Respostas Pesquisadas sobre Direito do Trabalho

Quais são os fatores que contribuem para o reconhecimento do vínculo empregatício dos pastores das Igrejas evangélicas?

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Denner Santana

O trecho abaixo, indicado como resposta, faz parte do seguinte conteúdo:

A POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO ENTRE PASTORES E IGREJAS EVANGÉLICAS
Autor: Gisele Gonçalves do Carmo
Área: Direito do Trabalho
Última alteração: 22/06/2016
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Com aumento das Igrejas evangélicas, as questões jurídicas sobre o reconhecimento do vínculo empregatício do Pastor com a Igreja têm recebido atenção da sociedade, da imprensa e até do Congresso Nacional.

A Revista Veja na publicação de 09 de junho de 1999 noticiou que pastores evangélicos criaram sindicato dos ministros de cultos religiosos evangélicos e trabalhadores assemelhados. A criação deste sindicato ocorreu em São Paulo e gerou significativas controvérsias na comunidade eclesiásticas.

Relata Mauricio Godinho Delgado (2004, p. 344), que o pagamento que descaracteriza a graciosidade será aquele que, por sua natureza, sua essência, tenha caráter basicamente contraprestativo.

A partir de tal apontamento surge a relação de empregado e empregador, que são figuras simetricamente opostas de uma relação jurídica do contrato de Trabalho. Portanto se caracterizam de acordo com as mesmas exigências da relação estabelecida, apenas com inversão dos polos que ocupam. Assim as ideias fundamentais de pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade estão presentes na noção do que é empregador e empregado.

Importante mencionar que algumas Igrejas como, por exemplo, a Igreja Batista adota o Fundo de Garantia por Tempo de Ministério - FGTM, o valor recebido pelo pastor é integrado a sua base de cálculo para previdência social e, é ele que tem a obrigação de declarar e pagar o valor de forma correta a própria Previdência Social.

Portanto verifica-se que o Fundo de Garantia por Tempo de Ministério - FGTM é uma espécie de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. Diante disso fica demonstrada a equiparação do direito do pastor aos celetistas.

Quanto ao critério da pessoa física, está inquestionavelmente presente, posto que o pastor é pessoa física devidamente inscrita sob o Cadastro de Pessoa Física (CPF); tal requisito está ligado a pessoalidade. Os pastores são conhecidos por seus fiéis por seu nome e sobrenome, em alguns casos por um aposto qualitativo que remete à sua "especialidade" de pregação da palavra de Deus, ou seja, os fiéis vão ao culto por desejarem estar na presença daquele determinado pregador. Aos pastores das Igrejas é confiada uma missão, uma função pessoal que só pode ser realizada por outros pastores com o consentimento da Igreja e de forma eventual.

O requisito da não eventualidade, por ser temporal, está configurado através da comprovação de quantas celebrações ocorrem por mês, semana e dia, inclusive horários realizados pelo pastor. Enfim, a prestação de serviços do pastor é de natureza contínua, permanente, não esporádica e pontual, ainda que o trabalho seja ajustado por tempo determinado.

A subordinação está presente na relação, em razão da hierarquia existente dentro da Igreja, é visível, em particular dos evangélicos, decorre de um processo de inserção mercadológica, o qual transforma a fé em produto a ser adquiridos e convertidos em templos religiosos. Assim, nesta competição por nichos de mercado, nada mais natural que tais Igrejas apresentem uma organização interna empresarial, exigindo de seus pastores lucro e produtividade, ou seja, as Igrejas buscam gerar riquezas e se beneficiam dos ganhos obtidos junto aos fiéis.

Portanto, existe algum grau de subordinação interna dos pastores para com as Igrejas, tanto é que a submissão está ligada àqueles religiosos superiores, ou seja, deve obediência aos horários dos cultos. Pode-se salientar que pastores não desempenham seus ofícios de forma autônoma, pois tem vigilância permanente do pastor-chefe, eles devem seguir regras, caso contrário pode sofrer sanções, podendo até ser proibido de realizar cultos, diante disso a subordinação não é de caráter puramente eclesiástico.

Sobre a onerosidade, há o pagamento de remuneração como salário pastoral, ajuda de custo e similares, é ajustada no momento da contratação/ordenação do pastor e se destina a cobrir as despesas com o sustento dele e de sua família, tendo, portanto, a mesma natureza de salário, conceituado este, no artigo 457 da CLT, e artigo 7º, IV da CR/88. Enfim é uma contraprestação pecuniária por seu esforço despendido em favor da Igreja, na verdade é de natureza puramente remuneratória.

É oportuno mencionar que é apenas alegada a gratuidade pelos doutrinadores nessa modalidade de prestação laboral, vez que a onerosidade é real e está presente, de forma expressa, na maioria dos estatutos das Igrejas.

Sendo assim, o pagamento descaracteriza a gratuidade e passa a ter caráter puramente contraprestativo. Para tanto, o vínculo que une o pastor à sua Igreja não é de natureza religiosa e vocacional, pois há valores financeiros ligando a relação.

Verifica-se, que a relação entre Pastor e Igreja ultrapassou os liames espirituais e adentrou ao mundo jurídico, tendo restado e demonstrado na subordinação existente e a onerosidade.

Apesar da caracterização do vínculo empregatício os tribunais ainda vêm entendendo majoritariamente a postura de que a relação existente entre pastores e Igrejas, seria de natureza puramente espiritual e voluntaria, ou seja, inexistência de vínculo empregatício.



PASTOR EVANGÉLICO.VÍNCULO EMPREGATÍCIO. INEXISTÊNCIA. A relação de emprego deriva da conjugação de certos elementos fático- jurídicos, verdadeiros pressupostos para a caracterização do vínculo empregatício. São eles: trabalho não eventual, prestado por pessoa física, de forma pessoal, sob subordinação e onerosidade. No caso, todavia, o reclamante admitiu que o exercício das funções de pastor da Igreja Mundial do Poder de Deus decorreu de sua convicção religiosa, não se tratando de uma profissão, mas de uma missão. Ademais, emerge da prova testemunhal a inexistência de subordinação jurídica na relação e, embora recebesse remuneração para tal mister, esta não detinha cunho salarial. 2. Recurso conhecido e desprovido. (TRT-10 - RO: 1871201280210006 DF 01871-2012-802-10-00-6 RO, Relator: Desembargador Brasilino Santos Ramos , Data de Julgamento: 05/12/2012, 2ª Turma, Data de Publicação: 25/01/2013 no DEJT).



Apesar do entendimento jurisprudencial majoritário no sentido de não haver a existência do vínculo, têm casos isolados que reconhecem os pastores como empregados das Igrejas. Não obriga, mas influencia outros juízes. Se ficar comprovado um caráter oneroso na relação, isso retira o caráter voluntário da atividade, caracterizando a relação de emprego.

Para tanto, verifica-se que diante do foi apresentado no parágrafo anterior a necessidade de averiguar com precisão a atividade pastor, porque o desvirtuamento das funções básicas da Igreja no âmbito do exercício voluntário pode constituir um vínculo de emprego do ministro religioso. Nota-se uma maior necessidade de evolução jurídica no Direito do Trabalho a fim de validar a efetividade da justiça no caso descrito da decisão abaixo citada:



TRABALHO RELIGIOSO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PARA IGREJA - RELAÇÃO DE EMPREGO CARACTERIZADA - AFASTAMENTO DA CONDIÇÃO DE PASTOR - SUBORDINAÇÃO, EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE METAS E SALÁRIO - LIVRE CONVENCIMENTO DO JUÍZO - ART. 131 DO CPC - REEXAME DE FATOS E PROVAS VEDADO PELA SÚMULA 126 DO TST.

1. A Lei 9.608/98 contemplou o denominado "trabalho voluntário", entre os quais pode ser enquadrado o trabalho religioso, que é prestado sem a busca de remuneração,em função de uma dedicação abnegada em prol de uma comunidade, que muitas vezes nem sequer teria condições de retribuir economicamente esse serviço, precisamente pelas finalidades não lucrativas que possui.

2. No entanto, na hipótese, o Regional, após a análise dos depoimentos pessoais, do preposto e das testemunhas obreiras e patronais, manteve o reconhecimento de vínculo empregatício entre o Autor e a Igreja Universal do Reino de Deus, pois concluiu que o Obreiro não era simplesmente um pastor, encarregado de pregar, mas um prestador de serviços à Igreja, com subordinação e metas de arrecadação de donativos a serem cumpridas, mediante pagamento de salário.

3. Assim, verifica-se que a Corte "a quo" apreciou livremente a prova inserta nos autos, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, e indicou os motivos que lhe formaram o convencimento, na forma preconizada no art. 131 do CPC.

4. Nesses termos, tendo a decisão regional sido proferida em harmonia com as provas produzidas, tanto pelo Autor, quanto pela Reclamada, decidir em sentido contrário implicaria o reexame dos fatos e provas, providência que, no entanto, é inadmissível nesta Instância Extraordinária, a teor da Súmula 126 do TST.

(TST - RR: Processo nº 19800-83.2008.5.01.0065, Ministro Relator: Ives Gandra Martins Filho, 7ª Turma, Data de Publicação: 08/02/2012).



A decisão proferida acima afastou a relação de caráter voluntário do serviço prestado pelo pastor. Neste caso houve ultrapassagem dos requisitos do voluntariado e passou a ter relação jurídica de trabalho.

Os requisitos devidamente preenchidos pelo pastor caracterizam visivelmente os fatores da onerosidade, habitualidade, subordinação e a existência de produção, vinculando relação de trabalho.

De fato, pode concluir que a submissão do autor às determinações da Igreja não decorria pura e simplesmente de sua fé, mas sim em razão da subordinação jurídica existente no liame contratual, ponderou o relator. Ao assumir a função de pastor, o reclamante ficou responsável por respeitar e propagar a doutrina da Igreja. No entanto, isso não significa que não existisse subordinação, porque, além de pregar a fé, o autor tinha que cumprir e observar as ordens originadas da reclamada. Para o relator convocado, todos os requisitos da relação de emprego estão presentes no caso, a Igreja não conseguiu comprovar a relação que existiu entre as partes eram de natureza religiosa.

Apesar de ter havido grandes transformações evolutivas no aspecto social, o poder judiciário no geral, infelizmente, lida com o fato material e não com o fato real e ainda não se posicionou, na maioria dos casos, de forma relacionada com a realidade, devido as poucas provas trazidas aos autos, sob sua jurisdição, enfim, não foi criado mecanismos que pudessem evitar a exploração do trabalho, sobretudo, da pessoa humana, por parte das Igrejas, que acabam sendo empresas da fé que visam lucros, pois estabelecem metas para os pastores atingirem.

A possibilidade de ser reconhecido o pastor como empregado da Igreja deixa claro que se trata de trabalho como outro qualquer e a vocação do religioso desvirtuada da sua natureza voluntária, ante à presença dos pressupostos caracterizadores do direito do trabalho.

Assim, vê-se que o reconhecimento de vínculo empregatício entre pastores e Igrejas Evangélicas é possível, entretanto, para a confirmação da existência da referida relação, necessário se faz a análise de cada caso, a fim de se verificar a existência concomitante dos requisitos caracterizadores daquele.



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