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Tráfico Internacional de Mulheres e seus desdobramentos


Autoria:

Crisley Girola Voltolini


Advogada, formada na Universidade do Vale do Itajaí - Univali

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Resumo:

Objetiva-se com o referido artigo dar conhecimento a fato que ocorre diariamente em todo o mundo, o tráfico internacional de mulheres, que finda, geralmente, prostituição ou trabalhos escravos. Mostra-se também as consequências de tal crime.

Texto enviado ao JurisWay em 14/09/2011.

Última edição/atualização em 19/09/2011.



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Crisley Girola Voltolini

 

RESUMO: Objetiva-se com o referido artigo dar conhecimento de um fato que ocorre diariamente em todo o mundo, o tráfico internacional de mulheres, que finda, geralmente, prostituição ou trabalhos escravos. Exemplificando, mostra-se também o que decorre de tal ação, no caso, os resultados na vida das mulheres submetidas a tal crime, sua previsão e sanções legais, dentre demais curiosidades na área. Para a realização do trabalho, usa-se de livros, periódicos e buscas online dentro do contexto.

 

PALAVRAS-CHAVE: tráfico internacional de mulheres, tráfico de pessoas, prostituição, trabalho escravo.

 

1.      INTRODUÇÃO

 

Tendo em vista que o enfoque dado ao tema não corresponde a sua real dimensão, fez-se a eleição do tema com base na necessidade de conhecimento às implicações sociais decorrentes da impunidade dos responsáveis pela barbárie em que consiste o tráfico internacional de pessoas, em especial, de mulheres.

Primordialmente, é necessário que se entenda o tráfico de pessoas de uma forma mais ampla, para posteriormente, conceituar o tráfico internacional de mulheres.

Constituindo uma grave violação aos direitos humanos, o tráfico internacional de seres humanos é uma forma de crime organizado, que visa, geralmente, cercear a liberdade sexual e a liberdade de ir e vir. A maioria destes casos visa a exploração sexual, indistintamente de homens e mulheres, e por vezes, sendo crianças e adolescentes. Porém, não é este o único objetivo, uma vez que é possível observar também com a finalidade de trabalho escravo, utilizando-se de famílias inteiras para tal.

“O tráfico pode envolver um indivíduo ou um grupo de indivíduos. O ilícito começa com o aliciamento e termina com a pessoa que explora a vítima (compra-a e a mantém em escravidão, ou a submete a práticas similares a escravidão, ou ao trabalho forçado ou outras formas de servidão”(Jesus, 2003, p. XXIV).

Independente do motivo que leva os aliciantes a traficarem pessoas, o artifício utilizado para ludibriar as vítimas geralmente é uma grande proposta de emprego bem remunerado, ou ainda, uma possibilidade de uma nova vida em um país desenvolvido, rico, com maiores possibilidades de crescimento.

Como estas propostas são utópicas, o retorno ao país de origem torna-se inviável, tendo em vista que os traficantes trabalham de forma a fazer com que as vítimas estejam sempre com alguma espécie de dívida e, por vezes, retém seus documentos para que tal retorno não ocorra.

Entretanto, é visível o esforço das comunidades globais, governamentais ou não, no intuito de erradicar este problema. Leis mais severas vêm sendo criadas e atitudes mais enérgicas estão sendo tomadas, o que vem sendo motivo de grande preocupação para ativistas nacionais e internacionais, além de agentes governamentais.

 Uma grande preocupação encontra-se no Brasil, tendo em vista que é um dos maiores exportadores de crianças e mulheres para fins de comércio sexual, porém, o Governo desconhece as proporções do problema no país, devido à falta de controle fronteiriço e também sobre esta espécie de tráfico.

Em tese, portanto, o tráfico internacional de pessoas, mais especificadamente mulheres, nada mais é do que a retirada do seu país de origem, com fins geralmente de comércio sexual, tendo, na maioria das vezes, cerceada sua possibilidade de retorno ao seu lar.

Portanto, em breve análise, será explicitado este problema, que atinge toda a comunidade global, porém, com maior enfoque ao nosso país.

 

2.      BREVE HISTÓRICO E DESENVOLVIMENTO DO TRÁFICO INTERNACIONAL DE MULHERES.

 

Não há como se falar da história do tráfico internacional de mulheres no Brasil sem mencionar que a prática deste crime teve inicio com o tráfico de escravos, desde a época do Brasil Colônia.

Mas em se falando das mulheres, a história é bem mais antiga. Sendo a prostituição a profissão mais antiga do mundo, não é de se esperar que o transporte de mulheres com essa finalidade tenha relato diferente.

Damásio de Jesus, em seu livro Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças, relata que, durante 300 anos, navios negreiros transportaram milhões homens, mulheres e crianças com o objetivo do trabalho agrícola, porém, também com a finalidade de exploração sexual, servidão doméstica e violações físicas.

Logo após a época da escravidão, iniciando-se um novo século, um grande fluxo de pessoas advindas da Europa iniciou rota ao território brasileiro, além de outros países do Novo Mundo, fugindo da perseguição e da fome que assolava o definido território naquela época. Inicia-se aqui, portanto, o tráfico de mulheres brancas, principalmente crianças e adolescentes.

Há de se ressaltar que ainda hoje milhares de pessoas atravessam oceanos em busca de uma nova vida, uma nova possibilidade de emprego, ou fugindo de condições precárias e perseguição religiosa e, ludibriadas, tornam-se escravas sexuais e não conseguem mais retornar aos seus países de origem.

 

3.      A ROTA DO TRÁFICO – O DESTINO DESTAS MULHERES

 

Segundo levantamento da ONU, as mulheres brasileiras são mais comumente encontradas na Europa e na Ásia e, mais especificadamente, para a Espanha, Suriname e Holanda. Para a Europa também são levadas mulheres da Ucrânia e Rússia.

O estudo usa a Espanha como exemplo do crescimento da presença de vítimas brasileiras no mercado do sexo europeu. Os dados mais recentes, de 2006, dão conta de que um terço das mulheres vítimas de tráfico na Espanha eram brasileiras e paraguaias e chegaram ao país por meio dos aeroportos do Brasil. No ano 2000, as prostitutas de origem brasileira e paraguaia levadas ilegalmente à Espanha representavam 15% do total das vítimas de tráfico. (João Varela, 2010)

Segundo Walter Maierovitch apud João Verella, a questão do tráfico de mulheres para fins de prostituição deve ser analisada também vistas a questão econômica, uma vez que, no citado momento, a Espanha passava por um período financeiro forte e crescente. Também se faz necessário observar a demanda de clientes, que por vezes é exigente e de grande poder aquisitivo. “É notória a rotatividade na prostituição. Quem vai para um local como esse [prostíbulo] e, depois retorna e encontra as mesmas mulheres, não vai mais depois. Para não perder o cliente, eles trocam constantemente as mulheres.”

“A Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial (PESTRAF) realizou um amplo mapeamento das rotas utilizadas pelas redes de tráfico no Brasil, contabilizando 131 internacionais e 110 domésticas.” (Material complementar: principais rotas do tráfico de seres humanos, 2011). Partindo deste ponto de vista, podemos chegar a conclusão de que as rotas são bastante dinâmicas e das mais variadas possíveis e que sempre haverá uma nova ou antiga rota que poderá ser utilizada casa alguma delas receba a devida atenção das autoridades competentes.

Geralmente estas rotas passam por cidades que são próximas a portos, aeroportos e rodovias, devido a facilidade de mobilidade que estes locais geram. A tabela a seguir mostra, por regiões, a quantidade de rotas utilizadas dentro do país  para o tráfico das mulheres:

Região de Origem

Internacional

Interestadual

Intermunicipal

Total

Sul

15

09

04

28

Sudeste

28

05

02

35

Centro-Oeste

22

08

03

33

Nordeste

35

20

14

69

Norte

31

36

09

76

Total

131

78

32

241

Fonte: Pesquisa de Mídia – PESTRAF – Banco de Matérias Jornalísticas 2002/ Relatórios Regionais da PESTRAF

            Ao observar a determinada tabela, concluímos que nas regiões mas pobres do Brasil, a rotas e, consequentemente, o tráfico de mulheres, são em maior número, totalizando absurdas possíveis 241 rotas no país.

            Conseguinte, analisando ainda as rotas, os países de trânsito, ou seja, aqueles que servem de passagem e também de berço à retirada de mulheres, são países cujas fronteiras são de fiscalização precária, com grande extensão de divisas e facilidade na corrupção dos fiscais, enquadrando aqui, também, o Brasil.

            Em países subdesenvolvidos, o motivo da saída das mulheres geralmente é a dificuldade de acesso a políticas públicas de qualidade, desrespeito social, pobreza, e dentro destes, enquadra-se o Brasil. As mulheres que são traficadas destes locais geralmente são ludibriadas com promessas de bom emprego como dançarinas, modelo, casamento. Os aliciadores geralmente camuflam-se como agencias de emprego ou casamento.

             Já os países de destino dessas mulheres são, em geral, desenvolvidos ou emergentes, onde o poder aquisitivo da população é maior e há grande facilidade no pagamento de bons valores pelas mulheres traficadas.

           


Fonte: Pesquisa de Mídia – PESTRAF / Banco de Matérias Jornalísticas 2002

           

4.      AS PESSOAS E O LUCRO POR TRÁS DO TRÁFICO INTERNACIONAL DE MULHERES

 

Como tudo na sociedade capitalista, o que se visa com o tráfico de mulheres é o lucro. “O tráfico internacional de mulheres e crianças movimenta, anualmente, de US$ 7 a US$ 9 bi. Somente perde, em lucros, para o tráfico de drogas e o contrabando de armas.” (Tráfico de mulheres, 2003).

Já no que diz respeito ao individual, em si, “as mulheres chegam a ser negociadas a US$ 20 mil”. (Rabelo, 2011).  Um absurdo, tenda em vista todos os direitos cerceados da vida dessas mulheres. São diversos anos colocados à disposição de trabalhos forçados e exploração sexual.

Por outro, no Brasil, segundo notícia vinculada no periódico Diário News, um cafetão pode comprar uma jovem sequestrada pelo equivalente a cerca de R$ 4,5 mil, mas existem leilões de adolescentes e meninas anunciadas como “virgens”. Preço: cerca de R$ 10 mil.

Porém, para que valham tal valor, as mulheres devem enquadrar-se no que os “clientes” buscam. “Mulheres jovens (entre 18 e 21 anos), solteiras e de baixa escolaridade são as principais vítimas das redes internacionais de tráfico de seres humanos que operam no Brasil.” (PESQUISA traça perfil de mulheres deportadas ou não admitidas na Europa, 2006)

Por sua vez, os aliciadores, são, em sua grande maioria, homens com bom grau de instrução, entre 31 a 40 anos e também que vivem em relações estáveis. Acredita-se que os traficantes de pessoas também pratiquem outros crimes, porém, escolhem o tráfico de seres humanos devido ao grande lucro e ao baixo risco inerente ao negócio, tendo em vista que a “mercadoria” pode ser reutilizada quantas vezes forem necessárias.

 

4.1 Histórias de mulheres traficadas

 

            Diversas são as possíveis explicações dadas ao sofrimento humano que o tráfico causa. “A exposição à situação do tráfico, embora guarde suas especificidades, é fruto da articulação perversa entre hierarquias de genro, raça e classe e a ação do crime organizado que, por sua vez, encontra terreno propício para agir graças a essas mesmas hierarquias”. (Portella, 2003, p. 37).

A vontade de transformar a própria vida somadas as razões estruturais, sejam elas de raça, classe ou gênero, colocam as mulheres traficadas em uma armadilha dupla. A primeira armadilha a que submetem-se é a que lhes deixa poucos modos de sobrevivência, além dos tipicamente femininos: prostituição, trabalho doméstico e casamento. Como segunda armadilha, é um simples resultado da primeira. Uma vez que se envolvem com o tráfico, “estas mulheres passam a fazer parte do grupo de mulheres moralmente condenável” (Portella, 2003, p. 40).

A revista Claudia fez um belíssimo trabalho ao entrevistar algumas mulheres que sofreram com o tráfico e, em determinado caso, com familiares, vistas que a vítima não mais retornou com vida para o berço da família com vida.

Escrava na Argentina

Nome: R.O.

Idade: 23

Local de aliciamento: Foz do Iguaçu, Paraná

Profissão: cozinheira, zeladora e empregada doméstica

 

O aliciamento

R.O.  vivia com os três filhos, sua mãe e seu padrasto em um bairro modesto de sua cidade. Começou a trabalhar aos 16 anos, com o primeiro grau incompleto. Sempre fez serviços sem carteira assinada e recebia um salário mínimo. Precisando de dinheiro para criar os filhos, optou pela prostituição, pois ganharia por noite o que ganhava em um mês. Já havia recebido várias propostas para ir ao exterior. Conheceu várias moças que tinham ido para Argentina e ‘tiveram sucesso’ na prostituição. De acordo com R.O., antes desse país entrar no atual quadro de grave crise econômica, o número de mulheres que iam para lá era grande, por ser fácil de entrar. Uma amiga que tinha o contato com o aliciador a convidou para ir. A viagem de R.O. foi combinada por telefone, a passagem paga pelo aliciador e o transporte até o país feito por um taxista que participava do esquema.

Lá, a responsável pela casa noturna onde trabalharia lhe esperava. Foi levada de carro para a Wiskheria Serena, na Província de Córdoba. Permaneceu nesse mesmo lugar durante os quatro meses em que esteve na Argentina. Vivia numa casa ampla, com outras nove meninas, várias delas brasileiras.

 

Todas prisioneiras

As condições de trabalho previam que metade do valor arrecadado com os programas ficasse com a casa e a alimentação e outros "gêneros de primeira necessidade" consumidos fossem descontados da metade que cabia às prostitutas. O pagamento deveria ser feito quando a moça deixasse a casa. Como os exploradores sempre alegavam que não tinham o dinheiro todo, elas eram obrigadas a permanecer, mesmo contra a vontade, na esperança de receber o que lhes era devido. A casa oferecia preservativos e, em casos urgentes, as moças eram levadas para o hospital. Os gastos com remédios também eram descontados. Segundo R.O., raramente as contas das mulheres e da casa coincidiam. As condições de habitação não eram boas: as dez meninas dormiam em apenas dois quartos, o local era sujo, distante do comércio local e todas eram encarregadas da limpeza e da manutenção. No entanto, o mais grave é que as mulheres não podiam sair do quintal da casa.

A rotina diária consistia em trabalhar à noite enquanto houvesse clientes. Durante o dia, tinham que cuidar da casa e fazer a comida. Quando as normas de disciplina da ‘casa’ eram infringidas, as mulheres apanhavam do dono do bordel.

Enquanto esteve lá, ela não falou com a sua família ou com os amigos. Contava que, se falasse, pediriam que ela voltasse imediatamente, pois não concordavam com sua ida e tinham medo de que ela sofresse algum tipo de violência. (Mulheres traficadas)

 

A partir deste depoimento, tem-se uma leve noção de como é o dia a dia de uma mulher traficada. Como na maioria dos casos, o motivo é uma proposta de vida melhor e dinheiro fácil. Porém, as condições de vida no novo país em quase sua totalidade são precárias e as mulheres vivem em cárcere privado.

Baiana, menor traficada

Nome: não informado

Idade: 16 anos

Local de aliciamento: interior da Bahia

O aliciamento

O envolvimento da adolescente de 16 anos - identificada aqui como Baiana - com o tráfico de mulheres para exploração sexual começou quando ela conheceu uma brasileira que morava na Suíça. Com ela, estabeleceu uma relação de confiança, chamando-a de "tia". A mulher logo lhe propôs trabalhar e estudar no país europeu. “Eu perguntei a ela como seria viver na Suíça. A resposta foi: "O país é maravilhoso, você terá tudo o que sempre sonhou e ainda liberdade.” Baiana contou a seus pais e conseguiu convencê-los. Poucos dias depois, a "tia" alertou sobre a questão da idade e propôs que providenciassem um documento falso -- ela enviou o dinheiro da Suíça para o pagamento do passaporte e a "sobrinha" já podia pegar a passagem aérea.

Casamento forjado, prostituição e aborto

Em Zurique, Baiana foi recebida por dois homens e pela "tia", que a obrigou a ter um encontro com um deles: “Perder minha virgindade com um homem podre como aquele, foi difícil.”, conta a adolescente. Esse homem e a "tia" fizeram um acordo no qual ele se casaria com Baiana, que, em troca, deveria se prostituir. Cerca de cinco dias depois, a "tia" a levou para trabalhar em uma sauna. Metade do dinheiro recebido deveria ser repassado à mulher. O restante seria destinado a pagar despesas do apartamento em que passou a morar com o “marido”. Baiana não tinha acesso ao que ganhava, tudo era tomado pela dupla sob a argumentação de que o estava juntando para pagar sua viagem para visitar a família no Brasil.

O "marido" chegou a engravidar a adolescente. A "tia" propôs um aborto, que foi realizado no terceiro mês de gravidez. No quarto dia após a cirurgia, Baiana foie obrigada a voltar para a prostituição. Ela sentia muitas dores e chegou a ter hemorragia durante uma relação. A partir daí, Baiana começou a se afastar da dupla que a escravizava. Iniciou um contato pessoal com um cliente, que passou a ajudá-la como amigo. Deixou de trabalhar para a "tia" perversa e foi morar em um hotel. Conforme diz, o amigo tornou-se um namorado, reduziu o número de vezes em que se prostituía. Atualmente, há um processo na justiça da Suíça acompanhado por uma ONG. (Mulheres traficadas)

Menores de idade, especialmente meninas, têm sonhos e geralmente buscam realizá-los. Neste caso, a possibilidade de estudar no exterior e ter um futuro promissor é algo realmente tentador. Ainda com o consentimento dos pais, a adolescente mudou o rumo de sua vida para sempre e, mesmo após deixar de trabalhar para o aliciador inicial, ainda foi obrigada a prostituir-se, ainda que em numero menor de vezes.

Vendida por 300 dólares em Israel

Nome: Kelly Fernanda Martins

Idade: 26 anos

Local de aliciamento: Rio de Janeiro, Rio de Janeiro

Trabalho: Foi guardadora de carros e faxineira

Data da morte: 17 de outubro 1998

O aliciamento

Em agosto de 1996, Kelly estava em uma festa junina quando foi abordada por duas moradoras do bairro de Ricardo de Albuquerque, na zona norte da cidade do Rio de Janeiro, que tentaram convencê-la a trabalhar em Israel, onde ganharia muito dinheiro. Desde então, ambas passaram a frequentar sua casa, tentando convencer Kelly, que, de acordo com sua mãe, não queria ir. Uma das aliciadoras chegou a contar que já havia trabalhado como babá em Tel Aviv e que, se Kelly fosse, ganharia 1 500 dólares por mês. Cerca de 20 dias depois, Kelly aceitou o convite para trabalhar em lanchonetes ou em casas de família.

Ao chegar no aeroporto de Paris, de onde pegaria outro avião para Israel, Kelly telefonou para a mãe dizendo que a história “não era bem aquela” que lhe haviam prometido: com o pretexto de providenciar o visto de entrada em Israel, dois homens tomaram-lhe o passaporte. Ao chegar, eles a levaram para uma boate. Sem entender o idioma local e não sabendo como recorrer à Embaixada Brasileira, Kelly se viu obrigada a prosseguir no esquema.

Ela avisou à mãe que foi vendida por 300 dólares para uma quadrilha, aparentemente chefiada pelo dono de uma boate, que a mantinha em cárcere privado e obrigava-a a se drogar e a se prostituir com cerca de 10 homens por noite, para receber os 1 500 dólares que lhe haviam sido prometidos.

Morta em Israel

No dia 17 de outubro, a mãe recebeu um telefonema anônimo dizendo que Kelly estava em coma. No dia seguinte, recebeu uma ligação avisando que sua filha havia morrido de overdose e pedindo 3 500 dólares para as despesas do traslado do corpo para o Brasil.

A mãe de Kelly procurou o jornal O GLOBO e suas denúncias apontaram para a existência de uma rede de tráfico de mulheres para exploração sexual comercial. De acordo com o jornal, a Divisão de Assistência Consular do Ministério das Relações Exteriores, em Brasília, informou no dia 23 de outubro que a Polícia de Israel suspeitava que ela havia morrido de overdose, mas ainda não havia fornecido detalhes sobre as circunstâncias que envolveram a morte de Kelly nem onde o corpo da moça foi encontrado. Refutando a versão da polícia israelense, a avó de Ana Lúcia (tia de Kelly, que também estava em Israel), disse que a neta contou, por telefone, que um dia antes de morrer, Kelly foi procurá-la na boate onde trabalha. Depois que se despediu dela, escutou gritos de socorro e, quando chegou à rua, viu um homem tapando a boca de Kelly com as mãos, enquanto outro a dopava.

O Itamaraty informou que a investigação e a aplicação penal cabiam ao país onde o fato ocorreu. O Brasil, neste caso, se encarregaria apenas de acompanhar o processo. Também não soube dizer quem entregou à embaixada, em Tel Aviv, o dinheiro para que o corpo de Kelly fosse embalsamado e enviado para o Brasil.

No dia 27 de outubro, o corpo de Kelly chegou ao Rio de Janeiro, mas a polícia de Israel ainda não havia divulgado o laudo com a causa da morte. Segundo a mãe de Kelly, o rosto dela estava todo machucado e cheio de hematomas nas partes laterais: ‘faltava até um dente’.(Mulheres traficadas)

Finalmente, o mais trágico dos depoimentos recebidos pela revista. Após uma busca por vida e dinheiro fácil, a jovem, convencida por duas pessoas até então desconhecidas dirigiu-se à Israel, onde, provavelmente devido a agressões, veio a falecer.

O caso ganhou repercussão e dois dias após sua morte, a polícia resgatou outras 8 brasileiras do mesmo bordel onde Kelly trabalhava, dentre elas, sua tia. “Diante desses fatos, as primeiras investigações da polícia de Israel levaram à prisão de um casal de israelenses integrantes da máfia russa, que passou a ser apontada como a instituição criminosa que controla o tráfico de mulheres para exploração sexual comercial. Após a prisão, os familiares de Kelly e as oito brasileiras pararam de receber ameaças.” (Mulheres traficadas)

      Não somente o desta jovem é o fim morte, como de tantas outras que, por vezes, não morrem naturalmente, mas são vítimas de tortura e homicídio. Diversas vezes a família não chega a ter contato com a mulher traficada e nem sabem de sua morte, e a ilusão de receber o dinheiro que esta ganharia trabalhando, não passa de uma utopia.

 

5.      DIFERENÇA ENTRE TRÁFICO E IMIGRAÇÃO ILEGAL

 

            Assim como o tráfico de seres humanos vem aumentando, aumenta também a imigração ilegal e pelos mesmos motivos: miséria, fome, novas oportunidades em vista. Mas não há de se confundir tais definições.

            O site Portal da Segurança, de Portugal, nos traz uma tabela comparativa, onde podemos analisar com maior clareza as diferenças entre o tráfico de seres humanos e a imigração ilegal.

Tráfico de Seres Humanos

Imigração Ilegal

Tem de envolver um elemento de força, fraude ou coerção (real, percebida ou implícita).

O indivíduo, em casos de imigração ilegal, geralmente coopera.

Exploração laboral e/ou trabalho forçado.

Não existe coerção real ou implícita.

Os indivíduos traficados são vítimas.

No caso da imigração ilegal, os indivíduos não são vítimas, antes encontram-se em violação da lei.

Escravatura, limitação de movimentos ou isolamento, sonegação de documentos.

As pessoas são livres de partir, mudar de emprego, etc.

Não implica necessariamente o cruzamento de fronteiras internacionais.

Facilita a entrada ilegal de um indivíduo num país que não o seu.

O indivíduo está a “trabalhar”.

A imigração ilegal implica, apenas, o cruzamento de uma fronteira internacional.

Quem viola a lei são os traficantes ao usufruir dos indivíduos como se estes fossem mercadorias.

Os indivíduos estão a violar a lei através da permanência no país ou entrada ilegal.

Fonte: Portal da Segurança, Portugal. Disponível em: http://www.portalseguranca.gov.pt

 

Analisando a tabela em questão, chega-se a conclusão de que, no tráfico de seres humanos, as vítimas são as pessoas que saem do seu lar com destino ao trabalho semi-escravo e a uma vida onde são utilizados como mercadoria. Por outro lado, na imigração ilegal, a vítima é o Estado que tem sua fronteira violada, sendo que os imigrantes ilegais não tem seus direitos cerceados.

Porém, de certa forma, é possível pensar que o envolvimento dessas mulheres com o tráfico seja fruto de sua própria vontade. Entretanto, há de se analisar que são ludibriadas, convencidas a tomarem a decisão da busca de uma nova vida através da mudança da país.

 

6.      MEDIDAS DE CONTROLES

 

Tendo em vista que o Brasil é um país de fonte, e não de destino, vê-se dificuldade no combate ao tráfico que, por nossa lei, gera pena de 3 a 8 anos. Segundo Damásio de Jesus, “a maior barreira policial é a falta de colaboração das famílias”. Porém, não é este o único motivo. Há também grande incompatibilidade da lei brasileira com a de outros países. Um exemplo é que na Espanha, o comércio sexual é permitido, e a polícia só passa a intervir se receber denúncia de cárcere privado.

            A maioria das campanhas voltadas ao combate do tráfico de mulheres, seja interno ou internacional, ocorre principalmente na época do Carnaval, onde a quantidade de turistas, e dentre eles, criminosos, aumenta significativamente no Brasil.

            No ano de 2011, uma das campanhas mais significativas foi feita pelo estado de São Paulo. As mulheres brasileiras são naturalmente belas, o que as enquadra com muita facilidade na espécie de mulheres que o tráfico busca. Em 25 de fevereiro de 2011, foi lançada no pré-Carnaval, a campanha “Mulheres traficadas – BASTA!”, visando conscientizar e alertar as mulheres que eventualmente participariam da festa popular sobre os riscos encontrados neste tipo de crime.

            Em 2010, ainda uma significativa campanha foi realizada pelo Ministério da Justiça, que abrangeu dez grandes cidades do país. Entre cartazes, folhetos e diversas outras publicidades, a face da campanha foi distribuída principalmente em rodoviárias, aeroportos e shoppings.

            “O combate ao tráfico de pessoas integra os projetos do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), lançado em 2007.”(Allan, 2010). Desde então, o tráfico de mulheres vem recebendo grande atenção do Governo com o intuito de tentar erradicar este crime, utilizando-se da conscientização das pessoas que possam ser vítimas de tal crime.

            Mas não é somente de 2007 em diante que temos campanhas neste sentido. Uma campanha bastante vasta também foi realizada em 2004, nos mesmos moldes que os atuais.

            Porém, há de se analisar não somente as campanhas relacionadas a prevenção, como também as leis já em vigor, que visam reprimir quem vem a cometer este crime.

“Numa perspectiva de direitos humanos, algumas OSCs (Organização da Sociedade Civil) internacionais, tais como a Aliança Global contra o Tráfico de Mulheres, a Fundação contra o Tráfico de Mulheres e o Grupo Jurídico Internacional de Direitos Humanos, vêm definindo, desde 1999, os Padrões de Direitos Humanos (PDH) para o Tratamento de Pessoas Traficadas” (Jesus, 2003, p.11).

Dentro deste contexto, é factível que não somente internamente realizam-se campanhas, projetos e leis que visam proteger os direitos de pessoas traficadas, especialmente as mulheres. Neste teor, Damásio de Jesus nos trás os principais padrões que visam a proteção de tais pessoas: o principio da não-discriminação; segurança e tratamento justo; acesso a justiça; acesso as ações civis e a reparação; estatuto do residente (o Estado providencia visto de residência temporária), saúde e outros serviços; repatriação e reintegração e cooperação entre os Estados. Nestes conceitos, não há algum menos ou mais importante, sendo necessário que todos tenham atuação na vida da mulher traficada.

 

6.1  A lei brasileira

 

            Após anos sem que o tráfico internacional de mulheres fosse tratado como crime, em 1890, no Código Penal, aparece em seu artigo 278, pela primeira vez, o crime de tráfico e prostituição forçada.

Art. 278. Induzir mulheres, quer abusando de sua fraqueza ou miseria, quer constragendo-as por intimidações ou ameaças, a empregarem-se no tratico da prostituição; prestar-lhes, por conta propria ou de outrem, sob sua ou alheia responsabilidade, assistencia, habitação e auxilios para auferir, directa ou indirectamente, lucros desta especulação:

Penas – de prisão cellular por um a dous annos e multa de 500$ a 1:000$000. (Brasil, Código Penal de 1890)

Nota-se a discriminação com a mulher na determinada época, uma vez que a “fraqueza”, assim dita no referido artigo, diz-se não a sua condição física, mas sim ao simples fato de ser mulher.

Mais tarde, o assunto é também brevemente abordado na Consolidação das Leis Penais de 1932, ainda que de forma indireta. Porém, atualmente, o Código Penal de 1940 aborda o tema de forma mais clara. Em sua parte geral, criminalizou o referido ato no artigo 231.

6.1.2 Atualidade

Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual 

Art. 231.  Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a exercer a prostituição ou outra forma de exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro. 

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos.

 § 1o  Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.

§ 2o  A pena é aumentada da metade se:

I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos;

II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;

III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou

IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.

 § 3o  Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Brasil, Código Penal de 1940)

 

Atualmente, sob a luz do Código Penal, “bem jurídico protegido é a moralidade pública sexual e os bons costumes.” (Bittencourt, 2007, p. 103). Há também o entendimento de que se o praticante do crime desconhecia a atividade a ser desempenhada pela vítima, este não age com dolo, portanto, não há crime, sendo este um erro de tipo, porém, há um entendimento de que, “para a consumação do delito basta a entrada ou saída da pessoa do território nacional, não se exigindo o efetivo exercício da prostituição. A tentativa é perfeitamente passível de ocorrer” (Mirabete, 2008, p. 469).

No caso tipificado nos §§ 2º e 3º, “se a figura qualificada for praticada com violência ou grave ameaça, haverá a soma de penas, desde que a violência constitua em si mesma crime.” (Bittencourt, 2007, p. 106). Temos ainda, como ação penal, a ação penal pública incondicionada.

Além do tráfico internacional de pessoas, o atual Código Penal ainda faz referência ao tráfico interno, em seu artigo conseguinte, 232.

Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual 

Art. 231-A.  Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual: 

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

 § 1o  Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la.

 § 2o  A pena é aumentada da metade se: 

 I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos; 

 II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato; 

 III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou

IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude.

§ 3o  Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa. (Brasil, Código Penal de 1940)

 

Ainda sob as palavras do atual Código Penal, há de se observar o artigo 245, § 2º, vez que trata da possibilidade de obtenção de lucro ao enviar menor de idade ao exterior, ainda que não especificadamente para trabalhos escravos ou exploração sexual.

Art. 245

[...]

§ 2º - Incorre, também, na pena do parágrafo anterior quem, embora excluído o perigo moral ou material, auxilia a efetivação de ato destinado ao envio de menor para o exterior, com o fito de obter lucro.(Brasil, Código Penal de 1940).

           

6.1.3 Consumação e tentativa

           

            Para que haja a consumação, não é necessária a exploração sexual ou física propriamente dita, basta que sejam ofendidas as liberdades garantidas de ir e vir. Portanto, embora a mulher traficada consiga livrar-se do trabalho em que se mantém obrigada, o crime já teve sua consumação. “O crime, portanto, exige tão somente que o deslocamento da mulher tenha sido com propósito a prostituição” (Jesus, 2003, p. 101).

            O legislador, no que tange ao modo da tentativa, à admitiu, vistas que as Convenções Internacionais obrigam que o crime deve ser punido, ainda que seja somente na forma tentada.

 

6.2  Luzes ao Direito Internacional

 

            O tráfico de pessoas é um problema que ultrapassa a esfera nacional de um Estado, pois se trata de fato que desperta interesse de toda a comunidade internacional, considerando que, geralmente, há um deslocamento da vítima de um país para outro, além dos países de trânsito, que servem de ponto intermediário até que se chegue ao local de destino.” (Paula, 2011)

            Envolvendo não somente o campo nacional, mas também o internacional, organizações internacionais e governos nacionais vem buscando cada vez mais trabalhar em programas e políticas para a erradicação do crime de tráfico de pessoas.

            Em se falando de organização internacional, é de papel fundamental a participação da ONU – Organização das Nações Unidas, vez que através dela nos foi apresentada a Declaração dos Direitos Humanos, em 1948, sendo esta, aceita por 191 países.

            Partindo deste ponto, a Declaração dos Direitos Humanos trás alguns princípios ditos fundamentais (Universalidade, Inalienabilidade e Interdependência), além da liberdade, que devem ser garantidos a todas as pessoas.

            Ao falarmos em universalidade, entende-se que os direitos humanos devem valer para todos.     Já a tratarmos da inalienabilidade, fala-se que os direitos decorrentes da referida declaração são inerentes à pessoa desde seu nascimento. Vemos aqui, então, os primeiro direitos retirados às mulheres traficadas, vistas que são privadas do apoio que necessitam no momento do tráfico e da vida pós-tráfico.

             No quesito interdependência, significa dizer que os direitos associam-se em consequência de suas interdependias e relações, ou seja, tais direitos não podem ser vistos de formas diferentes, tendo em vista que não há um direito que seja mais importante que o outro.

            Por fim, no que tange a liberdade, esta é retirada da mulher traficada desde o primeiro momento. Sua liberdade de conviver com seus amigos e familiares sob o teto de seu lar, de ir e vir, de decidir retornar ao país de origem, dentre outros.

            “Os instrumentos internacionais de direitos humanos impõem responsabilidades aos países no sentido de respeitarem e assegurarem a proteção legal, incluindo a obrigação de prevenir e investigar violações, tomar as medidas apropriadas contra os seus perpetradores e encontrar mecanismos de proteção e de reparação para aqueles que sofreram as consequências desses fatos ilícitos” (Jesus, 2003, p. 27).

           

6.2.1 Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas e Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional de Palermo

 

Claramente orientados para o controle do crime, a Convenção e o Protocolo fora elaboradas dentro de um conceito de luta global contra o crime organizado.

Em 1999, na 8ª seção que foi realizada em Viena, na qual o Brasil teve participação, a Comissão sobre Prevenção de Crime e Justiça Criminal da ONU, através do Conselho Econômico e Social, a adoção de certo numero de resoluções de importante relevância para o combate do tráfico de seres humanos. “Entre eles, estavam incluídas as resoluções relativas a adoção da Convenção contra o Crime Organizado Transnacional e do Protocolo sobre o Programa da ONU de Prevenção do Crime e Justiça Criminal”.(Jesus, 2003, p. 39). No protocolo, ainda foi ressaltado o intuito de desenvolver um Programa Global contra o tráfico de pessoas.

Já em 2000, no 10º Congresso da ONU sobre Prevenção do Crime e Tratamento dos Delinquentes, também ocorrida em Viena e com participação brasileira, foi amplamente discutido o impacto que o tráfico das mulheres tem sob suas vidas. Assume-se, daqui por diante, então, a “responsabilidade de desenvolver formas mais efetivas de colaboração para erradicar o tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças” (Jesus, 2003, p. 39).

 

6.2.2 Direitos Humanos das Mulheres

           

            Preocupada com a discriminação e a violência que sofrem as mulheres em todo o mundo, a Conferência Mundial Sobre Direitos Humanos de Viena, em 1993, passa a adotar a expressão Direitos Humanos das Mulheres, buscando a igualdade entre estas e os homens.

            Estes direitos nada mais são dos que os mesmos que direcionados a todos os seres humanos, porém, com enfoque direto às mulheres, vistas que são à um ponto de vista físico, vítimas mais frágeis, portanto, de fácil coação.

            “A Conferência Mundial sobre os Direitos Humanos apela à eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres, quer implícitas quer explícitas.” (Conferência mundial sobre direitos humanos). Não há como se falar em igualdade, se não forem realizados esforços para que este termo seja alcançado.

            Desta forma, o que se busca é a inserção da mulher em todos os campos de atuação, quer sejam na tomada de decisões ou cargos imponentes. Porém, de fato, não é bem o que acontece. As mulheres, pelo simples fato de serem do sexo feminino, sofrem diversas violações dos seus direitos, dentre elas, a privação de direitos básicos, principalmente quando tratamos do tráfico internacional. A educação, saúde, garantia de bom emprego no mercado de trabalho, participação política, maternidade e sexualidade de bom padrão, são praticamente retirados por completo de suas vidas.

            Mesmo com o reconhecimento da igualdade das mulheres e de seus respectivos direitos, isto não foi suficiente para acabar com o tráfico e muito menos com a discriminação.

 

CONCLUSÃO

 

            Além de representar um desafio global, o tráfico internacional de pessoas, especialmente mulheres, apresenta, ainda, grande desafio para as políticas de direitos humanos, vistas que a maioria destes direitos que deveriam ser inerentes e perpétuos a todas as pessoas, são cerceados bruscamente das vidas das pessoas traficadas.

            Crescendo em ritmo acelerado nos últimos anos, esta espécie de crime organizado vem recebendo cada vez mais atenção da sociedade internacional, buscando não somente o combate, mas também a prevenção através da conscientização das vítimas em potencial.

            Sendo escolhida esta espécie de crime, graças as grandes vantagens lucrativas e o ínfimo risco inerente ao negócio, o tráfico vem sendo vislumbrado como um crime fácil.

            A legislação brasileira e internacional vem buscando cada vez mais identificar as vítimas e criminosos em potencial, procurando barrar este crime bárbaro. Quem sabe, uma possível e prática solução fosse o controle mais fechado em relação às fronteiras, aeroportos, portos e rodoviárias, tendo em vista que são os caminhos tomados para a leva das mulheres traficadas a outro país.

            É importante ressaltar que, embora exista também o tráfico de homens e meninos, o tráfico de mulheres é significativamente maior. Portanto, deve-se dar maior atenção ao ponto mais fraco destas histórias de barbárie: as mulheres traficadas.

            É imprescindível que haja a efetiva responsabilização penal dos traficantes, porém, não há de se esperar que tal crime seja completamente erradicado, vistas que encontra-se na sociedade brasileira  desde cerca de 1700 e cresce a cada ano. “Apesar da importância de tal medida, não se pode olvidar que o arcabouço jurídico como um todo, e o ordenamento jurídico-penal em particular, não é e nunca conseguiu ser determinante de transformações sociais”.(Jesus, 2003, p. 203).

            Porém, cabe ressaltar que o Direito Penal representa um mecanismo de grande importância no que tange a um a um poder central e institucional. É através deste que a sociedade vive em controle, harmonia e paz social.

            O tráfico internacional de mulheres deve ser fortemente combatido, levando em consideração o sofrimento e todos os direitos arrancados das vítimas, e punidos os responsáveis pelas atrocidades cometidas dentro deste crime. Não é necessário que sejam assistidas a mais mortes ou fins trágicos. O começo de uma sociedade organizada começa por sua educação. Educar é prevenir.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial: volume 4. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

 

BRASIL. Código (1940). Código Penal, promulgado em 7 de dezembro de 1940. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ >. Acesso em: 11 mai. 2011.

 

BRASIL. Código (1890). Código Penal, promulgado em 11 de outubro de 1890. Disponível em: < http://www6.senado.gov.br >. Acesso em: 11 mai. 2011.

 

CONFERÊNCIA mundial sobre direitos humanos: declaração de Viena e programa de ação. Disponível em: < http://www.eselx.ipl.pt > Acesso em: 12 mai. 2011

 

JESUS, Damásio de. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças – Brasil. São Paulo: Saraiva, 2003.

 

MATERIAL complementar: principais rotas do tráfico de seres humanos. Disponível em: < http://www.dhnet.org.br >. Acesso em: 16 mai. 2011.

 

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal – parte especial. v. II. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

 

MULHERES traficadas. Revista Claudia. Disponível em: < http://claudia.abril.com.br >. Acesso em: 16 mai. 2011

 

PAULA, Cristiane Araujo de. Tráfico internacional de pessoas com ênfase no mercado sexual. Disponível em: <>. Acesso em: 16 mai. 2011.

 

PESQUISA traça perfil de mulheres deportadas ou não admitidas na Europa. Disponível em: < http://www.unodc.org/>. Acesso em: 16 mai. 2011.

 

PORTAL DA SEGURANÇA. Principais diferenças: tráfico de seres humanos e imigração ilegal. Disponível em:< http://www.portalseguranca.gov.pt >. Acesso em: 17 mai. 2001.

 

PORTELLA, Ana Paula. Rotas da exclusão: Tráfico de mulheres e exploração sexual em Pernambuco. Recife: SOS CORPO – Gênero e Cidadania, 2003.

 

RABELO, Carina. Campanha contra o tráfico de mulheres no Carnaval. Disponível em: < http://www.justica.sp.gov.br >. Acesso em: 08 mai. 2011.

 

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TRÁFICO de mulheres: Preço por "virgens" custa R$ 10 mil. Disponível em: < http://www.diarionews.com.br >. Acesso em: 14 mai. 2011.

 

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