesas de tratamento e os lucros cessantes em razão da incapacidade, ainda que temporária, para o trabalho, até o final da convalescença (art. 949 do CC).

  

4.4. COMPETÊNCIA

  

O art. 114 da CF/88, caput e inciso IX, estabelece competência à Justiça do Trabalho de processar e julgar, entre outros dissídios, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.

À luz da expressão outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, fica nítida a competência material da Justiça do Trabalho para apreciar e decidir litígio entre empregado e empregador que envolva o dano moral.

Entende-se, finalmente, que o pedido de reparação de dano moral em virtude do assédio moral, decorrente da relação contratual-trabalhista, configurando descumprimento da obrigação contratual de respeito aos direitos de personalidade e dignidade do empregado, será de competência material da Justiça do Trabalho, embora, a primeira vista, a questão interesse ao direito civil, cujo assédio moral se enquadra no conceito de ato ilícito, previsto no art. 186 do CC.

Portanto, cominando os art. 114 e o inciso X do art. 5º, ambos da CF/88, com o art. 8º da CLT, concluímos que a Justiça do Trabalho é competente para julgar dissídios entre empregado e empregador que envolva, não apenas matéria trabalhista prevista na CLT, como também pedidos de indenização por dano moral, que tenha decorrido da execução do contrato de trabalho, face à ampla garantia constitucional de reparação de dano moral, sendo que o texto constitucional não distingue ou limita a reparação apenas na esfera civil, e face à inovação da subsidiariedade da aplicação do direito comum à relação de emprego.

  

 

CONCLUSÃO

  

O Assédio Moral, antes de ser um fenômeno que invade e perturba o dia-a-dia do trabalhador, deve ser considerado como uma ferida social, que perturba a vida de forma geral da pessoa, pois é, na vivência, que as pessoas tendem a manifestar o instinto perverso e o intuito de manipular o outro, seja pela prática de abuso de poder, seja por maldade e competitividade antiética e desumana.

É antiga a prática de agressão contra a dignidade e personalidade, desde a escravidão, época em que a personalidade não era inerente ao escravo que era considerado como res.

No decorrer do trabalho, demonstra-se que o Assédio Moral é a violação a dignidade do trabalhador, princípio fundamental de natureza constitucional e universal, além de atingir os direitos de personalidade do empregado, com graves conseqüências individuais e sociais, além de ser um fenômeno prejudicial não apenas à saúde do trabalhador, mas também ao meio ambiente do trabalho.

Com a evolução social e o surgimento do Direito do Trabalho na era da Revolução Industrial, sem dúvida não deixou de existir a exploração do capital sobre a força de trabalho e, conseqüentemente, intensas práticas assediantes, contudo, os movimentos humanistas que se manifestavam naquela época, enfatizaram a necessidade de tutela à pessoa do trabalhador, considerando-o hipossuficiente diante da superioridade do capital.

Na era da globalização e flexibilização de condições de trabalho, não podem deixar de ser garantidas ao trabalhador condições mínimas de trabalho para a preservação de sua dignidade humana, inclusive a garantia de um meio ambiente de trabalho sadio que lhe dê satisfação, haja vista que passa a maior parte de sua vida no ambiente de trabalho.

É certo que o contrato de trabalho, por envolver a típica relação pessoal e de submissão, constitui-se em área produtiva para a prática do Assédio Moral, todavia, tal prática caracteriza flagrante violação contratual, encontrando fundamentação legal no art. 483 (quando praticado por empregador ou preposto deste) e no art. 482 (quando praticado por empregado), ambos da CLT, além de gerar dano moral e conseqüente responsabilidade civil do agente causador, havendo no ordenamento jurídico positivo ampla proteção legal contra o dano moral, seja no âmbito constitucional (art. 5º, incisos V e X), seja no infraconstitucional (CC, art. 186).

Claramente, para se buscar a tutela jurídica contra o Assédio Moral, não pode deixar de diferenciar o Assédio Moral como ato, gesto, comportamento, conduta degradante e humilhante dirigida contra o empregado de forma repetitiva e prolongada, com a intenção de rebaixá-lo, humilhá-lo, envergonhá-lo, e excluí-lo da organização do trabalho, de outras situações conflituosas que ocorrem no ambiente de trabalho, mas sem a conotação d conduta assediante, sob pena de criar falsas acusações de Assédio Moral, desestabilizando toda a organização do trabalho, pois gera clima de insegurança e incertezas, além de tornar a Justiça do Trabalho meio de obtenção de indenizações.

O Assédio Moral, além de prejudicar a personalidade e saúde do empregado, estende seus efeitos sobre a sociedade, pois conduz ao desemprego, e a vítima do Assédio moral pode se tornar um encargo para o Estado, pois gozará de benefícios previdenciários; posto que o empregado assediado tem queda na produtividade, dificuldade de integração e interação com o grupo, além de absenteísmo, tudo capaz de resultar em déficit para o empregador.

A regulamentação para coibição do Assédio moral não é suficiente para evitar a propagação desse mal na organização do trabalho, sendo elementar uma ação preventiva, pois a prevenção é a maior arma contra o Assédio Moral, exigindo do empregador a utilização de medidas necessárias para garantia de um meio ambiente do trabalho sadio e com qualidade de vida.

As empresas através de um trabalho bem estruturado e capacitado de Recursos Humanos devem adotar medidas preventivas contra o Assédio Moral, que deve agir de forma interdisciplinar como o médico do trabalho, psicólogo, sindicatos, comissão de empregados etc., possibilitando interagir, dinamizar, estabelecer a comunicação respeitosa, humana e solidária entre todos aqueles que integram o processo produtivo.

Os sindicatos não poderão deixar de chamar a responsabilidade pela prevenção e fiscalização contra o Assédio Moral, devendo exercer função protetora tanto do interesse coletivo como interesse individual do empregado, pois, como visto, mesmo o Assédio Moral sendo direcionado a um trabalhador, refletirá no ambiente de trabalho, desestabilizando-o, já que inspira nos demais empregados o receio, o medo de que se torne constante a prática na empresa e qualquer outro trabalhador seja vitimizado.

No momento em que o Assédio Moral conquistar uma amplitude igual à do Assédio Sexual muitos dramas poderão ser evitados e muitos abusos poderão ser contidos. Atualmente, ganância e preconceitos imperam. Sem dúvida que o Assédio Moral é um mal que não pode ser destruído, pois é próprio da sociedade atual, competitividade e discriminadora. No entanto, pode ser contido, penalizado, possibilitando à vítima a justa reparação de todo mal que viveu. E é esse o objetivo da presente monografia. Colaborar para tornar o mundo das relações de trabalho e serviço mais justo.

  

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  

ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio Moral na relação de Emprego. 2a tiragem. Curitiba: Juruá, 2006.

BARRETO, Margarida Maria Silveira. site: www.assediomoral.org, acessado 01/11/2006, atualizado em julho de 2004, link: E o que é assédio moral no trabalho?

BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos de personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989.

BOBBIO, Norberto. A era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campu, 1992.

da Silva, Jorge de Oliveira. Assédio Moral no Ambiente de Trabalho. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica, 2005.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha. Assédio Moral nas Relações de Trabalho. Campinas/SP. Russell, 2004.

HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio Moral: a violência perversa no cotidiano. Trad. Maria Helena Kruhner. 2a. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso do Direito do Trabalho. 18a ed. Revisado e atualizado, São Paulo: Saraiva, 2003.



[1]Trabalho [Der. de trabalhar] S. m.  1. Aplicação das forças e faculdades humanas para alcançar um determinado fim: O trabalho permite ao homem certo domínio sobre a natureza (...) 2. Atividade coordenada, de caráter físico e/ou intelectual, necessária à  realização de qualquer tarefa, serviço ou empreendimento: trabalho especializado;trabalho de responsabilidade (...)”. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. p.1.393.

[2] ALKIMIN, Maria Apareceida. Assédio Moral na Relação de Emprego.2º tiragem. Curitiba: Juruá, 2006, p.15.

[3] ibidem., p. 16.

[4]Art. 1º. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade ”.(Declaração Universal dos Direitos do Homem)

[5] BOBBIO, Norberto. A era dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campu, 1992. p. 74.

[6] ALKIMIN, Maria Aparecida. op. cit., p.17.

[7] ALKIMIN, Maria Aparecida. op. cit., p.20.

[8]Personalidade. [De personal (i)_+_dade]S.f 1. Caráter ou qualidade do que é pessoal, pessoalidade. 2. O que determina a individualidade de uma pessoa moral. 3. O elemento estável da conduta de uma pessoa; sua maneira habitual de ser, aquilo que a distingue de outra (...). 4. Traços típicos, originalidade (...). 5.(...). 6. Jur. Aptidão, reconhecida pela ordem jurídica , para exercer direitos e contrair obrigações (...). 7. Psicol. Organização constituída por todas as características cognitivas, ofensivas, volitivas e físicas de um indivíduo. (...)”.Cf. Aurélio Buarque de Holanda FERREIRA, p. 1.316.

[9] BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos de personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. p. 29. Esse doutrinador classifica os direitos de personalidade da seguinte maneira: direito à liberdade; direito à intimidade; direito à integridade psíquica; direito ao segredo; direito à honra e o direito ao respeito.

[10] Dispõe o art.11 do Cód. Civil/02: “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.

[11] ALKIMIN, Maria Aparecida. op. cit., p. 21.

[12] Curso do Direito do Trabalho. 18 ed. Revisado e atualizado, São Paulo: Saraiva, 2003. p. 416-417.

[13] ALKIMIN, Maria Aparecida. op.cit., p.22.

[14] Segundo Amauri Mascaro NASCIMENTO, “Dirigismo contratual é a política jurídica destinada a restringir a autonomia negocial na determinação dos efeitos do contrato”. Op. Cit., p.499.

[15] ALKIMIN, Maria Aparecida. op.cit., p.22.

[16] ibidem, p.23.

[17] ibidem., p. 23.

[18] ibidem, p. 23.

[19] ibidem, p. 23.

[20] ibidem, p. 24.

[21] CF/88, art. 200, inc. VIII

[22] ALKIMIN, Maria Aparecida. op.cit., p. 27.

[23] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Ob. Cit., p. 435.

[24] ALKIMIN, Maria Aparecida. op.cit., p.28.

[25] Segundo o Dicionário Aurélio, Etologista é um ramo da Biologia que tem por objeto o estudo dos hábitos dos animais e da sua acomodação às condições do ambiente. In Dicionário Aurélio básico da língua portuguesa, organização da Folha de São Paulo, Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 1995.

[26] apud. FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha. Assédio Moral nas Relações de Trabalho. Campinas/SP. Russell, 2004. p. 38.

[27] apud. FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p. 38.

[28] ibidem. p. 39.

[29] apud. FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p.40.

[30] LEYMANN, Heinz. Mobbing. Paris: SEUIL, 1996, apud HIRIGOYEN, Marie-France, Assédio Moral: a violência perversa no cotidiano, p. 66.

[31] apud. FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p.42.

[32] ibidem, p. 43.

[33] ibidem, p. 43.

[34] apud. FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p.44.

[35] Idem, p.45.

[36] FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p.45.

[37] apud FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p.46.

[38] HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio Moral: a violência perversa do cotidiano, p. 66. apud FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha, op. cit., p.46.

[39] site: www.assediomoral.org, acessado 01/11/2006, atualizado em julho de 2004, link: E o que é assédio moral no trabalho?

[40] apud da Silva, Jorge de Oliveira. Assédio Moral no Ambiente de Trabalho. Rio de Janeiro: Editora e Livraria Jurídica, 2005.

[41] DA SILVA, Jorge Luiz de Oliveira. op. cit. P.28.

[42] in verbis , Art. 482, b e j da CLT:

Constituem justa causa para rescisão do Contrato de Trabalho pelo empregado:

...

b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

...

j) ato lesivo da honra ou de boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, prórpia ou de outrem;

...

 

[43] apud ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio Moral na relação de Emprego.2º tiragem. Curitiba: Juruá, 2006, p.111.

[44] Ob. cit. p. 114.

[45] apud ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio Moral na relação de Emprego. 2a tiragem. Curitiba: Juruá, 2006, p.116.

[46] Art. 187 CC, in verbis: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

[47] Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça.

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