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VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL


Autoria:

Isabela Britto Feitosa


Advogada atuante nas áreas Cível, Trabalhista, Previdenciária e Administrativa.

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Resumo:

O valor probatório do inquérito policial é considerado muito reduzido ou até de nenhum valor, por conta da possibilidade de ocorrência de vícios e falhas por parte de agentes despreparados, ou, por conta de agentes mal intencionados.

Texto enviado ao JurisWay em 16/06/2011.



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1 INTRODUÇÃO

A prática de crimes e contravenções penais faz com que o Estado se utilize do seu ius puniendi, caracterizado em virtude de processo. A pretensão punitiva do Estado só será deduzida em juízo quando se propuser uma Ação Penal que determinará a sanção aplicada em cada caso específico.

Para que o Estado exerça o dever de punir, necessário se faz colher o mínimo de elementos probatórios que indiquem a ocorrência do fato e de sua autoria. O meio mais comum, mas não exclusivo, é através do Inquérito Policial, conforme se extrai do parágrafo único, do art. 4º, do Código de Processo Penal, uma vez que as autoridades administrativas também poderão, nos casos especificados em lei, desempenhar a mesma função da autoridade policial.

Inquérito Policial é um procedimento investigatório prévio, constituído por uma série de diligências, cuja finalidade é a obtenção de provas para que o titular da ação penal possa propô-la contra o autor da infração penal (CPP, art. 4º).

Trata-se de procedimento persecutório de caráter administrativo, segundo Capez (2008, p. 459), instaurado pela autoridade policial que tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública (CF, art.129, inciso I), e o querelante, titular da ação penal privada (CPP, art.30); como destinatário mediato tem o juiz, que se utilizará dos elementos de informação nele constantes, para o recebimento da peça inicial e para formação do seu convencimento quanto à necessidade de decretação de medidas cautelares.

O inquérito policial nada mais é do que uma fase preparatória para o surgimento da fase acusatória na ação penal. Assim a doutrina costuma argumentar que o inquérito não passa de um procedimento administrativo, em que o contraditório não poderá estar presente, pois o caráter investigatório do inquérito se destina a auxiliar à atuação do Ministério Público, que é o titular da ação penal.

A constituição Federal, ressalvando a prisão, não admite nenhuma outra forma de restrição de direitos individuais do ser humano, desta forma, entende-se que o contraditório deve ser aplicado a todo indiciado que também deverão ter direito à defesa.

Tanto a ampla defesa como o contraditório deve estar presente em qualquer forma de acusação, mesmo que esta não seja formal, ou seja, quando ainda não houver inquérito instaurado, o acusado possui o direito de se defender ou de ser defendido pelos meios legais, vale observar que se este não possuir advogado, o Estado deverá nomear defensor público para que não se configure violação dos direitos subjetivos daquele a quem se imputa a autoria do crime.

O inquérito policial tem por finalidade colher todas as informações possíveis e legais a respeito do fato criminoso, para que o titular da ação penal - o Ministério Público - possa instaurar a competente ação penal e exercer o jus persequendi. Saliente-se, pois, que eventuais vícios ou irregularidades no inquérito policial, destinados à formação da opinio delicti do titular da ação penal, não têm o condão de infirmar nulidades processuais à validade jurídica do subseqüente processo penal condenatório. Estas nulidades só podem ser inculcadas aos atos praticados ao longo da ação penal condenatória.

Entretanto, questiona-se a validade do inquérito policial como prova no curso da ação penal, bem como o fato deste ser ou não imprescindível para a concretização da ação penal.

O valor probatório do inquérito policial é considerado muito reduzido ou até de nenhum valor, por conta da possibilidade de ocorrência de vícios e falhas por parte de agentes despreparados, ou, por conta de agentes mal intencionados, os quais, tendo a incumbência de colher as provas que integrarão o bojo do inquérito, podem aproveitar-se da natureza inquisitiva do inquérito policial, procedendo às investigações criminais de maneira atentatória aos desígnios de imparcialidade e justiça, contrariando, por conseguinte, os ditames constitucionais conferidos ao indiciado, além de violar o dever ético assumido no ingresso para o exercício do múnus público.

Divididos em capítulos, a pesquisa ora manejada, apresenta inicialmente uma breve análise acerca do “inquérito policial”, abordando seus elementos caracterizadores, espécies, características. Como suporte aos argumentos desenvolvidos, considerou-se, basicamente, as doutrinas pátria e alienígena, à lume da Constituição Federal, especializadas no assunto sob exame, bem como o direito positivo brasileiro, além de alguns julgados dos nossos Tribunais e, ainda, artigos de internet, revistas, jornais dentre outros, como melhor serão apresentados.

Destarte, verifica-se a vertente jurídico-teórica como método de pesquisa aplicável, vez que serão fontes diversas bases orientadoras do que será então disposto, quer seja em linha ideológica, quer seja em linha conceitual.

O seu desenvolvimento dar-se-á utilizando-se o método descritivo-compreensivo, haja vista que, paulatinamente, conceituará o inquérito policial, bem como sua possível valoração, a fim de que, a partir de então se elucide acerca do valor probatório do inquérito policial.

No tocante ao procedimento a ser aplicado na pesquisa, a opção pelo teórico-funcionalista demonstrou-se razoável, pois, para se desenvolver o tema proposto, foi utilizado as disposições constitucionais pertinentes, o diploma legal correlato, bem como os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do aludido tema.

Por fim, não menos importante, o raciocínio a ser então desenvolvido é o dedutivo, em face de que se baseou o presente instrumento de pesquisa nas disposições constitucionais no que se referem à valoração do inquérito policial.

 

 

2 O INQUÉRITO POLICIAL

 

A prática de crimes e contravenções penais faz com que o Estado se utilize do seu ius puniendi, caracterizado em virtude de processo. A pretensão punitiva do Estado só será deduzida em juízo quando se propuser uma Ação Penal que determinará a sanção aplicada em cada caso específico.

Para que o Estado exerça o dever de punir, necessário se faz colher o mínimo de elementos probatórios que indiquem a ocorrência do fato e de sua autoria. O meio mais comum, mas não exclusivo, é através do Inquérito Policial, conforme se extrai do parágrafo único, do art. 4º, do Código de Processo Penal, uma vez que as autoridades administrativas também poderão, nos casos especificados em lei, desempenhar a mesma função da autoridade policial.

Para propositura da ação penal, faz-se necessário a existência de elementos probatórios suficientes para indicar a ocorrência de autoria e materialidade. A colheita desses elementos probatórios é feita no inquérito policial.

O inquérito policial está disciplinados nos artigos 4° a 23 do Código de Processo Pena (CPP). De acordo com Fernando Capez (2008, p. 458) inquérito se define da seguinte forma: é o conjunto de diligencias realizadas pela polícia judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo”.

Inquérito Policial é um procedimento investigatório prévio, constituído por uma série de diligências, cuja finalidade é a obtenção de provas para que o titular da ação penal possa propô-la contra o autor da infração penal (CPP, art. 4º).

Assim, cometido um delito, deve o Estado buscar provas iniciais acerca da autoria e da materialidade, para apresenta-las ao titular da ação penal (Ministério Público ou querelante), a fim de que este, avaliando-as, decida se oferece ou não a denúncia ou queixa-crime. Essa investigação inicial composta de uma série de diligências é chamada de Inquérito Policial.

Trata-se de procedimento persecutório de caráter administrativo, segundo Capez (2008, p. 459), instaurado pela autoridade policial que tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública (CF, art.129, inciso I), e o querelante, titular da ação penal privada (CPP, art.30); como destinatário mediato tem o juiz, que se utilizará dos elementos de informação nele constantes, para o recebimento da peça inicial e para formação do seu convencimento quanto à necessidade de decretação de medidas cautelares.

Entre os doutrinadores criminalistas, aquele que melhor define o inquérito policial é Fernando da Costa Tourinho Filho (2008, p. 124), o qual define como “o instrumento pelo qual o Delegado de Polícia materializa a investigação criminal, compila informações a respeito da infração penal, de suas circunstancias e resguarda provas futuras que serão utilizadas em juízo contra o autor do delito”.

No mesmo sentido, Júlio Fabrini Mirabete (2003, p. 189) expõe que se a fase do inquérito policial deve ser diferenciada da fase processual, pois se trata de um procedimento administrativo que  objetiva informar e fornecer a polícia administrativa os elementos necessários para a propositura da futura Ação Penal, ou seja, é uma instrução provisória, que não se confunde com a instrução criminal do processo, uma vez que investiga, prepara e informa a autoria e materialidade de uma infração.

Pode-se dizer que o Inquérito Policial é uma fase investigatória que se opera no âmbito administrativo, uma vez que ocorre antes mesmo da fase judicial. Muito se discutem no ordenamento brasileiro acerca da aplicabilidade de alguns princípios informadores do Processo Penal na fase do inquérito, entre eles o contraditório e a ampla defesa.

O inquérito policial, conforme o caso que lhe caiba, poderá ser instaurado de ofício por meio de portaria da autoridade policial, pela lavratura do auto de prisão, por representação do ofendido, por requisição do Magistrado ou até mesmo do Ministério Público e por requerimento da vítima. Assim, pode-se dizer que o inquérito policial possui o titular da ação como destinatário imediato, sendo que nas ações penais públicas o seu titular será o Ministério Público e nas ações Privadas será necessariamente o ofendido. O destinatário mediato será o Magistrado, pois o inquérito fornecerá a este os subsídios necessários para que a peça inicial seja recebida.

A atribuição para presidir o inquérito policial é outorgada aos delegados de polícia de carreira (CF, art.144, §§ 1º e 4º), conforme as normas de organização dos Estados. Essa atribuição pode ser fixada, quer pelo lugar da consumação da infração (ratione loci), quer pela natureza da mesma (ratione materiae). Em regra, no interior dos Estados, a autoridade policial não poderá praticar qualquer ato fora dos limites da sua circunscrição, devendo, se assim necessitar, solicitar, por precatória, ou por rogatória, conforme o caso, a cooperação da autoridade local com atribuições para tanto. Já na Capital do Estado, também dividida em circunscrições, a regra não é a mesma, haja vista que, "no Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias e requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em sua presença, noutra circunscrição" (CPP, art.22, grifo nosso).

A norma constitucional não prevê, em momento algum, segundo Capez (2008, p. 65), o direito de o suspeito ser investigado pelo delegado previamente indicado, até porque, sendo o inquérito m procedimento inquisitivo, não haveria, ainda segundo Capez (2008, p. 65), que se falar em devido processo legal. À vista disso, não se pode falar em princípio do "delegado natural", muito menos em nulidade dos atos investigatórios realizados fora da circunscrição da autoridade policial, até porque, para a maioria da doutrina o inquérito é mera peça de informação, cujos vícios, segundo Capez (2008, p. 66), não contaminam a ação penal.

É necessário salientar que ilustres professores, como Aury Lopes Jr. (2002, p. 199) e Marcellus Polastri Lima (2000, p. 69), não atribuem ao inquérito a qualidade pejorativa de mera peça de informação, pois os autos deste, muitas vezes, servem de embasamento para a formação do convencimento do juiz e, além disso, certas provas, como, por exemplo, a pericial, em regra, somente são produzidas na fase de inquérito tanto pela precariedade de sua própria natureza quanto pela própria preservação das características da prova.

O Inquérito não é processo, é, em verdade, um procedimento administrativo informativo, não estando, portanto, para grande parte da doutrina, sujeito ao princípio do contraditório (natureza inquisitiva).

Todavia, cabe assinalar que há hoje na doutrina entendimentos no sentido contrário, ou seja, defendendo a aplicação do princípio do contraditório no inquérito policial, valendo-se para tanto, dentre outros argumentos, o de que o inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal não excluiu de seu rol de atuação o inquérito policial tanto porque determina a aplicação de tal princípio mesmo aos procedimentos administrativos e, convenhamos, se o inquérito não é processo este é ao menos um procedimento administrativo, quanto porque o citado inciso se refere, expressamente, aos acusados em geral e, convenhamos mais uma vez, não há dúvida de que o indiciado possa ser qualificado como um acusado no sentido mais amplo dessa palavra.

 

3 CARACTERISTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL

 

3.1 CARACTERISTICA INQUISITIVA

 

A característica inquisitorial do inquérito policial, significa que tal procedimento administrativo é utilizado pela autoridade policial que se utiliza da discricionariedade para começar as suas investigações da maneira que lhe aprouver, sendo, portanto, de forma livre, é o que se observa da leitura da obra do doutrinador Paulo Rangel (2009, p. 89):

A autoridade policial enfeixa nas mãos todo o poder de direção do inquérito policial, inquirindo (indagando, investigando, pesquisando) testemunhas do fato e procurando esclarecer as circunstâncias em que estes fatos ocorreram.

O caráter inquisitivo do inquérito faz com que seja impossível dar ao investigando o direito de defesa, pois ele não está sendo acusado de nada, mas sim, sendo objeto de uma pesquisa feita pela autoridade policial.

 

Por meio desta característica, diz-se que nesta fase ainda não há um acusado e sim um indiciado. Há de se ressaltar a existência de inquéritos em que o contraditório e a ampla defesa encontram-se presentes como, por exemplo, nos crimes em que sua instauração é efetuada pela polícia federal a requisição do Ministério da Justiça (expulsão de algum estrangeiro que esteja em território nacional), ou mesmo em crimes falimentares (o qual já é de conhecimento as partes envolvidas).

Rogério Greco (2000, p. 237) considera que “a ausência do contraditório e da ampla defesa nesta fase, pode-se dizer que é característica mais marcante do inquérito policial”.

De acordo com o entendimento de Nestor Távola (2009, p. 75), “o inquérito é inquisitivo: as atividades persecutórias ficam concentradas nas mãos de uma única autoridade e não há oportunidade para o exercício do contraditório ou da ampla defesa”.

A doutrina majoritária, a qual inclui-se os ilustres doutrinadores Damásio Evangelista de Jesus (2009, p. 34) e Júlio de Fabrini Mirabete (2003, p. 76), dentre outros, milita a favor de que o contraditório e a ampla defesa façam parte do inquérito policial, por se tratar de uma questão de aplicação da mais perfeita justiça.

 

3.2 DISPONIBILIDADE

 

Trata-se de um procedimento que poderá ser dispensado quando os documentos existentes bastarem para que seja proposta a ação penal, sem necessidade de maiores diligências.  Vale salientar que não ele é indispensável para o oferecimento da denúncia ou queixa, se caso já existirem todos os elementos probatórios suficientes para a propositura da ação penal. Porém se o inquérito se tratar de base para o oferecimento da ação, esta não poderá ser ofertada sem a existência daquele, como dispõe o artigo 12 do Código de Processo Penal, in verbis: “Art. 12. O inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra”.

O inquérito policial não é indispensável para o oferecimento da denúncia ou queixa, sendo essa a opinião abalizada do doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho (2008, p. 27). Tal informação, aliás, pode ser extraída do artigo 12 do Código de Processo Penal como já especificado anteriormente.

Além disso, o artigo 27 do Código de Processo Penal dispõe acerca das pessoas que podem provocar a jurisdição para a iniciação do inquérito, vejamos:

Art. 27. Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

Outros artigos do Código de Processo Penal, como por exemplo os artigos 39, § 5° e 46, §1°, comprovam que tendo o titular da ação penal em seu poder os elementos necessários para o oferecimento da denúncia ou queixa, o inquérito é dispensável, in verbis:

 

Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial.

§ 5º O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de quinze dias.

Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de cinco dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de quinze dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (artigo 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos.

§ 1º Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia con­tar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação.

 

Eduardo Espínola Filho (2007, p. 126) expõe que “a dispensabilidade do inquérito também deriva da precaução do legislador em evitar o risco da prescrição iminente ou da decadência do direito de queixa”.

 

3.3 OBRIGATORIEDADE

 

Esta característica devera ser observada em casos de crimes em que se propõe a ação penal pública incondicionada, será obrigatório quando chegar ao conhecimento da polícia e forem necessárias maiores investigações acerca da materialidade, autoria e fatos.

Esta característica é a que estabelece que, em se tratando de crime que se apura mediante ação penal pública, tendo a autoridade conhecimento da infração, é obrigatória a instauração do inquérito policial como dispõe o artigo 5°, inciso I do Código de processo Penal: “Art. 5º Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I – de ofício”.

Comentando acerca do assunto, Fernando da Costa Tourinho Filho (2008, p. 456) diz que, como se trata de dever e não de faculdade, se o Delegado não instaurar o inquérito poderá infringir o artigo 319 do Código Penal, ou seja, prevaricação, além de sanções administrativas que possa ser imposta pela Corregedoria.

Contudo, no que tange aos crimes de ação penal pública condicionada e de ação penal privada, a autoridade policial só poderá dar inicio às diligencias policiais e instaurar o inquérito, havendo, na primeira modalidade de ação, a representação do ofendido (artigo 5°, §4°, CPP), e, na segunda, o requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la (artigo 5°, §5°, CPP).

Enfim, a atividade das autoridades policiais independe de qualquer espécie de provocação, sendo a instauração do inquérito obrigatória diante da noticia do crime.

 

3.4 FORMA ESCRITA

 

A forma escrita é especificada em dispositivo legal, no artigo 9° do Código de Processo Penal, in verbis: “Art. 9º Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade”.

Trata-se de uma obrigatoriedade. Todas as peças do inquérito policial serão,  num só processado, reduzidas a escrito ou digitadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade, uma vez que, tendo em vista a finalidade do inquérito, não se concebe a existência de uma investigação verbal.

 

3.5 INDISPONIBILIDADE

Uma vez instaurado, na poderá ser arquivado pela autoridade que o preside, sem que haja solicitação expressa do Ministério Público ao Magistrado e a autorização ou determinação destes. Neste caso, ele não deverá instaurar o inquérito, é o que determina o artigo 17 do Código de Processo Penal: “Art. 17. A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito”.

Como o inquérito policial tem por objetos valores indisponíveis, quase sempre de natureza pública e, sendo assim, à autoridade policial não é dado o poder de, segundo o seu juízo discricionário de conveniência e oportunidade, dispor de tais objetos, isto é, no presente caso, arquivar o inquérito, até porque, se assim fosse, acabar-se-ia por ofender o princípio do sistema acusatório imposto pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 129, inciso I.

 

3.6 SIGILOSO

 

A autoridade assegurará no inquérito policial o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. O direito genérico de obter informações dos órgãos públicos, assegurado no art.5º, XXXIII, da Constituição Federal, pode sofrer limitações por imperativos ditados pela segurança da sociedade e do Estado, como salienta o próprio texto normativo, em sua parte final.

Não é demais afirmar, ainda, que, o sigilo no inquérito policial deverá ser observado como forma de garantia da intimidade do investigado, resguardando-se, assim, seu estado de inocência.

Na fase do inquérito não vigora o princípio da publicidade, como ocorre na fase processual. O sigilo deverá ser oponível à terceiros estranhos à lide, isso evita que se tenha conhecimento acerca de dados importantes do inquérito, não devendo aplicar tal sigilo aos membros do Ministério Público e nem ao Magistrado.

No que se referem à atuação do advogado, estes possuem o Direito de consultar o inquérito policial, tomando os devidos apontamentos, pois a ele o sigilo não é aplicado, como especifica o artigo 7°, inciso XIV da Lei n°. 8.906/94 (Estatuto da Advocacia).

 

Art. 7º São direitos do advogado:

XIV - examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos.

 

Desta forma, a autoridade assegurará no inquérito policial o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. O direito genérico de obter informação dos órgãos públicos, assegurado no artigo 5°, XXXIII, da Constituição Federal, pode sofrer limitações por imperativos ditados pela segurança da sociedade e do Estado, como salienta o próprio texto normativo, em sua parte final:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

 

 Contudo, o sigilo não se estende ao representante do Ministério Público, nem à autoridade judiciária. No caso do advogado, pode consultar os autos do inquérito, mas, caso seja decretado judicialmente o sigilo na investigação, não poderá acompanhar a realização de atos procedimentais, conforme estabelecido no artigo 7°, inciso XIII a XV e §1° da Lei n°. 8.906/94:

Art. 7º São direitos do advogado:

XIII - examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral, autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos;

XIV - examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos;

XV - ter vista dos processos judiciais ou administrativos de qualquer natureza, em cartório ou na repartição competente, ou retirá-los pelos prazos legais;

§ 1º Não se aplica o disposto nos incisos XV e XVI:

1) aos processos sob regime de segredo de justiça;

2) quando existirem nos autos documentos originais de difícil restauração ou ocorrer circunstância relevante que justifique a permanência dos autos no cartório, secretaria ou repartição, reconhecida pela autoridade em despacho motivado, proferido de ofício, mediante representação ou a requerimento da parte interessada;

3) até o encerramento do processo, ao advogado que houver deixado de devolver os respectivos autos no prazo legal, e só o fizer depois de intimado.

 

Não é demais afirmar, ainda, que o sigilo no inquérito policial deverá ser observado como forma de garantia da intimidade do investigado, resguardando-se, assim, o seu estado de inocência.

Fernando Capez (2008, p. 376) assegura que “o sigilo não restringe a defesa, uma vez que no inquérito não há acusação, não se podendo, portanto, falar em defesa”. Dispondo sobre o mesmo assunto, Fauzi Hassan Choukr (2007, p. 58), dispõe que:

O sigilo não deve abranger as partes do processo, pois, desta forma, além de desequilibrar a relação entre as partes, acabar-se-á por incorrer em uma inconstitucionalidade, qual seja, a de admitir que o processo penal brasileiro, inclusive o inquérito, é orientado pelo sistema inquisitório e não pelo sistema acusatório estabelecido expressamente pela Constituição (CF, art. 129, inciso I), onde uma das partes não participa da realização da prova e a outra, no caso o Ministério Público, pode livremente participar.

 

3.7 OFICIALIDADE

 

A autoridade que irá presidir o inquérito reveste-se em Órgão Oficial do Estado, como está disposto no artigo 144, §4° da Constituição Federal de 1988:

Art. 144 - A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

§ 4º - Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares. 

 

 Ou seja, o inquérito policial é uma atividade investigatória feita por órgãos oficiais, não podendo ficar a cargo do particular, ainda que a titularidade da ação penal seja atribuída ao ofendido.

 

3.8 DISCRICIONARIEDADE

O delegado de policia é competente para a realização de investigações. De acordo com o artigo 6° e 7° do Código de Processo Penal, há uma série de providencias que devem e podem tomar durante as investigações, in verbis:

 

Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

I – dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais;

II – apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;

III – colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

IV – ouvir o ofendido;

V – ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura;

VI – proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;

VII – determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;

VIII – ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes;

IX – averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição eco­nômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.

Art. 7º Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.

 

Vale ressaltar que as diligencias que forem requeridas por parte do indiciado ou mesmo pela vítima, não irão vincular de forma alguma a autoridade policial, como dispõe o artigo 14 do Código de Processo Penal, podendo o delegado se negar a atender tais requerimentos efetuados pelas partes.

Se o membro do Ministério Público ou o Magistrado resolver requerer certa diligencia, o delegado não poderá se negar a fazê-la, a requisição do Ministério Público e do Magistrado mostra-se como uma ordem que deverá ser cumprida, como preceitua o artigo 13, inciso II do Código de Processo Penal, in verbis: “Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial: II – realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público”.

O delegado também não poderá indeferir em nenhum hipótese, o requerimento de realização de exame de corpo de delito, quando se tratar de uma infração que venha a deixar vestígios na vítima, como assegura o artigo 184 do Código de Processo Penal: “Art. 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade”.

 

4 O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E A NÃO INSERÇÃO NO INQUERITO POILICIAL

 

A doutrina que não aceita a aplicação do contraditório no inquérito conta com os argumentos de Dilemando Filho, Alexandre de Moraes, Ada Pellegrini, entre outros. Para esses doutrinadores, na fase do inquérito ainda não existe a figura de um “Réu” e sim do indiciado. Trata-se de um procedimento inquisitório e não acusatório. Assim, não há que se falar em defesa. Muitos acreditam que o contraditório apenas atrapalharia o teor das investigações.

O inquérito policial nada mais é do que uma fase preparatória para o surgimento da fase acusatória na ação penal. Assim a doutrina costuma argumentar que o inquérito não passa de um procedimento administrativo, em que o contraditório não poderá estar presente, pois o caráter investigatório do inquérito se destina a auxiliar à atuação do Ministério Público, que é o titular da ação penal.

Para o doutrinador José Frederico Marques (2009, p. 46), a fase de investigação do inquérito possui natureza inquisitiva, e desta forma, a presença do contraditório apenas atrapalharia as investigações policiais. Assim argumenta o autor:

Infelizmente, a demagogia forense tem procurado adulterar, a todo custo, o caráter inquisitivo da investigação, o que consegue sempre que encontra autoridades fracas e pusilânimes. Por outro lado, a ignorância e o descaso relativos a institutos de processo penal contribuem, também, decisivamente, para tentativas dessa ordem. (MARQUES, 2008, p. 256)

 

Há também alguns doutrinadores que tem posições hibridas, ou seja, que possuem pensamentos intermediários ao dispor sobre o contraditório no inquérito policial. Assim, Scaranse Fernandes (2008, p. 467), Flávio Böechat Albernaz (2009, p. 30) e Evandro Fernandes de Pontes (2009, p. 90), admitem que o contraditório apenas seja implantado em relação aos fatos alegados pela perícia e não a todo procedimento inquisitivo. Para essa parte da doutrina, a defesa se faz necessária nesta fase ainda que a lei não permita a incidência do contraditório.

Mesmo que não se admita a aplicação de tal princípio em todo o procedimento investigativo, vale observar que a defesa deveria ter mais participação dentro do inquérito, possuindo assim o direito de conhecer os rumos de determinada investigação e o direito de ser ouvido em relação a estar dando a oportunidade de que o acusado possa contribuir com dados que sejam favoráveis as sua defesa e ao bom andamento da investigação.

 

4.1 A PRESENÇA DO CONTRADITÓRIO NA FASE INVESTIGATIVA

 

A constituição Federal, ressalvando a prisão, não admite nenhuma outra forma de restrição de direitos individuais do ser humano, desta forma, entende-se que o contraditório deve ser aplicado a todo indiciado que também deverão ter direito à defesa.

Todos que estão envolvidos em algum crime carecem de ampla defesa, sendo esta totalmente efetivada dentro dos moldes da contrariedade em todo o período do inquérito policial sem limitar os direitos subjetivos dos indiciados em geral. Assim, preceitua Júlio Fabrini Mirabete (2003, p. 128) que “o contraditório é indispensável em qualquer instrução criminal, dando igualdade de Direitos às partes”.

A afirmação da maior parte da doutrina é no sentido de que não existe contraditório no inquérito policial, trata-se de um equívoco. Isso se justifica no fato de que antes mesmo de qualquer ação ou processo, ainda na fase do investigatório policial, o indiciado poderá expor a versão dos fatos ou mesmo de exercer seu direito de silencio configurando assim uma forma de ampla defesa. Da mesma forma, o acompanhamento de advogado ou defensor público, que poderá intervir no interrogatório, requerer nova diligência, juntar documentos, como também, poderá impetrar em juízo mandado de segurança ou hábeas corpus em favor do indiciado.

Tanto a ampla defesa como o contraditório deve estar presente em qualquer forma de acusação, mesmo que esta não seja formal, ou seja, quando ainda não houver inquérito instaurado, o acusado possui o direito de se defender ou de ser defendido pelos meios legais, vale observar que se este não possuir advogado, o Estado deverá nomear defensor público para que não se configure violação dos direitos subjetivos daquele a quem se imputa a autoria do crime.

Deve-se admitir a presença do contraditório na fase do inquérito. O resultado das investigações coletadas que não estiverem sobre segredo de justiça devem ser divulgado para que sejam estruturados os argumentos do Ministério Público no oferecimento da denúncia e para que a defesa tenha ciência dos fatos e, dessa forma, formular suas táticas favoráveis à absolvição do acusado em momento oportuno.

É verdade que não se pode permitir que o indiciado intervenha nas diligências, pois estas são essenciais para a formação da peça do inquérito. A intervenção não poderá ser permitida nem mesmo quando depois de instaurada a ação penal, não existindo assim o inquérito policial.

O Juiz ou o promotor que venha a requerer novas diligências investigativas, no entanto há de se entender que o indiciado possui o interesse de se defender para que possa repelir a culpa imputada a este, dessa forma, devem-se assegurar todas as garantias necessárias a sua ampla defesa e contraditório.

Mesmo possuindo uma característica inquisitiva, o inquérito policial não poderá sujeitar o indiciado aos atos contrários à lei processual, como a tortura, que tem como fim a obtenção de uma prova, por exemplo, assim, mesmo que restritamente o inquérito devera estar em consonância com os princípios e garantias constitucionais.

Se o indiciado resolve faltar com a verdade no momento do interrogatório, não haverá qualquer prejuízo no andamento das investigações ou mesmo para a administração pública. Se o advogado, sendo intermediado pelo presidente do inquérito direcionar repergunta acerca dos fatos, configura assim uma forma de contraditório. Caberá o delegado aceitar ou não as reperguntas formuladas.

A presença e participação do advogado de defesa no momento do interrogatório policial fazem com que se afastem imputações acusatórias e alegações de coação efetuadas pela polícia.

É necessário que o contraditório e a ampla defesa estejam presentes no inquérito policial para que os princípios constitucionais e as garantias humanas não sejam violadas. No entanto, o acolhimento desta aplicação dependem tão somente da discricionariedade da polícia investigativa que, por meio do delegado, poderá aceitar ou rejeitar as perguntas formuladas pelos advogados de defesa no momento do interrogatório.

A lei admite que as reperguntas sejam formuladas tanto por parte da defesa como pelo Ministério Público, tal procedimento não era concedido pelo magistrado antes da vigência da lei federal ora citada, isso afastava o contraditório da fase de inquérito.

O delegado de polícia deverá se adaptar e obedecer as imposições da nova lei federal que trouxe em sua redação mudanças favoráveis no momento do interrogatório, como expõe o artigo 6°, inciso V do Código de Processo Penal:

Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

V – ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura;

 

Vale ressaltar que desde dezembro de 2003 após a vigência da Lei de Execuções Penais (LEP), tornou-se indispensável a presença do advogado de defesa quando o investigado for indiciado, principalmente quando resultar de prisão em flagrante. Isso possibilita a presença do contraditório na fase do inquérito, à medida que o indiciado tem a possibilidade de tomar conhecimento das provas a serem produzidas e possui o direito de contraditar quando necessário, ou mesmo de exigir arrolamento de testemunhas.

O argumento da doutrina contrária à participação do contraditório no inquérito policial ainda é bastante discutido entre a doutrina criminalista. Este princípio de nenhuma maneira atrapalha o bom andamento das investigações.

5 VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL

 

Segundo a doutrina, o inquérito policial é peça de valor informativo, na qual se apura todas as circunstâncias que ensejaram a infração penal, bem como sua respectiva autoria. Trata-se de procedimento administrativo e de caráter inquisitivo, no qual as atividades persecutórias concentram-se numa única autoridade, sem que haja, nesta fase, possibilidade de ampla defesa e contraditório.

Nesse passo, o inquérito policial tem por finalidade colher todas as informações possíveis e legais a respeito do fato criminoso, para que o titular da ação penal - o Ministério Público - possa instaurar a competente ação penal e exercer o jus persequendi. Saliente-se, pois, que eventuais vícios ou irregularidades no inquérito policial, destinados à formação da opinio delicti do titular da ação penal, não têm o condão de infirmar nulidades processuais à validade jurídica do subseqüente processo penal condenatório. Estas nulidades só podem ser inculcadas aos atos praticados ao longo da ação penal condenatória.

Entretanto, questiona-se a validade do inquérito policial como prova no curso da ação penal, bem como o fato deste ser ou não imprescindível para a concretização da ação penal.

Poder-se-ia afirmar que estamos diante do contraditório diferido ou postergado, ou seja, as provas produzidas no inquérito policial, mesmo as irrepetíveis, devem estar em consonância com o material constante nos autos da ação penal. Segundo Vicente Greco Filho (2009, p. 187):

A constituição não exige, nem jamais exigiu, que o contraditório fosse prévio ou concomitante ao ato. Há atos privativos de cada uma das partes, como há atos privativos do juiz, sem a participação das partes. Todavia, o que assegura o contraditório é a oportunidade de a eles se contraporem por meio de manifestação contrária que tenha eficácia prática entes da decisão. Assim, por exemplo, é válida a prova pericial realizada na fase do inquérito policial, por determinação de autoridades policial, desde que em juízo, possa ser impugnada e, se estiver errada, possa ser refeita.

 

Das decisões proferidas em nosso tribunais, é unânime o argumento contrário à interpretação constitucional exposta no artigo 5°, entendendo os nossos magistrados que o princípio do contraditório não se aplica à fase investigativa.

Assim assegura Moraes (2008, p. 139), “o inquérito, por natureza, pode ser considerado como uma forma de processo administrativo, pois o indiciado, em sentido amplo, também é considerado como um acusado à medida que se imputa a autoria do crime ora cometido”.

A bilateralidade dos atos praticados no inquérito pela policia judiciária poderia trazer prejuízos ao bom andamento das investigações. Porém não se pode agir contrariamente aos princípios constitucionais e garantias do acusado.

Mesmo que de forma limitada, a presença da defesa no inquérito se faz necessária, pois, por meio desta, se assegura os direitos e garantias do cidadão a quem se imputa a culpa, coibindo também, as arbitrariedades praticadas pela polícia na procura por provas.

Faz-se necessário que as provas produzidas na fase do inquérito esteja de acordo com o conteúdo da peça do inquérito enviada ao Ministério Público para que se possa oferecer a denúncia. Na fase processual, o réu poderá rejeitar todos os meios que julgar contrários aos seus direitos.

O inquérito policial é um instrumento investigatório importante para se desvendar a verdade dos fatos. Em seus documentos escritos direcionados ao Ministério Público, o delegado de polícia reúne todos os documentos referentes às diligências efetuadas, esclarecendo as circunstancias do fato apresentado e consequentemente, confirmando a autoria do delito imputando a culpa ao indiciado, essa não é sua finalidade, pois não deverá acusar, não poderá o inquérito estar embutido de juízo de valor.

Se a paridade de armas está presente em todos os atos do processo penal, deve-se aplicar da mesma maneira aos atos do inquérito, pois ao contrario do que expõe as jurisprudências pátrias e a maioria da doutrina nacional, o inquérito possui mais características de processo e não de um mero procedimento.

 A característica do processo penal em nosso país é construído sobre os ditames de uma característica acusatória, sendo assim, o inquérito policial não se vê fora desta realidade. Eis que existe uma parcela de acusação na figura do inquérito.

O valor probatório do inquérito policial é considerado muito reduzido ou até de nenhum valor, por conta da possibilidade de ocorrência de vícios e falhas por parte de agentes despreparados, ou, por conta de agentes mal intencionados, os quais, tendo a incumbência de colher as provas que integrarão o bojo do inquérito, podem aproveitar-se da natureza inquisitiva do inquérito policial, procedendo às investigações criminais de maneira atentatória aos desígnios de imparcialidade e justiça, contrariando, por conseguinte, os ditames constitucionais conferidos ao indiciado, além de violar o dever ético assumido no ingresso para o exercício do múnus público.

Trata-se, em princípio, de argumentos válidos que, no entanto, para não se cometer injustiças, beiram a leviandade, pois generalizam a classe policial apenas em razão de alguns. Não obstante, certo é que isso gera uma insegurança e o inquérito policial passa a ser visto como uma “faca de dois gumes”. De um lado estão profissionais sérios, competentes e imparciais e, de outro lado, encontram-se aqueles considerados mercenários, iníquos, parciais, acusadores e arbitrários. Se o Ministério Público assumisse definitivamente sua função de exercer o controle externo sobre a polícia judiciária, provavelmente seria possível diminuir ou anular a ação dos maus policiais. Entretanto, não é essa a prática hodierna.

Alicerçada nesse temor, a jurisprudência dos Tribunais tem entendido que o inquérito policial tem valor probatório relativo. Isso significa que, de acordo com o caso concreto e com o grau de confiabilidade das informações extraídas do inquérito - haja vista que estas não são colhidas sob a égide da ampla defesa e do contraditório - é possível afirmar que o inquérito policial tem valor probatório, ainda que diminuto em razão de sua natureza inquisitiva. Algumas provas, tais como perícias e exames de corpo de delito, as quais necessitam ser realizadas em tempo, sob pena de perecimento das circunstâncias elementares à caracterização do fato típico, têm merecido validade em certas ocasiões, devido ao seu valor probante de caráter técnico e não de indiciamento.

Senão, vejamos uma decisão do STF corroborando esse fato:

5001575 - HABEAS CORPUS - ACÓRDÃO QUE MANTENDO A SENTENÇA EMPRESTOU VALIDADE AO LAUDO PERICIAL - ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO - AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DA DEFESA SOBRE A PERÍCIA TÉCNICA - INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA - 1. A perícia não é um simples indício e sim prova técnica e, por isso, pode ser considerada pelo julgador na sentença, sem que caracterize cerceamento de defesa, pois o acusado, ciente da sua juntada ao inquérito policial que instruiu a ação penal, poderia pugnar por elidi-la. 2. Laudo pericial. Validade. Prova hábil a ser considerada judicialmente para demonstrar a imprudência do paciente que, ao conduzir o seu veículo em velocidade incompatível com o local e as condições do tempo, causou duplo atropelamento do qual resultou a morte de uma das vítimas. (STF - HC 73.647 - SP - 2ª T. - Rel. Min. Maurício Corrêa - DJU 06.09.1996).

 

 Nos demais casos, diferentes daqueles em que há o perecimento da prova, o valor probatório do inquérito policial, além de relativo é limitado. Limitado, segundo Julio Fabrini Mirabete (2003, p. 83), pela comprovação de prova judicial ou de elemento subsidiário para reforçar o que for apurado em juízo e, por corolário, firmar o livre convencimento do juiz. Disso, é possível inferir, com fulcro no princípio constitucional do contraditório, inadmissível seria fundamentar decisão condenatória amparada exclusivamente em inquérito policial. Nesse sentido, acena a jurisprudência do STJ:

16034597 - RECURSO ESPECIAL - FURTO QUALIFICADO - RÉUS ABSOLVIDOS - PROVA POLICIAL NÃO CONFIRMADA EM JUÍZO - ACUSAÇÃO QUE TEM COMO SUFICIENTE, AS OBTIDAS EM INQUÉRITO POLICIAL, DESDE QUE NÃO CONTRARIADAS NA FASE JUDICIAL - DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA EM SENTIDO INVERSO - 1. Para que seja respeitado, integralmente, o princípio do contraditório, a prova obtida na fase policial terá, para ser aceita, de ser confirmada em juízo, sob pena de sua desconsideração. Tal significa que, acaso não ratificada na fase judicial, a solução será absolver-se o acusado. Precedentes. 2. Apelo raro que não se conhece. (STJ - REsp 93464 - GO - 6ª T. - Rel. Min. Anselmo Santiago - DJU 29.06.1998 - p. 333).

 

Fernando da Consta Tourinho Filho (2008, p. 92), atenta ainda para o fato de que se no inquérito não há acusação - trata-se de procedimento meramente informativo - logo, não pode haver defesa. Sustenta haver manifesto equívoco daqueles que se fundam no dispositivo constitucional do art. 5º, LV, garantidor do contraditório e da ampla defesa aos acusados dentro do inquérito policial. Para ele, tal argumento falece diante da simples constatação de que no inquérito não há "acusados", mas apenas, "indiciados". Acusado é o indivíduo, detentor de direitos fundamentais, presente em denúncia ou queixa oferecida pelo titular da ação penal (Ministério Público); indiciado é o objeto da investigação policial.

Para tanto, os militantes que buscam um Direito mais satisfatório e justo, clamam em favor da eqüidade, ou seja, de que haja um equilíbrio entre a natureza inquisitória do inquérito e os direitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa, ainda que na fase policial. A análise do inquérito sob essa ótica, mesmo se tratando de procedimento informativo, com efeito, traria benefícios para todos. O valor probatório do inquérito passaria a ter credibilidade; o advogado, nesta fase, seria tratado com mais tato, podendo exercer sua função constitucional de agente indispensável à administração da justiça, inclusive com os subsídios legais necessários, quer fiscalizando o inquérito, quer complementando-o; e o indiciado seria tratado como sujeito de direitos, respeitadas as suas garantias legais e constitucionais.

Resta-nos complementar que nessa visão mais equânime, a ingerência do advogado do indiciado no inquérito, teria o caráter exclusivamente de fazer valer seus direitos sem, no entanto, obstar a investigação policial. Nesse passo, a ingerência ficaria atinente apenas aos atos distintos daqueles relativos à investigação policial e dos que, porventura, necessitem ser realizados com sigilo, sob pena de impossibilidade de sua produção.

 

6 CONCLUSÃO

 

Tendo em vista o entendimento jurisprudencial dominante, é possível dizer que o inquérito policial não possui valor probatório algum, salvo algumas exceções, tais como aquelas relativas a exames periciais e exames de corpo de delito. Isso porque, a maior parte das provas presentes do bojo do inquérito, depende, para a sua validade no curso da ação penal, de serem ratificadas em juízo. Ora, em sendo o entendimento de que a convalidação das provas está vinculada à sua corroboração em juízo, logo, pode-se dizer, que a sua realização na fase policial é pura perda de tempo, ou seja, é nula, ressalvadas as provas que podem perecer devido ao tempo exíguo para a sua concepção.

Embora esse entendimento possa ressoar como extremista, na verdade, se busca, não o argumento de que o inquérito policial é prescindível - pois faleceria diante da realidade - mas, ao revés, o argumento de que o inquérito policial é indispensável à investigação da autoria e da materialidade do fato típico.

Se o inquérito policial é praticamente desprezado, logo, percebe-se que há algo de errado em seus mecanismos de investigação, ainda que alguns poucos contestem sua necessidade existencial.

É exatamente nesse ponto que queremos chegar. Para nós, o cerne da questão do valor probatório do inquérito policial, no curso da ação penal, consiste na sua falta de credibilidade, no que tocante à confiabilidade policial, o que gera insegurança processual nas provas colhidas em seu bojo.

Não obstante, o inquérito policial queira ou não, é fundamental e decisivo e, em muitos casos, é capaz de absolver ou condenar o réu, ainda que a doutrina e a jurisprudência afirmem o contrário.

A respeito de toda essa celeuma e, na esteira do ordenamento constitucional, posicionamo-nos e comungamos do ideal daqueles que militam em favor do equilíbrio entre a natureza inquisitorial do inquérito e os direitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa, ainda que na fase policial. Ora, o inquérito policial não pode sobrepujar a Carta Política de 1988. O indiciado não pode mais ser tratado como objeto, mas deve sim, ser tratado como sujeito de direitos, dispondo das garantias legais e constitucionais.

Enganam-se aqueles que afirmam que a ampliação do contraditório e da ampla defesa na fase policial acarreta morosidade ao inquérito. Na verdade, o que deveras ocorre é o proveito do tempo e a satisfação das garantias do indiciado.

Assim, diante do desencontro entre o inquérito policial e o processo judicial, e sendo a fase judicial amparada pelos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, vislumbra-se uma possibilidade para que os estudiosos do assunto busquem uma forma legal de que à autoridade caberia a tarefa de relacionar os envolvidos no evento criminoso, como vítima, indiciado, testemunhas, informantes, sem colher os seus depoimentos, apenas com as qualificações, já que isto ocorreria na fase judicial, evitando uma grande perda de tempo, no mais cuidava de solicitar perícias e formalizar os atos imprescindíveis na fase do inquérito policial.

Foi buscado durante todo o trabalho demonstrar de forma clara o valor probatório do inquérito policial e as fontes de pesquisas indicam o valor relativo para tal procedimento.

 

REFERÊNCIAS

 

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