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Resumo:
O presente artigo tem como intuito abordar os principais aspectos da segregação sócio-espacial, bem como sua influência em nossa sociedade e os principais fatores geradores.
Texto enviado ao JurisWay em 12/05/2014.
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A origem do processo de segregação difere em relação a sua natureza, que pode ser atribuída ao Estado ou ao mercado. Segundo Romero:
“Numa visão institucional, a segregação é vista como um processo de diferenciação espacial institucionalizada e legitimada por ordens legais que conformam à produção do espaço urbano e regulam/regulamentam a dinâmica urbana. A ideia de novos padrões de segregação pressupõe a sobrevalorização da dimensão institucional na constituição de novos formatos de habitação e moradia privilegiados pelas reformas nas legislações urbanas de âmbito federal e municipal[...]”[1]
Na visão do mercado é entendida como a expressão espacial dos diferenciais de renda no acesso ao solo urbano e aos seus serviços, orientadas pelo mercado imobiliário/fundiário e onde os mecanismos institucionais parecem estar em acordo ou subjugados à própria lógica do mercado. Ambos entendimentos nos conduzem a uma lógica de funcionamento do mercado imobiliário, das decisões locacionais das classes sociais e do papel do Estado sobre a relação, desigual, entre oferta e demanda.
Encontraram-se derivações do processo de segregação sócio espacial urbana que vem a ser a auto-segregação e a segregação imposta, que nas palavras da mesma autora:
“De uma maneira geral, a noção de auto-segregação refere-se às ações de certos grupos sociais caracterizados pelo elevado poder de compra e de mobilidade residencial, elites que se isolam ou se concentram em determinadas áreas como forma de reprodução de seu poder político e social. Com relação a noção de segregação imposta ,a lógica se inverte, pois na relação entre oferta e demanda, atores como o Estado determinam a localização e os processos de mobilidade residencial e espacial de ampla maioria da população regida pela soberania da oferta à demanda.”[2]
Segregação pode ser entendida como um fenômeno eminentemente urbano, de características que se relacionam à sobreposição de condições de vida inadequadas, na escala geográfica e na social, visualizadas por meio dos mecanismos de acesso à moradia, bem como aos serviços e equipamentos urbanos, essencialmente determinadas pelas particularidades de cada cidade e de suas idiossincrasias locais determinantes dos formatos de apropriação do espaço urbano.
Conforme afirma Irene Molina, a problemática da segregação habitacional mostra que:
[...]” Os seres humanos, semelhantes aos animais, tenderiam a competir pelo domínio do território intentando ocupar as áreas mais atrativas da cidade, assim como, no caso da vida urbana, significaria que os indivíduos mais fortes estariam capacitados para instalar-se nos melhores setores, enquanto os menos capacitados seriam relegados ao resto do espaço urbano.”[...][3]
A autora afirma que as estratégias de classe social e política visam à segregação. Segundo a mesma autora, as classes operárias seriam vítimas da segregação, expulsas da cidade tradicional e privadas da vida urbana atual ou possível, isto é, habitariam na cidade sem ter direito a ela.
De acordo com David Harvey, surge na década de 1950 uma nova corrente de estudos que buscava compreender de forma mais ampla a questão da segregação habitacional:
[...] "a explicação da segregação residencial urbana deve ser buscada nos mecanismos de distribuição desigual inerentes ao sistema capitalista de produção, que representam a causa e o efeito; devemos dizer que os padrões de diferenciação são a causa de uma distribuição desigual dos recursos da sociedade, ao mesmo tempo que estes padrões contribuem para o manutenção e reprodução das desigualdades sociais."[4]
Caldeira[5] afirma que as regras de organização do espaço urbano são basicamente padrões de diferenciação social e de segregação. O referido autor afirma que ao longo do século XX a segregação sócio-espacial apresentou pelo menos três diferentes formas descritas a seguir.
A primeira, até a década de 1940, caracterizava-se pela aglomeração de diferentes grupos sociais em uma área urbana pequena e esses grupos se diferenciavam conforme o tipo de moradia. No início do século, as construções não seguiam um padrão de separação espacial e de funções dentro da cidade. Nessa época, podia-se observar indústrias, comércios e residências urbanas das elites e de trabalhadores, convivendo num mesmo espaço. A diferenciação se dava por meio do tipo de residência que cada classe possuía.
A segunda forma de segregação perdurou até a década de 1980 e acompanhou uma grande expansão da área da cidade. Caracterizou-se por uma grande diferenciação entre o centro e a periferia.
As classes sociais possuidoras de rendas mais altas, concentravam-se em bairros centrais, bem servidos em infraestruturas e serviços públicos, enquanto as classes mais pobres eram deslocadas para os locais afastados do centro, locais onde os investimentos realizados pelo poder público ainda eram precários, e, portanto, com moradias mais acessíveis às camadas mais baixas da sociedade.
As áreas melhor equipadas da cidade eram as mais valorizadas, apresentando uma grande procura em detrimento de uma pequena oferta, elevando, assim, o valor de tais produtos. Com o crescimento da população a necessidade por espaço cresceu e a intenção de morar em áreas melhor equipadas, centrais, tornou-se objeto de desejo de todos. Tais produtos, porém, só estavam disponíveis para aqueles que almejavam e podiam adquiri-los.
Na análise de Milton Santos[6], a chegada de melhorias em uma área termina por elevar seu valor econômico o que, por sua vez, eleva o valor das taxas e impostos. Assim, tais áreas tornam-se inviáveis à população de baixo poder aquisitivo que se desloca para locais mais distantes do centro.
Para que essa expansão em direção às periferias fosse viabilizada, várias medidas foram implementadas entre elas, desenvolvimento do transporte urbano, planos de reformas urbanas como alargamento e aumento das avenidas e de vias de circulação rápidas.
Segundo Milton Santos[7], nas cidades existem cidadãos dos mais variados níveis socioeconômicos, os que por abundância de recursos podem utilizar toda a cidade e os que pela falta desses mesmos recursos a utilizam parcialmente.
A segregação dos pobres nas periferias desprovidas de infraestruturas e serviços sociais faz com que os mesmos sejam privados do direito à cidade, tendo sua cidadania diminuída.
A terceira forma de segregação, iniciada em meados de 1980, levou ao surgimento de cidades mais diversificadas, podendo conviver em um mesmo espaço ricos e pobres, mas mantidos sinais nítidos de segregação que são os muros, as cercas e todos os aparatos tecnológicos necessários para delimitar as fronteiras das modernas “ilhas utópicas degeneradas”, representadas pelos condomínios fechados.
Verifica-se, assim, que tal padrão de segregação atua de forma a criar dentro de espaços urbanos heterogêneos, pequenos focos homogêneos fortemente delimitados, em nome da privacidade e da segurança. Trata-se, também, de uma tentativa utópica, mas degenerada, de não coexistir com os problemas existentes na sociedade atual tais como: insegurança, necessidade de privacidade e exclusividade social (status), por exemplo. Ao tentar privatizar praças, ruas, calçadas, etc., as áreas públicas tradicionais dos espaços urbanos ficam destinadas aos pobres e aos excluídos.
Tais atitudes, conforme afirma Teresa Caldeira[8], levariam à fragmentação das cidades, nas quais seria muito difícil prevalecer os princípios básicos de livre circulação e abertura dos espaços públicos à utilização de todos.
Comparando-se o padrão de segregação centro-periferia com o padrão de segregação por muros, observa-se que o primeiro é muito mais excludente, causando marcas profundas de abandono a uma camada extensa da sociedade. A segregação por muros nos condomínios fechados, segundo Beatriz Favaretto[9], representa um novo padrão de segregação:
[...]“os “condomínios fechados” representam um novo tipo de segregação sócio-espacial que difere tanto do modelo induzido pelo Estado ou pelo setor industrial, através da construção de conjuntos habitacionais, quanto da segregação da pobreza, intensificada nas ultimas décadas entre uma crescente população de excluídos do meio urbano. Este novo processo é a auto-segregação das classes médias e elites sociais, detentoras de recursos para pagar pela privatização de grandes áreas altamente valorizadas e pelo distanciamento ou isolamento dos problemas urbanos : violência, degradação ambiental, miséria, lixo, poluição visual, congestionamento, confusão social, etc”[...]
Esse padrão de segregação tem criado profundas transformações no espaço urbano, tornando-o cada vez mais violento.
[1]ROMERO, Marta; GUIA, George; ANDRADE, Liza; SILVEIRA, Ana; Indicadores de sustentabilidade dos espaços públicos urbanos : aspectos metodológicos e atributos das estruturas urbanas, pág. 11. XI Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional. Salvador, 2005. Disponível em :
[2]ROMERO, Marta; GUIA, George; ANDRADE, Liza; SILVEIRA, Ana. Op. Cit., pág. 12.
[3]MOLINA, Irene . Segregacion Habitacional Étnica em La Ciudad Sueca. Um Processo de Racionalizacion. Scripta Nova – Revista Eletrônica de Geografia y Ciências Sociales. Univercidade de barcelona. Vol II , nº 146 (90), 1 de junio de 2001.ISSN: 1138-9788. Disponível em : < http:∕ ∕www.ub.es. :∕ geocrit :∕ sn :∕ sn-146.htm>. Acesso 15 de Set. 2013.
[4]HARVEY, David. Condição Pós-Moderna. Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. Tradução de Adail Ubirajara Sobral e Maria Stela Gonçalves. 3ª ed. São Paulo : Loyola,1993.p.349.
[5]CALDEIRA, Teresa Pires do Rio. “Enclaves Fortificados: A nova segregação urbana”. São Paulo: Estudos Sebrap.1997.
[6] SANTOS, Milton. Metrópole corporativa e fragmentada: o caso de São Paulo. São Paulo : Studio Nobel. 1990.
[7] Idem. A Natureza do Espaço. São Paulo: EDUSP. 2002.
[8]CALDEIRA, Teresa Pires do Rio. Op. Cit. p. 15.
[9]FAVARETTO, Beatriz Secorum. O Uso Privado do Espaço Público e a Nova Segregação Urbana. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Geografia). IGDG, UNICAMP, 2003, pág. 23.
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