Todo vínculo contratual que venha ser estabelecido entre as partes, qualquer que seja o seu objeto, deve ser norteado pelo princípio geral da boa-fé, mas, no tocante ao contrato de seguro de vida, o referido valor desfruta de maior relevância, não havendo exagero em cunhar a seguinte expressão: "o contrato de seguro exige boa-fé ao cubo".
Vale dizer, além da boa-fé ínsita aos ajustes contratuais em geral, também deve observar a boa-fé oriunda das relações de consumo e, ainda, a cláusula da boa-fé objetiva prevista no atual Código Civil de 2002, de molde a que não subsista nenhuma ineficácia digna de frustar a regular produção de seu principal efeito jurídico, dar segurança ao segurado, preservando-o do risco, que se vier a ocorrer, será suportado pela Seguradora com o pagamento de uma indenização nos limites anteriormente ajustados.
Nessa esteira, o contrato de seguro de vida deve proteger o beneficiário, terceiro nessa relação, dando-lhe o direito de receber a quantia fixada entre as partes contratantes, (não é possível quantificar o valor da vida!), de acordo com o prêmio pago e pelo encargo assumido, sempre tangido pela incerteza da existência humana, essa indene de garantia de duração.
Dentro da estabelecida premissa, a jurisprudência, inclusive sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, somente obrigava as Seguradoras a arcar com sinistros oriundos de "suicídios voluntários", ou seja, aqueles onde não haveria álea (risco), pois o celebrante já teria premeditado dar fim à sua vida, na contra-mão da boa-fé ínsita ao instrumento da apólice, que é bilateral, tanto para o consumidor, quanto para o fornecedor.
Agora, com o artigo 798, parágrafo único, do vigente estatuto civil, toda a cláusula que vier a afastar o dever de indenizar o evento suicídio nos primeiros 02 (dois) anos, será considerada nula de pleno direito, fazendo jus o beneficiário apenas aos valores constante dos pagamentos realizados para a constituição da reserva técnica.
O dispositivo é muito infeliz, sendo mesmo um estímulo ao reprovável ato de fugir da tarefa nem sempre agradável de enfrentar problemas e desafios inerentes á condição humana, pondo termo à existência, medida essa que a lei não deixa de representar perigoso elemento catalizador, não só por ser a depressão e o stress corriqueiros na moderna sociedade humana, assim também porque a interpretação literal de seu inteiro teor representa a porta aberta para o denominado "suicídio com hora marcada", que, como de sabença conspira contra a dignidade da pessoa humana, tão prestigiada no texto constitucional aprovado em 1988.
Meus augúrios são no sentido de que o Poder Judiciário, ao sopesar a questão, irá prestigiar o entendimento até então cristalizado na intelecção pretoriana, tratando de maneira díspar a voluntariedade ou não do ato de suicídio, em homenagem a acentuada boa-fé dos contratos de seguro e principalmente em defesa da vida.