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Reincidência Criminal


Autoria:

Jose Vital Brigido Nunes Junior


Advogado, formado pela Universidade de Fortaleza no curso de Direito, especialista em Processo Civil Individual e Coletivo.

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Resumo:

Perspectivas doutrinárias sobre a reincidência criminal

Texto enviado ao JurisWay em 03/05/2012.



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1. Da Individualização Judicial da Pena

A doutrina apresenta três momentos em que se torna necessária a individualização da pena: a

individualização legislativa, a judicial e a executória. Pela primeira, deverá o legislador observar critérios
sociais, políticos, ideológicos, quando do processo de produção da norma. Na fase de execução da pena,
caberá ao magistrado a fiscalização dos excessos e desvios porventura existentes, de modo a garantir
ao condenado o cumprimento da exata sanção aplicada na sentença. Finalmente, há a aplicação judicial
do princípio, que, diante da especificidade desse estudo, será explanada de forma pormenorizada à luz
da Constituição Brasileira.

Realizada pelo magistrado, consagra-se a individualização da pena à medida que delimita-se a atuação
do Estado em razão da quantidade e da forma da sanção a ser aplicada ao indivíduo que praticou a
conduta típica, antijurídica e culpável. É a exteriorização da segurança jurídica, limitada pelo princípio da
legalidade, haja vista ser:

O marco principal de todo o processo penal, onde se encontram entrelaçadas as garantias da análise
crítica das provas, obtidas com apoio nos direitos fundamentais, a valoração do bem jurídico protegido,
contido no tipo penal, e a finalidade de reprovação, ou censura da conduta, que causou o dano social
relevante .

Recepcionada pelo legislador no artigo 59 do Código Penal, e ainda consagrada no artigo 5º, inciso XLVI
da Constituição Federal, cada indivíduo tem o direito de ver na sanção que lhe foi imposta a medida de
sua culpabilidade2 , de sua responsabilidade pela prática delitiva. Dessa forma, pode-se afirmar que o
princípio da culpabilidade também se apresenta como um limitador do poder discricionário do
magistrado, que embora analise determinados requisitos, encontra-se vinculado aos limites da norma,
devendo prolatar sua decisão apresentando, para tanto, a motivação detalhada e específica sobre a
relação existente entre os pressupostos legais e o ato realizado pelo infrator (coibir arbitrariedades do
juiz).
Aplicar este princípio, materialmente, significa dizer que a sanção deverá corresponder às características
do fato, do agente e da vítima, considerando todas as circunstâncias do delito. Assim sendo, o
magistrado deverá observar circunstâncias de natureza subjetiva – culpabilidade, antecedentes, conduta
social e personalidade do agente – e de natureza objetiva – motivos, circunstâncias e conseqüências do
crime – para posteriormente fixar o inicial regime de cumprimento da pena, após esta ser determinada
em quantidade suficiente para a prevenção e reprovação do delito. Nesse sentido:
Na fixação da reprimenda o Magistrado deve atender e buscar o equilíbrio necessário entre o interesse
social e a expiação, sempre visando ao sentido binário da pena, verdadeira pedra de toque do direito
penal moderno: reinserção social e expiatório-aflitivo, afeiçoando-se ao princípio da humanidade da
pena, finalidades atribuídas pelo estatuto repressivo pátrio – TRF, 4ª Reg. – AC – Rel. Gilson Dipp –
RTJE 152/267.

Ao passo que os efeitos da reincidência criminal – considerada como agravante – deve ser de aplicação
obrigatória, a inovação pretendida pelo legislador ao considerá-la na individualização somente se
evidencia ao verificar o âmbito de atuação do magistrado na dosimetria da pena. Isto porque, as
circunstâncias elencadas para a fixação da pena base são de cunho facultativo, vale dizer, apóia-se na
valoração do magistrado diante da dose de discricionariedade a ele existente.
Nesse sentido, poderá o juiz não considerar a reincidência ao determinar a pena base, se assim permitir
a sua convicção. Logo, percebe-se que poderá vir a beneficiar a situação do sentenciado no caso
concreto, à medida que não mais terá aplicação obrigatória. Ora, seria esta a única implicação prática da
referida modificação, permanecendo os efeitos da reincidência em âmbito processual e executório.
2. Posicionamento da Doutrina acerca da Abolição do Instituto
Após a apresentação e análise crítica da reincidência, deve-se apontar qual a tendência que poderá ser
adotada pela moderna doutrina, a exemplo de outras jurisdições que após discussões optaram por
amenizar seus efeitos ou até mesmo, a extinguir do ordenamento.

Dentre as fundamentações existentes sobre a inadmissibilidade dos efeitos do instituto, numerou-se
anteriormente a ofensa a valores constitucionais, como a ofensa à coisa julgada e a dupla condenação
pelo mesmo tipo penal praticado – que se distancia do fim de ressocialização do sentenciado. Porém, é
preciso explanar, ainda, sobre outros fundamentos utilizados por alguns doutrinadores que defendem a
extinção da reincidência criminal.

Antes de adentrar ao fundamento legitimador desta orientação doutrinária, deve-se dispor sobre
periculosidade, culpabilidade e culpabilidade de autor, apresentando, ainda que de forma superficial,
suas definições.

O direito penal de culpabilidade é aquele que admite a possibilidade de censurar um sujeito (no sentido
de aplicar uma sanção), porque pressupõe que tem a liberdade de escolher, de se responsabilizar, de se
autodeterminar diante da vontade de praticar ou não o ilícito. A reprovabilidade que pelo fato se faz ao
autor é a culpabilidade, que se fundamenta na exigibilidade de uma conduta diversa diante daquela a
que optou por realizar.

De forma diferenciada, “quando se sustenta que o homem é um ser que somente se move por causas,
isto é, determinado, que não goza de capacidade de escolha”4 existe o direito penal de periculosidade.
Mirabete dispõe ser um “estado subjetivo, mais ou menos duradouro de anti-sociabilidade”5 . Ao passo
que a culpa é o fundamento e o limite para justificar a cominação e a aplicação da pena, a periculosidade é a premissa básica para a imposição da medida de segurança.

Diante dos princípios basilares do Estado Democrático de Direitos, a reprovação deve ter como base o fato penalmente relevante que foi praticado, respeitando os postulados da legalidade e igualdade, na medida em que todos os homens devem ser punidos pelas ações ilícitas que realizam.

Ocorre que, de forma diferenciada, existe a culpabilidade de autor, que é aquela que pondera o caráter, a conduta de vida, a personalidade do agente do fato quando da análise da medida a ser aplicável.
Decorre de um juízo moral feito sobre o acusado, o que implica na invasão de sua intimidade, incompatível com o direito penal mínimo e garantista que assegura a liberdade de atuação e expressão da individualidade, inserida no preceito do respeito a dignidade humana. Nesse sentido:

[...] é uma corrupção do direito penal, em que não se proíbe o ato em si, mas o ato como manifestação
de uma forma de ser do autor, esta sim considerada verdadeiramente delitiva. O ato teria valor de
sintoma de uma personalidade; o proibido e reprovável ou perigoso, seria a personalidade e não o ato.
Dentro dessa concepção, não se condena tanto o furto, como o “ser ladrão” [...].

No que se refere especificamente a reincidência, o entendimento majoritário adotado é de que o que
fundamenta sua previsão legal são os conceitos de periculosidade – entendida como a probabilidade de
voltar a delinqüir – e de culpabilidade de autor, haja vista a majoração que é feita porque o indivíduo já
cometeu outros delitos, os quais, em nada interferem àquele fato pelo qual está sendo sancionado.
De acordo com Gustavo L. Vitale, a periculosidade não deve ser adotada como causa de agravação da
pena, “porque ela violenta abertamente o princípio da culpabilidade pelo fato, e por isso, resulta
contrária aos princípios consagrados nas normas fundamentais”. Da mesma maneira, a culpabilidade
de autor foi afastada do ordenamento em virtude da adoção de princípios como o da culpabilidade e
reserva legal, sendo, portanto, inadmissível a existência da reincidência criminal por ser oposta à
filosofia adotada pela Constituição Democrática.

Ainda no que tange à culpabilidade, destaco a lição da juíza Maria Lúcia Karam:
Os argumentos que giram em torno do maior grau de culpabilidade, ou de uma maior decisão na
vontade do autor reincidente, contradizem as próprias finalidades, que seus defensores costumam
atribuir à pena: se, com o cumprimento de uma pena anterior, se reforçou a motivação contrária à
norma, o que se demonstra é que aquela pena foi contraproducente e criminalizante, o que torna um
paradoxo a insistência nesta mesma reação punitiva.

Inobstante os estudos acerca da inadmissibilidade da aplicação dos efeitos da reincidência, há setores da
doutrina que não só a rechaçam, como invertem sua existência para que possa beneficiar a situação do
réu, ao torná-la atenuante inominada, conforme ensina o elogiável penalista Eugênio Raúl Zaffaroni:
[...] não é possível que o Estado presuma possuir a conduta do autor um maior conteúdo de injusto, por
demonstrar um desprezo para com a autoridade estatal, com a prática de uma nova infração depois de
uma condenação, quando, anteriormente, foi esse mesmo Estado e o mesmo sistema penal que
atuaram de forma a condicionar a pessoa para isso.

Diante da interpretação do artigo 66 do Código Penal, pode-se considerar como atenuante da pena
“circunstância relevante não prevista expressamente em lei”. Essa determinação não taxativa, garante a
posição acima defendida, baseada na chamada teoria da “co-culpabilidade”. Poder-se-ia dizer que
algumas considerações do ramo da política criminal podem tornar-se circunstância relevante e atenuar a
sanção aplicada?

Com base nesta situação, tende a teoria supracitada a considerar como relevante questões de cunho
social, o desenvolvimento econômico, grau de instrução, enfim, a condição de sobrevivência oferecida
pela sociedade como importante fator a ser apreciado quando da aplicação da reprimenda. Zaffaroni
assim expõe:
[...] se a sociedade outorga, ou permite a alguns, gozar de espaços sociais dos quais outros não
dispõem ou são a estes negados, a reprovação de culpabilidade que se faz à pessoa a quem se tem
negado as possibilidades outorgadas a outras, deve ser em parte compensada, isto é, a sociedade deve
arcar com uma parte da reprovação, pois, não pode, creditar ao agente uma maior possibilidade de
motivar-se numa norma, cujo conhecimento não lhe possibilitou.11

Ainda que a proposta defendida por Zaffaroni não esteja entre as intenções do legislador, pode-se
verificar o indício da aceitação da moderna concepção de co-culpabilidade, uma vez que assim dispõe o
projeto de lei 3473/00:

[...] Quanto ao agente, ao lado da culpabilidade (mesmo considerando o seu sentido mais abrangente,
trazido pela Reforma de 1984) e dos antecedentes, determina que a reincidência deixe de ser
considerada circunstância agravante obrigatória (grifo nosso) e que, nos critérios relativos ao autor, a
personalidade, considerada de improvável aferição, e a conduta social, devem ceder lugar às condições
pessoais e oportunidades sociais a ele oferecidas [...]

Ora, considerar na fase de individualização da pena o quantum de reprimenda que poderá ser aplicada
ao sentenciado tomando por base questões sociais, vêm a realçar a posição da criminologia crítica que
analisa o indivíduo enquanto vítima do sistema penal marginalizador. Em sentido contrário a aplicação dos efeitos da co-culpabilidade, apresento a posição defendida José Antônio Paganella Boschi:

[...] adota a meu sentir, a teoria da co-culpabilidade aventada por Zaffaroni, segundo o qual o maior ou
menor âmbito de determinação individual pode resultar de causas sociais, teoria que merece mais longa
e detida reflexão, especialmente considerando a realidade sócio-econômica de nosso país e a ausência
do Estado no fornecimento de padrões mínimos de bem-estar a parcela significativa da população, que
não pode vir a ser, de repente, pretexto para a prática de crimes.12
Ora, diante de todo o exposto, a adoção dessa moderna concepção se faz necessária justamente quando
se considera a realidade econômica e social do Brasil, o que de certa forma virá a proporcionar uma
igualitária distribuição da “justiça”.
3. Referências
MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de Direito Penal: parte geral. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2004.
KARAM, Maria Lúcia. De crimes, penas e fantasias. Niterói: Luam, 1991
BOSCHI, José Antônio Paganella. Individualização da Pena. In: Revista AJURIS. n.79, ano XXVI. Porto
Alegre, set. 2000.
BARROS, Carmen Silva de Moraes. A individualização da pena na execução penal. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001.
ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.
3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

Quinta-Feira, 03 de Maio de 2012.

 

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Comentários e Opiniões

1) Adirso (27/10/2012 às 20:21:00) IP: 189.30.108.86
ótimos comentários.
2) Sergio (08/12/2015 às 21:55:45) IP: 177.194.183.54
Conteudo muito bom.
3) Markyane (21/06/2016 às 08:50:10) IP: 191.247.226.173
Muito bom, as teses da autora sobre o instituto
4) Claudia (13/07/2018 às 10:37:20) IP: 191.193.119.142
muito bom


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