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 Sala dos Doutrinadores - Artigos Jurídicos
Autoria:

Tiago Dâmaso Corrêa
Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília - DF.

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Monografias Direito Constitucional

O Marco Legal dos Jogos no Brasil

Com a volta à tona do tema, decorrente do reconhecimento da repercussão geral, o artigo faz um apanhado breve sobre o problema do marco legal dos jogos no Brasil.

Texto enviado ao JurisWay em 12/07/2017.

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O Problema do Marco Legal dos Jogos no Brasil

 

             A regra, no ordenamento jurídico brasileiro, é a proibição do jogo de azar. Segundo a Lei de Contravenções Penais, é contravenção penal estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público. Diz-se jogo de azar todos aqueles em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte.

 

            Entretanto, a legislação brasileira estabelece exceções à regra. A própria LCP dispõe que a loteria é exceção, desde que autorizada. O Decreto-Lei 204 de 1967, ainda, restringe a admissão das loterias: “considerando que a exploração de loteria constitui uma exceção às normas de direito penal, só sendo admitida com o sentido de redistribuir os seus lucros com finalidade social em termos nacionais.” A legislação de vários países estabelece padrão semelhante quanto à finalidade social. A exploração de loteria constitui serviço público exclusivo da União, não passível de concessão, sendo a Caixa Econômica Federal o único órgão incumbido dessa exploração.

            Quanto aos bingos, excepcionando a norma penal, a Lei nº 8.672, de 6 de julho de 1993 (Lei Zico), em seu artigo 573 , autorizou as entidades de direção e de prática desportiva a explorar o jogo de bingo ou similar, obedecidas as condições nela previstas. A autorização para exploração de jogo similar ao bingo, como consta na Lei Zico, e de modalidades lotéricas similares ao bingo, como consta no Decreto nº 981, de 1993, deram ensejo à autorização para exploração de videoloterias (caça-níqueis) pelas casas de bingo.

            A Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998 (Lei Pelé), revogou a Lei Zico e, conforme previsto em seus arts. 59 a 81, passou a permitir a exploração de jogos de bingo, em todo o território nacional, por entidades de administração e prática desportiva, diretamente ou através de empresa comercial, nas modalidades permanente ou eventual, mediante credenciamento junto à União e obedecidas as condições que fixava. Os arts. 73 e 74 da Lei Pelé proibiam a instalação de qualquer tipo de máquinas de jogo de azar ou de diversões eletrônicas nas salas de bingo e estabeleciam que nenhuma outra modalidade de jogo ou similar, que não seja o bingo permanente ou eventual, poderia ser autorizada.

            A Lei nº 9.981, de 14 de julho de 2000 (Lei Maguito), revogou, a partir de 31 de dezembro de 2001, os referidos artigos 59 a 81 da Lei Pelé, que permitiam a exploração do bingo, e transferiu para a Caixa Econômica Federal a competência para autorizar e fiscalizar os jogos de bingo.

Portanto, a partir de 31 de dezembro de 2001, ressalvadas as autorizações que estavam em vigor nessa data, a exploração de jogos de bingo voltou a caracterizar contravenção penal, tendo em vista não existir mais a legislação especial que a autorizava, voltando a incidir a lei geral – o art. 50 da LCP, que tipifica como contravenção a exploração de jogos de azar.

Em 2004, foi editada a Medida Provisória nº 168, que proibia a exploração de todas as modalidades de jogos de bingo e jogos em máquinas eletrônicas denominadas “caça-níqueis”, e tornava nulas as autorizações existentes. Em verdade, a única inovação da MP era tornar a conduta um ilícito administrativo, cominando multa. A exploração de bingos e caça níqueis já estava proibida, desde 31 de dezembro de 2001, e em 2004 todas as autorizações já haviam expirado, não se podendo conceder novas autorizações. Dessa forma, a MP foi considerada sem caráter de urgência, e por esse motivo rejeitada. Tal rejeição não significou, entretanto, como alguns argumentam, a liberação da exploração do bingo e caça níqueis.

A despeito de tal proibição, vários Estados da Federação têm autorizado a exploração de jogos de bingo como modalidade de loteria estadual. Porém, essa autorização dos Estados não encontra respaldo na legislação federal: a CF atribuiu à União competência privativa para legislar sobre loterias, e, ainda, a legislação federal veda a criação de loterias estaduais.

 

O Poder Judiciário e a Exploração de Jogos de Bingo

 

            O STF já declarou, em 2004, a inconstitucionalidade de leis do DF e do Mato Grosso, que criavam loterias no âmbito daquelas unidades da federação.

            Há cerca de 14 ADIns em julgamento, arguindo-se a inconstitucionalidade de leis editadas pelos Estados de Alagoas, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins, todas envolvendo competência legislativa em matéria de loterias e jogos.

            Pelos dispositivos citados acima, os Estados estão claramente impedidos de autorizar a exploração de quaisquer modalidades de jogos de azar.

            O STJ possui o mesmo entendimento: a Constituição Federal atribuiu expressamente à União a competência de legislar sobre sistemas de consórcio e sorteio - consideram-se os bingos e as loterias uma espécie, da qual sorteio é gênero – e a legislação federal reputa como contravenção penal os jogos de azar e jogo do bicho, e estabelece, ainda, que a exploração de loterias constitui serviço público exclusivo da União.

            Os tribunais estaduais, em regra, têm decidido pela não autorização dos jogos. Também não têm acatado os argumentos de muitos interessados, que alegam, baseados inclusive em perícias, que as máquinas caça-níqueis não são jogos de azar, mas apenas diversão eletrônica.

            Apenas o Tribunal do Mato Grosso do Sul tem autorizado o jogo do bingo: foi editado um decreto revogando as autorizações de funcionamento das casas de bingo e prevendo novas autorizações, mediante licitação. As decisões judiciais são no sentido de manter a autorização para funcionamento dos bingos sob o argumento de que a revogação de autorização para atividade de bingo permanente, através de decreto estadual fundado em medida provisória, é ato vinculado, e não discricionário do Poder Público; logo, não convalidada a medida provisória, a manutenção da revogação ofende direito líquido e certo,

            Os interessados alegam, ainda, que, com a revogação da norma que autorizava a exploração dos bingos, não ocorreu a repristinação da norma que enquadra essa atividade como contravenção penal. Alegam que haveria, para tanto, necessidade de repristinação expressa.

            O Tribunal de Justiça de Minas Gerais rebateu esse tipo de argumento, entendendo da seguinte forma:

 

“O artigo 50 da Lei de Contravenções Penais não foi revogado tacitamente pela autorização da exploração da atividade de bingo contida originariamente no artigo 57 da Lei nº 8.672/93, pois aquele tipo penal estende-se a todos os jogos de azar em geral. Dessa forma, deixando o bingo de ser atividade lícita pelo disposto na Lei nº 9.981/00, volta a se enquadrar na hipótese prevista no § 3º, alínea 'a', do artigo 50 da Lei de Contravenções Penais, o qual, nunca tendo sido revogado, prescinde de disposição repristinatória expressa.”

 

            As decisões do Tribunal de Justiça do Maranhão remetidas a esta CPI, todas proferidas em 2001, foram no sentido de que as máquinas eletrônicas programadas (MEPs) seriam legais, por não caracterizar jogo, além do fato de que a importação dos equipamentos era autorizada pelo Governo e a atividade era autorizada na Lei Pelé. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em algumas oportunidades, decidiu no sentido de permitir o funcionamento das máquinas caça-níqueis até a decisão do STF sobre a ADI que questiona a legislação estadual sobre loterias. O Tribunal de Justiça de São Paulo não tem acolhido mandados de segurança impetrados pelas casas de bingo com vistas a manter seus estabelecimentos em funcionamento. No Estado do Espírito Santo, a LOTERES foi extinta, não havendo nenhuma decisão autorizando o funcionamento de bingos10.

            Muitas empresas que exploram o jogo de bingo têm conseguido junto à Justiça Federal se manter em funcionamento, à base de liminares, invocando diversos argumentos, entre os quais, os seguintes:

(1)   Tese da não repristinação da norma penal: a revogação das normas que autorizavam a exploração do bingo não implica na revigoração da norma que a caracterizavam como contravenção. Não mais havendo qualquer disciplina legal em relação à matéria, prevaleceria o princípio da livre iniciativa, podendo quaisquer interessados explorá-la.

(2)   Tese do direito adquirido: Outras empresas alegam direito adquirido de permanecer em funcionamento, tendo em vista os altos investimentos realizados para instalação dos empreendimentos. O argumento em contrário é de que não se pode invocar direito adquirido contra normas constitucionais (entendimento do STF).

(3)   Invoca-se, ainda, o inciso IX do art. 24 da CF, segundo o qual compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre desporto, sob o argumento de que a legislação sobre jogos de bingo, quando prevê a destinação de recursos para entidades desportivas, diz respeito a desporto, o que legitima a legislação estadual que autoriza a exploração dos jogos de bingo. O STF já decidiu que o tema se insere no gênero sorteios, e que, portanto, é competência privativa da União legislar sobre a matéria.

 

Repercussão Geral Reconhecida

 

                        Ainda não houve uma pacificação jurisprudencial quanto à questão, embora o STF tenha editado a Súmula Vinculante nº 2, declarando inconstitucional a lei ou ato normativo estadual ou distrital que disponha sobre sistemas de consórcios e sorteios, inclusive bingos e loterias. Isso porque o Supremo adota o entendimento de que é competência privativa da União legislar sobre a matéria.

 

                        Quanto à questão da configuração ou não de contravenção penal, foi recentemente reconhecida Repercussão Geral sobre o tema no STF, em acórdão de 03/11/2016, de relatoria de Luiz Fux, no RE 966177 RG / RS, interposto pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. A lide é decorrente do entendimento das turmas recursais gaúchas, que têm entendido no sentido de que a principiologia constitucional adotada pela Constituição de 1988 não teria recepcionado o Decreto-Lei 9.215/46, nos seguintes termos:

 

“APELAÇÃO CRIME. JOGOS DE AZAR. ART. 50 DO DL 3.688/41. ATIPICIDADE. Conduta inserida no âmbito das liberdades individuais, enquanto direito constitucional intocável. Os fundamentos da proibição que embasaram o Decreto-Lei 9.215/46 não se coadunam com a principiologia constitucional vigente, que autoriza o controle da constitucionalidade em seus três aspectos: evidência, justificabilidade e intensidade. Ofensa, ainda, ao princípio da proporcionalidade e da lesividade, que veda tanto a proteção insuficiente como a criminalização sem ofensividade. Por outro lado, é legítima a opção estatal, no plano administrativo, de não tornar legal a atividade, sem que tal opção alcance a esfera penal. RECURSO PROVIDO.”

 

 

 

              A matéria está próxima de ser julgada, e pode chegar a liberar o bingo em todo o território federal. Entretanto, como se vê no próprio julgado acima, a declaração de inconstitucionalidade do mencionado Decreto-Lei apenas afirma o não alcance da esfera penal quanto aos jogos, não tendo como consequência necessária a sua autorização, uma vez que o Estado pode torná-los ilícitos no plano administrativo e até civil. 

Importante:
1 - Todos os artigos podem ser citados na íntegra ou parcialmente, desde que seja citada a fonte, no caso o site www.jurisway.org.br, e a autoria (Tiago Dâmaso Corrêa).
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