O núcleo do tipo penal previsto no art. 334 do Código Penal faz referência a duas condutas distintas.
A primeira diz respeito ao crime de contrabando, importar ou exportar mercadoria proibida, e a segunda trata do descaminho, que consiste em frustrar o pagamento do tributo de importação ou exportação de produtos permitidos.
Estabelecida sucintamente a diferença entre as duas condutas, temos que a importação de cigarros do Paraguai não enseja a aplicação do princípio da insignificância, porquanto o produto apreendido – cigarros de origem estrangeira – constitui mercadoria proibida que ofende a saúde, a higiene, a moral e a ordem pública, caracterizando uma conduta mais reprovável, que afasta a possibilidade de aplicação da aludido princípio.
Esse é o entendimento que se formou nos últimos anos, pois sobre a importação de mercadorias de cunho proibido não incide apenas a questão tributária, na verdade, está chega a ser despicienda, pois em sede de contrabando, ou seja, importação ou exportação de mercadoria proibida, em que, para além da sonegação tributária há lesão à moral, higiene, segurança e saúde pública, não há como excluir a tipicidade material tão-somente à vista do valor da evasão fiscal.
No entanto, em recentíssima decisão do Tribunal Regional Federal da 3º Região autos de n.º 0002237-49.2013.4.03.6105/SP foi reconhecida a decisão de primeiro instância que rejeitou a denúncia devido à ausência de justa causa, sob o argumento de que deve ser aplicado o princípio da insignificância, tendo em vista o valor dos tributos iludidos.
A decisão do TRF3 aponta que os precedentes jurisprudenciais vêm reconhecendo a aplicação do princípio da insignificância no crime de descaminho quando o valor do tributo iludido é inferior ao estipulado como piso para execução fiscal, valor este que atualmente é de R$ 20.000,00, conforme disposto na Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012.
Asseverou-se no acordão que o montante de impostos supostamente devido pela acusada inferior ao mínimo legalmente estabelecido para a execução fiscal, não constando da denúncia a referência a outros débitos em seu desfavor, em possível continuidade delitiva, constatada está à ausência de justa causa para a ação penal, pois uma conduta administrativamente irrelevante não pode ter relevância criminal. Nesse aspecto, a decisão do TRF3 está amparada por precedente do Supremo Tribunal Federal (STF) que ressalta os princípios da subsidiariedade, da fragmentariedade, da necessidade e da intervenção mínima do Direito Penal.
Diz a decisão do TRF3: "De fato, na hipótese vertente, o dano decorrente da conduta praticada pelo agente pode ser considerado penalmente irrisório, ou seja, é possível a exclusão da tipicidade delitiva, razão pela qual a rejeição da denúncia deve ser mantida".
Está decisão, a nosso ver, deve ganhar novos contornos jurídicos, pois, para o Tribunal, pouco importa o tipo de produto ou a proibição relativa de sua comercialização e ainda que sua prática constitua crime de contrabando, havendo mínima ofensividade da conduta do agente; nenhuma periculosidade social da ação; o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, deve ser aplicado o princípio da insignificância independentemente da classificação penal.