JurisWay - Sistema Educacional Online
 
É online e gratuito, não perca tempo!
 
Cursos
Certificados
Concursos
OAB
ENEM
Vídeos
Modelos
Perguntas
Eventos
Artigos
Fale Conosco
Mais...
 
Email
Senha
powered by
Google  
 

Fazenda Pública


Autoria:

Mariana Guimarães Dos Santos


Universitária da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco-UNDB, cursando 10º período de Direito, estagiária na área cível do escritório Mirella Parada & Advogados Associados há 3 anos, monitora do Dr. Humberto Oliveira na disciplina de Direito Falimentar

envie um e-mail para este autor

Resumo:

O estudo sobre a Fazenda Pública traz grandes peculiaridades no ordenamento jurídico, tendo em vista que é diferenciada das demais ações. Nesse estudo faz-se uma abordagem do seu conceito, natureza jurídica, princípios e privilégios.

Texto enviado ao JurisWay em 13/07/2010.

Última edição/atualização em 15/07/2010.



Indique este texto a seus amigos indique esta página a um amigo



Quer disponibilizar seu artigo no JurisWay?

1 FAZENDA PÚBLICA

 

 

1.1 Conceito de Fazenda Pública

 

 

Em sentido léxico “Fazenda Pública” é o nome genérico dado às finanças federais, estaduais ou municipais, conhecido também como erário ou fisco[1]. Considerado como aspecto financeiro do Estado[2], destina-se a todas as pessoas de direito público.

  No comentário de Hely Lopes Meirelles[3], a Administração Pública, quando ingressa em juízo por qualquer de suas entidades estatais, suas autarquias, suas fundações públicas ou órgãos que tenham capacidade processual, recebe a designação tradicional de Fazenda Pública.

 Samuel Monteiro[4] assim define o instituto:

 

(...) alcança e abrange apenas as entidades públicas (autarquias, Estados, União Federal, Distrito Federal e Municípios), que arrecadam diretamente, com autonomia administrativa e financeira própria, ou recebem tributos e contribuições criados por leis tributárias ou previdenciárias, observada a competência impositiva constante expressamente da própria Constituição Federal.

 

A Fazenda Pública não se restringe a concepção de pessoas jurídicas de direito público, ou seja, os entes federativos, devido às autarquias serem identicamente pessoas jurídicas de direito público com finalidade estritamente administrativa[5].

A Constituição da República de 1.967 em seu art. 117 disciplinou sobre quem seria a Fazenda Pública, senão vejamos: “O sujeito passivo da execução contra a Fazenda Pública é necessariamente pessoa jurídica de direito público, ou seja, a União, os Estados e os Municípios, suas respectivas autarquias, os Territórios e o Distrito Federal”.

Conforme entendimento de Juvêncio Viana[6] sobre a definição de Fazenda Pública, a sua demarcação abrange até as Autarquias e Fundações Públicas, pois estas também estão inclusas, por constituírem pessoas jurídicas de direito público interno, uma vez que exercem o papel dos entes estatais.

Destarte, vale frisar que os entes que não estão inseridos no conceito de Fazenda Pública são as sociedades de economia mista, a exemplo do Banco do Brasil e as empresas públicas, como a Caixa Econômica Federal que, por mais que sejam constituídas por recursos públicos, são pessoas jurídicas de direito privado, não podendo gozar das prerrogativas referentes aos entes da Fazenda Pública, ficando, dessa maneira, sujeitos à execução na forma prevista para as pessoas jurídicas de direito publico[7].

Cita-se o art. 6º da Lei n° 9.469/97 que dispõe sobre os valores devidos pela “Fazenda Pública Federal, Estadual ou Municipal e pelas autarquias e fundações públicas, em virtude de sentença judiciária”, não abrangendo as empresas públicas, nem as sociedades de economia mista e nem as fundações[8].

Diante de uma universalidade de direito, com personalidade jurídica, a União, Estados e Municípios enquadram-se nas categorias de entidades que compreendem o conceito de Fazenda Pública a ensejar-lhes a extensão dos privilégios processuais a esta conferidos, os quais, aliás, não comportam interpretação ampla e sim restritiva[9].

 

1.2 Princípios da Fazenda Pública

 

 

                        Quando a Fazenda Pública é parte em uma ação judicial, usufrui de certas prerrogativas que não são atinentes aos particulares, pois esta é uma peculiaridade do órgão público, desnivelando as partes nas relações jurídicas[10].

                        Para o Ministro do Supremo Tribunal Federal Afrânio Costa, a Fazenda Pública está intrinsecamente ligada a prerrogativas e privilégios, que são garantias indispensáveis a sua salva-guarda, pois o seu patrimônio é comum de todos os cidadãos. Devendo, assim, o patrimônio do Estado ser acautelado por prerrogativas especiais[11].

Há certa necessidade de se conferir a Fazenda Pública determinadas prerrogativas, tendo em vista que a mesma está tutelando o interesse público, transcreve-se[12]:

(...) quando a Fazenda Pública está em juízo, ela esta defendendo o erário. Na realidade, aquele conjunto de receitas públicas que pode fazer face às despesas não é responsabilidade, na sua formação do governante do momento. É toda a sociedade que contribui para isso. (...) Ora, no momento em que a Fazenda Pública é condenada, sofre um revés, constes uma ação ou recorre de uma decisão, o que se estará protegendo, em ultima analise, é o erário. É exatamente essa massa de recurso que foi arrecadada e que evidentemente supera, aí sim, o interesse particular. Na realidade, autoridade pública é mera administradora.


                       
Caso o gestor da coisa pública não efetive o cumprimento de seus fins que constituem a defesa do interesse público, causará ao Poder Público gravame inestimável e um enorme peso, que onerará a administração pública. Assim, com o fito de preservar o ente público, nasceu a definição de poder-dever entre o particular e a Administração, que tem o poder de agir de acordo com a lei e dever de defender o interesse público[13].

As prerrogativas da Fazenda Pública que irão ser analisadas serão: a supremacia do interesse público e o princípio da isonomia.

 

 

1.2.1 – Principio da supremacia do Interesse Público

 

 

A prerrogativa da supremacia do interesse público frente à Fazenda Pública é de extrema relevância, tendo em vista que, segundo tal prerrogativa, deve ser conferida com prevalência do coletivo em detrimento do individual[14].

A prerrogativa, supramencionada, é um dos grandes alicerces do direito público, asseverando que não há norma constitucional que lhe assegure, pois decorre tão somente da premissa de que deve estar acima do direito do particular[15].

Por interesse público entende-se que é o bem estar coletivo, sendo que o mesmo somente começou a se desenvolver quando superado o Direito Civil e o individualismo, para assim tornar-se fundamento para todo o direito público, o de que os interesses públicos têm supremacia sobre os individuais[16]. 

A sede deste princípio está no Direito Constitucional e Administrativo, pois incube ao Estado tutelar interesses públicos, com finalidade de atender ao interesse geral que não pode ceder diante do interesse individual[17].

A Lei nº. 9.784/1999 que regula sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, disciplina o interesse público:

 

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

 II - atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;

 

Para a Ministra do Supremo Tribunal Federal, Ellen Gracie, o princípio da supremacia do interesse público deve ser aplicado de forma que dê a melhor solução para administração pública, a solução que melhor atender a ultimação desse interesse, se caso venha ser aplicado de forma distorcida, tal ação não terá validade nenhuma[18].

Para muitos ministros do Superior Tribunal de Justiça, o principio da supremacia do interesse público deve prevalecer diante do privado, transcreve-se os arestos do voto do Min. Gilson Dipp[19]:

Portanto, não há ilegalidade na decisão que negou, fundamentadamente, aos recorrentes, vista dos autos de ação penal, fora de cartório, especialmente porque, conforme salientado pela decisão, buscava-se privilegiar a efetividade dos atos jurisdicionais, especialmente por se tratar de ação criminal vultosa, na qual deve prevalecer a supremacia do interesse público sobre o interesse privado.

 

Em acórdão[20], Desembargador Stélio Muniz do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão afirma que não se pode negligenciar. No entanto, acima da própria legalidade estrita, existe um princípio maior no direito administrativo e constitucional que é o da supremacia do interesse público. O interesse público, no caso concreto sempre terá relevância, em detrimento do particular.

A função da prerrogativa da supremacia do interesse público visa proteger os direitos da coletividade, com o dever na prestação consistente em adotar medidas positivas e eficientes, capazes de proteger o exercício de seus direitos perante a atividade de particulares que venham afetá-los[21].

                        Conforme todo o exposto acima, o principio da supremacia do interesse público está intrínseco no conceito e nos fundamentos da Fazenda Pública, tendo em vista o mesmo é preservado pelo Estado, que faz a gerência da Administração Pública.

 

 

1.2.2 – Principio da Isonomia

 

                           

 Desde a antiguidade clássica, é entendido o principio da isonomia da seguinte forma: “deve-se tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”, esta máxima advém da Ética aristotélica, sendo que tal preceito foi adequado ao Direito vivenciado na atualidade, admitindo que a lei estabeleça diferenças entre pessoas em situação paritária, conferindo-lhes tratamento juridicamente adequado, às circunstâncias vividas[22].

A Constituição Federal de 1988 consagrou o princípio da isonomia como aquele que prevê que todos os cidadãos têm direito a um tratamento idêntico pela Lei, em consonância com o ordenamento jurídico[23].  

Para o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Eros Grau, o princípio da isonomia consiste em dar tratamento igual aos iguais e desigual aos desiguais.                                                                                                                                                                                                                     Neste sentido remete-se aos ensinamentos de Aristóteles, nas leis, na política na Ética a Nicômaco[24]. 

No âmbito da aplicação do princípio, asseverou Hans Kelsen:

A igualdade dos indivíduos sujeitos à ordem jurídica, garantida pela Constituição, não significa que aqueles devam ser tratados por forma igual nas normas legisladas com fundamento na Constituição, especialmente nas leis. Não pode ser uma tal igualdade aquela que se tem em vista, pois seria absurdo impor os mesmos deveres e conferir os mesmos direitos a todos os indivíduos sem fazer quaisquer distinções, por exemplo, entre crianças e adultos.

 

Com a garantia da igualdade perante a lei, no entanto, apenas se estabelece que os órgãos aplicadores do Direito somente podem tomar em conta aquelas diferenciações que sejam feitas nas próprias leis a aplicar. Com isso, porém, apenas se estabelece o princípio, imanente a todo o Direito, da juridicidade da aplicação do Direito em geral e o princípio imanente em todas as leis da legalidade da aplicação das leis, ou seja, apenas se estatui que as normas devem ser aplicadas de conformidade com as normas[25].

 

O principio da isonomia é o corolário do devido processo legal, pois os juízes e as partes devem se submeter a ele. O art. 125, inciso I do Código de Processo Civil transcreve a seguinte redação[26]:

Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:

 

I - assegurar às partes igualdade de tratamento.

 

O artigo acima alude sobre o principio da isonomia, que é uma garantia constitucional, traduzindo em dever do Estado-juiz para com o jurisdicionado. O principio supramencionado está ligado com o acesso ao Poder Judiciário[27].

Nesse contexto, é que se aplicam regras especiais quando a Fazenda Pública é parte numa demanda judicial, a fim de atender o bem comum, alcançando metas de boa convivência dos individuas que compõem a sociedade, pois quando a Fazenda Pública está em juízo, ela está defendendo o erário[28].

Merecendo, portanto um tratamento diverso, cita-se, a título de exemplo, a regra especial dos prazos diferenciados, pois o art. 188 do CPC prevê aos entes estatais prazo em dobro para recorrer em quádruplo para contestar, vejamos: Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte  for a Fazenda Pública ou o Ministério Público”.

O Supremo Tribunal Federal[29] entende que quando Fazenda Pública está em juízo deve merecer tratamento diferenciado, pois está lidando com interesses coletivos, transcreve-se aresto do julgado proferido pela Suprema Corte: “Não ofende o princípio da isonomia, aplicável a igualdade das partes no processo, o conferimento de tratamento especial à Fazenda Pública, o que se faz em atenção ao peso e superioridade dos seus  interesses em  jogo”.

No que diz respeito aos prazos diferenciados, Nelson Nery Junior[30] argumenta que o art. 188 está em plena consonância com a constitucionalidade, tendo vista que o princípio constitucional da isonomia deve ser percebido em relação à Fazenda Pública e ao Ministério Público no seu sentido substancial, sintético. Devendo-se assim conceder tratamento desigual aos desiguais, no exato alcance das suas desigualdades.

A prerrogativa da isonomia confere ao ente público, o exercício de uma atividade sem maiores prejuízos ao erário, pois é promotora do interesse público, justificando pelas prerrogativas e privilégios processuais, em favor da Fazenda Pública[31].

 

1.3 Privilégios inerentes a Fazenda Pública

 

Os privilégios garantidos à Fazenda Pública têm como fundamento as prerrogativas processuais anteriormente explanadas: supremacia do interesse público e o principio da isonomia.

As pessoas jurídicas de direito público gozam de vários benefícios quando estão em demandas judiciais, como por exemplo, com relação a honorários advocatícios a que se sujeitam quando a Fazenda Pública for vencida, a prazos, a eficácia das sentenças contra a Fazenda Pública, o seu procedimento de execução distinto dos demais, em especial, a execução de pagar a quantia certa[32].

Outros privilégios processuais são os pagamentos das despesas judiciais ao final do processo, nos casos de sentença proferida contra ela e a dispensa de efetuar o preparo nos recursos desfavoráveis à Fazenda Pública. No caso das ações possessórias, com pedido de medida liminar, é necessário designação de audiência prévia, suspensão de segurança quando houver interesse seu[33].

 

 

1.3.1 Juízo Privativo

 

 

O juízo privativo da Fazenda Pública é competente para julgar todas as causas em que o interesse da União, dos Estados e dos Municípios se manifestem, ainda que indiretamente no desenlace da contenda judicial[34].

O Código de Processo Civil, em seu artigo 91, dispõe sobre a competência em razão da matéria, prevendo que a competência da Fazenda Pública é regulada pela Lei de Organização Judiciária, transcreve-se para melhor visualização: “Regem a competência em razão do valor e da matéria as normas de organização judiciária, ressalvados os casos expressos neste Código”.

Na explanação de Maria Sylvia Zanella Di Pietro[35] esse juízo privativo é para beneficiar as entidades estatais. Informa que, no Estado de São Paulo, para as demandas concernentes ao Estado, Município ou às entidades paraestatais, a competência é das Varas da Fazenda Pública, conforme art. 36 do Decreto-Lei Complementar nº. 03 de 27 de agosto de 1969.

Assim, todas as demandas em que os entes públicos, estando tanto no pólo ativo como no pólo passivo, terão o benefício do juízo privativo para conhecer, processar e julgar as demandas em que o Estado atuar como autor.

 

 

1.3.2 Dos prazos diferenciados

 

 

Quando a demanda contiver, no pólo passivo ou ativo a Fazenda Pública, os prazos serão computados em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer, conforme o art. 188 do Código de Processo Civil: Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte  for a Fazenda Pública ou o Ministério Público”.

O prazo diferenciado foi concedido de forma especial por causa da organização burocratizada que envolve a Fazenda Pública. Salientando-se que para Costa Machado não há nada de inconstitucional nele, pois o principio da isonomia determina que devam se tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual[36]. 

O particular, no procedimento ordinário, tem prazo de 15 dias para contestar, conforme art. 297 do CPC. Quanto a Fazenda Pública, a Lei prevê o prazo em quádruplo para apresentar  contestação, que constitui em forma de defesa, de resposta do réu, ou seja, 60 (sessenta) dias para contestar. Também é aplicado, o privilégio em comento, no caso de reconvenção, oposição de exceções [37].

Ainda de acordo com o artigo acima mencionado, a Fazenda Pública dispõe de prazo em dobro para recorrer. Este benéfico é aplicado somente para os recursos, e não para os atos impugnativos, como por exemplo, do pedido de reconsideração[38].

Sobre a apresentação de contra-razões ao recurso, a Fazenda Pública, não dispõe do privilégio em dobro, pois tal beneficio é somente para recorrer, então para responder ou contrarrazoar o prazo é comum[39].

O referido privilégio é de cunho especialíssimo, não podendo ser aplicado de forma extensiva e nem por via da interpretação analógica, somente nas hipóteses previstas na lei processual civil[40].

  Assim deve-se conceder o beneficio do prazo dilatado à Fazenda Pública, em atenção a certos valores e circunstancias, pois é o principio do interesse público, bem como da isonomia que justifica tal favorecimento[41].

 

 

1.3.3 – Do Reexame Necessário

 

 

Existem pontos muito relevantes sobre o duplo grau de jurisdição obrigatório para a Fazenda Pública, sobre os seus efeitos e privilégios processuais, pois a imposição do duplo grau obrigatório em relação às sentenças desfavoráveis à Administração Pública ainda é alvo de árduas discussões[42]. 

O reexame necessário é referido como o antigo recurso ex officio, terminologia abandonada, porque hoje é incoerente a idéia de que o juiz recorra da sua própria decisão. Portanto, não se trata de recurso, mas como o próprio nome já diz, de um reexame necessário, que condiciona a liberação dos seus efeitos à formação da coisa julgada[43].                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                              

A lei nº. 10.352/2001 preceitua que a redação dada ao art. 475 do CPC indica que está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeitos senão depois de confirmado pelo Tribunal de Justiça, a sentença que desfavorecer a Fazenda Pública[44]. Transcreve-se o art. 475, inciso II e I, do Código de Processo Civil.

Conforme o artigo supramencionado, o juiz ordenará a remessa dos autos, havendo ou não apelação da parte vencida e, no caso da Fazenda Pública, o próprio Tribunal de Justiça irá avocá-los[45].

O objetivo de tal procedimento é para permitir que as ações em que as partes são os entes estatais, que envolvem assuntos de interesses públicos, sejam reapreciadas por uma instância superior[46].

Quando for proferida a sentença, as partes somente sentirão os seus efeitos, depois de apreciado o recurso pelo Tribunal, conforme entendimento de Candido Rangel Dinamarco[47]:

(...) não se trata de somente negar a autoridade de coisa julgada, mas também excluir-lhes por completo qualquer eficácia – porque a devolução oficial tem efeito suspensivo, não permitindo sequer à execução provisória das sentenças sujeitas ao regime do art. 475.     

 

O reexame necessário faz com que a sentença seja reapreciada e enquanto isso não ocorre, não transitará em julgado. Nestes termos, o reexame necessário tem natureza jurídica de “condição de eficácia da sentença”, não ostentando o timbre de um recurso[48].

Todavia, há casos que o reexame necessário não é obrigatório, como nas causas que não excedam 60 (sessenta) salários mínimos, e quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste tribunal ou do tribunal superior competente (art. 475, §2º e §3º do CPC). Entretanto, encontrarão óbice no art. 100 da Constituição Federal.

 A razão do reexame necessário é dar às sentenças um julgamento com maior segurança, sendo que tal reexame pode obter melhor resultado do que o julgamento de primeiro grau. Deve-se salientar que, no julgamento da sentença que desfavoreceu a Fazenda Pública, não há de se falar em reformatio in pejus, tendo em vista que, por mais que a remessa necessária tenha efeito translativo pleno, não permite que a situação da Administração Pública se agrave, conforme verbete de súmula nº 45 do Superior Tribunal de Justiça: “No reexame necessário, é defeso, ao Tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda Pública” [49].

 

 

1.3.4 – Pagamento das despesas judiciais

 

No que diz respeito ao pagamento das despesas processuais pela Fazenda Pública, o artigo 27 e o parágrafo único do art. 1.212 do Código de Processo Civil prevêem o momento oportuno:

 

Art. 27. As despesas dos atos processuais, efetuados a requerimento do Ministério Público ou da Fazenda Pública, serão pagas a final pelo vencido.

 

Art. 1.212. parágrafo único. As petições, arrazoados ou atos processuais praticados pelos representantes da União perante as justiças dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, não estão sujeitos a selos, emolumentos, taxas ou contribuições de qualquer natureza.

 

 A Lei de nº. 9.494/97, que disciplina a aplicação da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, em seu art. 1º-A determina que:

 

Art. 1o-A.  Estão dispensadas de depósito prévio, para interposição de recurso, as pessoas jurídicas de direito público federais, estaduais, distritais e municipais.

 

                        A lei nº 6.830/1980 que dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública prevê que a Administração Pública não está sujeita ao pagamento de despesas judiciais:

Art. 39 - A Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento de custas e emolumentos. A prática dos atos judiciais de seu interesse independerá de preparo ou de prévio depósito.

 

Tal matéria sempre enseja controvérsias, considerando que há os que recomendam que a isenção que goza a Fazenda Pública está adstrita aos auditórios, secretarias ou serventias, enquanto os atos realizados no âmbito do Poder Judiciário, como despesa de locomoção com oficial de justiça, adiantamento de salários periciais, diárias de perito com diligência são de responsabilidade do autor/particular[50].

                        Vale transcrever o trecho do voto proferido, à unanimidade, no ROMS nº. 10349/RS, de Relatoria do em. Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, DJ de 20/11/2000:

Estadeado o facies, na trilha da solução, ganha vulto registrar disposições cujos efeitos devem ser considerados: - CPC, art. 27: 'As despesas dos atos processuais, efetuados a requerimento do Ministério Público ou da Fazenda Pública, serão pagas a final pelo vencido ' (g. f.) - Lei 6.830/80, art. 39: 'A Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento de custas e emolumentos . A prática dos atos judiciais de seu interesse independerá de preparo ou de prévio depósito ' (g. f.). A foco os padrões legais comemorados, no soar da franquia, convém observar a natureza jurídica das chamadas 'despesas ' que não se confundem com 'custas' e 'emolumentos '. De imediato, sob pena de ficar desajustado, certo que o direito não pode ignorar as realidades ('natureza das coisas'), anotadas as diferenças dos nominados ônus processuais, a jurisprudência tem excluído da dispensa as despesas fora da atividade cartorial (p. ex.: perícias, avaliações, publicações de editais na imprensa, rogatórias, etc. É o sentido da Súmula 232/STJ). Fora as restritas hipóteses, entende-se que operada a isenção específica privilegiando a Fazenda Pública, os atos judiciais, a final, serão pagos pela parte ou interessado vencido. Por isso, à mão de ilustrar, a alforria do prévio preparo ou depósito de 'custas e emolumentos ', não estão liberados, porém somente cobráveis ou exigíveis pelas serventias não oficializadas, a final (CPC, art. 27 c/c o art. 39, Lei 6.830/80).

 

Exemplifica Araken de Assis a instrução de carta precatória, pois é sabido que é um ato praticado no cartório pela serventia e é custeado pelo Estado. Sendo que a Fazenda Pública está dispensada do pagamento das custas judiciais, inclusive preparo e emolumentos[51].

Entretanto, há casos como as despesas com postagem, que inexiste isenção especifica, havendo de recair dita responsabilidade sobre a parte que será beneficiada pelo ato citatório e, se caso for a Fazenda Pública, sob o argumento de que a isenção constituirá evidente injustiça para aquele que deve suportar o encargo, e que, inexistindo isenção expressa, seria inconcebível atribuir a referida despesa para outrem, uma vez que a Constituição Federal assegura que: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CF, art. 5º, II) [52].

Caso a Fazenda Pública seja vencida na demanda deverá ressarcir o vencedor da ação, inclusive os honorários de perito, locomoção, diária. Frisa-se, que as despesas em comento constituirão crédito contra o ente público, exeqüível pelo procedimento previsto no art. 730 do CPC[53].

 

 

1.3.5 Da Revelia

 

 

A revelia advém do comportamento do réu em juízo, pois a defesa da ação não é um dever do réu, mas sim um comportamento de que se espera do demandado. Em sentido estrito, a revelia seria a situação em que se coloca o réu quando o mesmo não contesta a ação[54].

Assim, será revel aquele que não pratica o ato processual de contestar, ou que,  citado, não comparecer, ou ainda, quando comparece à demanda, desacompanhado de advogado[55].

A respeito da revelia, a Fazenda Pública não está adstrita a o que diz o art. 319 do CPC: “Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor”.

Caso a Fazenda Pública não apresente contestação, ela será revel, entretanto não poderá sofrer os efeitos da revelia, que consistem na dispensa de intimação para todos os demais atos do processo, sendo este efeito somente produzido caso o réu além de não contestar, não comparecer na demanda[56].

O efeito material da revelia está esculpido no art. 319 do CPC, que prevê serão considerados verdadeiros os fatos articulados pelo autor na exordial. Entretanto, a Fazenda Pública não esta ligada ao efeito material, tendo em vista que o ente público tem como pilastra o principio da supremacia e da indisponibilidade do interesse público, de forma que não há como presumir ser legítima a pretensão do autor, pois os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade[57].

O posicionamento da Corte Superior sobre a revelia é de que quando a Fazenda Pública atua no processo em virtude da existência de interesse público, confere-se ao próprio interesse público o exercício dessa atividade no processo, da melhor maneira possível, pois quando o legislador concedeu privilégios processuais à Fazenda Pública, atribuiu uma posição diferenciada dos particulares. É em razão desse fundamento que a Fazenda Pública, não sofre os efeitos da revelia, nos termos do art. 320, II, do CPC[58].

 

 

1.3.6 Precatório Judicial

 

 

A palavra ‘Precatório’ vem da precata que significa dizer requisitar alguma coisa a alguém. São cartas que os juízes expedem ao Presidente do Tribunal para que este ordene as repartições de efetuarem o pagamento.[59]

O precatório Judicial é a forma de pagamento do Estado para o jurisdicionado, pois a Fazenda Pública tem um procedimento especial para o pagamento da sentença condenatória.

Há dois momentos para realização do procedimento de precatório judicial, o primeiro se dá quando a expedição do precatório é deferia pelo juiz da execução e a segunda quando remetida ao presidente do tribunal, que requisitará a ordem de pagamento ao respectivo órgão.[60]

A atividade do presidente do tribunal para com o precatório é meramente administrativa, entendimento este reconhecido tanto pelo Supremo Tribunal Federal, como pelo Superior Tribunal de Justiça.[61]

O valor a ser pago é o que está subscrito no precatório e previsto no orçamento. Antigamente, com a inflação que o Brasil passava, o valor pago ao credor não correspondia ao poder de compra da moeda. Era, então, expedido um precatório complementar em decorrência da diferença existente na correção monetária.[62]

Entretanto, nos dias de hoje, não é mais possível a expedição do precatório complementar, tendo em vista o que dispõe o §1º do art. 100 da Constituição Federal que prevê que o pagamento deve ser efetuado em valor corrigido monetariamente, evitando-se assim os precatório complementares.[63]

O pagamento do precatório será realizado por ordem cronológica quando apresentada a requisição ao respectivo órgão. Quando se faz a requisição ao órgão competente à ordem de pagamento, a pessoa jurídica de direito público tem por obrigação, conforme §1º art. 100 da Constituição Federal, incluir a verba para satisfação do precatório até o dia 1º de julho, pois assim será incluso no orçamento do Estado e efetuado o pagamento até o final do exercício seguinte.[64]

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1] FELIPPE, Donaldo J. Dicionário do Advogado. 1 ed. São Pauo: Julex Livros, 1992, p. 205

[2] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 7. Ed. São Paulo: Dialética, 2009, p. 15

[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro . 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 95

[4] MONTEIRO, Samuel. Dos Crimes Fazendários. São Paulo: ed. Hemus, 1998. p. 10.

[5] MACHADO, Antonio Cláudio da Costa. Código de processo Civil Interpretado. São Paulo: Manole, 2007, p. 1.037/1.038

[6] VIANA, Juvêncio Vasconcelos. Execução contra a Fazenda Pública. São Paulo: Dialética, 1998. p. 15.

[7] ROCHA SOBRINHO, Délio José. Prerrogativas da Fazenda Pública em Juízo. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1999. p. 72

[8] Ibidem, MACHADO, Antonio Cláudio da Costa. p. 1.039

[9] STJ – Agravo de Instrumento nº Nº 543.895 – RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 15/03/2005, DJ 05/12/2005 P. 536

[10] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 710.

[11] STF - RE 8574, Relator(a):  Min. AFRÂNIO COSTA - CONVOCADO, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/08/1952, ADJ DATA 27-06-1955 PP-02134 ADJ DATA 22-06-1953 PP-01713 DJ 21-05-1953 PP-05562 EMENT VOL-00126 PP-00077

[12] CUNHA, 2009, p. 34.

[13] FEDERIGHI, 1996, p.15.

[14] CUNHA, op cit., p. 32

[15] Ibid., p. 33

[16] DI PIETRO, op cit., p. 64.

[17] Ibid.,p. 65.

[18] STF - RE 253885, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Primeira Turma, julgado em 04/06/2002, DJ 21-06-2002 PP-00118 EMENT VOL-02074-04 PP-00796

[19] STJ - RMS 20.100/SC, Rel. Ministro  GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 22/05/2007, DJ 29/06/2007 p. 666.

[20] TJMA- Mandado de Segurança nº 013780/2008 – São Luis, Relator Des. José Stélio Nunes Muniz, Acórdão n. 83.757/2009, data da publicação: 31/07/2009.

[21] CUNHA JÚNIOR, Derley da. Controle Judicial das Omissões do poder Público. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 165

[22] STF - RE 453740, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 28/02/2007, DJe-087 DIVULG 23-08-2007 PUBLIC 24-08-2007 DJ 24-08-2007 PP-00056 EMENT VOL-02286-14 PP-02627 RTJ VOL-00202-01 PP-00341

[23] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p.31

[24] STF - RE 453740, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES., op cit., p. 2.686.

[25]KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Martins Fontes, 2006, p. 76

[26] CUNHA, 2009, p.30.

[27] CUNHA, op cit., p. 31

[28] Ibidem, CUNHA, Leonardo José Carneiro da, p. 33

[29] STF - RE 83432, Relator(a):  Min. LEITAO DE ABREU, Tribunal Pleno, julgado em 22/03/1979, DJ 06-06-1980 PP-***** EMENT VOL-01174-01 PP-00402 RTJ VOL-00094-01 PP-00209

[30] NERY JÚNIOR; NERY., 2007, p.742.

[31] CUNHA, op cit., p. 36.

[32] ZAVASCKI, 2000, p.190.

[33] FEDERIGHI, 1996, p.12.

[34] STF - CJ 2202, Relator(a):  Min. RIBEIRO DA COSTA, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/08/1956, ADJ DATA 01-04-1957 PP-01025

[35] DI PIETRO, 2008, p. 711.

[36] MACHADO, 2007, p. 180.

[37] CUNHA, 2009, p.50

[38] CUNHA, op cit, p. 57-58

[39] Ibid. p. 59

[40] DIAS, Francisco Geraldo Apoliano. Execução da Obrigação de Dar, Fazer e Não Fazer em face da Fazenda Pública: Casos Concretos na Justiça Federal. Brasília: CJF, 23. v. 2003, p. 238

[41] STF - RE 94960, Relator(a):  Min. RAFAEL MAYER, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/11/1981, DJ 08-10-1982 PP-10190 EMENT VOL-01270-02 PP-00487

[42] SILVA, Ana Cristina Lima. A Efetividade da Tutela Jurisdicional na Atual Reforma da Legislação Processual Civil. Revista do Ministério Público do Maranhão. 1. v. 1. ed. São Luis: jan/dez, nº10, 2003, p. 239-240,  

[43] MACHADO, op.cit., p. 494.

[44] SILVA, op.cit., p. 240.

[45] DI PIETRO, 2008, p. 712.

[46] Idem, ibidem.

[47] DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da Reforma. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 131.

[48] CUNHA, op.cit.,p. 198.

[49] NERY JÚNIOR; NERY., 2007, p.713.

[50] STJ - REsp 1076914/SE, Rel. Ministro  LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/03/2009, DJe 22/04/2009

[51] ASSIS, Araken de. Manuel de Execução. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 471

[52] Ibidem, STJ - REsp 1076914/SE, Rel. Ministro  LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/03/2009, DJe 22/04/2009

[53] ASSIS, op.cit., p. 472

[54] WAMBIER, 2007 , op.cit., p. 383

[55] Ibid, p. 383-384

[56] CUNHA, op.cit., p. 93.

[57] Ibid., p. 95.

[58] STJ - AgRg no REsp 1137177/SP, Rel. Ministro  HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/02/2010, DJe 02/03/2010

[59] SILVA, 1999, op cit., p. 115/116

[60] Ibid., p.116

[61] CUNHA, op cit., p. 303

[62] Ibid., p. 304

[63] Ibid., p. 304

[64] ASSIS, op cit., p. 938

Importante:
1 - Conforme lei 9.610/98, que dispõe sobre direitos autorais, a reprodução parcial ou integral desta obra sem autorização prévia e expressa do autor constitui ofensa aos seus direitos autorais (art. 29). Em caso de interesse, use o link localizado na parte superior direita da página para entrar em contato com o autor do texto.
2 - Entretanto, de acordo com a lei 9.610/98, art. 46, não constitui ofensa aos direitos autorais a citação de passagens da obra para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor (Mariana Guimarães Dos Santos) e a fonte www.jurisway.org.br.
3 - O JurisWay não interfere nas obras disponibilizadas pelos doutrinadores, razão pela qual refletem exclusivamente as opiniões, ideias e conceitos de seus autores.

Nenhum comentário cadastrado.



Somente usuários cadastrados podem avaliar o conteúdo do JurisWay.

Para comentar este artigo, entre com seu e-mail e senha abaixo ou faço o cadastro no site.

Já sou cadastrado no JurisWay





Esqueceu login/senha?
Lembrete por e-mail

Não sou cadastrado no JurisWay




 
Copyright (c) 2006-2024. JurisWay - Todos os direitos reservados