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A ORTOTANÁSIA SOB A LUZ DO SISTEMA JURÍDICO E SOCIAL BRASILEIRO


Autoria:

Fábio Gomges Paulino


Graduado em Direito pelo Centro Universitário Newton Paiva; Mediador judicial e extrajudicial em formação pelo IMA - Instituto de Mediação Aplicada; Pós-graduando em Direito Tributário pela Faculdade Milton Campos; Associado na Abradt Jovem - Associação Brasileira de Direito Tributário; Graduado em Administração com ênfase em Comércio Exterior; Pós-graduado em Gestão de Pessoas e Liderança pelo Centro Universitário Newton Paiva; Participou do grupo de estudo em Direito Internacional - GEDINP por três semestres; Monitor de Direito Constitucional - teoria das constituições - três anos; Atuou como voluntário na Semana Jurídico Cultural por três semestres consecutivos; Foi "coach" de equipe na primeira competição de mediação e conciliação do Centro Universitário Newton Paiva tendo recebido a equipe menção honrosa pela efetiva participação no programa; Professor na Comissão Direito na Escola - OABMG; Professor de Direito em curso técnico no SENAC/MG

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Resumo:

A construção narrativa desse artigo tem como intuito explanar sobre a ortotanásia dentro de um contexto jurídico e social, de modo a permitir uma ampliação do pensamento crítico sobre o tema.

Texto enviado ao JurisWay em 26/12/2017.



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1    INTRODUÇÃO 

Fruto de um longo processo judicial travado entre familiares de Terri Schiavo[i] e a justiça americana – no intuito de conceder o direito a morte natural a paciente Terri que permaneceu em estado vegetativo por 15 anos, sendo alimentada e hidratada via sonda –, tanto a ortotanásia quanto temas relacionados ganham cada vez mais força nas discussões da contemporaneidade, trazendo mais uma vez a tona um embate antigo entre a medicina e o direito, nos levando a questionamentos distintos, tais como: uma vida deve ser mantida a qualquer custo ou devemos também ter o direito de escolha sobre a morte?

Esse breve relato se fundamenta a partir do momento que tomamos como base discussões recorrentes sobre a emersão de uma consciência e reivindicação de um controle do processo da própria morte em casos terminais, em contraposição com muitos povos que lutam pela sobrevivência e clamam por uma vida mais digna. Isso nos permite dizer que, na contemporaneidade, a morte se apresenta com diferentes conotações, variando de acordo com o estado econômico de determinada região e/ou o contexto social no qual está inserida, permitindo assim que se levante o pensamento de que a morte deixou de ser algo natural. Nesse sentido, a morte ou ato de morrer deixa de depender somente do desenvolvimento da medicina que passa, a partir de então, a dividir espaço com o processo cultural conforme podemos observar no texto de Jungues: 

A atividade da medicina moderna não consiste apenas em curar e prolongar a vida, ‘mas também em fazer viver quem já está morto’. Os progressos atuais da medicina podem manter as funções vitais de um corpo muito além do curso normal da doença. Nesse contexto o morrer está em nosso poder e pode ser dominado. Esse domínio possibilita e favorece uma obstinação terapêutica que agride e não respeita a dignidade do morrente. Antes, a medicina se retirava, quando era incapaz de curar. Hoje, ela pode prolongar indefinidamente uma vida vegetativa em detrimento da qualidade de vida do enfermo. (JUNGUES, 1999, p. 172).  

Jungues também traz questões relativas ao tema ligadas diretamente ao capitalismo e as sociedades de consumo, uma vez que trata-se, em geral, de uma cultura narcisista que faz uma ligação direta do conceito de vida com o sentimento do prazer e do consumo. E, nesse sentido, quando há uma contracorrente que conecta esses indivíduos com a dor e o sofrimento, há uma dificuldade de lidar com essa realidade fazendo assim com que estes busquem alternativas para não ter que enfrentar grandes agruras. E, do mesmo modo, “não se tem sensibilidade e solidariedade para com aqueles que sofrem e padecem dor e privações. Para essa mentalidade existe uma total incompatibilidade entre sofrimento e realização humana.” (1999, p. 173). E envolto pelos mais diversos sentimentos, fruto dessa linha de pensamento, ou mesmo por entender que a morte faz parte de um processo biológico de desgaste gradativo natural, muitos acabam por optar pela morte como meio de estanque.

Essa perspectiva pode também ser apresentada como uma das justificativas e/ou como uma possibilidade de entendimento do aumento crescente de buscas individuais por diagnósticos médicos de um possível mal, em contraposição ao fato da história nos mostrar que muitas vezes tanto a morte quanto o nascimento chegavam de forma inesperada. Contudo, o processo de morte é algo de extrema relevância para o enfermo. E para melhor entender como funciona essa dinâmica no psicológico do paciente, que tem ciência do pouco tempo de vida que lhe resta, a pesquisadora americana Elisabeth Kübler-Ross relata em seu livro “Sobre a morte e o morrer” (1987, p.49-145) cinco fases pelas quais passa o moribundo terminal: 

  •  Fase da negação explícita: nega a evidência do relato dos sintomas;
  • Fase da ira: o doente assume atitudes coléricas contra os que o rodeiam. Ele se sente mal pela vitalidade que o rodeia;
  • Fase da negociação: é uma espécie de tréguas e colocação de prazos, enquanto se negocia com Deus. A pessoa faz promessas em troca da cura;
  • Fase da depressão: inicialmente surge uma culpa com relação a coisas e pessoas que talvez pudessem ter sido mais valorizadas no passado. Posteriormente esse sentimento também se volta para o futuro onde o enfermo sente a necessidade de estar só.
  • Fase da aceitação: o medo é superado e dá lugar a um profundo sentimento de paz interior. Nesse momento a religião ocupa um lugar central.

Em complemento, Jungues (1999, p. 178), em seu discurso sobre Bioética, nos mostra as responsabilidades dos acompanhantes dos pacientes terminais, ao citar os seus direitos conforme segue: 

  • Morrer com dignidade, respeito e humanidade;
  • Ser informado adequadamente sobre a verdade de sua situação;
  • Morrer com a menor dor possível e sem a agressão da obstinação terapêutica;
  • Receber os cuidados necessários para o seu bem-estar físico;
  • Recordar e sentir os benefícios de uma vida compartilhada, sendo permitida a visita de amigos e familiares;
  • Aclarar suas relações, expressar os seus desejos e compartilhar os seus sentimentos;
  • Planejar com seus familiares as mudanças que a sua morte imporá aos que rodeiam;
  • Ter em conta o interesse pelos sentimentos daqueles que ficam;
  • Receber assistência religiosa. 

E é a partir desses direitos que daremos andamento a esse estudo no intuito de ampliar o leque discursivo dos temas apresentados nessa introdução. Isto, pois, trabalhar com estas e outras questões correlatas significa trazer a tona linhas polêmicas de pensamento do Direito e, por isso, se faz necessário ampliar o entendimento dos mecanismos e aparatos médicos, legais e filosóficos que transitam pelas discussões desses paradigmas, conhecendo assim suas raízes e o universo no qual essas correntes transitam. Para tal daremos seguimento à pesquisa conceituando três temas: a eutanásia, a distanásia e a ortotanásia, sendo este último o foco de nossa discussão.

 

1.1     Eutanásia

Tema ainda polêmico em muitas sociedades, a eutanásia pode ser definida por uma determinada corrente de pensamento como uma morte em paz, sem dor. Já outra corrente a considera como uma privação da pessoa de sua vida, por acreditarem que sua existência não faz mais sentido para o próprio indivíduo ou mesmo para a sociedade em que ele está inserido. Essas duas correntes também são tradicionalmente conhecidas como eutanásia ativa e passiva, conforme explica Jungues: 

Na moral tradicional, falava-se de eutanásia ativa ou positiva, que podia ser direta ou indireta. Era o ato de privar alguém da vida por razões de dor. Por outro lado, falava-se de eutanásia negativa ou passiva, que era o ato de privar a pessoa dos meios que poderiam prolongar a sua vida. (JUNGUES, 1999, p.179). 

Essa divergência de correntes gerou diversos debates e atualmente a palavra eutanásia é utilizada apenas para definir “a prática que procura deliberadamente a morte para aliviar a dor.” (JUNGUES, 1999, p.180).

Ao entender a eutanásia a partir dessa concepção, podemos também dizer que estamos diretamente ligados a um tema que envolve tanto valores éticos quanto de direitos humanos e, sendo assim, é importante também conhecer a posição de correntes religiosas sobre o tema. Isto se deve ao fato de que apesar de o Brasil ser um país laico, é inegável a força da igreja católica no que se refere a questões que envolvam o embate entre o direito a vida e a religiosidade, e nesse sentido, ao falarmos de eutanásia também é importante considerar o entendimento da igreja sobre a questão, uma vez que essa é uma corrente de pensamento seguida por grande parte da sociedade. E sobre o referido tema a igreja católica apresenta uma posição rígida, defendendo a valorização a vida humana como premissa única admissível, conforme constatamos no relato da declaração sobre a eutanásia, assinada pelo Cardeal Prefeito, Franjo Seper, e aprovada pelo Sumo Pontífice João Paulo II, que descreve: 

Ora, é necessário declarar uma vez mais, com toda a firmeza, que nada ou ninguém pode autorizar a que se dê a morte a um ser humano inocente seja ele feto ou embrião, criança ou adulto, velho, doente incurável ou agonizante. E também a ninguém é permitido requerer este gesto homicida para si ou para um outro confiado à sua responsabilidade, nem sequer consenti-lo explícita ou implicitamente. Não há autoridade alguma que o possa legitimamente impor ou permitir. Trata-se, com efeito, de uma violação da lei divina, de uma ofensa à dignidade da pessoa humana, de um crime contra a vida e de um atentado contra a humanidade. (VATICANO, 1980)[ii]. 

Em complemento ao acima declarado, a medicina também possui posições éticas que vão ao encontro desta prática, se nos amparamos pelo descrito no Juramento de Hipócrates que define: “A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda[iii]”.

Esses entendimentos abrem o campo de discussão permitindo um julgamento crítico do pedido de eutanásia do paciente, que pode então ser interpretado de diversas formas, devendo assim ser realizado uma análise criteriosa, ou mesmo excludente, de argumentos em favor da prática da eutanásia que se amparam em pensamentos de caráter emocional e que levam em consideração definições particulares de felicidade e bem estar do enfermo. A utilização do termo “análise criteriosa” se fundamenta por acreditarmos que é preciso entender em qual contexto social o moribundo está inserido, uma vez que, em muitos países há uma luta pela liberação legal da eutanásia, quando aplicada em caráter próprio ao enfermo consciente. Esta prática é “equiparada ao suicídio racional e defendida como um direito da esfera da autonomia que deveria ser reconhecida e tutelada pelo ordenamento jurídico” (JUNGUES, 1999, p.184).

Para demais práticas correlatas utiliza-se os conceitos de distanásia (morte difícil) e ortotanásia (morte correta) conforme veremos nos próximos itens.

 

1.2     Distanásia

Também conhecida como morte difícil, a distanásia é uma prática que visa prolongar a todo custo à vida do paciente terminal por vias terapêuticas. Contudo, há uma crítica perene sobre a prática, pois o avanço técnico e científico da medicina permite atualmente prolongar a vida de pacientes que apresentam pouca ou nenhuma qualidade de vida, como é o caso daqueles que se encontram cerebralmente mortos. Nesse contexto, Jungues esclarece: 

Diante de situações distanásicas, deve-se afirmar que não é necessário fazer, sempre e em todas as circunstâncias, o máximo para se conservar a vida de alguém, pois a existência meramente biológica não significa necessariamente vida humana; não é preciso usar meios desproporcionados para prolongar a vida de quem já não tem esperança de recuperação; existem situações em que a melhor atitude ética é deixar o paciente morrer, sem intervir para prolongar a vida. (JUNGUES, 1999, p.183). 

Essa linha de pensamento leva em consideração o fato de que em certos casos o procedimento terapêutico parece estar em primeiro plano e o paciente em segundo, configurando a chamada “obstinação terapêutica” ou “encarniçamento terapêutico” que é definida por Baudouin como “uma prática médica excessiva e abusiva decorrente diretamente das possibilidades oferecidas pela tecnociência e como o fruto de uma obstinação de estender os efeitos desmedidamente, em respeito à condição da pessoa doente.” (Baudouin apud BORGES, 2005, p.1). E sendo assim, o exercício dessa prática, sem o devido consentimento do paciente ou de seus familiares, pode ser visto como um atentado a dignidade humana.

Essas premissas nos permite compreender o caráter ético da permissão familiar de desligamento de aparelhos que mantém biologicamente vivo o paciente que já se encontra comprovadamente com morte cerebral. E, do mesmo modo, abre uma discussão filosófica sobre o entendimento da vida humana, apresentando dois pontos distintos: ser humano visto como um ser para a morte e a morte enxergada como parte da vida.

 

1.3     Ortotanásia

Caminhando em direção contrária da eutanásia e da distanásia, a ortotanásia tem como premissa o respeito ao direito dos pacientes terminais em ter uma morte digna e em paz. Essa prática parte do princípio de que, com o devido acompanhamento médico, o processo de morte se desenvolva naturalmente, ou seja, uma vez que o processo de morte já está instalado, não é aplicado no paciente nenhum procedimento que possibilite um prolongamento da vida sem o consentimento do enfermo, como declara Maria Celeste Cordeiro dos Santos ao dizer que “o médico (e só ele) não é obrigado a intervir no prolongamento da vida do paciente além do seu período natural, salvo se tal lhe for expressamente requerido pelo doente.” (apud BORGES, 2005, p. 1). Contudo, vale advertir que a administração de medicamentos para aliviar a dor é um direito do paciente e, nesse sentido, o médico deve agir no intuito de amenizá-la.

Mesmo esse procedimento sendo considerado por muitos como a “morte correta” existem muitas opiniões que são contra o método, uma vez que, argumenta-se que o processo de desenvolvimento da ciência é contínuo e tem se mostrado cada vez mais acelerado e, com isso, torna-se cada vez mais discutível o julgamento de irreversibilidade de um determinado caso patológico, salvo aqueles que apresentam morte cerebral ou encefálica. Isso permite uma ampliação estrondosa à discussão sobre o tema, pois, a prática além do campo do lícito ou ilícito passa também a transitar no campo dos limites do conhecimento científico.

Sobre esse aspecto, o Congresso brasileiro tem se posicionado de forma incisiva no que refere à regulamentação da questão, conforme pudemos observar em matéria divulgada pelo site da Procuradoria Geral da República[iv], de onde extraímos o seguinte trecho: 

Vícios – A resolução do Conselho Federal de Medicina possui, entre outros vícios, o extravasamento do poder regulamentar. “Inexiste norma, constitucional ou legal, que conceda ao réu competência para normatizar a prática da ortotanásia”, esclarece Ailton Benedito. 

Outra vicissitude do ato do CFM consiste na ameaça à segurança jurídica. Para o procurador, a normativa nem sequer exige capacidade civil para que o paciente manifeste sua vontade, deixando ao arbítrio da criatividade do médico – profissional cuja formação não requer conhecimentos técnico-jurídicos. ‘Exemplificadamente, não há esclarecimentos sobre casos de menoridade, de emancipação ou de interdição civil. Tampouco há previsão de limite temporal à validade do ‘testamento vital’. Corre-se o risco insofismável de que as diretivas externadas pelo paciente, quando ainda sadio e lúcido, sejam esquecidas e não mais correspondam à sua vontade, anos depois, quando da terminalidade da vida. (MPF, 2013)[v]. 

Toda a discussão relatada até o momento tem girado em torno do sujeito, estabelecendo um link direto ou indireto com a ideia de autonomia e dignidade da pessoa humana. Isso nos permite dizer que é de fundamental importância compreender o grau de autonomia jurídica que o indivíduo possui sobre a morte, uma vez que esse entendimento torna-se imprescindível para a garantia do direito a dignidade humana. Além disso, “deve-se compreender que a dignidade da pessoa humana não é um conceito objetivo, absoluto, geral, possível de ser abstraído em padrões morais de conduta a serem impostos a todas as pessoas.” (BORGES, 2005, p. 3). Inspirado por esses conceitos, e tendo em vista que a ortotanásia é uma prática permitida no Brasil, que acreditamos ser fundamental explorar e entender os mecanismos legais e sociais que cercam a questão. E é no intuito de levantar questões pertinentes e discutir os desdobramentos jurídicos que envolvem a prática da ortotanásia que ampliaremos nossa pesquisa nos próximos tópicos.

 

2      DISCUSSÕES JURÍDICAS

O procedimento da ortotanásia é um procedimento aprovado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), como prática válida em todo território brasileiro, a partir do descrito na resolução nº 1805/2006 (DOU 28-11-2006). Os autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald no livro Direito Civil: Teoria Geral (2010, p. 290) trazem um aclaramento acerca da questão da eutanásia e a morte digna apresentando nesse revés a ortotanásia. Ambos posicionam-se criticamente ao legislador do código civil de 2002 face à superficialidade discursiva deste assunto no âmbito da morte e a possibilidade de estender a este momento o reflexo da dignidade da pessoa humana, ou seja, estendendo ao momento da inexorabilidade da vida, a morte e a dignidade que o ser gozou em vida. Discussão essa que obrigatoriamente passaria pelo rol jurídico pareando em searas como a moral, a religiosa e a ética.

A discussão tem por base os vértices morte e vida. Metaforicamente esses vértices se apresentam contrários, porém complementares. Valendo-se da geometria, morte e vida são como ângulos adjacentes: contrários, porém complementares. Destarte, para Farias e Rosenvald (2010, p. 290), uma morte digna seria o reverso de uma vida digna. Nota-se que esta definição se apresenta cosoante a um entendimento claro do direito civil-constitucional. Autores como Roxana Cardoso Brasileiro Borges dissertam também sobre um entendimento do próprio doente acerca da morte, para a autora o doente assume o papel de propriedade da morte e assim tenta conferir dignidade ao momento futuro sem o prolongamento da agonia.

A discussão em si, nas searas da eutanásia, ortotanásia e até da distanásia, não chegará ao ponto da solução pontual para cada caso. Ainda assim a melhor solução será a ponderação, o entendimento de cada caso e o respeito às circunstâncias envolvidas. Categoricamente tem-se que o Código Penal brasileiro versa que a eutanásia situa-se na ilicitude, assim sendo, o chamado testamento vital documento que o doente expressaria sua opção por determinado tratamento, não é admitido.

 

3      UMA ANÁLISE CONSTITUCIONAL 

Ao tratar do tema ortotanásia sob a luz do sistema constitucional, ressaltamos que a dignidade da pessoa humana é uma das premissas prevista no art. 1º da Constituição Federal de 1988, se apresentando como princípio fundamental do Estado Democrático de Direito brasileiro. E é baseado nessa norma que muito se discute a respeito da ortotanásia, uma vez que, defende-se que usufruir desse direito constitucional parte do princípio de que o indivíduo possa exercer sua liberdade e autonomia, o que implica em respeitar as escolhas dos indivíduos em seus últimos momentos de vida. Aceitar isso é entender que o paciente julga ineficaz passar por tratamentos médicos que apenas irão prolongar por um determinado tempo sua existência biológica, conforme explana Borges no trecho que segue: 

A não intervenção, desejada pelo paciente, não é uma forma de eutanásia, com provocação da morte ou aceleração desta, é o reconhecimento da morte como elemento da vida humana, é da condição humana ser mortal. É humano deixar que a morte ocorra sem o recurso a meios artificiais que prolonguem inutilmente a agonia. (BORGES, 2005, p.1). 

O Código de Ética Médica Brasileiro esclarece que a ortotanásia configura-se como uma forma de assegurar ao paciente portador de uma doença em estágio terminal, dignidade e autonomia em seus momentos finais de vida. Nesse sentido, a Constituição busca assegurar uma morte digna ao paciente, sempre se pautando no princípio da Dignidade Humana, visto que obrigar uma pessoa a viver através de tratamentos que lhe causam dores e sofrimentos que em muitos casos são extremamente degradantes vai contra a própria finalidade buscada pela Carta Magna.

Mas não estamos falando aqui em adiantar o momento da morte, mas sim em assegurar ao ser humano o direito de escolha de como ele quer morrer e de garantir lhe o direito a uma morte com dignidade.

De acordo com a Resolução n. 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina (CFM) a ortotanásia se refere a uma forma de tratamento onde não se envolve uma omissão aos cuidados do paciente, mas sim de um tratamento que busca aliviar os sintomas da doença, evitando os sofrimentos decorrentes da fase final da doença.

Segundo a referida resolução, 

Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal. (RESOLUÇÃO nº 1.805/2006, CFM). 

Com efeito, a garantia de dignidade da pessoa humana é um princípio garantido durante todo o desenvolvimento da vida do ser humano, e não lhe pode ser negado no momento de seu término, pois constituiria assim em uma violação ao conteúdo assegurado pela Constituição Brasileira de 1988. Nesse sentido, a autora Roxana Borges esclarece: 

A concepção de dignidade humana que nós temos liga-se à possibilidade de a pessoa conduzir sua vida e realizar sua personalidade conforme sua própria consciência, desde que não sejam afetados direitos de terceiros. Esse poder de autonomia também alcança os momentos finais da vida da pessoa. (BORGES, 2001, p.1).  

Então, o direito a morte digna através da ortotanásia está permeado não apenas pela dignidade humana, mas também pelo direito a vida, previsto no caput do artigo 5º da Constituição da República de 1988. O artigo expressa que todos são iguais perante a lei, garantindo-se a inviolabilidade do direito a vida, e a liberdade, portanto, trata-se de garantias fundamentais e inerentes à pessoa humana.

Ora, nenhum paciente é obrigado a se submeter a tratamento, mesmo que exista o dever estatal e profissional de que os melhores tratamentos médicos estejam a sua disposição. No momento em que o paciente é obrigado a aceitar algum tratamento contra a sua vontade temos ai à violação dos direitos e garantias fundamentais, e há também a violação do direito a vida digna e de qualidade, bem como do bem estar físico, psicológico, social e econômico.

Nesse sentido, os artigos 6º e 196 da Constituição da República de 1988 asseguram o direito à saúde e o respeito ao princípio da universalidade de cobertura e de atendimento, abarcando ações de natureza preventiva e reparadora, senão, vejamos: “É direito de todos e dever do Estado, garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, e ao acesso universal e igualitário ás ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

Ressalta-se que este direito a saúde não é aquele onde o paciente terminal é obrigado a aceitar tratamentos desumanos e degradantes, mas sim o direito a saúde que busca ajudar ao paciente e a família durante os momentos finais, onde o médico é solidário a dor e busca auxiliar e diminuir o sofrimento do paciente e não aumentá-lo com tratamentos que só irão prolongar uma vida com dor e sem dignidade.

Portanto, para que a liberdade seja garantia, é necessário que a vontade do paciente seja respeitada, e sua vontade de morrer com dignidade seja atendida. No entendimento de Ronald Dworking (2003, p.307) levar alguém a morrer de maneira que outros aprovam, mas que para ele representa uma terrível contradição de sua própria vida é uma devastadora e odiosa forma de tirania. 

 

4      A ORTOTANÁSIA SOB A LUZ DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO

Inicialmente, cumpre-nos destacar que a ortotanásia é um assunto bastante polêmico e relevante nos tempos atuais, principalmente a luz do direito penal. O que se tem discutido é se existe a possibilidade legal de deixar que um enfermo morra sem que seja aplicado nenhum recursos que possibilite um prolongamento a vida sem que o ato possa configurar omissão ou a eutanásia passiva.

É importante destacar que a definição de ortotanásia tem grande relevância na configuração do fato como criminoso ou não. Conforme esclarece Maria Villas-Bôas, a ortotanásia se diferencia da eutanásia provocada por omissão (eutanásia passiva), na qual a intenção de matar é direta, recorrendo-se, para tanto, à suspensão ou omissão de medidas que ainda são indicadas e úteis para o paciente que sofre, mas que não se encontra em estado terminal ou que ainda poderia delas se beneficiar. Nas condutas médicas restritivas da ortotanásia o tratamento é inútil e, por isso, não indicado, ou seja, na iminência de uma morte inevitável, após a utilização de todos os recursos existentes e necessários, renuncia ao tratamento que daria somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem interromper os cuidados normais devido ao paciente (2008, p.61-83).

Ressalta-se que o Código Penal brasileiro de 1940 não tinha como prever expressamente hipóteses dessa ordem, assim, não existe no Direito Penal Brasileiro vigente, um tratamento específico para a ortotanásia. Entretanto, mudanças estão por vir uma vez que a comissão de constituição e justiça (CCJ) da câmara dos deputados aprovou em dezembro de 2012 o anteprojeto que atualiza o Código Penal Brasileiro.

De acordo com as alterações previstas no anteprojeto do novo Código Penal, a prática da ortotanásia será legalmente válida. Não caracterizará crime quando o agente deixar de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível. Segue a seguir o artigo 122 do anteprojeto[vi]: 

Art. 122. Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal, imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em razão de doença grave:

Pena – prisão, de dois a quatro anos. 

§ 1º O juiz deixará de aplicar à pena avaliando as circunstâncias do caso, bem como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima.

 

Exclusão de ilicitude 

§ 2º Não há crime quando o agente deixa de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. (Proposta de anteprojeto de reforma do Código Penal. Grifos nossos). 

Salientamos que a disposição do artigo 122 constante do anteprojeto de reforma do Código Penal vai ao encontro do entendimento firmado recentemente pelo Conselho Federal de Medicina – CFM, externado na Res. n°. 1.995/2012.

Conforme consta da Resolução n°. 1.995/2012, foi permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, desde que respeitada à vontade do paciente ou de seu representante legal. Conforme se depreende abaixo: 

CONSIDERANDO que os novos recursos tecnológicos permitem a adoção de medidas desproporcionais que prolongam o sofrimento do paciente em estado terminal, sem trazer benefícios, e que essas medidas podem ter sido antecipadamente rejeitadas pelo mesmo; 

CONSIDERANDO o decidido em reunião plenária de 9 de agosto de 2012, resolve:

 Art. 1º Definir diretivas antecipadas de vontade como o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade; 

Art. 2º Nas decisões sobre cuidados e tratamentos de pacientes que se encontram incapazes de comunicar-se, ou de expressar de maneira livre e independente suas vontades, o médico levará em consideração suas diretivas antecipadas de vontade. (Resolução n° 1.995/2012). 

Como se observa, embora o atual Código Penal Brasileiro não aborde o instituto da ortotanásia, o artigo 122 do anteprojeto supracitado e a própria resolução do CFM nos leva a entender que essa prática não se configurará crime uma vez que na ortotanásia a vida se extingue por si própria.

 

5      UM OLHAR SOCIOLÓGICO 

5.1     Morte digna? 

Etimologicamente a palavra ortotanásia significa ortho = certo e tanathos = morte, ou seja, “a morte no tempo certo”. Essa morte acontece quando o médico se limita a cumprir os procedimentos do tratamento que prolongariam a vida do doente em fase terminal, permitindo então ao doente seguir o processo natural, espontâneo, sem nenhuma tentativa de tratamento. Segundo a visão de Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), “O tema ortotanásia é polêmico porque mexe com os fantasmas da morte e esbarra em valores morais e religiosos.” (2013)[vii]Entende-se que este auxílio a morte é lícito se não provocar o encurtamento da vida, e, nesse sentido, a ortotanásia se encaixa no contexto uma vez que visa respeitar o bem-viver global da pessoa e a dignidade em seu viver e em seu morrer.

Assim, a ortotanásia se coloca no intuito de proporcionar uma morte valorada de forma positiva, levando em consideração o fato de que o paciente já se encontra em fase terminal e não deseja mais sofrer com a doença, portanto, a morte gerada através da ortotanásia não deve ser considerada um homicídio.

Em reforço a esse pensamento, esclarecemos que em 2009 houve a edição do novo Código de Ética Médica (Resolução CFM 1.931/2009)[viii], vigente desde abril de 2010, cujo texto também tratou da ortotanásia. Segundo seu art. 41, parágrafo único, “nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal”.

Quando se diz uma morte benéfica ou digna pensamos diretamente no paciente e também em sua família, porque o “bem” de morrer afetaria diretamente a estes. Vendo de perto o quão doloroso é o procedimento pergunta-se se realmente é adequado prolongar esse sofrimento, mesmo sabendo que a morte é inevitável. Neste ponto, seria digno deixar o enfermo assistir a deterioração de seu corpo sem poder decidir se o que ele realmente quer é morrer sofrendo em uma cama de hospital ou se prefere encerrar seus dias sem dor em sua casa junto de seus familiares? Cada um tem o direito de decidir como deve passar seus últimos dias de vida?

Dessa forma, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº. 6.715 de 2009, que torna prevista em lei a ortotanásia. Em outros termos, a resolução do CFM poderá sair do campo da polêmica para ter respaldo legal. Segundo o site da Câmara dos Deputados este projeto de lei ainda está tramitando, encontrando-se nesta situação: Aguardando Parecer – Ag. Devolução Relator não-membro na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), Origem: PLS 116/2000, Autor: Senado Federal – Gerson Camata – PMDB/ES, Apresentação: 23/12/2009, Ementa: Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para excluir de ilicitude a ortotanásia.

Além desta posição o Código de Ética Médica[ix] prevê no capítulo IV dos Direitos Humanos que é vedado ao médico: Art. 24. “Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa o seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo”, ou seja, a medicina contemporânea tem acolhido a prática da ortotanásia, de modo que o CFM demonstra uma preocupação com a dignidade da pessoa humana.

Apesar de toda a complexidade que envolve a ortotanásia, devem ser consideradas as opiniões do médico, da família e principalmente do paciente que se encontra nesta situação. No caso da ortotanásia, não há dolo de lesão ou perigo à vida, ou seja, não é crime, ao contrário, pretende-se preservar a dignidade humana de quem está em estado precário de saúde e sem perspectivas de cura.

 

5.2     Os direitos humanos

Como já pudemos observar muitas pessoas ainda confundem os conceitos de ortotanásia e eutanásia, julgando serem a mesma coisa, e por isso condenam de forma preconceituosa um procedimento considerado nobre na opinião de muitos médicos, pacientes e familiares de pacientes em fase terminal.

Pois bem, os argumentos expostos nesse estudo deixam claro que a ortotanásia é o procedimento pelo qual o indivíduo se abstém de um tratamento doloroso e prolongado, ao qual o médico mantém um mínimo possível de tratamento para garantir os direitos da dignidade da pessoa humana. Nesses casos, o paciente em questão é portador de uma doença incurável e frequentemente está em fase terminal irreversível. Assim, médicos e paciente, sabendo que se trata de uma doença incurável, optam por uma “morte boa”, sem o doloroso processo de tratamento para a sobrevida, quando o tratamento somente prolongaria uma sobrevida.

Observa-se, também, que a Eutanásia, por sua vez, desconsidera o mínimo necessário para que haja vida, fazendo com que a morte do indivíduo seja imediata ou quase imediata à sua ação. Desta feita, desligar equipamentos que mantém a vida do paciente é prática de eutanásia, pois, nesse procedimento o médico age ou omite-se, constituindo crime previsto no Código Penal Brasileiro.

Desta forma, muitas são as discussões sobre um tema tão relevante e complexo. Mas, se a Constituição Federal contempla o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, buscando assim, um mínimo de condições possíveis para que a pessoa viva uma vida digna, porque não entendermos que também somos merecedores de uma morte digna, sem sofrimentos e muitas vezes, constrangimentos?

Não podemos deixar de lembrar, ainda, que a revista Veja publicou em sua edição nº. 2162, em 28 de abril de 2010, uma matéria com depoimentos de médicos, pacientes e familiares de pacientes, envolvidos em questões relacionadas aos dilemas levantados pela possibilidade médica de prolongar ou abreviar a agonia de pacientes terminais.

Um dos depoimentos mais emocionantes é de Cláudia de Crescenzo, de 45 anos de idade, que conta: “Minha filha Mariana tinha apenas seis anos quando diagnosticada com leucemia. Nos seis anos seguintes, ela foi submetida a tratamentos muito agressivos. Valente, enfrentou a doença de forma muito madura. Nos últimos dias de vida, pediu para ser sedada porque ‘estava cansada e queria dormir’. Que tipo de mãe eu seria se não respeitasse a vontade de minha filha?”

Aliás, a consagração da autonomia de uma pessoa sobre o seu destino é um instrumento legal existente no direito dos Estados Unidos, o living will, que traduzido para o português, quer dizer testamento em vida. Idealizado no fim da década de 60 pelo advogado americano Luis Kutner. O documento é o registro expresso da vontade do paciente de ter ou não a vida mantida artificialmente em casos de doença terminal.

O testamento em vida é feito na presença de duas testemunhas e tem força de lei. No Brasil, um documento assim não tem amparo legal. Mas acordos desse tipo vêm sendo firmados entre os médicos e seus pacientes.

Entretanto, a partir da resolução nº. 1.805/2006 promulgada pelo CFM os profissionais de medicina tiveram um norte de como agir, pois antes não poderiam por vontade própria aconselhar a ortotanásia, quando uma simples menção regulativa iria contra princípios morais e éticos profissionais. 

A boa morte. Se perguntardes a um homem que morte prefere, ou doce e tranquila, ou então entre sofrimentos atrozes e intermináveis, não tereis dúvida sobre a resposta. A razão e o sentimento são acordes em querer evitar os males inúteis. Todos desejamos a eutanásia, a morte boa, e temos medo da morte má. (CANTONI apud COSTA, 2011, p. 12). 

Assim, podemos dizer que a ortotanásia é o direito que o homem tem desde seu nascimento a viver com dignidade, ou seja, ter seu fim com dignidade e respeito também é um direito do ser humano e o Estado deve garantir esses direitos. 

 

6      CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Todo este arcabouço teórico nos permite entender que a ortotanásia está diretamente ligada à morte digna, que é um direito do homem que está amparado por princípios constitucionais da vida, da igualdade, da liberdade, e do direito a saúde. Além disso, o Conselho Federal de Medicina regulamentando procedimentos que buscam proporcionar aos pacientes terminais uma garantia de escolha nos momentos finais da vida, colocando o tão polêmico discurso morte versus vida nas mãos de quem cabe essa decisão, ou seja, o próprio paciente terminal, consagrando assim a autonomia do enfermo sobre o seu próprio destino.

Além disso, a ortotanásia pode ser vista como um modelo naturalista que sustenta o fato de que a natureza é dotada de um ritmo próprio, pela qual ela se auto regula, isto é, visa que o processo de morrer deve ser algo natural, fruto da vontade do paciente, considerando, inclusive, que esta pode ser uma decisão muito complicada e dolorosa para os familiares, pois às vezes é difícil pesar racionalmente que a natureza deve seguir naturalmente seu curso.

Vale ressaltar que uma série de questões e procedimentos médicos e jurídicos deverão ser seguidos até que o processo de ortotanásia se concretize de fato, por isso, é importante frisar que trazer esse tema a tona não significa discutir a morte, mas sim a forma como ela é tratada no estágio final de vida do ser o humano.

Para tal, procuramos abordar a ortotanásia de forma abrangente, trabalhando seus méritos e deméritos sob diversos contextos (ético, social, jurídico etc.), estabelecendo assim um paralelo que nos permitiu entender que, ao violar os direitos fundamentais de um doente em fase terminal não estamos desrespeitando apenas o direito deste paciente, mas também a própria Constituição Brasileira.

Isto, pois, já vimos que a partir do texto previsto na Constituição Brasileira de 1988 é possível defender e assegurar ao paciente terminal, que em pleno gozo de sua faculdade mental, escolha como será o seu tratamento, podendo assim se abster de receber tratamentos que só irão prolongar a sua dor. Desta forma, podemos concluir então que entender esse processo significa conceber o fato de que o direito a uma morte digna deve ser efetivado em plenitude, e, para tal, é preciso compreender e respeitar o fato de que a morte deve ser tratada como um acontecimento natural da vida.


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