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Resumo:
Artigo escrito em parceria com Simone do Amaral Fonseca Araújo, professora de Português, licenciada em Letras, pós-graduada em Metologia de Lingua Portuguesa, Supervisão e Inspeção Escolar, atualmente cursa 4º Ano Direito UFU
Texto enviado ao JurisWay em 10/12/2012.
Última edição/atualização em 11/12/2012.
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Raíssa Heicke Winking e Simone do Amaral Fonseca Araújo[1]
RESUMO:
Este artigo discute a questão da Lei antidrogas, buscando estudar as raízes históricas que justificam a criminalização de algumas substâncias psicotrópicas e a licitude de outras, a exemplo do tabaco e do álcool. Ademais, buscar-se-á, com este estudo, analisar o atual sistema de “guerra contra as drogas”, com o intuito de avaliar os aspectos positivos e negativos da política proibicionista. A partir desses dados, analisar-se-á a atual lei 11343/2006, bem como as tendências atuais de descriminalização do uso da maconha, com enfoque no direito penal garantista. Tomar-se-á por base, para realização deste trabalho, a doutrina e jurisprudências existentes acerca do assunto, assim como pesquisa de notícias veiculadas sobre o tema no direito brasileiro e no direito comparado.
ABSTRACT:
This article discusses the Drug Act, seeking to study the historical roots that justify the criminalization of some psychotropic substances and legality of other, like tobacco and alcohol. In addition, it will seek, with this study, analyze the current system of "war on drugs", in order to evaluate the positive and negative aspects of prohibitionist policy. From these data, it will analyze the current law 11343/2006, as well as current trends in the decriminalization of marijuana use, with a focus on criminal law garantista. Tomar will be the basis for this work, the existing doctrine and jurisprudence on the matter, as well as search news published on the topic in Brazilian law and comparative law.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Penal Garantista, Lei antidrogas, descriminalização do uso da maconha, política proibicionista.
1. INTRODUÇÃO:
Desde os primórdios da sociedade, o Homem fez uso de substâncias psicotrópicas como forma de “driblar” as crises existenciais inerentes ao ser humano. Ocorre que, com a evolução das normas que regem a vida em sociedade, surgiram regras especificas para controlar o uso das drogas.
Assim, no Brasil, foi elaborada a Lei 6.368, de 21 de Outubro de 1976, como primeira tentativa de reprimir o uso indiscriminado de drogas. Em 2002, surge então, a Lei 10.409, visando aprimorar a legislação anterior. Entretanto, em função da Lei 10.409/2002 ser permeada de inconstitucionalidades e falhas técnicas, esta foi aprovada apenas em seu âmbito processual, de forma que havia dois institutos legais acerca do tema.
Destarte, é promulgada a Lei 11.343, de 26 de agosto de 2006 que revogou os diplomas anteriores e é considerada um grande avanço em relação ao tratamento dado ao tráfico e, especialmente, ao uso de entorpecentes.
Por fim, tem-se um panorama social atual no qual, de um lado há uma “guerra contra drogas”, mais próximo do Direito Penal do Inimigo, e de outro, vários movimentos, com fundamento no Direito Garantista, cuja intenção é descriminalizar a maconha, tornando-a uma droga lícita, a exemplo do tabaco e do álcool.
2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CRIMINALIZAÇÃO DO USO DE DROGAS:
A história da utilização de alucinógenos é algo que faz parte da própria evolução da sociedade, entretanto a criminalização do uso de tais substâncias surgiu bem depois. Desde a sociedade antiga, o uso de drogas, especialmente as alucinógenas, era liberado, de forma que existiam até mesmo lugares reservados para tal prática, a exemplo das “casas de ópio”, presentes no Ocidente e também em alguns países da Europa.
Substâncias como a heroína e a cocaína eram comercializadas livremente em farmácias como remédios para tratamento de diversas doenças, inclusive psíquicas, tais como a depressão. Por volta de 1919, a cocaína, que até então era comercializada, até mesmo no Brasil, passou a ser proibida. Assim, ao longo do tempo, a utilização de outras drogas consideradas “pesadas”, também passou a ser considerada ilícita.
Com relação ao Brasil, segundo o sociólogo Paulo César Pontes Fraga:
Desde as Ordenações Filipinas, ordenamento jurídico português, com validade no território do Brasil Colônia, havia um item referido ao uso e à posse de determinadas substâncias. O seu título 89 determinava que nenhuma pessoa poderia ter em casa, exceto os boticários, substâncias como ópio, rosalgar branco, vermelho ou amarelo ou solimão[2].
Ainda conforme o sociólogo supra, o Código Penal do Império em nada se manifestava quanto à proibição de uso ou venda de substâncias entorpecentes, ao passo que o Código de 1890, vigente no Brasil República, estipulava multa para quem comercializasse ou utilizasse as chamadas substâncias venenosas sem a devida regulamentação.
Em meados da década de 1920, com a grande onda de luta contra o uso de drogas que se deu no mundo todo, gerou a mudança da nomenclatura do termo “venenosa” por “entorpecente” do art. 159 da Consolidação das Leis Penais de 1932, in verbis:
Art. 159. Vender, ministrar, dar, trocar, ceder ou, de qualquer modo, proporcionar, substâncias entorpecentes; propor-se a qualquer desses actos sem as formalidades prescriptas pelo Departamento Nacional de Saúde Publica; induzir ou instigar por actos ou por palavras o uso de qualquer dessas substâncias: Pena – de prisão cellular por um a cinco annos e multa de 1:000$ a 5:000$000.(Grifo nosso).
Tal mudança acarretou uma tendência legislativa de não criminalizar apenas o comércio das chamadas “substâncias entorpecentes”, mas inclusive a sua fabricação e consumo.
Interessante notar que, até o início do século XX, não havia, em nosso ordenamento jurídico, nenhum diploma legal que tratasse de forma específica sobre o problema das drogas, o que só ocorreu, em 1976, com a Lei 6.368/76, trazendo em seu texto a previsão de crimes de drogas e o procedimento processual a ser seguido.
Essa situação perdurou até o advento da Lei 10.409/2002 que, por ser considerada uma “aberração” jurídica, foi aprovada apenas em seu conteúdo processual. Atualmente, a Lei 11.343/2006, que revogou as Leis 6.368/76 e 10.409/2002, é o diploma legal que disciplina a questão das drogas no Brasil.
A Lei Antidrogas não descriminalizou a conduta de porte de entorpecente para uso próprio, como querem alguns doutrinadores. Apenas, diminuiu a carga punitiva. A sanção penal, como é sabido, possui como uma das espécies a pena. As penas podem ser as seguintes, sem prejuízo de outras, de acordo com o inc. XLVI, art. 5º, da Constituição Federal: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos.
Percebe-se, claramente, que é crime a posse de drogas para consumo pessoal. A mudança diz respeito à espécie da pena, que deixou de ser privativa de liberdade. Claro que se trata de um avanço para que o tema passe a ser tratado somente como questão de saúde pública, incidindo sobre ele as normas de caráter administrativo.[5]
Importante ressaltar, ainda, que os Capítulos I e II do Título III da Lei Antidrogas traz um avanço quanto às atividades de prevenção de uso indevido de tais substâncias, bem como as destinadas à atenção e reinserção do usuário à sociedade, de forma que o dependente não mais é tratado como “inimigo”, mas sim como alguém que tenha resguardado suas garantias e direitos fundamentais. Conforme explicam Bizzoto e Queiroz, nos comentários à Lei 11.343/2006, ao falar sobre a proteção aos usuários de drogas:
A invasão das drogas nas instituições de ensino é tema de uma série de reportagens que o Correio publica a partir de hoje. Levantamento feito pela Secretaria de Segurança Pública a pedido do jornal revela que, de janeiro a julho deste ano, cresceu 13% a quantidade de ocorrências relacionadas ao uso de substâncias ilícitas em um raio de até 100 metros das 1.095 unidades educacionais distribuídas na capital brasileira (veja arte). Em 2012, a polícia já flagrou 661 pessoas consumindo maconha, cocaína ou crack nas imediações ou dentro de escolas. São seis casos por dia letivo — devido à greve, de janeiro a julho foram 105 dias com aulas —, fora o consumo que passa despercebido das autoridades. A cidade que mais concentra o delito é Ceilândia, com 75 ocorrências.
O crescimento é mais acentuado nas instituições particulares, onde o número de ocorrências aumentou 15% nos primeiros sete meses do ano. Nas escolas públicas, a alta é de 12%. Apesar de o número de usuários flagrados seguir uma alta, os registros policiais apontam uma redução de 8% no tráfico no perímetro escolar entre 2011 e 2012. Ainda assim, foram 239 flagrantes de venda de entorpecentes ao redor das escolas, média superior a duas prisões por dia letivo.[13]
A cristianização da América considerou como práticas idolátricas os usos tradicionais indígenas de uma série de drogas psicoativas, que foram a partir de então perseguidas. Isso ocorreu também com a maconha, que tinha uma origem oriental, ligada às culturas hindu e islâmica, e também a tradições africanas.: todas elas se chocaram com essa ordem cultural do ocidente cristão.
Finalmente, há um elemento também ligado à cultura, que é o racismo. Essa planta foi identificada nas sociedades ocidentais com populações de origem estrangeira: árabes, na Europa; africanos, no Brasil; e mexicanos, nos Estados Unidos. Então, isso serviu como pretexto xenofóbico de perseguição a minorias
étnicas de outras origens.[14]
Existe, assim, uma tendência conservadora e autoritária no tratamento desta problemática no país que é, além de tudo, legitimada pela população, uma vez que 75% dos entrevistados nesse mesmo levantamento afirmaram discordar da legalização do uso da maconha no Brasil.
Justamente. De acordo com o levantamento, 111 milhões de pessoas mostraram-se absolutamente contra a legalização desta droga no país, ao passo que apenas 11% da amostra entrevistada (16,3 milhões) apoiou a legalização da maconha.[15]
7. REFERÊNCIAS
ASSUNÇÃO, Marlize Daltro. Teoria Geral do Garantismo. Disponível em: <: http://jus.com.br/revista/texto/8037/teoria-geral-do-garantismo#ixzz2D2q9xNG2>. Acesso em: 23/11/2012
BIZZOTTO, A.; RODRIGUES, A. de B.; QUEIROZ, P. Comentários Críticos à Lei de Drogas. 3. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
CABETTE, Eduardo Luiz Santos e LOBERTO, Eduardo de Camargo. O Direito Penal do Inimigo. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/11142/o-direito-penal-do-inimigo#ixzz2DT3lkicO>. Acesso em: 27 nov. 2012.
CARNEIRO, Henrique. Entrevista concedida à Rede Brasil Atual. A Legalização das Drogas é Inevitável numa Democracia, garante especialista. Disponível em: <http://www.pragmatismopolitico.com.br/2012/08/legalizacao-das-drogas-e-inevitavel-numa-democraciagarante-especialista.htm>. Acesso em: 21 nov. 2012.
Comissão de Política Nacional de Drogas – IBCCRIM. Política de Drogas, Cultura do controle e Propostas Alternativas. Disponível em: < http://www.ibccrim.org.br/site/comissoes/politicaDrogas.php>. Acesso em: 21 nov. 2012.
CYMROT, Danilo. Da Boca do Lixo à Cracolândia: Mais do Mesmo. Boletim IBCCRIM. Ano 20, nº 233. Abril, 2012
Droga Avança sobre Território Escolar. Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/eu-estudante/ensino_educacao basica/2012/09/03/ensino_educacaobasica_interna,320497/droga-avanca-sobre-territorioescolar.shtml>. Acesso em: 21 nov. 2012
FILHO, Clóvis Alberto Volpe. Considerações Pontais sobre a Nova Lei Antidrogas (Lei 11.343/2006). Disponível em:
FRAGA, Paulo César Pontes apud PELLI, Ronaldo. Histórico da Criminalização de Drogas. Disponível em:
JAKOBS, Günther apud CARDOSO, Joaquim Manoel Alves. Direito Penal do Inimigo: da Negação do Garantismo Penal às Teses Legitimadoras. Disponível em: < http://jus.com.br/revista/texto/21832/direito-penal-do-inimigo-da-negacao-do-garantismo-penal-as-teses-legitimadoras>. Acesso em: 21 nov. 2012.
GOMES, Luiz Flávio e BUNDUKY, Mariana Cury. 75% da População é contra a Legalização da Maconha. Disponível em:
PEREIRA, Pedro H. S. Breve Análise da Nova Lei de Tóxicos – Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Disponível em:
[1]Raíssa Heicke Winking e Simone do Amaral Fonseca Araújo são acadêmicas do 4º ano da Universidade Federal de Uberlândia – Faculdade de Direito Professor Jacy de Assis. Endereço eletrônico, respectivamente, raissa_heicke@hotmail.com e simoneport@hotmail.com.
[2] FRAGA, Paulo César Pontes apud PELLI, Ronaldo. Histórico da Criminalização de Drogas. Disponível em:
[3] PEREIRA, Pedro H. S. Breve Análise da Nova Lei de Tóxicos – Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Disponível em:
[4] BIZZOTTO, A.; RODRIGUES, A. de B.; QUEIROZ, P. Comentários Críticos à Lei de Drogas. 3. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
[5] FILHO, Clóvis Alberto Volpe. Considerações Pontais sobre a Nova Lei Antidrogas (Lei 11.343/2006). Disponível em:
[6] BIZZOTTO, A.; RODRIGUES, A. de B.; QUEIROZ, P. Comentários Críticos à Lei de Drogas. 3. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
[7] JAKOBS, Günther apud CARDOSO, Joaquim Manoel Alves. Direito Penal do Inimigo: da Negação do Garantismo Penal às Teses Legitimadoras. Disponível em: < http://jus.com.br/revista/texto/21832/direito-penal-do-inimigo-da-negacao-do-garantismo-penal-as-teses-legitimadoras>. Acesso em: 21 nov. 2012.
[8] CABETTE, Eduardo Luiz Santos e LOBERTO, Eduardo de Camargo. O Direito Penal do Inimigo. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/11142/o-direito-penal-do-inimigo#ixzz2DT3lkicO>. Acesso em: 27 nov. 2012.
[10] Comissão de Política Nacional de Drogas – IBCCRIM. Política de Drogas, Cultura do controle e Propostas Alternativas. Disponível em: < http://www.ibccrim.org.br/site/comissoes/politicaDrogas.php>. Acesso em: 21 nov. 2012.
[11] CYMROT, Danilo. Da Boca do Lixo à Cracolândia: Mais do Mesmo. Boletim IBCCRIM. Ano 20, nº 233. Abril, 2012
[13] Droga Avança sobre Território Escolar. Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/eu-estudante/ensino_educacaobasica/2012/09
/03/ensino_educacaobasica_interna,320497/droga-avanca-sobre-territorioescolar.shtml>. Acesso em: 21 nov. 2012.
[14] CARNEIRO, Henrique. Entrevista concedida à Rede Brasil Atual. A Legalização das Drogas é Inevitável numa Democracia, garante especialista. Disponível em: <http://www.pragmatismopolitico.com.br/2012/08/legalizacao-das-drogas-e-inevitavel-numa-democraciagarante-especialista.htm>. Acesso em: 21 nov. 2012.
[15] GOMES, Luiz Flávio e BUNDUKY, Mariana Cury. 75% da População é contra a Legalização da Maconha. Disponível em:
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