O controle de qualidade nos moldes atuais teve origem na Revolução Industrial, com a passagem do artesanato à manufatura e correspondente divisão do trabalho. Com o capitalismo ditando a produção e jornadas de trabalho chegando a durar 80 horas em 1780 e 67 horas em 1820, não tardou a surgirem produtos sem as características mínimas de uso e segurança. Isso demandou o surgimento da figura dos inspetores, que ficavam ao final da linha verificando, um por um, as características de cada produto produzido.
Esse meio de inspeção da qualidade guarda muita semelhança com o Exame de Ordem. Fundamenta-se sê-lo uma maneira (meio) da OAB controlar a qualidade do advogado (produto final) que chegará ao mercado de trabalho e irá servir a população. É, pois, um típico controle de qualidade inspirado no Fordismo, a inspeção no final da linha de produção.
Mas vale lembrar que, no Fordismo, os produtos que estavam abaixo do mínimo de qualidade tinham dois destinos: ou retornavam para reparo ou, caso isso não compensasse em razão do dinheiro e tempo a ser gasto na readequação, eram descartados. O desperdício de dinheiro e insumos era enorme.
Com passagem dos anos e o aumento da competitividade os métodos de controle da qualidade evoluíram. Viu-se que era mais econômico e inteligente controlar o processo produtivo, ao invés de se focar produto final. A premissa a que se chegou foi a de que, se for possível controlar a qualidade a cada etada da produção, o resultado não poderia ser outro que não a confecção final um produto de qualidade. Assim, passou-se a assegurar a qualidade do produto garantindo a qualidade do processo. Além de implicar em enorme redução de custo e do desperdício, isso resolveu o problema, também, de muitos produtos que não são passíveis de teste, pois o teste os tornaria inutilizáveis, como, por exemplo a bala de revólver.
Não sei ao certo se a educação ministrada Faculdade de Direito e o advogado podem ser considerados produtos finais, passíveos de análise em final de linha. Provavelmente o controle de qualidade seja exigência natural em um país que possui mais faculdades de Direito que todo resto do mundo (são 1.240 no Brasil e 1.100 no restante do globo). As perguntas que me vêm são: não seria o exame da OAB um controle de qualidade de final de linha? Se sim [o que me parece claro], não é justamente esse tipo de controle de qualidade a pior maneira de se controlar a entrega de bem ou serviço? E ao bacharel de Direito, quais os reais custos, materiais e psicológicos, de fazê-lo retornar "à linha de produção" porque foi considerado não adequado aos padrões mínimos exigidos de um advogado?
Estamos falando de seres humanos que devem ter sua dignidade preservada! Porque não se passa a controlar da qualidade do formando passando-se a inspecionar o seu processo de formação na Faculdade de Direito? Aqui, a premissa de que um bom processo de produção apresentará, consequentemente, um bom produto final, também é verdadeira, bem como seu inverso o é: um mau produto é consequencia de um processo produtivo ruim.Bem, até agora, nada me tira da cabeça que o modo de se inspecionar a qualidade na Advocacia não muda até hoje porque nele [Exame de Ordem] os prejudicados não são aqueles que fabricam ou controlam a qualidade. Os prejudicados são os próprios produtos [seres humanos anônimos] considerados inadequados.
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Autor: Lucas dos Santos Faria.
*Chaplin, ilustrando o fordismo