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Alf Ross e o realismo jurídico


Autoria:

César Augusto De Oliveira


Mestrando em Direito pela UNIFIEO (Osasco - SP).Bacharel em Direito pela UNIP (SP). Especialista em Direito Processual Civil pela PUC (SP). Advogado e Procurador Jurídico do Município de Ibiúna (SP). Técnico Contábil.

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Resumo:

Este artigo tem o objetivo de realizar uma análise do livro Direito e Justiça, escrito pelo jurista Alf Ross, o qual fez parte da denominada filosofia do realismo jurídico.

Texto enviado ao JurisWay em 02/12/2016.



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Mestrado em Direitos Humanos – Centro Universitário FIEO - Osasco – São Paulo: 19.10.2016

Mestrando: César Augusto de Oliveira – Professor: Dr. Fernando Pavan Baptista

Disciplina: Filosofia e teoria crítica da dogmática jurídica

 

Introdução

Este artigo tem o objetivo de realizar uma análise do livro Direito e Justiça, escrito pelo jurista Alf Ross, o qual fez parte da denominada filosofia do realismo jurídico, e para tanto temos a intenção de apresentar um resumo de maneira clara e objetiva sobre o conceito de direito, ideia do direito, direito vigente, a vigência do ordenamento jurídico, enfim todos os temas abarcados pelos capítulos I e II do respectivo livro, e logicamente sem a intenção de esgotarmos o assunto.

 

Contexto histórico

O autor do livro é Alf  Niels Christian Ross, nascido em 1899 em Copenhague, Dinamarca, formando-se em Direito e cuja tese de doutorado foi aprovada em 1934, começando a lecionar em 1935, aposentando-se em 1974 e falecendo em 1979[1]. O livro objeto deste estudo foi publicado originalmente em 1953, sendo traduzido para a língua inglesa, espanhola e portuguesa, nos anos de 1958, 1962, e 2000 respectivamente. Insta esclarecer que o jurista foi aluno de Axel Hägerström (1868-1939) e também de Hans Kelsen (1881-1973) este que recebeu um agradecimento por ter iniciado o jurista na filosofia do direito, sobretudo por ter ensinado a real importância da coerência[2].

O jurista ainda foi contemporâneo de Norberto Bobbio, este que realizou algumas objeções sobre a teoria jurídica do realismo, contudo, este assunto será tratado com maior acuidade nos capítulos posteriores.

Por fim, o jurista foi seguidor da filosofia do realismo jurídico, o qual podemos dividir em realismo americano e escandinavo, e sobre os quais iremos realizar algumas considerações para facilitar a compreensão sobre os capítulos a que nos propusemos a estudar.

 

 

Realismo comportamentista americano e o realismo psicológico escandinavo

Inicialmente cabe salientar que o positivismo propagado por Hans Kelsen e Norberto Bobbio se sustenta na validade do direito, ou seja, com o nascimento de uma norma, a lei no sentido mais amplo ingressa no ordenamento jurídico, e sendo assim, passa a produzir os seus efeitos independentemente da forma, ou seja, a norma não tem um conteúdo específico mas possui uma validade com um caráter deontológico, dever-ser seguido pelo direito positivado.

De maneira distinta os seguidores do realismo entendem que o direito tem outra dimensão, ou seja, o direito não é simplesmente um conjunto de normas que podem ter qualquer conteúdo, mas sim é um fato social e isto quer dizer estamos tratando de “um conjunto de fatos sociais, reduzido a um único mundo, o da realidade empírica”[3].

Ultrapassada estas diferenças entre o positivismo e o realismo podemos esclarecer de maneira sucinta, que para o realismo comportamentista americano[4] o direito efetivo se sustentaria na produção dos juízes após proferirem as suas decisões, ou seja, o agrupamento de várias decisões formariam um conjunto do denominado direito real em face do fenômeno social após a atuação dos tribunais/juízes[5].

Por outro lado, o realismo psicológico escandinavo[6] se sustenta na afirmação de que um ordenamento jurídico é aceito de acordo com a consciência psicológica da população, ou seja, um direito vigente/aplicado levaria todos a agirem conforme um modelo padrão de conduta, todavia estas duas facetas do realismo serão exploradas mais adiante, já que neste momento a intenção é somente demonstrarmos o posicionamento dessas correntes de pensamento.

 

            Capítulo I – Problemas da Filosofia do Direito

§ 1. Terminologia e Tradição

Neste primeiro ponto o jurista faz uma rápida explicação sobre a denominação do termo jurisprudence o qual é utilizado na língua inglesa, e esclarece que este termo abarca várias áreas do estudo do Direito.

Mais, adiante informa que o termo jurisprudence, pode ter outros significados e dá alguns exemplos como Filosofia do Direito, Ciência Geral do Direito, Enciclopédia Jurídica e Teoria Geral do Direito, mas independentemente da denominação, teríamos três situações a serem analisadas, as quais verificaremos nos itens subsequentes.  

 

1.1. O problema do conceito ou natureza do Direito

Sobre este tema, o jurista aborda a questão sobre a problemática para conceituar qual é a natureza do Direito, tomando como parâmetro o ensinamento da escola analítica, a qual “a lógica formal é analítica de acordo com a seguinte acepção: permite a análise e decomposição dos preceitos, dos argumentos, das proposições, para o alcance de seus resultados científicos”[7], cuja utilização teve um grande destaque na obra de Hans Kelsen.

 

1.2. O problema do propósito ou ideia do Direito

Neste ponto é esclarecido que há uma necessidade também de se enfrentar a problemática a respeito das concepções e opiniões sobre o direito e qual seria a sua relação com a justiça e a sua influência num ordenamento jurídico, sempre considerando este fato do ponto de vista do direito natural, fato que está atrelado à filosofia do direito.

 

1.3. O problema da interação do Direito e a sociedade

Para sustentar a sua tese, também será tratada a influência do Direito em uma sociedade, ou seja, qual o comportamento popular em face das atitudes do legislador e quais as consequências dessas relações, sempre se utilizando do aspecto histórico, sociológico e psicológico. Este tema segundo o autor será tratado pela sociologia do direito, a qual se preocupa com o direito concreto em ação e o comportamento jurídico.

As considerações iniciais sobre este três primeiros itens expostos pelo autor servirão de fundamentos para a conclusão racional e analítica sobre o conceito da natureza geral do direito[8].

 

§ 2. A natureza do Direito

O tema proposto é muito interesse, pois, estamos diante de uma questão que merece uma análise mais meticulosa. Sendo assim, qual a natureza do Direito? Poderíamos utilizar uma rápida explicação mencionando que a natureza é um “conjunto das características básicas próprias de um ser ou coisa”[9], todavia isto não seria suficientemente satisfatório para esclarecer qual é a natureza do Direito, pois, “é imperioso que se faça essa distinção visto que expressões diferentes podem ter o mesmo significado, bem como uma mesma expressão pode, de acordo com as circunstâncias, deter significados variados”[10].

            Ademais, deixamos consignado algumas considerações no tocante a sintaxe e a semântica, e sobre isto apresentamos a lição do Prof. Luís Rodolfo Dantas de Souza[11] o qual foi muito esclarecedor a respeito das distinções entre signos e significados, e ainda na mesma esteira podemos citar o jurista Norberto Bobbio[12], o qual também se preocupou com as questões semânticas do ordenamento jurídico.

Retornando ao livro de Alf Ross[13], o jurista também diz que é necessário enfrentar e buscar o significado da expressão linguística, e por isto ele divide os significados em expressivo ou sintomático dos representativo ou semântico.

Assim, podemos apontar que existem expressões com conteúdo expressivo e representativo: “meu pai está morto”. Para o autor, a forma expressiva (comunica o fato) e a representação (asserção/afirmação/proposição) aponta uma situação do fato, neste caso o “pai está morto”.

Segundo o autor, há também um conteúdo somente expressivo (comunicar) “Ai”, ou, “feche a porta!”. Essas expressões nada simbolizam, não têm significado representativo (asserção/afirmação/proposição)”[14].

Assim, discorrendo sobre as expressões linguísticas o autor ainda propõe que um conteúdo expressivo “Ai”, e o qual não tem intenção de influenciar pode entendido como uma exclamação, e aquela expressão com a intuito de ordenar, deve ser considerada como uma diretiva.

Esclarecendo os fatos e de acordo com os ensinamentos do jurista temos que:

a)      Expressões de asserções (é um conjunto entre expressivo ‘a comunicação de um fato’ e representativo ‘afirmação de algo’) “Está chovendo”, “Está frio”;

b)      Exclamações (expressão ‘comunicação de um fato’ sem intenção de influenciar;

c)      Diretivas (expressão com a intenção de influenciar, ordenar, comandar, sugerir, solicitar, requerer).

Com estas divisões entre as expressões linguísticas e os seus significados semânticos, é possível extrair deste contexto apresentado pelo autor, que a ideia de ordenamento e regras jurídicas devem estar inseridas nas expressões diretivas, ou seja, “deverão ser punidas” de um certo modo, “tem que” ou “pode fazer ou não fazer algo”[15], e por fim vencidos estes esclarecimentos, a natureza do direito deve ser observado como uma expressão diretiva.

 

§ 3. Análise preliminar do conceito “Direito vigente”

Para solucionar e demonstrar a natureza do direito, o autor utiliza uma metáfora das regras do jogo de xadrez as quais servem como sustentáculo para afirmar que “a vida social humana numa comunidade não é um caos de ações individuais mutuamente isoladas. Adquire o caráter de vida comunitária do próprio fato de que um grande número de ações individuais (não todas) são relevantes e têm significado relativamente a um conjunto de regras comuns”[16].

E ainda continua neste sentido ao afirmar que

 

Uma regra de xadrez “é vigente”, significando que dentro de uma dada co-participação (que compreende fundamentalmente os dois jogadores de uma partida concreta) essa regra recebe adesão, porque os jogadores sentem a si mesmos socialmente obrigados pela diretiva contida na regra. O conceito de vigência (no xadrez) envolve dois elementos. Um deles se refere à efetividade real da regra que pode ser estabelecida pela observação externa. O outro se refere à maneira na qual a regra é sentida como motivadora, ou seja, socialmente obrigatória[17].

 

                De permeio, o jurista encerra este assunto ao esclarecer que o conceito de direito vigente “é o conjunto abstrato de ideias normativas que serve como um esquema interpretativo para os fenômenos do direito em ação, o que por sua vez significa que essas normas são efetivamente acatadas e que o são porque são experimentadas e sentidas como socialmente obrigatórias”[18], as quais sempre serão aplicadas pelos juízes/tribunais.

É preciso destacar neste ponto que para uma correta compreensão do direito vigente se faz necessário analisar a ciência do direito (normas jurídicas) e a sociologia do direito (direito em ação/comportamento jurídico) que neste caso entendemos como o direito em movimento e comportamento da sociedade.

 

§ 4. Os ramos do estudo do Direito – 4.1. Ciência do Direito – 4.2. Sociologia do Direito

Ao considerar que o direito é visto como um fato social, o autor é bem claro ao mencionar que não é possível analisar separadamente a ciência do direito e sociologia do direito, senão vejamos

 

A ciência do direito jamais poderá ser separada da sociologia do direito. Embora a ciência do direito esteja interessada na ideologia, é sempre uma abstração da realidade social. Mesmo que o jurista não esteja interessado no nexo que liga a doutrina à vida real, esse nexo existe. Reside no conceito de “direito vigente” que, como foi mostrado, constitui parte essencial de todas as proposições doutrinárias, pois esse conceito, em consonância como nossa análise provisional, se refere à efetividade das normas enquanto constituintes de um fato social[19].

 

É possível notar a importância dispendida a respeito da imprescindibilidade da observação conjunta da ciência do direito e a sociologia do direito, e sendo assim, podemos esquematizar esses ramos do direito da seguinte forma:

 

CIÊNCIA DO DIREITO

a)      Direito em sentido estrito: ocupa-se de um ordenamento jurídico específico: direito brasileiro;

b)     Direito histórico: analisa o direito vigente do passado e a sua evolução;

c)      Direito comparado: analisa diversos ordenamentos jurídicos, os efeitos sociais e a sua evolução;

 

SOCIOLOGIA DO DIREITO

a)      Sociologia fundamental: analisa num primeiro momento o direito em ação/movimento sem um ramo específico, e depois, parte para observação de uma ramo definido do direito: exemplo – criminologia que está inserida no direito penal;

b)     Sociologia do direito: verifica e aponta quais os problemas e as soluções práticas dentro de um determinado ordenamento jurídico, servindo como apoio para a política jurídica[20].

 

Diante deste esquema proposto o autor menciona que o direito vigente necessariamente deve ser observado à luz da ciência do direito e da sociologia do direito.

 

§ 5. Em lugar de “Filosofia do Direito”, “Problemas Jusfilosóficos”

Com o encerramento dos argumentos a respeito da ciência do direito e da sociologia do direito, passamos a observar que inicia-se um enfrentamento no tocante à filosofia do direito, e neste ponto, e indica que a ciência do direito e filosofia do direito se relacionam, mas a filosofia do direito sempre estaria num nível superior, já que o filosofo do direito se propõe a investigar situações que em tese já estariam superadas pela ciência do direito.

Todavia, para analisar e equacionar algumas questões o autor entende que a denominação mais adequada para esta situação seria adotar a expressão “problemas jusfilosóficos” para delimitar o estudo sobre a ciência do direito, já que o termo “filosofia do direito” sugere um domínio de investigação sistematicamente restrito[21].

 

§ 6. Discussão

Para encerrar o capítulo I do livro, há uma rápida consideração sobre a importância da sociologia em relação à filosofia, pois, os resultados desta verificação sempre deve levar em conta que o direito é um fato social.

 

Capítulo II – Conceito de “Direito vigente”

§ 7. O conteúdo do ordenamento jurídico

Alf Ross esclarece que o conceito de direito vigente “é o conjunto abstrato de ideias normativas que serve como um esquema interpretativo para os fenômenos do direito em ação, o que sua vez significa que essas normas são efetivamente acatadas e que o são porque são experimentadas e sentidas como socialmente obrigatórias”[22], as quais sempre serão aplicadas pelos juízes/tribunais. Todavia, o que seria um ordenamento jurídico? Seria o direito?

O autor esclarece não há razões para tentar definir o que é um conceito de ordenamento jurídico, pois, para ele é preciso somente delimitar um conjunto de normas e que podem ser destacadas, por exemplo, direito brasileiro, direito português, argentino, ou seja, limitar o terreno de atuação.

Vencidas estas observações, o conteúdo de um conjunto de normas/ordenamento jurídico, deve conter normas de conduta e normas de competência, e que ao final podemos designar que este conteúdo será

                                              

Um ordenamento jurídico nacional é um corpo integrado de regras que determina as condições sob as quais a força física será exercida contra um pessoa; o ordenamento jurídico nacional estabelece um aparato de autoridades públicas (os tribunais e órgãos executivos) cuja função consiste em ordenar e levar a cabo o exercício da força em casos específicos; ou ainda mais sinteticamente: um ordenamento jurídico nacional é o conjunto de regras para o estabelecimento e funcionamento do aparato de força do Estado[23].

 

§ 8. A vigência do ordenamento jurídico

            Dentro do conceito de um direito vigente, temos um conjunto de normas que irão formar um ordenamento jurídico, e sendo assim, qual é a vigência de um ordenamento jurídico? Segundo Alf Ross[24] está vigência está atrelada ao fato de que

 

Um sistema de normas será vigente se for capaz de servir como um esquema interpretativo de um conjunto correspondente de ações sociais, de tal maneira que se torne possível para nós compreender esse conjunto de ações como um todo coerente de significado e motivação e, dentro de certos limites, predizê-las. Esta capacidade do sistema se baseia no fato das normas serem efetivamente acatadas porque são sentidas como socialmente obrigatórias.

 

            Neste capítulo e de acordo com as explanações do jurista, entendemos que o termo vigência na língua dinamarquesa - o qual foi traduzido para o português e considerando o nosso contexto cultural – faz referência a eficácia de um ordenamento jurídico, pois estamos tomando como pressuposto de que “as normas são efetivamente acatadas porque são sentidas como socialmente obrigatórias”[25].

            Com base nestas argumentações e para sustentar esta observação, entendemos que é salutar transcrevermos a lição de Tércio Sampaio Ferraz Jr.[26], ao afirmar que

 

Eficácia é uma qualidade da norma que se refere à possibilidade de produção concreta de efeitos, porque estão presentes as condições fáticas exigíveis para sua observância, espontânea ou imposta, ou para a satisfação dos objetivos visados (efetividade ou eficácia social), ou porque estão presentes as condições técnico-normativas exigíveis para sua aplicação (eficácia técnica).

 

§ 9. Verificação de proposições jurídicas concernentes a normas de conduta

            Com a existência do direito vigente, devemos verificar quais são as normas de conduta e os seus destinatários, sempre observando o direito vigente sempre terá expressões diretivas.

            Como o próprio termo sugestiona, as normas de conduta dizem respeito ao comportamento regulamentado por alguns parâmetros/direcionamentos, e neste caso são os juízes/tribunais que recebem as expressões diretivas (normas de conduta), ou seja, o juiz deverá aplicar com um certo grau de probabilidade que determinada atitude de um cidadão receberá a condenação, absolvição, será forçado a pagar, fazer ou não fazer.

            Temos então que os particulares recebem as proposições/regulação/indicações jurídicas e sem houver a infração ou a omissão de determinada proposição, ficará aguardando a postura do juiz que seguirá uma norma de conduta com observância das expressões diretivas constantes num ordenamento jurídico.

 

§ 10.Verificação de proposições jurídicas concernentes a normas de competência

            Cabe neste momento observamos as normas de competência, para fecharmos o raciocínio do direito vigente e o conteúdo do ordenamento jurídico.

            Assim, as normas de conduta de competência são normas de conduta indireta e terão como conteúdo o fato de que os tribunais deverão aplicar as leis que respeitaram as respectivas etapas, ou seja, “as normas de conduta criadas pela legislação em conformidade com a Constituição serão aplicadas pelo tribunais”[27].

 

§ 11. Direito – Força – Validade

            Neste aspecto há uma explanação para distinguir que o direito não é constituído pela força, pois, esta relação seria despida de qualquer fundamento sólido, e que numa análise mais detida apontaria a sua fragilidade.

            O entendimento de que o direito é constituído pela força levaria invariavelmente ao um estado de violência, ao revés, o direito deve ser entendido como um ordenamento jurídico com poder/força e eficácia, ou seja, temos que ter “a consciência de que o comportamento contrário a essas normas de conduta traz consigo o risco de juízo, sentença e execução, indiscutivelmente gera um forte motivo para agir de uma maneira lícita”[28].

 

§ 12. Direito, moral e outros fenômenos normativos

            Neste tópico o autor trata da distinção do direito em relação aos outros fenômenos, expressando que o direito é um “conjunto de regras para o estabelecimento e funcionamento do aparato de força do Estado”[29].

            Por isto, também são realizadas algumas observações sobre outras instituições que não possuem este poder/força/sanção inerentes ao Estado, ou seja, associações, organizações e o direito internacional, que muito embora, possam impor sanções nunca haverá a possibilidade do emprego da força física.

            Posteriormente há uma análise da relação entre o direito e a moral, sempre apontando as suas diferenças e aplicações, mas logicamente em nenhum momento a moral é desconsiderada, ao contrário, por ser um fenômeno jurídico e o direito ser um fato social, Alf Ross[30] afirma que

 

É necessário haver um grau considerável de harmonia entre um e outras, já que um e outras estão radicados em valorações fundamentais comuns, na tradição cultural da comunidade. O ordenamento jurídico e as atitudes morais se acham também em relação de cooperação recíproca. As instituições do direito constituem um dos fatores do meio ambiente que moldam as atitudes morais individuais. Esta últimas, por sua vez, constituem parte dos fatores práticos que, através da consciência jurídica moral contribuem para moldar a evolução do direito.

 

§ 13. Discussão: idealismo e realismo na teoria jurídica

            O ponto central desta discussão tem primeiramente como objeto a análise crítica da teoria jurídica do idealismo (baseado na validade das normas), a qual pode ser dividida em idealismo material (derivada da ideia de justiça) e o idealismo formal (validade das normas). Esta última forma de idealismo teve como um dos seus seguidores Hans Kelsen o qual aceitava qualquer ordenamento jurídico positivado, ou seja, se é válido é aceito independentemente do conteúdo da norma, todavia, Alf Ross realiza vários apontamentos críticos, rebate e contesta esta forma de visão do sobre o direito.

            Posteriormente em contraponto a teoria idealista, é apresentado o realismo jurídico, pois, segundo na visão do autor, não se deve preocupar somente com a validade, mas também observar o direito como um fato social e efetivo, pois esta seria a verdadeira essência do direito em face de uma realidade social.

 

§ 14. Discussão: realismo psicológico, realismo comportamentista e sua síntese

            Encerradas as discussões sobre as fragilidades da teoria jurídica do idealismo/positivismo, e com a apresentação da teoria jurídica do realismo baseado no fato social do direito, há um esclarecimento sobre o realismo psicológico e o realismo comportamentista.

O realismo psicológico sustenta suas convicções de que haveria uma consciência jurídica popular, ou seja, o respeito implícito de determinadas regras jurídicas, todavia, é demonstrado que este método esbarra numa dificuldade em solucionar a questão da consciência jurídica, pois, segundo o autor a “consciência jurídica é um conceito que pertence ao indivíduo. Ao vincular o conceito de direito vigente à consciência jurídica individual, esse ramo do realismo converte o direito num fenômeno individual que se acha num plano idêntico ao da moral”[31].

            Por outro lado, há o realismo comportamentista baseado na argumentação de que o direito efetivo se sustentaria na produção dos juízes após proferirem as suas decisões, ou seja, o agrupamento de várias decisões formariam um conjunto do denominado direito real em face do fenômeno social após a atuação dos tribunais/juízes, mas isto seria redundante, pois, o direito é aplicado porque é vigente, e é vigente porque é aplicado.

            Por fim, para solucionar este impasse sobre o direito como fato social, aplicado e efetivo, se faz necessário realizar uma junção entre o realismo psicológico e o comportamentista, pois, o autor afirma que a sua visão

 

É comportamentista na medida em que visa a descobrir consciência e previsibilidade no comportamento verbal externamente observado do juiz; é psicológica na medida em que a aludida consistência constitui um todo coerente de significado e motivação, somente possível com base na hipótese de que em sua vida espiritual o juiz é governado e motivado por uma ideologia normativa cujo conteúdo nós conhecemos[32].

 

       Considerações sobre o livro Direito e Justiça

       Sem adentrarmos no mérito, é possível observar que o realismo analisa o direito como um fato social, de modo que o direito vigente deve ser eficaz e para isto utiliza-se de uma política jurídica[33], sempre tendo em vista que o juiz não é um autômato, ou seja, ele deve pensar e interpretar o fato social com base no ordenamento jurídico para que ao final consiga produzir uma eficaz política jurídica com uma interpretação evolutiva do direito.

Todavia, esta forma de pensamento encontrou objeções por parte de outros juristas, e neste caso podemos citar Norberto Bobbio[34], o qual sustentou que esta postura de uma contínua criação do juízes poderia levar a uma insegurança jurídica.

Numa visão mais contemporânea e guardadas as devidas proporções, é possível observar que essa maior liberdade dos juízes serviu com um dos pilares para o ativismo judicial[35], muito em discussão atualmente, mais isto deve ser objeto de um estudo mais aguçado sobre este tema, pois, o ativismo judicial deve ser observado à luz de outras considerações como o modo de interpretar, o conflito entre princípios, regras, sopesamento, princípio da razoabilidade e proporcionalidade, mas que não cabem serem discutidos neste momento.

Por fim, o direito sempre está conexo com a ideia de justiça, todavia esta relação entre o direito e justiça, é no sentido de que o ordenamento jurídico deve ser compreendido como um “o conjunto de regras para o estabelecimento e funcionamento do aparato de força do Estado”[36], e a justiça estaria vinculada somente no fato de ser uma expressão contrária em face de uma decisão, ou seja, a injustiça seria uma posição/entendimento particular diverso ao que foi determinado pelos juízes/tribunais.   

 

            Referências bibliográficas

BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. Trad. Ariani Bueno Sudatti e Fernando Pavan Baptista; apresentação de Alaôr Caffé Alves. 6. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2016.

 

FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 2. ed. São Paulo : Atlas, 1994.

 

LAROUSSE. Minidicionário Larousse da língua portuguesa – Larousse do Brasil: coautora Laiz Barbosa de Carvalho. 3. ed. São Paulo : Larousse do Brasil, 2009.

 

RAMOS, Elival da Silva. Ativismo judicial : parâmetros dogmáticos. 2. ed. São Paulo : Saraiva, 2015.

 

ROSS, Alf. Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007.

 

SOUZA DANTAS, Luís Rodolfo A. Pluralismo lógico. In. www.bugiosepapagaios.blogspot. com/2010_08_01_archive.html acessado em 10.out.2016.



[1] Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 16.

[2] Ibidem, p. 9-22.

[3] Conforme Alaor Caffé Alves. In. Direito e justiça. Tradução Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 11.

[4] Os expoentes desta forma de pensamento foram Oliver Wendell Holmes, John Chipman Gray, Jerome Frank.

[5] Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 95.

[6] Conforme as pesquisas realizadas foram membros destacados da escola de Uppsala, Hägerstrom, Lundstedt, Olivecrona.

[7] SOUZA DANTAS, Luís Rodolfo A. Pluralismo lógico. In. www.bugiosepapagaios.blogspot. com. /2010_08_01_archive.html acessado em 10.out.2016.

[8] Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 28.

[9] LAROUSSE. Minidicionário Larousse da língua portuguesa – Larousse do Brasil: coautora Laiz Barbosa de Carvalho. 3. ed. São Paulo : Larousse do Brasil, 2009. p. 568.

[10] Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 29.

[11] A respeito do assunto ler sobre o Pluralismo lógico. In. www.bugiosepapagaios.blogspot. com. /2010_08_01_archive.html acessado em 10.out.2016, aonde estão expressas estas considerações ao afirmar que: “A sintaxe estuda as relações entre os signos como unidades básicas no processo de formação de complexos como proposições abstração feita do significado desses signos. Caracteriza-se como uma ciência formal, definindo as regras de formação das proposições, enquanto entidades abstratas, a partir de combinações possíveis entre os signos. Isso pode ser ilustrado com um exemplo da sintaxe da língua portuguesa. A sentença “João fora lá corre” é uma combinação sintaticamente incorreta, uma vez que, de acordo com as regras da língua portuguesa, os diferentes signos linguísticos utilizados na formação desta sentença não estão corretamente relacionados. O correto seria “João corre lá fora”.  [...] Por outro lado, a semântica estuda o significado dos signos linguísticos, ou seja, seu modo de relação com os objetos que designam. Assim, por exemplo, “Júlio César concluiu a conquista da Gália em 51 a.C.”, é uma sentença dotada de significado, já que os signos que a compõem têm significado e estão corretamente articulados, referem-se a objetos no real e a sentença descreve adequadamente um fato histórico ocorrido, sendo verdadeira materialmente. A semântica diz respeito, portanto, ao conteúdo significativo dos signos. Pode-se dizer que, no caso das sentenças de uma determinada língua, a sintaxe é um pressuposto da semântica. Isto ocorre porque se os signos não estiverem corretamente articulados, a própria sentença não terá significado nem valor de verdade, não poderá descrever adequadamente fatos ocorridos e, portanto, não será nem verdadeira, nem falsa, mas sem sentido”.

[12] De maneira resumida: “o direito é tratado como fenômeno da linguagem, escrita, gestual, um conjunto de símbolos, é preciso saber a linguagem para entender que se trata de uma ordem. Sendo assim o supracitado jurista afirma que é possível haveriam as proposição, descritivas, expressivas e as prescritivas, esta última sendo a mais importante pois cria um significado jurídico, que prescreve algo que deverá ser cumprido”. In, Teoria da norma jurídica. Trad. Ariani Bueno Sudatti e Fernando Pavan Baptista; apresentação de Alaôr Caffé Alves. 6. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2016. p. 69 ss.

[13] Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 29.

[14] Ibidem, p. 30.

[15] Ibidem, p. 31.

[16] Ibidem, p. 37.

[17] Ibidem, p. 39.

[18] Ibidem, p. 41.

[19] Ibidem, p. 43.

[20] Segundo Alf Ross o termo política jurídica, deve ser entendida da seguinte forma: “A expressão ‘política jurídica’ é introduzida para designar a atividade criadora de direito do legislador ou do juiz e a discussão racional dessa atividade. Seria supérfluo salientar que a política jurídica nada tem a ver com política no sentido ordinário desta palavra”. In, Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 48.

[21] Ibidem, p. 50.

[22] Ibidem, p. 41.

[23] Ibidem, p. 58.

[24] Ibidem, p. 59.

[25] Ibidem, p. 59.

[26] Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação 2. ed. São Paulo : Atlas, 1994. p. 202.

[27] Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 76.

[28] Ibidem, p. 80.

[29] Ibidem, p. 58.

[30] Ibidem, p. 89.

[31] Ibidem, p. 98.

[32] Ibidem, p. 100.

[33] O termo política jurídica, deve ser entendido da seguinte forma: “A expressão ‘política jurídica’ é introduzida para designar a atividade criadora de direito do legislador ou do juiz e a discussão racional dessa atividade. Seria supérfluo salientar que a política jurídica nada tem a ver com política no sentido ordinário desta palavra”. In, Direito e justiça. trad. Edson Bini – revisão técnica Alysson Leandro Mascaro – 2. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2007. p. 48.

[34] Neste aspecto o referido autor faz um crítica a respeito da insegurança jurídica, pois, “o direito é uma contínua criação do juiz, é obra exclusivamente do magistrado no ato em que decide uma controvérsia. Cai, desse modo, o tradicional princípio da certeza jurídica, e de fato, qual pode ser a possibilidade de prever a consequência de um comportamento – nisso consiste a certeza -, se o direito é uma contínua nova criação do juiz?. In, Teoria da norma jurídica. Trad. Ariani Bueno Sudatti e Fernando Pavan Baptista; apresentação de Alaôr Caffé Alves. 6. ed. Bauru, São Paulo : Edipro, 2016. p. 65.

[35] RAMOS, Elival da Silva. Ativismo judicial : parâmetros dogmáticos. 2. ed. São Paulo : Saraiva, 2015. P. 324. O autor dá a seguinte definição. “Por ativismo judicial, deve-se entender o exercício da função jurisdicional para além dos limites impostos pelo próprio ordenamento que incumbe, institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer atuar, resolvendo litígios de feições intersubjetivas (conflito de interesses) e controvérsias jurídicas de natureza objetiva (conflitos normativos). Essa ultrapassagem das linhas demarcatórias da função jurisdicional se faz em detrimento, particularmente, da função legislativa, não envolvendo o exercício desabrido da legiferação (ou de outras funções não jurisdicionais) e sim a descaracterização da função típica do Poder Judiciário, com incursão insidiosa sobre o núcleo essencial de funções constitucionalmente atribuídas a outros Poderes”.

[36] Ibidem, p. 58.

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