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SOLIPSISMO JUDICIAL: Do Livre Convencimento ao convencimento motivado


Autoria:

Neilso Alves Ferreira Junior


NEILSO ALVES FERREIRA JÚNIOR. Advogado Cível, Criminal e Trabalhista. Graduado em Direito pela PUC - Minas.

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Resumo:

O presente trabalho baseia-se na analise do famigerado solipsismo judicial bem como do paradigma da filosofia da consciência que segundo a doutrina é tido como o paradigma filosófico ao qual se sustenta o solipsimo.

Texto enviado ao JurisWay em 07/03/2018.

Última edição/atualização em 13/03/2018.



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SOLIPSISMO JUDICIAL:

Do livre convencimento ao convencimento motivado

 


 

 

 

RESUMO

 

O presente trabalho baseia-se na analise do famigerado solipsismo judicial bem como do paradigma da filosofia da consciência que segundo a doutrina é tido como o paradigma filosófico ao qual se sustenta o solipsimo. E ainda confrontar o príncipio do livre convencimento motivado ao principio do convencimento motivado, com o escopo de analisar ambos os princípios regedores do sistema de apreciação da prova, objetivando-se traçar uma relação entre o problema da a atual conjuntura processual das decisões judiciais discrepantes e a latente crise de segurança jurídica vivida no Brasil ao principio do livre convencimento motivado, através da analise doutrinaria e jurisprudencial do referido principio. Após será feita uma analise da nova ótica inaugurada pelas inovações trazidas pelo novo código de processo civil, dando uma ênfase ao fim do principio do livre convencimento motivado e afirmação do convencimento motivado a luz do Estado Democrático de Direito, dos mandamentos constitucionais e do posicionamento doutrinário.

 

Palavras-chave: Solipsismo judicial; Filosofia da consciência; Livre Convencimento Motivado; Convencimento Motivado; Novo CPC;

ABSTRACT

 

This work is based on the judicial solipsism infamous of analysis as well as the paradigm of the philosophy of consciousness according to the doctrine is considered the philosophical paradigm to which sustains solipsism. And still confront the principle of free conviction motivated the beginning of motivated conviction, with the aim of analyzing both aldermen principles of evidence evaluation system, aiming to draw a relationship between the problem of the current procedural situation of conflicting court decisions and the latent legal security crisis in the Brazil to the principle of free conviction motivated by doctrinal and jurisprudential analysis of that principle. After an analysis of the new perspective opened by the innovations brought by the new civil procedure code will be giving an emphasis to the end of the principle of free motivated conviction and affirmation of motivated conviction light of the democratic rule of law, constitutional commandments and doctrinal position .

 

Keywords: judicial solipsism; Philosophy of consciousness; Free Convincing Motivated; Convincing Motivated; New CPC;

 

 


1 INTRODUÇÃO

 

O presente trabalho baseia-se na analise do famigerado solipsismo judicial bem como do paradigma da filosofia da consciência que segundo a doutrina é tido como o paradigma filosófico ao qual se sustenta o solipsimo. E em um segundo momento busca confrontar o principio do livre convencimento motivado ao principio do convencimento motivado, com o escopo de analisar ambos os princípios regedores do sistema de apreciação da prova, objetivando-se traçar uma relação entre problema da a atual conjuntura processual de decisões discrepantes e a latente crise de segurança jurídica vivida no Brasil, ao principio do livre convencimento motivado, que aduz que o juiz pode sentenciar de acordo com o seu livre convencimento.

Deste modo em um primeiro momento busca-se entender o que a doutrina entende pelo famigerado termo: solipsismo judicial. Iniciando-se com uma analise do paradigma da filosófia da consciência, demonstrando o fundamento central de tal paradigma filosófico, qual seja a “relação sujeito-objeto”, bem como demonstrar como o sujeito desta relação irá oportunizar a construção de seu conhecimento e como os sentidos dos objetos desta relação passão a ser objetiváveis por este sujeito.

Feito isso, passa-se a uma analise mais detida do solipsismo judicial, de modo a demonstrar que o decidir de forma solipsista ou “decidir conforme a consciência” encontra respaldo na consciência do julgador, transformando a decisão judicial em um mero exercício de escolha que acaba por gerar um verdadeiro descaso com a ciência jurídica e oportunizando discricionariedades e insegurança jurídica.

Em um terceiro momento, já no capítulo três, é inicialmente feito um levantamento doutrinário dos sistemas de apreciação da prova anteriores ao do livre convencimento motivado, quais sejam o sistema da certeza legal e o da livre convicção.

Em seguida busca-se demonstrar de maneira mais detalhada as características do sistema de apreciação da prova do “livre convencimento motivado” recém-extinto do ordenamento processual Brasileiro, de forma a demostrar a suas características e os efeitos que esse sistema tem gerado na ciência do direito.

Ainda no terceiro capitulo é feita uma analise jurisprudencial de forma a demonstrar os moldes que as decisões tomam a partir da liberdade conferida ao julgador pelo principio do livre convencimento motivado e os efeitos causados a ciência do direito pelas decisões oportunizadas pelo dito príncipio com o intuito de se analisar sua suficiência e coerência com o atual processo civil e o Estado Democrático de Direito.

No capitulo quarto é feita uma analise da nova ótica inaugurada pelas inovações trazidas pelo novo código de processo civil, dando uma ênfase ao fim do principio do livre convencimento motivado e afirmação do convencimento motivado.

De modo se fazer uma analise constitucional conjuntamente com uma exposição mais detalhada dos Artigos 1º, 10º, 371º e 489º do novo diploma processual civil. Demonstrando o posicionamento da doutrina quanto às alterações e inovações propiciadas por estes diapositivos.

Bem como demonstrar a opção feita pelo legislador e muito bem acerta em adequar o processo civil aos mandamentos constitucionais, elegendo para tanto o devido processo legal e o contraditório com regedores do processo e demonstrar a preocupação do legislador com a fundamentação das decisões judiciais e adequação das mesmas com o paradigma do Estado Democrático de Direito.

No que se refere a metodologia a ser utilizada para se concretizar o objetivo deste trabalho, o método principal a ser utilizado será o da análise crítica da bibliografia específica sobre o tema. Além disso, procederemos à análise crítica mediante a comparação entre diferentes interpretações possíveis das ideias preconizadas nas obras de natureza primária. Nesse diapasão, ao passo que colocaremos os estudiosos em uma situação de diálogo, procederemos à análise crítica de suas posições. Ademais, priorizar-se-á a construção de esquemas conceituais específicos, utilizando de processos discursivos e argumentativos para o convencimento sobre a validade dos esquemas propostos.

Em suma este trabalho se propôs a analisar a construção filosófica solipsista e os efeitos causados por ela na decisão judicial e na ciência do direito, buscando uma resposta para tal construção a partir da analise do principio do livre convencimento motivado e do convencimento motivado a partir dos preceitos fundamentais do Estado Democrático de Direito e atual adequação do processo civil a estes preceitos por meio de seu novo código de processual civil.


2 O SOLIPSISMO

 

Este trabalho busca compreender o que a doutrina entende pelo famigerado termo: solipsismo judicial. Tendo em vista que a discussão sobre o solipsismo no direito brasileiro ganha importância na medida em que os tribunais passam a assumir a função do legislador.

Assim, a grande questão é o solipsismo representa uma ruptura com a legitimidade democrática ou significa uma técnica de decisão judicial que o direito não pode controlar?

E se seria possível em um sistema normativo regido pelo contraditório a existência do livre convencimento, sustentado pelo solipsismo judicial? Bem como se seria possível se falar em segurança jurídica diante da liberdade do julgador?

Em diversas de suas obras Lenio Luiz Streck denuncia a discricionariedade judicial e solipsismo judicial com o intuito de se evitar a perda da autonomia do Direito. E em suas denuncias podemos destacar o combate que o doutrinador trava contra o decidir de forma solipsista e sua raiz filosoica:

 

O “decidir” de forma solipsista encontra “fundamentação” – embora tal circunstância não seja assumida explicitamente – no paradigma da filosofia da consciência. Essa questão assume relevância e deve preocupar a comunidade jurídica, uma vez que, levada ao seu extremo, a lei – aprovada democraticamente – perde(rá) (mais e mais) espaço diante daquilo que “o juiz pensa acerca da lei.[1]

 

Deste modo é mister que inicialmente compreendamos o significado da construção solipsista, o que melhor poderemos fazer a partir de uma breve analise da raiz desta construção, que segundo a doutrina está diretamente ligada ao paradigma epistemológico da filosofia da consciência.

 

2.1Filosofia da consciência

 

A partir do advento da filosofia da consciência tem-se a ideia de que os sentidos estão na consciência do sujeito, os sentidos não estão mais nas coisas, pois agora estas não possuem mais uma essência, pelo contrario o sujeito a partir de sua razão dará sentido as coisas, e essas serão o que a consciência do sujeito dizer que é. Pois este é um ser pensante e se pensa não pode ser colocado em duvida. Conforme bem explica Lenio Luiz Streck:

 

A partir de René Descartes, tem-se que os sentidos se antes estavam nas coisas (por que estas tinham uma essência), agora passam a estar na consciência do sujeito. Vale dizer, a filosofia cartesiana transfere a substância aristotélica que se colocava na natureza e naquilo que, diante da constante modificação, permanece inalterado, para a certeza de si do pensamento pensante (cogito). Todas as afirmações e dogmas da tradição foram colocados em dúvida pelo cartesianismo, até que essa dúvida encontrou qualquer coisa que já não podia ser posta em dúvida: enquanto se duvida, não se pode duvidar que aquele que duvida ele próprio existe e que tem que existir para que possa duvidar. Na medida em que duvido, portanto, eu sou. O eu é aquilo que não pode ser colocado em dúvida. Desse modo, antes da teoria acerca do mundo (esse sim, objeto da dúvida), deve colocar-se a teoria acerca do sujeito. Daqui em diante a teoria do conhecimento é o fundamento da filosofia, o que a torna moderna, distinguindo-a da medieval[2].

 

Assim o sujeito do paradigma da filosofia da consciência ira fundar sua busca pelo conhecimento em uma intencionalidade subjetiva dominante, tornando-se assim livre para tomar decisões. Onde ira prevalecer à ação do sujeito sobre o objeto “relação sujeito-objeto”, tornando-se se assim quase absoluto e livre na construção do conhecimento, não estando, portanto vinculado a nada a não ser sua própria consciência, nem se quer as condições históricas e objetivas que envolvem a construção do objeto, pois este sujeito é autossuficiente, bastando-se de si próprio para construção do conhecimento.

E neste sentido o paradigma da filosofia da consciência para José Carlos Libâneo:

 

Sustenta-se na idéia de que o sujeito, na busca do conhecimento e na orientação da ação humana, baseia suas decisões numa intencionalidade subjetiva soberana. É essa intencionalidade consciente que dá sentido às nossas ações e que nos torna autônomos e livres para tomar decisões, já que somos sujeitos cognitivos e éticos. Prevalece, na relação sujeito-objeto, a ação do sujeito sobre o objeto, em que o sujeito torna-se quase absoluto, autônomo, na construção do conhecimento e do pensamento. No extremo, esse paradigma defende a autonomia das idéias, o primado explicativo das idéias, a auto-suficiência do sujeito pensante, frequentemente sem considerar as condições históricas e objetivas que envolvem a construção do conhecimento[3].

 

Deste modo a filosofia da consciência propicia ao sujeito a construção do conhecimento, pois a partir deste paradigma filosófico os objetos não possuem mais uma essência, não a sentido a se buscar nesses objetos, não se busca mais interpretar este objeto para conhecê-lo, o conhecimento a partir daqui é subjetivista e não mais objetivista, pois o sujeito a partir de métodos específicos ira estabelecer os sentidos de todas as coisas, o conhecimento a partir daqui será construído pelo interprete, pois este é dono dos sentidos. Nesse sentido ressalta Luiz Lenio Streck:

 

(...) filosofia da consciência, que coloca como fator de organização, que se antecipa em todo processo de conhecimento, a subjetividade que conhece as coisas. Nesse âmbito, o conhecimento não é “dado”. Aqui, o conhecimento é “construído” por um sujeito que emprega um método específico de análise e passa a estabelecer os sentidos.

Daí que nesse contexto, teremos um tipo de interpretação que podemos nomear como subjetivista.

Em resumo: tendo em conta os paradigmas filosóficos que dirigem a interpretação, é possível dizer que objetivista é a postura hermenêutico-interpretativa que organiza o seu processo de determinação do sentido a partir de um aprisionamento do sujeito que conhece ao objeto que é conhecido; ao passo que subjetivista é a postura hermenêutico-interpretativa que espelha o paradigma da filosofia da consciência, no interior do qual o intérprete é o dono dos sentidos.[4]

 

Acredita-se, pois, a partir da filosofia da consciência na existência de um sujeito cognoscente capaz de conhecer o mundo e as coisas contidas nesse mundo a partir de sua razão. Se aposta a partir do paradigma filosofico da consciência no esquema sujeito-objeto, no qual esse sujeito já não está mais nesse mundo mais sim situado enfrente a este mundo. E a partir dessa sua nova posição em relação a este mundo esse sujeito é capaz de descrever e objetivar esse mundo a partir de seu pensamento. Sendo, portanto capaz de conhecê-lo a partir de sua razão utilizando-se de um instrumento, que aqui é apresentado como uma terceira coisa, que é a linguagem. Conforme bem explica Luiz Lenio Streck:

 

Mais contemporaneamente, a dogmática jurídica vem apostando no paradigma epistemológico que tem como escopo o esquema sujeito-objeto, no qual um sujeito observador está situado em frente a um mundo, mundo este por ele “objetivável e descritível”, a partir de seu cogito (filosofia da consciência). Acredita-se, pois, na possibilidade da existência de um sujeito cognoscente, que estabelece, de forma objetificante, condições de interpretação e aplicação. O jurista, de certo modo, percorre a antiga estrada do historicismo. Não se considera já e sempre no mundo, mas, sim, considera-se como estando-em-frente-a-esse mundo, o qual ele pode conhecer, utilizando-se do “instrumento” (terceira coisa) que é a linguagem jurídica...![5]

 

Pois bem, a partir da filosofia da consciência tem-se a ideia de que a razão é suficiente para se explicar a realidade e conhecer o mundo, sendo necessário para tanto somente se voltar para o mundo interior do sujeito interprete. Ou seja, o sujeito da relação que delineamos deduzira o que é algo a partir de sua consciência. “E a realidade a partir deste paradigma será a que o sujeito estabelecer a partir de sua consciência”.[6]

E é segundo a doutrina justamente neste paradigma epistemológico filosófico que o solipsismo judicial se enquadra. Deste modo e a partir do que delineamos neste capitulo, poderemos buscar compreender a construção solipsista, bem como o que a doutrina entende ser está construção e os efeitos da mesma no direito brasileiro.

 

2.2 Solipsismo judicial

 

A partir do que foi delineado anteriormente podemos entender o que é tido pela doutrina como solipsismo judicial.

Sendo que a doutrina aponta como sendo o solipsismo um derivado de uma corrente filosófica que estabelece a ideia de existência de apenas um Eu que acredita que a única certeza de existência é o pensamento bem como que o conhecimento deve estar fundado em suas aspirações interiores, em sua razão. Como bem afirma Blackburn:

 

O solipsismo “é a consequência extrema de se acreditar que o conhecimento deve estar fundado em estados de experiência interiores e pessoais, não se conseguindo estabelecer uma relação direta entre esses estados e o conhecimento objetivo de algo para além deles”. Trata-se, portanto, de uma corrente filosófica que determina que exista apenas um Eu que comanda o Mundo, ou seja, o mundo é controlado consciente ou inconscientemente pelo Sujeito. Devido a isso, a única certeza de existência é o pensamento, instancia psíquica que controla a vontade. O mundo ao redor é apenas um esboço virtual do que o Sujeito imagina, quer e decide o que é. [7]

 

A partir deste ponto temos que o decidir de forma solipsista ou “decidir conforme a consciência” encontra fundamentação nos pensamentos interiores do julgador, suas experiências adquiridas em sua vida forense ou pessoal, seus sentimentos e suas opiniões pessoais sobre certo tema, podendo ser inclusive influenciada pelo seu humor. Porém se está afirmação for correta teremos um verdadeiro descaso com a ciência jurídica, pois se estes forem os critérios utilizados pelo julgador para formar a decisão judicial, estaremos diante de uma escolha e não diante de uma decisão construída a partir do Direito. E nesse ponto devemos nós perguntar, será que uma escolha pode trazer segurança jurídica?

O solipsismo judicial traz consigo uma ideia de que o juiz é livre para decidir e que está liberdade de decisão está ligada a uma ideia de que há apenas uma responsabilidade subjetiva em suas decisões. Como se o juiz construísse sua decisão a partir de seus sentimentos e vontades. Deixando de lado a construção democrática representada pela Lei. Nas palavras de Lenio Luiz Streck:

 

(...) a ideia de que a “liberdade de decisão do juiz” está ligada a uma ideia de responsabilidade subjetiva dos julgamentos que profere. Algo como dizer que o-juiz-constrói-sua-decisão-a-partir-de-uma-simbiose-de-razões-e-sentimentos que são apenas seus (vale dizer, um juiz solipsista — um Selbstsüchtiger).[8]

 

O juiz reduz a complexa questão do ato de decidir, ou melhor, dizendo “julgar” á um ato da consciência do intérprete, como se este ato devesse apenas explicações a um “tribunal da razão” ou decorresse de um simples ato de vontade do intérprete, como se a realidade ou a construção de uma possível realidade fosse reduzida a representação subjetiva do julgador.[9]

 Esse pensar subjetivista leva á ideia de que o magistrado, no exercício de sua função judicante não esteja adstrito a qualquer critério que seja de apreciação das provas contidas nos autos e nas teses elencadas pelas partes, podendo valorar as provas e interpretar as teses como sua consciência indicar, já que é soberano dos elementos probatórios apresentados e detém todo conhecimento necessário para apreciação da lide apresentada. Não estando compromissado com nada mais além de sua consciência. E é nesta mesma linha de pensamento que foi a decisão do Superior Tribunal de Justiça no Habeas Corpus HC 94.826/SP.

“Em face do princípio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, o Magistrado, no exercício de sua função judicante, não está adstrito a qualquer critério de apreciação das provas carreadas aos autos, podendo valorá-las como sua consciência indicar, uma vez que é soberano dos elementos probatórios apresentados.”[10]

 

            A partir do julgado acima fica claro a existência da figura do sujeito solipsista no Direito brasileiro, bem como que o juiz solipsista se compromete ao decidir apenas com sua consciência e conforme já demonstrado é motivado apenas por suas vontades.

 Pois bem, a partir do que foi demonstrado neste capitulo pode-se concluir que o sujeito solipsista ao decidir não busca compreender o que é posto a sua apreciação, mas sim interpreta conforme sua consciência e busca em seguida fundamentação para sua interpretação “escolha” que provavelmente também será extraída de seus pensamentos interiores. E é este o ponto crucial da questão, pois devemos compreender para interpretar, não a possibilidade de interpretação sem compreensão. A decisão não é e não pode ser uma mera escolha do julgador, sob pena de destruir a ciência jurídica.

 

 

3 PRINCIPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO OU PRINCIPIO DO CONVENCIMENTO MOTIVADO

 

Segundo a doutrina historicamente são três os sistemas de apreciação da prova: o sistema da certeza legal; o da livre convicção; o do livre convencimento motivado, conhecido também por parte da doutrina como da “persuasão racional”.

 Porém com o novo código de processo civil de 2015 á inauguração de um novo sistema de apreciação da prova, qual seja, o sistema do “convencimento motivado”, que será tratado mais detidamente em capitulo próprio.

Neste capitulo iremos justamente traçar um breve relato dos sistemas de apreciação da prova apontados pela doutrina, de forma a demonstrar as características destes sistemas.

E por fim e objetivo principal deste capítulo demonstrar de maneira mais detalhada as características do sistema de apreciação da prova do “livre convencimento motivado” recém-extinto do ordenamento processual Brasileiro, de forma a demostrar a suas características e os efeitos que esse sistema tem gerado na ciência do direito e em conseguinte e a partir de analise jurisprudencial demonstrar os moldes que as decisões tomam a partir da liberdade conferida ao julgador pelo referido sistema de apreciação da prova, com o intuito de se analisar sua suficiência e coerência com o atual processo civil e o Estado Democrático de Direito.

 

3.1 Sistema da certeza Legal

 

O sistema da certeza legal já a tempos superado, era o sistema adotado pelo direito romano primitivo e pelo direito medieval[11], ele se caracteriza pela previa valoração da prova.

Segundo Rosemiro Pereira Leal, neste sistema a certeza dos fatos dependera da manifestação de Lei natural ou divina, por isso é que se denominou critério probatório da “certeza legal”.[12]

A respeito deste sistema Chiovenda ressalta:

Assim é que a apreciação das provas se vinculou a normas preestabelecidas. Foram rigidamente enumeradas, ordenadas e classificadas as razões que permitiam ou negar fé à testemunha. Duranti, no Speculum iudiciale, alinha-as em número de noventa e seis. E, aplicando-se esse procedimento a todas as provas, em geral, constitui-se o sistema da prova legal, ou seja, aquele complexo de regras que, distinguindo as provas em plenas e semiplenas, e cada uma em várias espécies; determinando o número de presunções necessárias a formar uma prova plena; precisando os casos e os defeitos por que uma prova baixa a semiplena; comensurando a idoneidade das provas à natureza do processo; perturbou o convencimento do juiz, reduzindo a tarefa do magistrado a uma verificação quase por inteira aritmética, do concurso do numero dos elementos necessários a formar, no caso concreto, aquilo que se convencionou como a verdade legal.[13]

 

Assim a prova revela a vontade divina que teria de ser acatada pelo julgador, mesmo que está não guardasse nenhum vinculo racional com a realidade[14].

 

3.2 Sistema da livre convicção

 

O sistema da livre convicção se contrapõe ao sistema da certeza legal. Neste o que prevalece é a intima convicção do juiz, que é soberano para investigar a verdade e apreciar as provas[15].

Ele surge com o iluminismo que traz uma nova concepção do Estado e do próprio homem. Nesse ambiente histórico, seria mesmo inaceitável a manutenção do sistema da certeza legal. O instrumento utilizado pelo homem à investigação das coisas deixa de ser a vontade supostamente divina e passa a ser a razão, a qual passa a ser abordada como o único meio de resgatar o homem daquilo que Kant chamava de minoridade[16].

Nesse sistema o juiz poderia adotar a solução que entendesse mais justa. A sentença aqui se baseia na “escolha” da melhor conduta que o julgador entendesse coerente com os costumes e valores de um determinado grupo social[17]. 

 

3.3 Sistema da persuasão racional - Principio do Livre Convencimento motivado

 

O “principio do livre convencimento” também denominado de principio da persuasão racional do juiz, foi adotado pelo Código de Processo Civil Brasileiro de 1973, mais especificamente em seu artigo 131, que dispõe o seguinte:

 

"Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento." 

 

O principio do livre convencimento motivado indica que o juiz deve formar de maneira livre sua convicção. Ou nas palavras de Paixão Junior, livre convencimento é a liberdade do juiz para escolha dos fatos que se convenceu serem verdadeiros, sobre os quais, no julgamento, o direito incidirá[18].

A partir do livre convencimento o julgador poderá decidir com base nas provas dos autos, mas também sem provas e até mesmo contra a prova[19].

 

3.4 A (in) suficiência do livre convencimento motivado ao Direito e as decisões dos Tribunais Brasileiros

 

Nota se que o principio em tela acaba possibilitando, ou melhor, dizendo gerando discricionariedade e arbitrariedades, se enquadrando perfeitamente no paradigma solipsista já delineado.

 O que podemos perceber claramente no voto proferido pelo Ministro Humberto Gomes de Barros em julgamento do Superior Tribunal de Justiça:

 

Não me importa o que pensam os doutrinadores. Enquanto for ministro do Superior Tribunal de Justiça, assumo a autoridade da minha jurisdição. O pensamento daqueles que não são ministros deste Tribunal importa como orientação. A eles, porém, não me submeto. Interessa conhecer a doutrina de Barbosa Moreira ou Athos Carneiro. Decido, porém, conforme minha consciência. Precisamos estabelecer nossa autonomia intelectual, para que este Tribunal seja respeitado. É preciso consolidar o entendimento de que os Srs. ministros Francisco Peçanha Martins e Humberto Gomes de Barros decidem assim, porque pensam assim. E o STJ decide assim, porque a maioria de seus integrantes pensa como esses ministros. Esse é o pensamento do Superior Tribunal de Justiça e a doutrina que se amolde a ele. É fundamental expressarmos o que somos. Ninguém nos dá lições. Não somos aprendizes de ninguém. Quando viemos para este Tribunal, corajosamente assumimos a declaração de que temos notável saber jurídico - uma imposição da Constituição Federal. Pode não ser verdade. Em relação a mim, certamente, não é, mas, para efeitos constitucionais, minha investidura obriga-me a pensar que assim seja.”[20]

 

Perceba que a partir do “livre convencimento” o Ministro deixa claro que não importa o que está fora da sua consciência, não importa o que é trazido aos autos, não lhe importa as construções doutrinarias, pois este decide conforme sua consciência e decide de tal modo por pensar que assim o é. E aqui estamos de frente a um verdadeiro descaso com a ciência jurídica e as diversas construções doutrinarias.

Vejamos mais um exemplo de julgado:

 

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. CONCEITO. A omissão que justifica opor embargos de declaração diz respeito apenas à matéria que necessita de decisão por parte do órgão jurisdicional (arts. 897-A/CLT e 535-II/CPC). Não é omissão o Juízo não retrucar todos os fundamentos expendidos pelas partes ou deixar de analisar individualmente todos os elementos probatórios dos autos. A sentença é um ato de vontade do Juiz, como órgão do Estado. Decorre de um prévio ato de inteligência com o objetivo de solucionar todos os pedidos, analisando as causas de pedir, se mais de uma houver. Existindo vários fundamentos (raciocínio lógico para chegar-se a uma conclusão), o Juiz não está obrigado a refutar todos eles. A sentença não é um diálogo entre o magistrado e as partes. Adotado um fundamento lógico que solucione o binômio" causa de pedir/pedido" inexiste omissão."[21]

 

No julgamento do embargo colacionado acima o relator afirma não haver omissão do Juízo ao não retrucar todos os fundamentos expendidos pelas partes ou deixar de analisar individualmente todos os elementos probatórios dos autos e mais, vai além, afirma ser a sentença um ato de vontade do juiz. E ai fica a pergunta, como assim sentença como ato de vontade? E a base legal para se fundamentar a decisão. Onde fica a lei aprovada de maneira democrática neste contexto, não estaria à lei perdendo espaço para o que o juiz pensa a respeito da mesma. Não estaria também a se sacrificar a garantia do contraditório.

Bem, exemplos é o que não nos faltam, quando a questão é discricionariedade, pois bem vejamos mais um exemplo, este, porém um pouco peculiar, pois trata-se da sagrada liberdade do livre convencimento:

“PROCESSUAL CIVIL. RESCISÃO CONTRATUAL. REITEGRAÇÃO DE POSSE. SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO. PRINCÍPIO DA PERSUASÃO RACIONAL. PROVA TESTEMUNHAL SUFICIENTE. POSSIBILIDADE. I – Vige em nosso sistema processual o princípio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional. Assim, não configura violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa o fato de o magistrado ter decidido contrariamente à tese esposada pela recorrente, desde que tenha formado seu convencimento mediante análise da prova produzida nos autos. II – sendo a prova testemunhal produzida suficiente e idônea para o deslinde da controvérsia, não há que se argumentar que o juiz decidiu a lide contra a lei e a orientação jurisprudencial, uma vez que o magistrado tem a sagrada liberdade do livre convencimento, não estando, por isso, vinculado a precedentes de qualquer natureza, senão a sua própria consciência e ao ordenamento jurídico vigente. III – Negou-se provimento ao recurso.”[22]

 

Veja que agora o poder conferido ao magistrado pelo livre convencimento é sagrado, algo divino, por tanto incontestável, não estando vinculado a qualquer precedente, mas apenas a sua consciência. E isso acaba por gerar uma insegurança jurídica e uma perda da legitimidade da lei.

Interessante também é trazer a confissão feita pelo Juiz de direito Fernando Vieira Luiz, na abertura de sua dissertação de mestrado, a qual foi demonstrada pelo Doutrinador Lenio Luiz Streck como o modelo de juiz B em uma de suas colunas na Conjur:

 

“sou juiz, minha mãe é juíza, meus amigos juízes e promotores, com os quais convivo, são todos honestos, probos e jutos. Interessante é que, quando nos reunimos para falar sobre os casos que decidimos, chegamos a conclusão que, embora a nossa honestidade, probidade e sentimento de justiça, damos sentenças tão diferentes umas das outras, em casos, por vezes, muito, muito similares”. Por isso, continuou, “cheguei a conclusão de que havia algo errado. Não basta ser honesto, probo e ter sentimento do justo. Todos, eu, minha mãe, meus amigos, decidimos conforme nossas consciências. Só que as decisões são tão discrepantes... Por isso, fui estudar ‘teoria da decisão’”[23].

 

   Desse modo fica claro a partir da confissão do ilustre juiz de Direito Fernando Vieira, que honestidade, probidade como também varias outras qualidades do julgador não levam a decisões adequadas e tão pouco garantiram segurança jurídica aos litigantes. Como bem alerta o doutrinador Lenio Luiz Streck “no mínimo, geram discrepâncias, porque os valores de cada um são contingenciais (aqui Habermas entra rachando!). Por isso, uma criteriologia vem bem... Ou seja: mesmo um conjunto de “boas pessoas” não garante decisões adequadas a Constituição.”[24]

E este é justamente o problema gerado ao se afirmar que o juiz é livre para escolha dos fatos que se convenceu serem verdadeiros e ou ser livre para decidir até mesmo contra as provas. De que adianta afirmar que o processo é regido pelo contraditório e que nesse processo é assegurada a garantia de ampla participação das partes se se permiti que o julgador esteja livre para apreciar as provas trazidas a lide pelas partes, conforme demonstrado nos julgados acima. Não pode o julgador estar livre para decidir e não está como já foi dito antes, “decidir” não é escolher, não pode a sentença estar vinculada a consciência do julgador e muito menos a sua vontade. Deve-se abandonar o subjetivismo, só assim teremos decisões coerentes com a ciência do direito e as leis democraticamente aprovadas.



4 CONVENCIMENTO MOTIVADO A NOVA OTICA DO CPC

 

O novo Código de processo civil já em seu livro I capítulo I que trata Das normas fundamentais do processo civil, mais precisamente no Art. 1º[25] deixa evidente sua preocupação com uma interpretação mais alinhada com os preceitos fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal, sendo que o processo civil deverá ser interpretado e aplicado à luz da constituição, sempre buscando uma maior paridade com a constituição federal. Neste sentido ressalta Leonardo Carneiro da Cunha:

 

O processo civil deve ser estudado, ordenado, aplicado, disciplinado e interpretado a partir das normas contidas na Constituição Federal. O dispositivo encerra uma obviedade. Não somente as normas processuais, mas qualquer outra há de ser construída e interpretada de acordo com a Constituição da República. São varias as normas da Constituição Federal que contemplam preceitos de ordem processual. As normas fundamentais constitucionais aplicam-se ao processo. O art. 1º do CPC refere-se a “normas” estabelecidas na Constituição. A expressão é adequada, abrangendo tanto regras como princípios constitucionais. Norma é gênero do qual são espécies as regras e os princípios. A constituição contém tanto regras como princípios[26].

 

Dentre os preceitos fundamentais percebesse uma especial preocupação ao devido processo e ao contraditório e o que não se percebia no diploma revogado uma acertada preocupação com a fundamentação da decisão, haja vista a atual conjuntura processual de decisões discrepantes, que acabam por revelar uma seria crise no que tange a segurança jurídica e devemos entender aqui “segurança jurídica”, como uma uniformização do sentido da lei.

 Essas mudanças inauguradas pelo novo código de processo civil acarretam diretamente ao banimento do livre convencimento, visto que “todas as referências de que-o-juiz-teria-o-poder-de-livre-convencimento foram colocadas em um exílio epistêmico. Isto é: foram retiradas do ordenamento processual”[27].

 

 

4.1 Efetivação do devido processo legal e do contraditório no novo CPC

 

 A carta magna de 1988 garante a todos no âmbito processual o direito ao devido processo legal e ao contraditório previsto nos Art. 5º, LIV[28] e Art. 5º, LV[29] da Constituição Federal. Sendo assim os mesmos foram adotados pelo legislador como pilares regedores do novo código de processo civil, com intuito de se efetivar o processo constitucional, próprio de um estado democrático de direito.

A respeito do processo constitucionalizado Dierle Nunes comenta:

 

O processo constitucionalizado brasileiro representa uma garantia de participação e limites às atividades de todos aqueles que dele fazem parte, devendo proporcionar um ambiente cooperativo no qual o debate seja ampliado com a finalidade de obtenção de decisões bem fundamentadas, em todos os graus de jurisdição, pelo obrigatório respeito ao devido processo constitucional (due processo of law)[30].

 

Desta maneira com a finalidade de se dar uma maior concretude ao principio do contraditório o legislador optou por prevê-lo de maneira dinâmica em seu Art. 10º:

 

Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

 

Nota-se que o principio do contraditório recebe uma nova significação “passando a ser entendido como direito de participação na construção do provimento, sob a forma de uma garantia processual de influência e não surpresa para a formação das decisões[31].

Neste sentido Dierle Nunes ressalta:

 

Este é o contraditório como garantia de influência e não surpresa no qual se consagra o conteúdo substancial do comando normativo constitucional (art. 5º, LV) que impede, salvo exceções legais, que o juiz profira decisões com conteúdos que as partes não tenham podido debater. Assim, o contraditório não poderá mais ser aplicado tão somente como mera garantia formal de bilateralidade da audiência (oitiva antecipada de ambos os lados – art. 9º, caput), ou como garantia de simétrica paridade de armas, que asseguraria a necessidade de igualdade de meios para fazer seus direitos/interesses[32].

 

O principio do contraditório inserido de tal maneira no novo CPC contribuirá para conquista de um modelo processual comparticipativo/cooperativo, não tão somente conferindo as partes o poder de influir efetivamente na construção da decisão como também impõe ao juiz o dever de levar em consideração a contribuição das partes no ato de julgar, não permitindo que o juiz fundamente suas decisões em suas concepções pessoais, ou melhor, dizendo conforme sua consciência, por não terem sido submetidas ao debate processual. Assim o dialogo processual não se passa somente entre as partes, já que nele se insere também o juiz, que fica impedido de resolver questões que não passaram pelo crivo da audiência dos principais interessados no conflito, ainda que se trate de matérias apreciáveis de oficio[33].

Deste modo com a inserção do contraditório no processo civil sob esta nova ótica há uma grande contribuição para a obrigatoriedade da fundamentação das decisões conforme previsto no Art. 489 deste novo diploma.

 

4.2 A (re) afirmação do Convencimento motivado no novo CPC e o fim do Livre Convencimento motivado

 

Um dos temas mais comentados pelos juristas e que tem gerado bastante polemica a respeito do novo código processual e certa insatisfação por parte dos magistrados brasileiros, com certeza é o banimento do Livre convencimento do Código de processo civil. E diga-se o fim justamente por não haver mais nenhuma referencia que seja no novo código de que o juiz teria o poder do livre convencimento. Muito pelo contrario o novo diploma processual civil procurou de maneira clara e acertada deixar bem claro que o juiz devera apreciar as provas contidas nos autos, bem como indicar na decisão as razões de seu convencimento.

 Conforme disposto na redação do novo CPC em seu Art. 371: O juiz apreciara a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver produzido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.

 

Essa mudança vem com o escopo de adequar o direito processual ao Princípio da motivação das decisões, clausula constitucional prevista no Art. 93, IX da Constituição Federal:

 

Art. 93 Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

 

Não se trata, porém a alteração inaugura pelo novo CPC em apenas uma adequação a um preceito constitucional, mas sim a uma adequação ao Estado Democrático de Direito, ao se falar em livre convencimento não havia somente um desrespeito ao preceito constitucional da motivação, mas sim uma quebra com o paradigma do Estado Democrático de Direito inaugurado pela Constituição de 1988 e ao conjunto de direito individuais assegurados pela mesma. E é nesse sentido que o Doutrinador Lenio Luiz Streck justificou a solicitação de alteração e conseguinte extinção do livre convencimento do projeto do atual CPC.

Vejamos resumo da justificativa apresentada pelo Doutrinador ao Relator do projeto:

 

Embora historicamente os Códigos Processuais estejam baseados no livre convencimento e na livre apreciação judicial, não é mais possível em plena democracia, continuar transferindo a resolução de casos complexos em favor da apreciação subjetiva dos juízes e tribunais. (...) O livre convencimento se justificava em face da necessidade de superação da prova tarifada. Filosoficamente, o abandono da fórmula do livre convencimento ou da livre apreciação da prova é corolário do paradigma da intersubjetividade, cuja compreensão é indispensável em tempos de democracia e de autonomia do direito[34].

 

Com a redação do Art. 371 e consequente extinção da palavra “livre” do código de processo civil se encerrou conforme bem afirma Lenio Luiz Streck, com um ciclo, onde se colocava o juiz como protagonista detentor do poder do livre convencimento:

Com a retirada do livre convencimento do CPC, o legislador encerrou um ciclo. Desde o socialismo processual (Menger, Klein, Bullow) se pensava que o juiz era o protagonista e que tinha livre convencimento. Em outras palavras, ele era livre para decidir, desde que, depois, justificasse, como se a justificação ou motivação conseguisse suprir o problema fulcral que residia, exatamente, no livre atribuir de sentidos, corolário do paradigma da subjetividade[35].

 

Desta maneira com as alterações trazidas pelo novo código processual, não poderá mais o juiz ou tribunal alegar ser a sentença um ato de vontade do juiz, ou que decidem de certa maneira por pensarem que assim o é. Não podendo referir que determinada decisão foi exarada desse modo em face da livre apreciação da prova de seu livre convencimento e nem poderá o juiz fundamentar a decisão alegando que julgou segundo sua consciência[36].

Em uma ultima palavra, com o fim do livre convencimento no novo CPC e a exigência da motivação das decisões pelo julgador, que aqui devemos ler como um direito que o cidadão tem de ver sua pretensão respondida pelo direito através da obrigação que o juiz passa a ter de fornecer está resposta, que devera não mais ser dada a partir de sua consciência mais sim a luz do direito de maneira fundamentada.

 

4.3 A nova sistemática da sentença e adequação ao contraditório e a motivação como forma de efetivação da fundamentação

 

Mudanças importantes também sofreu o novo código processual no que tange aos elementos e aos efeitos da sentença. E estas mudanças, claro, vêm com o objetivo de propiciar uma melhor fundamentação das decisões, bem como efetivar uma real e responsável apreciação dos elementos probatórios e teses levadas a juízo pelo jurisdicionado, de modo a efetivar o contraditório e o devido processo legal.

  E está preocupação com a fundamentação da decisão segundo parte da doutrina parte da preocupação do legislador me fazer que o novo CPC venha impor e adequar ao já era previsto pelo mandamento constitucional contido no Art. 93, IX, da CRFB/1988, conforme é afirmado pelos Doutrinadores Humberto Theodoro, Dierle Nunes, Alexandre Bahia e Flávio Pedron:

O Novo CPC impõe o cumprimento do que já estava contido no art. 93, IX, da CRFB/1988, no seu art. 489, uma vez que ao analisar o modo como as decisões são (mal) fundamentadas tornou-se imperativa uma perspectiva adequada para a referida cláusula constitucional, inclusive com o respaldo dessa (nova) legislação que promova com efetividade a expansividade e perfectibilidade típicas do modelo constitucional de processo brasileiro[37].

 

Deste modo o novo código de processo civil traz em seu Art. 489 os elementos essências que devam integrar a sentença bem como os efeitos da sentença, sob uma perspectiva de validação ou anulação da mesma. Conforme será demonstrado a seguir.

 

Art. 489.  São elementos essenciais da sentença:

I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.

§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

§ 2o No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

§ 3o A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.

 

Quantos aos elementos essenciais da sentença o novo código não diferencia do anterior, sendo ainda o relatório, os fundamentos e o dispositivo, conforme era previsto pelo revogado Art. 458 do Código de Processo Civil de 1973:

 

Art. 458. São requisitos essenciais da sentença:

I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu, bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;

III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes Ihe submeterem.

 

 Quanto a esses elementos não houve inovação, porém é interessante que relembremos o que são e para que servem estes elementos. Sendo que o primeiro elemento elencado no inciso I do atual código é o relatório. Neste relatório devera  conter os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo. Devendo o juiz efetuar a reconstrução da historia do caso que está em julgamento de forma a demonstrar as teses apresentadas pelas partes em seus mínimos detalhes.

O segundo elemento trata dos fundamentos em que o juiz devera analisar as questões de fato e de direito. Esse elemento se refere ao dever que o magistrado tem de fundamentar e está previsto na Constituição Federal de 1988.

O terceiro elemento o dispositivo é onde o juiz ira resolver as questões principais que as partes lhe submeterem. Esse elemento segundo Lenio Luiz Streck está “ligado umbilicalmente á fundamentação, pela simples razão de que está é condição de possibilidade para aquele” [38], em outras o dispositivo é parte integrante da fundamentação. Nesse sentido ainda explica Lenio Luiz Streck, “numa palavra: o dispositivo deve ser entendido não mais como algo a ser visto teleologicamente. O juiz não chega ao dispositivo para depois construir os fundamentos. Pensar assim é negar dois séculos de teoria do direito e dois giros ocorridos no campo da filosofia”[39].

Porém não é pelo fato de não se tratarem de inovação que não tenham importância ou que sejam menos importantes, pelo contrario os elementos tratados são de suma importância não só a sentença, mas para todo o processo, sendo que faltando um destes elementos ou se estiverem mal colocados na sentença esta ultima será nula.

Quanto ao § 1º do Art. 489 e este sim é uma das inovações tragas pelo novo CPC e uma importante inovação. Este paragrafo tem o condão de fazer um controle mais rigoroso das decisões e seu principal componente a fundamentação, haja vista o histórico de decisões mal fundamentadas e discrepantes, o que acabou por gerar na atualidade uma insegurança jurídica, que creio ser o maior dos motivos da opção do legislador por um controle mais detido das decisões.

Diz o inciso I do § 1º que não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que, se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida. Aqui fica claro que o legislador teve a intenção de proibir decisões vazias sem contexto com o caso. Como bem ressalta Lenio Luiz Streck, ao explicar que “fica nítida a opção hermenêutica do legislador, na medida em que impede que verbetes, enunciados ou condensações estandardizadas produzidas por compêndios ou resumos de baixa qualidade teórica possam vir a ser citadas sem o necessário contexto (DNA da decisão)” [40]. 

 Em seguida no inciso II do mesmo § 1º, não será considera fundamentada a decisão que empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso. Mas uma vez fica claro a opção hermenêutica que vez o legislador. Aqui o novo CPC deixa claro não ser compatível com a fundamentação da decisão os conceitos vazios, pois como demonstrado acima há uma necessidade contextual entre o fundamento e o caso.

No inciso III ainda do mesmo § 1º, não se considerara fundamentada a decisão que invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão. Mais uma vez a preocupação do legislador com o nexo contextual da sentença. Pois “os motivos invocados na decisão devem ter um nexo causal – portanto, sempre a questão do caso concreto assume condição de possibilidade do agir do juiz – entre o feito sob julgamento e as razões pelas quais determinada decisão está sendo exarada”[41]. Assim não será mais possível a utilização de sentenças padrões, estando o magistrado obrigado a se ater as minucias do caso concreto, devendo efetuar pronunciamentos adequados a cada caso e suas especificidades.

 Ainda no mesmo § 1º em seu inciso IV, não ira ser considerada decisão fundamentada que não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador. Aqui podemos dizer ser um dos pontos fundamentais, trata pois de uma reafirmação do contraditório que se traduz no direito que as partes tem de ver todos os seus argumentos analisados pelo julgador, devendo este aceita-los ou rebate-los sempre de maneira fundamentada. Neste ponto o doutrinador Lenio Luiz Streck explica, “não basta tomar conhecimento dos argumentos e delineá-los no relatório. A parte tem direito a que sejam considerados os argumentos de modo serio e detido, valendo aqui, outra vez invocar o principio da Erwagungspflicht (dever de examinar o que foi argumentado)” [42].

 E com esta inovação não serão mais possíveis decisões do tipo “Não é omissão o Juízo não retrucar todos os fundamentos expendidos pelas partes ou deixar de analisar individualmente todos os elementos probatórios dos autos”. Desse modo não á que se falar que o juiz não esteja obrigado a analisar todas as teses elencadas pelas partes ou examinar todas as provas produzidas pelas mesmas.

Agora tratando dos enunciados sumulados o § 1º inciso V, não será considerada decisão fundamenta que se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos. Aqui se trata da obrigatoriedade que o julgador deve ter na, hipótese de invocar um precedente ou uma sumula, de apontar seus fundamentos determinantes explicitando que o caso sob julgamento se ajusta aos fundamentos daquele enunciado ou sumula[43].

Neste sentido explica Lenio Luiz Streck:

 

Enunciados jurisprudências – vinculantes ou não - somente proporcionam a resposta correta adequada á Constituição quando compreendidos a partir de um olhar hermenêutico. Ementários não podem ser aplicados, portanto, de forma irrestrita e por mera subsunção[44].

 

Também no mesmo § 1º no inciso VI, não será considerada decisão fundamentada, a decisão que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. Deste modo é obrigatório a analise do caso concreto, o juiz esta obrigado a analisar o caso concreto e suas especificidades para se chegar a uma resposta se o caso invocado é correspondente ao caso em julgamento ou não, ou se a sumula é correspondente com o caso em julgamento. Assim essas inovações estão a amarrar o julgador na estrita observação do caso concreto e suas especificidades bem como na devida observação dos sentidos e fundamentos que permeiam os enunciados e precedentes. Não sendo possível de este modo dizer qualquer coisa sobre qualquer coisa a que se ter um nexo fático jurídico na decisão que ligue o direito em discussão aos fundamentos da decisão.

Quanto ao § 2º do mesmo Art. 489, que estabelece que, no caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

Esse dispositivo conforme já denunciado pela doutrina sem duvida alguma é inconstitucional, o que faz gerar uma grande polemica em torno do mesmo.

O aludido dispositivo ao estabelecer que o juiz fará ponderação de normas, e aqui devemos lembrar que o direito é um sistema de regras e princípios e que, portanto ambas, são normas, é incompatível com o Art. 93, IX, da constituição federal, além de entrar em descompasso com  outros dispositivos do próprio CPC, como o Art. 10 que estabelece que o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício, o Art. 926 que determina que a jurisprudência estável, integra e coerente, e o próprio dispositivo 489 em analise. Pois se o juiz alegar a existência de uma colisão entre normas, estará autorizado a escolher entre uma determinada regra ou um determinado principio[45].

Também ao fazer a alusão ás premissas fáticas que fundamentam a conclusão, tem se ideia de que o juiz primeiro decide e depois busca fundamentação o que estaria a reafirmar o livre convencimento e a livre apreciação da prova, que atualmente foram banidos do processo pelo então comentado novo código de processo civil. E neste sentido e em analise ao referido disposto Lenio Luiz Streck ressalta:

 

Outro problema do novel dispositivo é a alusão ás premissas fáticas que fundamentam a conclusão, o que pode fazer pensar que o juiz primeiro decide e depois busca fundamentação. Grave equívoco de cariz filosófico. Acreditar que o juiz primeiro conclui e depois busca as “premissas fáticas” é recuar no tempo em duzentos anos. É confessar que ele é livre para decidir e que a fundamentação é apenas um ornamento. È ignorar que o novo CPC expungiu o livre convencimento e a livre apreciação da prova, o que configura outra incompatibilidade da ponderação com essa opção do legislador[46].

 

Ainda citando Lenio Luiz Streck que em analise do referido dispositivo concluiu pela sua inconstitucionalidade:

 

O fato de o dispositivo não ter sido vetado pela Presidente não quer dizer que sua vigência implique sua validade. Tanto pode ser inquinado de inconstitucional por violação ao art. 93, IX, como pode ser fulminado por uma interpretação que envolva a totalidade do CPC, naquilo que se pode denominar interpretação sistemática. Há nítida lesão ao principio da segurança jurídica, que é exatamente prestigiado por outros dispositivos do CPC. Outro argumento a favor da não aplicação do dispositivo é que a colisão (de – ou entre – normas) não é um conceito despido de intenções teóricas prévias. É diferente de alguns consensos que já temos, como a garantia da não surpresa, o respeito á igualdade e a coerência que devem ter as decisões etc. A ponderação ainda depende do esgotamento de um debate teórico, circunstância que prejudica sua colocação em um texto de lei nestes moldes. Portanto foi um equivoco do legislador conferir status legislativo a questões polêmicas como essa (novamente há risco de lesão á segurança jurídica)[47].

 

De fato o § 2º do Art. 489 é bem polemico conforme já afirmado, visto o retrocesso que pode se acarretar a partir da forma atécnica que o legislador estabeleceu a ponderação de normas, deixando um caminho aberto para arbitrariedade do julgador.

Por fim e uma ultima analise a ser feita do referido Art. 489 o seu § 3º que estabelece que a decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.

Aqui devemos observar que o comando contido no dispositivo não trata do mesmo já previsto no Art. 5º do comentado novo código de processo civil, que estabelece que aquele que de qualquer forma participa do processo deve comporta-se de acordo com a boa-fé, o Art. 5º trata da maneira como o juiz e as partes devem se comportar e agir durante o processo.

 Assim para melhor compreender a função deste dispositivo vale trazer o comentário do doutrinador Lenio Luiz Streck:

O termo boa-fé é vago e ambíguo na dogmática jurídica. Tem sido utilizada no direito civil naquilo que se entende por “boa-fé objetiva”. Não se trata de um comando de como as partes e o juiz devem se comportar ou agir. Isso já está estabelecido no Art. 5º, que estabelece que aquele que de qualquer forma participa do processo deve comporta-se de acordo com a boa-fé. Já no dispositivo em tela, tem-se um comando que estabelece o modo como deve ser interpretada a decisão judicial. Deve ser entendida a partir de uma totalidade (do todo para a parte e da parte para o todo – o que se chama de círculo hermenêutico), tendo como norte a boa-fé. Portanto, não se está falando de comportamentos stricto sensu e, sim, de como devem os destinatários interpretar o que foi decidido. A boa-fé, então, é uma regra de comportamento no ato de interpretação e cumprimento da sentença ou acordão. Boa-fé é posta, assim, no patamar de princípio, um padrão pelo qual, em princípio, devem os destinatários interpretar. Tem uma função hermenêutica, isto é, de como se compreende o fenômeno (decisão); ela limita as atitudes subjetivas lato sensu, como interpretação por partes, usos descontextualizados de palavras etc., e, por fim, cria um dever de agir[48].

 

Deste modo o referido dispositivo vem estabelecer que sentença tida como o produto final de um processo deva ter um padrão ético que será dirigido pela boa-fé, surgindo a partir deste padrão um dever de dar sentido ao texto da decisão[49].

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

As mudanças inauguradas pelo novo código de processo civil buscam resgatar o paradigma democrático já instituído na Constituição, através de uma conexão entre o dever de fundamentar e a legitimidade democrática dos pronunciamentos jurisdicionais. Como também vem trazer uma real efetivação ao principio do contraditório entendido como principio da cooperação normativa extensível a todos os atores processuais. Visto que nesse novo paradigma viabilizasse a atuação e influencia de todos os sujeitos processuais na decisão, firmando o contraditório como garantia de não surpresa.[50].

Nota-se que o principio do contraditório recebe uma nova significação “passando a ser entendido como direito de participação na construção do provimento, sob a forma de uma garantia processual de influência e não surpresa para a formação das decisões[51].

As alterações inauguradas pelo novo CPC trazem para o processo o real viés constitucional que o deve envolver, acabando com as possibilidades de decisões surpresas conforme a consciência do julgador e afirmando a garantia de que a decisão será construída a partir das provas produzidas pelas partes e as teses elaboradas por elas.

Temos a partir desse novo código processual uma responsabilização politica do juiz, sendo que a fundamentação passa a ser condição de possibilidade de legitimidade da decisão judicial. Não podendo o julgador se basear em sentimentos pessoais, pois o julgamento deva se dar por princípios e não por questões politicas ou convicções morais do mesmo[52].

Essas mudanças se apresentam como uma resposta direta ao solipsismo judicial, visto que o julgador não está mais autorizado a formar sua convicção de maneira livre, não podendo mais se valer de sua consciência para fundamentar as decisões, estas agora devem ser fundamentadas de acordo com a ciência do direito, o que acarreta da efetiva extinção do livre convencimento.

Concluindo deve se abandonar o subjetivismo, em nome da segurança jurídica, pois só assim teremos decisões coerentes com a ciência do direito e as leis democraticamente aprovadas.


REFERÊNCIAS

 

ABAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

 

CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros Editores, 2013.

 

CHIOVENDA, Giusepe. Instituições de direito processual civil. Trad. Paolo Capitanio. Campinas: Bookseller, 1998.

 

Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

 

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Jr., THEODORO, Humberto, NUNES, Dierle, BAHIA, Alexandre Franco, PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC - Fundamentos e Sistematização, 3ª edição. Forense, 03/2016. VitalSource Bookshelf Online.

 

LEAL, André Cordeiro. O contraditório e a fundamentação das decisões no direito processual democrático. – Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.

 

LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria geral do processo – 6. ed. -  São Paulo: IOB Thomson, 2005.

 

LIBÂNEO, José Carlos. Do paradigma da consciência ao paradigma da linguagem ‖. Texto didático de uso exclusivo em sala de aula, escrito para a disciplina Teorias da educação e processos pedagógicos, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Católica de Goiás. Goiânia, 2003. Disponível em:

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STRECK, Lenio Luiz, Senso Incomum - O “decido conforme a consciência” dá segurança a alguém? /Boletim de Notícias Consultor Jurídico, São Paulo, 2014.Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-mai-15/senso-incomum-decido-con

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STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 11. ed. rev., atual. e ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014.

 

STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência?. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010.

 

STREK, Lenio Luiz, Senso Incomum - Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC./ Boletim de Notícias Consultor Jurídico, São Paulo, 2014. Disponível em:

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THEODORO JÙNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento – vol. I – Rio de Janeiro: Forense, 2014.



[1] Streck, Lenio Luiz, O que é isto – decido conforme minha consciência?- Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora,2010, p. 30.

[2] Streck, Lenio Luiz, O “decido conforme a consciência” dá segurança a alguém?,– Conjur,2014.

[3] LIBÂNEO, José Carlos. Do paradigma da consciência ao paradigma da linguagem.‖ Texto didático de uso exclusivo em sala de aula, escrito para a disciplina Teorias da educação e processos pedagógicos, no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Católica de Goiás. Goiânia, 2003.

[4] Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito / Lenio Luiz Streck. 11. ed. rev., atual. e ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014. p. 101.

 

[5] Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito / Lenio Luiz Streck. 11. ed. rev., atual. e ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014. p. 86.

[6] Streck, Lenio Luiz, O que é isto – decido conforme minha consciência?- Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora,2010.

[7] Dicionário Oxford de Filosofia, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

[8] O “decido conforme a consciência” dá segurança a alguém?, Streck, Lenio Luiz – Conjur,2014.

[9] Streck, Lenio Luiz, O que é isto – decido conforme minha consciência?- Porto Alegre: Livraria do                  Advogado Editora,2010.

[10]Acórdão nº 2007/0272858-2 do Superior Tribunal de Justiça - Quinta Turma. HC 94.826/SP julgado  em 17/04/2008.

[11]Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de   conhecimento – vol. I – Humberto Theodoro Júnior – Rio de Janeiro: Forense, 2014, p 465.

[12] Teoria geral do processo / Rosemiro Pereira Leal – 6. Ed. – São Paulo: IOB Thomson, 2005, p 190.

[13]CHIOVENDA, Giusepe. Instituições de direito processual civil. Trad. Paolo Capitanio. Campinas:   Bookseller, 1998, p. 170.

[14]LEAL, André Cordeiro. O contraditório e a fundamentação das decisões no direito processual democrático. – Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p. 94.

[15]Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento – vol. I – Humberto Theodoro Júnior – Rio de Janeiro: Forense, 2014, p 465.

[16]ABAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 534.

[17]LEAL, André Cordeiro. O contraditório e a fundamentação das decisões no direito processual              democrático. – Belo Horizonte: Mandamentos, 2002, p. 95.

[18] Teoria geral do processo, Manuel Galdino da Paixão júnior – Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p 129.

[19] Teoria Geral do Processo; Cintra, Grinover, Dinamarco – São Paulo: Editora Malheiros, 2013, p 76,

[20] Voto do Ministro Humberto Gomes de Barros no AgReg em ERESP nº 279.889-AL,STJ.

[21]TRT - Processo: AP 180200001710005 DF 00180-2000-017-10-00-5, Relator: Des. André R. P. V. Damasceno. Julgamento:14/03/2007 . Órgão Julgador: 1ª Turma. No mesmo sentido: TJPR - Embargos nº 932808102 PR 932808-1/02; TRT – Recurso Ordinário Trabalhista - RO 343200001210008 DF 00343-2000-012-10-00-8. 

[22]TJDF- Apelação Cível: APL 4677120098070008 DF 0000467-71.2009.807.0008. Relator: José Divino de Oliveira. Julgamento: 16/02/2011. 

[23]Strek, Lenio Luiz - Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC. Conjur, 2015.

[24]Strek, Lenio Luiz - Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC. Conjur, 2015.

[25]Art. 1º. O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste código.

[26]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 28.

[27]Strek, Lenio Luiz - Dilema de dois juízes diante do fim do Livre Convencimento do NCPC. Conjur, 2015.

[28]Art. 5º, LIV. Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

[29]Art. 5º, LV. Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

[30]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 52.

[31]Jr., THEODORO, Humberto, NUNES, Dierle, BAHIA, Alexandre Franco, PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC - Fundamentos e Sistematização, 3ª edição. Forense, 03/2016. VitalSource Bookshelf Online, p. 110.

[32]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 53.

[33]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

[34]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 552.

[35]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 552.

[36]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

[37]Jr., THEODORO, Humberto, NUNES, Dierle, BAHIA, Alexandre Franco, PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC - Fundamentos e Sistematização, 3ª edição. Forense, 03/2016. VitalSource Bookshelf Online, p. 327.

 

[38]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

[39] Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 683.

[40]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 684.

[41]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 685.

[42]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 685.

[43]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

[44]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 686.

[45]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

[46]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 690.

[47]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 690/691.

[48]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016, p. 691.

[49]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

[50]Jr., THEODORO, Humberto, NUNES, Dierle, BAHIA, Alexandre Franco, PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC - Fundamentos e Sistematização, 3ª edição. Forense, 03/2016. VitalSource Bookshelf Online.

[51]Jr., THEODORO, Humberto, NUNES, Dierle, BAHIA, Alexandre Franco, PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC - Fundamentos e Sistematização, 3ª edição. Forense, 03/2016. VitalSource Bookshelf Online, p. 110.

[52]Comentários ao código de processo civil / organizadores Lenio Luiz Streck, Dierle Nunes, Leonardo Carneiro da Cunha; coordenador executivo Alexandre Freire. – São Paulo : Saraiva, 2016.

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