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Resumo:
A questão aborda um tema intrincado, a proteção das garantias e direitos fundamentais, ou seja, a observância da presunção de inocência, devido processo legal e a prisão preventiva.
Texto enviado ao JurisWay em 20/06/2016.
Última edição/atualização em 27/06/2016.
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Fundamentos para uma prisão preventiva.
A questão aborda um tema intrincado, pois, aponta para um problema que necessariamente precisa ser equacionado, protegendo as garantias e direitos fundamentais, ou seja, a observância da presunção de inocência, devido processo legal e fundamentação das decisões judiciais, de modo que iremos expor as possíveis razões para o decreto de uma prisão preventiva.
O juiz ao determinar ou não a prisão preventiva deve necessariamente fundamentar a sua decisão, e José Frederico Marques[1] já ensinava que “a motivação revela dê como o juiz interpretou a lei e os fatos, pelo que deve vir exposta com clareza, lógica e precisão, a fim de que as partes tenham perfeito conhecimento da solução dada ao litígio[...]”.
Darlan Barroso[2] argumenta que “a fundamentação das decisões é pressuposto para que a parte prejudicada possa impugnar o ato que lhe causar prejuízo, pois o ato que padece de fundamento, impede que o prejudicado exerça o próprio direito de contraditório da parte. Como alguém poderá recorrer da decisão se não sabe os motivos que levaram o magistrado ao convencimento?”.
A disposição estampada no artigo 93, inciso IX da Constituição Federal é uma garantia que dá ao cidadão o direito de obter uma decisão fundamentada, acesso ao contraditório e ao devido ao processo legal, além de ser um mecanismo para aferir-se em concreto a imparcialidade[3].
Certamente a prisão preventiva é um instrumento que deve ser utilizado em casos extremos, pois é consabido ser uma medida de exceção, mas como dito alhures, o decreto prisional sempre deve ser fundamentado sob pena de nulidade, e também para entregar ao cidadão o direito de saber porque está sendo preso, ainda que temporariamente. “Meras ilações e conjecturas, destituídas de qualquer evidência material, não têm o condão de justificar a ruptura das garantias constitucionais[4][...]”. Desse modo, o juiz ao optar pela prisão preventiva deve fundamentar a sua decisão em bases concretas, demonstrar que o réu necessita ser aprisionado, que a instrução criminal será prejudicada caso o réu ameace a testemunha.
Porém, é preciso ter provas concretas, não basta que o juiz suponha que talvez o réu possa algum dia ameaçar a testemunha, ou então, ou se cogite que o acusado possa fugir, e sendo assim, o juiz deve apontar de acordo com o artigo 312 do Código de Processo Penal qual o motivo concreto para o aprisionamento do réu.
Realizada estas considerações, podemos tomar como parâmetro os Habeas Corpus em que o Relator foi o Ministro Cezar Peluso (HC 84.997-1 e 89.503-4, respectivamente), aonde esta questão foi muito bem enfrentada, pois, alegações sobre a natureza e gravidade do crime, e repercussão na sociedade não podem servir de base para o encarceramento do cidadão, conforme as explanações no voto do HC 84.997-1 (páginas 261/264).
O Ilustre Ministro entende ainda que a prisão preventiva deve “fundar-se em razões objetivas e concretas, capazes de corresponder às hipóteses legais (fattispecie abstratas) que a autorizem”. (trecho do voto HC 84.997/SP – página 259).
Podemos observar ainda o HC 82.770-5/RJ cujo relator foi o Ministro Celso de Mello, sendo possível observar a preocupação em se decretar uma prisão sem que haja a devida fundamentação, sendo o entendimento de que “a decretação da prisão cautelar do ora paciente apoiou-se, no caso, em razões – ‘gravidade do crime’ e a alegada repercussão social dele resultante, além da necessidade de preservar-se ‘a própria credibilidade da justiça[...]’. (página 397)
Também nota-se no referido HC 82.770-5/RJ, que não se tolera a falta de fundamentação, bem como a nulidade não pode suprida (voto Ministro Celso de Mello, p. 402) sob pena de haver supressão de outra instância.
Todavia, os Ministros Celso de Mello e Maurício Corrêa foram votos vencidos, pois, o demais integrantes entenderam que a decisão estava bem fundamentada pelo juízo a quo e sendo assim não haveria condições de acolher o pedido formulado no HC 82.770-5/RJ.
Desse modo, realizadas as colações e apresentados os argumentos, fica claro que os Ilustres Ministros enfrentaram a questão da falta de fundamentação, muito embora haja alguma divergência entre os julgadores como ocorreu no HC 82.770-5/RJ.
Ademais, conforme a problemática apresentada cabe ao juiz ao decidir pela prisão preventiva demonstrar de maneira concreta a existência de alguma das situações estampadas no artigo 312 do Código de Processo Penal, e não se utilizar de simples conjectura ou suposição de que o réu poderá fugir, irá ameaçar uma testemunha ou interferirá na instrução processual, é necessário ter provas, demonstrar objetivamente através de fatos concretos que o cidadão deve ser aprisionado.
Sendo assim, “o movimento de constitucionalização do direito influencia de forma marcante todo o sistema processual, a ponto de se identificar claramente um novo processo e, por conseguinte, uma nova visão de jurisdição que não mais se limita a desvelar o conteúdo da lei no caso concreto, mas fazer com que a lei se conforme aos princípios constitucionais de Justiça e direitos e garantias fundamentais do cidadão, os quais devem ser levados em consideração em todas as decisões do Poder Judiciário a par das circunstâncias de cada caso concreto, ou seja, os valores encampados pela Constituição devem estar refletidos nas decisões judiciais”[5].
Urge esclarecer que fundamentar não é somente transcrever o artigo de lei, ou utilizar-se de expressões como “indefiro por falta de amparo legal”, ou ainda, “presentes os pressupostos decreto a prisão”, é necessário que o juiz informe quais os motivos, os fatos concretos que o levaram a decretar a prisão, até porque o réu necessita destes elementos para que possa utilizar-se dos instrumentos processuais existentes para obter novamente a sua liberdade.
Cabe assim ao juiz, muito antes de proferir um decreto prisional, analisar toda a questão, averiguar e observar a existência de elementos concretos que possibilitem adotar a medida extrema da prisão, sem isto, os princípios do devido processo legal, contraditório, e decisões fundamentadas ficam sem sentido.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROSO, Darlan. Manual de direito processual civil. 2. ed. Barueri: Manole, 2007, volume 1, 576 p.
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, 383 p.
MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. 2. ed. Campinas: Millenium, 2000, volume III, 394 p.
SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Visão panorâmica da última reforma do cpc numa ótica constitucional. In: CAVALCANTI, Bruno; ELALI, André; VAREJÃO, José Ricardo, coordenadores. Novos temas de processo civil. São Paulo: MP Editora, 2006, p. 265-306.
[3] Além da necessidade de se obter a uma decisão fundamentada, também há uma tendência no sentido de que, “mais modernamente, foi sendo salientada a função política da motivação das decisões judiciais, cujos destinatários não são apenas as partes e o juiz competente para julgar eventual recurso, mas quisquis de populo, com a finalidade de aferir-se em concreto a imparcialidade do juiz e legalidade e justiça das decisões” (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel, 2006, p. 74). (grifo do autor)
[4] Trecho do julgamento de um Habeas Corpus, pelo STJ – 6ª T., HC nº 59.257-RJ; Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura; j. 22/8/2006; m. v.) fonte Boletim da AASP nº 2553 – Jurisprudência p. 4553. “Ementa: Investigação Criminal – Crime de evasão de divisas. Quebra de sigilo fiscal. Decisão sem motivação. Revogação. 1 – Pedido e decretação de quebra de sigilo fiscal com o fim de colher mínimos elementos necessários à investigação. 2 – Não foi declinado o fumus commissi delicti, pelo contrário, decretou-se a quebra a fim de buscá-lo. 3 – Manifesta violação do art. 93, inciso IX, da Constituição Federal. 4 – Ordem concedida”.
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