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Resumo:
O presente trabalho pretende discutir as questões em volta da aceitação ou não das provas ilícitas no Processo Penal.
Texto enviado ao JurisWay em 10/07/2013.
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PROVA ILÍCITA
A Constituição Federal vigente tacitamente inadmite, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
Entendo-se que a prova está presente no processo para convencer o juiz do que se está alegando, há uma sensata justificativa em não se admitir que provas obtidas de maneira viciosa sirvam de objeto de consideração para busca da verdade.
Partindo para a perspectiva do processual penal, com o advento da Lei 11.60/2008, o art. 157, CPP, a ter a seguinte redação:
“Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
1º São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
2º Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.
3º Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.”
Entenda-se que esta reforma foi necessária por vários motivos. Primeiro, tem que se relevar a verdade processual, também chamada de material, que não necessariamente inclui a aceitação de toda e qualquer prova, exigindo-se para comprovação da verdade o que realmente aconteceu, ou seja, a narração verdadeira dos fatos.
Outro ponto a ser destacado é que o princípio que designa a liberdade das provas não é absoluto, sendo refutável pela supracitada situação de uma prova obtida por meio ilícito. Há limites para que se possa expressar sua versão dos fatos, e esses limites ficam submissos as licitudes das provas.
Para delimitar o que seriam provas ilícitas, o supracitado artigo foi modificado para que se conceba a idéia de que estas seriam aquelas obtidas de maneira que venha a violar as normas constitucionais ou legais, violando assim o direito material, constitucional ou legal.
Importante frisar que no nosso ordenamento jurídico considera as provas ilícitas inadmissíveis e não nulas, ou seja, é uma desconsideração total. Sendo inadmissível ela não pode estar presente no processo, se fosse apenas nula, poderia estar, e seria, ao longo do mesmo, descartada.
Doutrina Carnelutti que provar indica uma atividade do espírito dirigida à verificação de um juízo. Cor responde à cogitação do convencimento de outrem acerca da verdade referente a determinado fato.
No pensamento praticamente unânime da doutrina atual, não se deve reduzir o conceito de ação, mesmo em perspectiva abstrata, a simples possibilidade de instaurar um processo. Seu conteúdo é mais amplo. Abarca série extensa de faculdades cujo exercício se considera necessário, em princípio, para garantir a correta e eficaz prestação da jurisdição. Dentre tais faculdades sobressai o chamado direito à prova. Sem embargo da forte tendência, no processo contemporâneo, ao incremento dos poderes do juiz na investigação da verdade, inegavelmente subsiste a necessidade de assegurar aos litigantes a iniciativa – que, em regra, costuma predominar – no que tange à busca e apresentação de elementos capazes de contribuir para a formação do convencimento do órgão judicial. (MOREIRA, 1996).
É importante notar que o entendimento constitucional foi criado em 1988, logo após o fim do regime autoritário no Brasil, período este marcado pelo desrespeito as liberdades individuais.
Talvez a delimitação de só se aceitar no processo provas originariamente lícitas, tenha vindo deste novo entendimento (livre!), de que também as garantias individuais deveriam se colocar como importantes.
Analisemos como decide o STJ e o STF acerca do tema:
“PROCESSUAL – GRAVAÇÃO DE CONVERSA AUTORIZADA POR UM
DOS INTERLOCUTORES – CONTROVÉRSIA.
1. A jurisprudência desta Corte tem firmado o entendimento de que a gravação de conversa por um dos interlocutores não configura interceptação telefônica, sendo lícita como prova no processo penal. 2. Para se verificar se houve a efetiva autorização ou não por parte do ora paciente, necessária seria a realização de dilação probatória, o que não se admite nesta via constitucional.
3. Não conheço do Habeas Corpus. (STJ – HC 14336 – RJ – 5ª T. – Rel. Min. Edson Vidigal – DJU 18.12.2000 – p. 00224)”
“PROVA – Licitude. Gravação de telefonema por interlocutor. É lícita a gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, ou com sua autorização, sem ciência do outro, quando há investida criminosa deste último. É inconsistente e fere o senso comum falar-se em violação do direito à privacidade quando interlocutor grava diálogo com seqüestradores, estelionatários ou qualquer tipo de chantagista. (STF – HC 75.338-8 – RJ – TP – Rel. Min. Nelson Jobim – DJU 25.09.1998)”
“Prova Ilícita: Inadmissibilidade - RE 251.445-GO* RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: PROVA ILÍCITA. MATERIAL FOTOGRÁFICO QUE COMPROVARIA A PRÁTICA DELITUOSA (LEI Nº 8.069/90, ART. 241). FOTOS QUE FORAM FURTADAS DO CONSULTÓRIO PROFISSIONAL DO RÉU E QUE, ENTREGUES À POLÍCIA PELO AUTOR DO FURTO, FORAM UTILIZADAS CONTRA O ACUSADO, PARA INCRIMINÁ-LO. INADMISSIBILIDADE (CF, ART. 5º, LVI). - A cláusula constitucional do due process of law encontra, no dogma da inadmissibilidade processual das provas ilícitas, uma de suas mais expressivas projeções concretizadoras, pois o réu tem o direito de não ser denunciado, de não ser processado e de não ser condenado com apoio em elementos probatórios obtidos ou produzidos de forma incompatível com os limites ético-jurídicos que restringem a atuação do Estado em sede de persecução penal. - A prova ilícita - por qualificar-se como elemento inidôneo de informação - é repelida pelo ordenamento constitucional, apresentando-se destituída de qualquer grau de eficácia jurídica. - Qualifica-se como prova ilícita o material fotográfico, que, embora alegadamente comprobatório de prática delituosa, foi furtado do interior de um cofre existente em consultório odontológico pertencente ao réu, vindo a ser utilizado pelo Ministério Público, contra o acusado, em sede de persecução penal, depois que o próprio autor do furto entregou à Polícia as fotos incriminadoras que havia subtraído. No contexto do regime constitucional brasileiro, no qual prevalece a inadmissibilidade processual das provas ilícitas, impõe-se repelir, por juridicamente ineficazes, quaisquer elementos de informação, sempre que a obtenção e/ou a produção dos dados probatórios resultarem de transgressão, pelo Poder Público, do ordenamento positivo, notadamente naquelas situações em que a ofensa atingir garantias e prerrogativas asseguradas pela Carta Política (RTJ 163/682 - RTJ 163/709), mesmo que se cuide de hipótese configuradora de ilicitude por derivação (RTJ 155/508), ou, ainda que não se revele imputável aos agentes estatais o gesto de desrespeito ao sistema normativo, vier ele a ser concretizado por ato de mero particular. Doutrina.
Descobrir a verdade dos fatos ocorridos é o escopo de toda investigação, mas isso não pode ser feito a qualquer custo. Nem o Estado nem o particular podem conquistar uma prova violando regras de direito constitucional ou legal.
Nosso CPP, no art. 157, mencionou regras constitucionais e legais. . Ocorre que paralelamente às normas constitucionais e legais existem também as normas internacionais (previstas em tratados de direitos humanos). Por exemplo: Convenção Americana sobre Direitos Humanos. No seu art. 8º ela cuida de uma série (enorme) de garantias. Todas essas regras fazer parte (também) do nosso devido processo legal. Provas obtidas (fora do momento processual) com violação a essas garantias são provas que colidem com o devido processo legal. Logo, são obtidas (também) de forma ilícita.
Não importa, como se vê, se a norma violada é constitucional ou internacional ou legal: caso venha a prova a ser obtida com violação a qualquer uma dessas normas, não há como deixar de reconhecer sua ilicitude (que conduz, automaticamente, ao sistema da inadmissibilidade). Exemplo: prova obtida (fora do processo) com violação ao direito de não autoincriminação (que está previsto no art. 8º da CADH) é prova ilícita. Ninguém é obrigado a participar da reprodução simulada do evento delituoso, ninguém é obrigado a fornecer padrões gráficos ou padrões vocais, para efeito de perícia criminal (STF, HC 96.219-MC-SP, rel. Min. Celso de Mello).”
No HC 92.219-SP o Min. Celso de Mello su (ora comentado) blinhou que "A garantia constitucional do silêncio encerra que ninguém está compelido a auto-incriminar-se. Não há como decretar a preventiva com base em postura do acusado reveladora de não estar disposto a colaborar com as investigações e com a instrução processual. ."(...) (HC 83.943/MG , Rel. Min. MARÇO AURÉLIO - grifei)". Quem exercita um direito não pode ser punido (ou prejudicado) por tê-lo exercido.
"Em virtude do princípio constitucional que protege qualquer pessoa contra a auto-incriminação, ninguém pode ser constrangido a produzir provas contra si próprio (RTJ 141/512, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RTJ 180/1125, Rel. Min. MARÇO AURÉLIO - HC 68.742/DF , Rel. p/ o acórdão Min. ILMAR GALVAO, v.g.), tanto quanto o Estado, em decorrência desse mesmo postulado, não tem o direito de tratar suspeitos, indiciados ou réus como se culpados (já) fossem (RTJ 176/805-806, Rel. Min. CELSO DE MELLO).”
HABEAS CORPUS. CRIME QUALI FICADO DE EX PLORAÇÃO DE PRESTÍGIO (CP, ART I GO357, PÁR. ÚNI CO). CONJUNTO PROBATÓRIO FUNDADO, EX CLUSI VAMENT E, DE I NT ERCEPT AÇÃO T ELEFONI CA, POR ORDEM JUDI CI AL, PORÉM, PARA APURAR OUT ROS FAT OS (T RÁFI CO DE ENT ORPECENT ES): VI OLAÇAO DO ART I GO 5º, X I I , DA CONST I T UI ÇÃO.
1. O art. 5º, X II, da Constituição, que prevê, excepcionalmente, a violação do sigilo das comunicações telefônicas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal não é auto-aplicável: exige lei que estabeleça as hipóteses e a forma que permitam a autorização judicial. Precedentes.
a) Enquanto a referida lei não for editada pelo Congresso Nacional, é considerada prova ilícita a obtida mediante quebra do sigilo das comunicações telefônicas, mesmo quando haja ordem judicial (CF, artigo5º, LVI ).
b) O artigo 57, II, a, do Código Brasileiro de Telecomunicações não foi recepcionado pela atual Constituição (artigo5º, XII), a qual exige numerus clausus para a definição das hipóteses e formas pelas quais é legítima a violação do sigilo das comunicações telefônicas.
2. A garantia que a Constituição dá, até que a lei o defina, não distingue o telefone público do particular, ainda que instalado em interior de presídio, pois o bem jurídico protegido é a privacidade das pessoas, prerrogativa dogmática de todos os cidadãos.
3. As provas obtidas por meios ilícitos contaminam as que são exclusivamente delas decorrentes; tornam-se inadmissíveis no processo e não podem ensejar a investigação criminal e, com mais razão, a denúncia, a instrução e o julgamento (CF, art. 5º, LVI ), ainda que tenha restado sobejamente comprovado, por meio delas, que o Juiz foi v í t ima das contumélias do paciente. 4. Inexistência, nos autos do processo crime, de prova autônoma e não decorrente de prova ilícita, que permita o prosseguimento do processo. (HC nº 72588/ PB, ST F, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, D. J. 04. 08. 00, provido, por maioria).
Constitucional e Processual Penal. "Habeas Corpus". Escuta Telefônica com ordem judicial. Réu condenado por formação de quadrilha armada, que se acha cumprindo pena em penitenciária, não t em como invocar direitos fundamentais próprios do homem livre para trancar ação penal (corrupção ativa) ou destruir gravação feita pela polícia. O inciso LVI do artigo 5º da Constituição, que f ala que ‘são inadmissíveis. . . as provas obtidas por meio ilícito’, não t em conotação absoluta. Há sempre um substrato ético a orientar o exegeta na busca de valores maiores na construção da sociedade. A própria Constituição Federal Brasileira, que é dirigente e programática, oferece ao juiz, através da ‘atualização constitucional’
(VERFASSUNGSAKT UALI SI ERUNG), base para o entendimento de que a cláusula constitucional invocada é relativa. A jurisprudência norte-americana, mencionada em precedente do Supremo Tribunal Federal, não é tranqüila. Sempre é invocável o princípio da ‘razoabilidade’ (REASONABLENESS). O ‘princípio da exclusão das provas ilicitamente obtidas’ (EX CLUSI ONARY RULE) também lá pede temperamentos. (HC nº 3982/RJ, ST J, 6ª T . , Rel. Min. Adhemar Maciel, D. J. 26. 02. 96, denegada a ordem, por unanimidade)
Nota-se que no nosso ordenamento jurídico, os magistrados inadmitem as provas ilícitas no processo, influenciados pela “Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada”. Entende-se, portanto, que as provas oriundas de meios ilícitos “contaminariam” o processo, tornando-o tão vicioso quanto a fonte daquelas. É bem simples o raciocínio: a prova ilícita tornará também ilícita todos os elementos dela oriundos.
Importante salientar: não se deve olvidar que a jurisprudência de nossos tribunais, nos casos supracitados, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, tem que a prova ilícita não gerará, necessariamente, a nulidade dos autos processuais. Há do que se falar em casos onde, eliminando as provas dotadas de ilicitude, obviamente, dentro da possibilidade processual penal, poderia se falar em uma “correção”, e não nulidade dos atos daquelas, originários.
CONCLUSÃO
Entende-se coerente a não admissibilidade da prova ilícita com dentro do processo. Não se deve viciar o processo já em sua fonte, com a utilização de provas oriundas de meios não confiáveis e, claramente, inconstitucionais.
“A Constituição Federal de 1988 prevê a existência de três poderes, harmônicos e independentes entre si, sendo um deles o Judiciário. Este possui como atribuição a intervenção, quando requerida, resolvendo a lide mediante uma decisão, no intento de assegurar a paz social.Para que aludido Poder alcance satisfatoriamente seu objetivo, garantindo uma sentença justa e correta para os cidadãos, é necessária a observância de certas regras pelo magistrado.” (PETRY, 2003)
REFERÊNCIAS
INTRA, Antonio Carlos de Araújo; Et al. Teoria Geral do Processo. 18. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002.
CRETELLA JÚN I OR, José. Comentários A Constituição Brasileira de 1988. São Paulo: Forense Universitária, 1989
GRINOVER, Ada Pellegrini, Antonio Scarance Fernandes e Antonio Magalhães Gomes Filho - As Nulidades no Processo Penal, Editora Revista dos Tribunais, 6ª edição.
GRECO FILHO, Vicente - Manual de Processo Penal, Editora Saraiva, 4ª edição.
NERY JR, Nelson - Proibição da prova ilícita, 4ª edição, São Paulo,
1997.
PEDROSO, Fernando de Almeida - Prova penal, Rio de Janeiro, AIDE, 1994, p. 163, e Processo penal: O direito de defesa: Repercussão, amplitude e limites, Rio de Janeiro, Forense, 1986
PETRY, Vinícius Daniel. A prova ilícita. Jus Navigandi, Teresina, ano 8 (/ revista/ edições/ 2003), n. 146 (/ revista/ edições/ 2003/ 11/ 29), 29 (/ revista/ edições/ 2003/ 11/ 29) nov . (/ revista/ edições/ 2003/ 11) 2003 (/ revista/ edições/ 2003). Disponível em:
THEODORO JÚNIOR, Humberto - A Gravação de conversa telefônica como meio de prova, www.oab-mg.org,br
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