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O Projeto do Código Penal é uma reforma que precisa de reforma


Autoria:

Bibiana Rabaioli Prestes


Advogada e Gestora Legal

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Resumo:

Este artigo de opinião foi publicado de forma resumida no Jornal Mundo Jovem em Setembro de 2013 - Edição nº 440.

Texto enviado ao JurisWay em 25/08/2014.

Última edição/atualização em 10/09/2014.



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Vivemos em uma sociedade, e uma sociedade precisa de leis, normas, regimentos, meios para regular e manter a convivência entre os cidadãos e preservar seus direitos, pelo bem da coletividade, e essas leis devem ser formuladas conforme a conceituação e caracterização das necessidades da sociedade.

O Código Penal brasileiro é um conjunto de leis, que regula as condutas tipificadas (descritas) como crimes e infrações, ou seja, são crimes ou infrações penais os que o Código Penal diz que são. Existem leis esparsas que também trazem alguns conceitos de crimes, infrações, contravenções penais de menor potencial ofensivo, outras condutas humanas tipificadas como crimes. O Código Penal atual entrou em vigor (isso quer dizer, passou a ter valor na sociedade devendo ela ser regida por ele) no ano de 1940.

Um código é feito pela formulação de conceitos históricos, culturais, pelas características da sociedade, conforme suas necessidades. O primeiro ponto de questionamento então é, se o código penal foi escrito em 1940, estaria ele atual às necessidades da sociedade de hoje, que é bem diferente da década de 40? Essa questão é fácil de responder. O Código passou, ao longo dos anos, por modificações com o propósito de modernizá-lo e torná-lo mais coerente com as características da sociedade atual, pois o Direito deve andar em conjunto com a sociedade, devendo se atualizar, mudar, conforme ela muda, mas ainda tem muitas deficiências.

Existem diversos pontos que precisariam ser mudados no Código Penal. Há crimes descritos que praticamente não ocorrem mais, ou ocorrem de forma diferenciada, e por outro lado, existem condutas que prejudicam terceiros que deveriam ser tipificadas como crimes e ainda não são, condutas novas, que a sociedade vem conhecendo a pouco tempo e só com o tempo o direito passará a conhecer também, como por exemplo os crimes cibernéticos.

Há outro ponto a ser lembrado quando pensa-se em reformar o Código Penal, e é o ponto mais importante. As leis de uma sociedade devem atender seus anseios, da melhor forma possível. Mas, fica evidente, basta observar a realidade, que muitas leis pecam ao tentar encontrar o interesse social, e quando são bem formuladas, não são bem aplicadas.

O Código Penal tem um caráter marcadamente repressivo. Tipifica, determina, as condutas humanas que são consideradas crimes e traz uma sanção a cada uma delas, sabemos que determinadas condutas são crimes e cometendo-as podemos ser punidos com penas. Esse é o primeiro fator do caráter repressivo, é necessário para manter a ordem numa sociedade. Mas também é a primeira punição, como dizem os criminólogos, pois se está estabelecendo que determinada conduta é punível. Outro fator do caráter repressivo do Código Penal, são as penas cominadas aos crimes. Em determinados crimes, as penas são bastante graves e, principalmente não preveem nenhuma forma de ressocialização, adotando um caráter repressivo excessivo.

Sendo parte de um sistema maior, o sistema criminal, o código não pode se manter sozinho, precisa abarcar o todo que o envolve, como o sistema carcerário, as prisões. E esse sistema transborda (literalmente) o caráter repressivo do seu código. As pessoas que são enviadas às prisões, deveriam cumprir sua pena de restrição de liberdade, mas pagam muito mais do que isso, devido à péssima condição do sistema carcerário brasileiro, que é extremamente degradante, lotado, insalubre, inabitável e desumano, sendo praticamente impossível para essas pessoas se ressocializarem e tenham uma nova chance na sociedade, fora da criminalidade.

O Brasil é um dos países mais violentos do mundo, está em 18º lugar, pela pesquisa do Instituto Avante Brasil, e a origem dessa estatística está no círculo vicioso da criminalidade e do sistema criminal que não a comporta. O Brasil também é um dos países que tem mais presos no mundo, a população carcerária chega a 550 mil. Os dados foram divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Sem falar no custo que o sistema criminal tem para o país.

            Pelas estatísticas, pela realidade, podemos compreender que esse sistema com caráter apenas repressivo não funciona e que o Código Penal precisa urgentemente ser mudado e adotar um caráter mais ressocializador e buscar ao máximo a efetivação dessa característica.

            Existem sistemas diferenciados, alternativos, de cumprimento de pena fora do sistema carcerário comum, e esses métodos adotam principalmente o caráter ressocializador, tendo se mostrado com efetividade quanto aos índices de reincidências que têm sido bem mais baixos do que no sistema comum. O Método APAC por exemplo tem estatísticas de reincidência abaixo de 10%, enquanto o sistema comum está em torno de 70%, das pessoas que tornam a cometer crimes, conforme dados da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados.

            Na busca de uma melhora do sistema penal, e atualização do Código Penal, uma comissão de juristas trabalhou durante 7 meses para a formulação da Reforma do Código Penal, e está em tramitação, desde julho de 2012 no Senado, o Projeto do Novo Código Penal, conhecido por PLS 236/2012.

            Esse Projeto tem diversas inovações, mas também trouxe muitas críticas no mundo jurídico. Por exemplo, o jurista Miguel Reale, criticou o fim do livramento condicional, em que o ­condenado, após cumprir parte da pena, pode ser posto em liberdade se preencher requisitos que estavam postos como condição para ele sair. O país já está com as prisões lotadas e com a extinção dessa figura, pode ter muito mais gente nas prisões.

            Também haveria o aumento das penas para crimes mais violentos. Voltamos no ponto sobre o caráter repressivo. Aumentar as penas não parece a melhor saída se não houver um programa de ressocialização efetivo junto com o cumprimento de pena.

            Reale criticou também a instituição da figura da Barganha, por eliminar o processo e induzir o acusado, mesmo se inocente, a aceitar uma condenação mínima apenas pelo temor das dificuldades para provar que não tem culpa. É muito utilizada nos Estados Unidos, o promotor oferece ao acusado a opção de aceitar o cumprimento da pena mínima cominada para o crime que ele supostamente cometeu, para não ter que passar pelo processo e correr o risco de ter uma pena maior e, por outro lado, abstendo também a possibilidade do acusado ser absolvido. Acredito que a Barganha vai contra os Princípios do Devido Processo Legal e da Presunção de Inocência, que são basilares do nosso ordenamento jurídico e previstos na Constituição Federal.

            Há inconstitucionalidade no projeto, dispositivos que violam os princípios constitucionais da proporcionalidade e razoabilidade das penas de diferentes crimes, com excesso em alguns casos e falta de rigor em outros, por exemplo a pena mínima de um mês de prisão por omissão de socorro a criança abandonada e a pena de um ano de prisão para abandono de animal. “É um absurdo da desproporção e da falta de critério”, como disse Miguel Reale.

            A questão sobre a implantação do “juiz de garantias” também gerou bastante polêmica, esse seria um juiz que poderia fazer diligências e solicitar provas quando quisesse e outro juiz seria só parar julgamento. Além de ser inviável pelo número insuficiente de juízes e sobrecarregaria demais o judiciário, a OAB também criticou em virtude das novas despesas que isso traria ao Poder Público, e também seria inviável porque o juiz não poderia garantir ao advogado as vistas do inquérito, pois o próprio juiz não teria conhecimento do inquérito.

            Tem algumas inovações como a ampliação das situações em que o aborto não é punível, como a possibilidade de aborto assistido, até a 12ª semana de gestação, quando por vontade da gestante, quando for atestado (por médico ou psicólogo) que ela não tem condições psicológicas de ser mãe (arcar com a maternidade).

            Haveria ampliação no rol dos crimes considerados hediondos, incluindo os crimes de tortura, trabalho escravo e racismo, financiamento ao tráfico de drogas, crimes contra a humanidade e terrorismo. Essa é uma proposta bastante importante, pois se formos analisar, o crime de homicídio qualificado é hediondo e os crimes contra a humanidade ainda não são considerados hediondos. O financiamento ao tráfico de drogas é o fomentador de todos os problemas que temos com drogas no país, considerá-lo hediondo também é importante. A escravidão contemporânea infelizmente ainda existe, segundo o Ministério Público do Trabalho, 20 mil pessoas ainda são submetidas ao trabalho escravo no Brasil.

            Seriam previstos outros meios de comprovação de embriaguez ao volante, como depoimentos de pessoas próximas ao local, podendo ser policiais em trabalho, fotos, vídeos e outras provas, permanecendo como meios de prova o teste do bafômetro e o exame de sangue, tornando mais fácil a comprovação.

            Há propostas para tornar atos como bullying e stalking crimes. O bulliyng é definido no código penal como "intimidação vexatória" e chegaria a quatro anos de prisão e stalking é definido como "perseguição obsessiva" e chegaria a seis anos de prisão.

                Outros novos crimes também seriam previstos e também aumentaria a pena em alguns crimes já previstos.

 

Conclusão

 

            Visto tudo isso e tendo uma breve noção dos problemas que o Código Penal atual tem e também o sistema carcerário, pode-se observar que uma reforma no Código Penal é extremamente necessária e urgente. Mas essa urgência deve ter paciência, porque foi por causa da urgência da proposta do Projeto do Novo Código Penal que ele possui tantas deficiências, impropriedades, e peca na ausência da característica ressocializadora.

            O texto traz propostas importantes e que atenderiam às atuais necessidades da sociedade, mas alguns dispositivos estão ainda imprecisos ou apresentam problemas técnicos e conceituais, são questões que requerem correção. São incoerências que devem ser retiradas do projeto e para isso é necessária maior discussão, mais debates e maior participação da população.

            Esse projeto não pode ser aprovado do jeito que está, ele representa uma reforma que precisa de reforma. Se for aprovado, além de poder ser uma vergonha internacional, como disse Miguel Reale, trará diversos problemas e acentuará outros já existentes. É de extrema importância uma maior reflexão.

 

Referências

 

 

AGUIAR, Sara Rebeca. Brasil é apontado como 18º país mais violento do mundo em pesquisa. Encontrado em: http://www.opovo.com.br/app/fortaleza/2013/05/04/noticiafortaleza,3050678/brasil-e-apontado-como-18-mais-violento-do-mundo.shtml Acesso em: 09/07/2013.

 

 

FREITAS, Carolina. Reale Júnior: “Novo Código Penal tem falhas insuperáveis”. Encontrado em: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/reale-junior-%E2%80%9Cnovo-codigo-penal-tem-falhas-insuperaveis%E2%80%9D Acesso em: 08/07/2013.

PRUDENTE, Neemias Moretti. Principais Mudanças e Polêmicas: Projeto de Novo Código Penal (PLS 236/2012). Encontrado em:

 http://atualidadesdodireito.com.br/neemiasprudente/2013/02/20/principais-mudancas-e-polemicas-projeto-de-novo-codigo-penal-pls-2362012/ Acesso em: 09/07/2013

 

REALE JR., Miguel. Erros e Absurdos do Projeto de Código Penal. Encontrado em: http://interessenacional.uol.com.br/2013/01/erros-e-absurdos-do-projeto-de-codigo-penal/ Acesso em: 10/07/2013.

 

SENADO FEDERAL, Portal de Notícias. Projeto de Código Penal gera críticas e defesa. Encontrado em: http://www12.senado.gov.br/noticias/jornal/edicoes/2013/03/01/projeto-de-codigo-penal-gera-criticas-e-defesa Acesso em 09/10/2013.

 

 

VASCONCELOS, Jorge. População carcerária do Brasil atingiu 550 mil presos em junho. Encontrado em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/22552-populacao-carceraria-do-brasil-atingiu-550-mil-presos-em-junho Acesso em: 09/07/2013

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