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A INVIOLABILIDADE E O SIGILO PROFISSIONAL DO ADVOGADO


Autoria:

Rosalina Leal De Oliveira


Advogada, especializada em direito do trabalho.

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Resumo:

A inviolabilidade é uma garantia constitucional dada ao advogado, vez que este é indispensável à administração da justiça. Já, o sigilo profissional é um dever ético ao qual o advogado está subordinado. O objetivo deste trabalho é abordar os temas.

Texto enviado ao JurisWay em 06/08/2010.



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1     INTRODUÇÃO

 

 

A advocacia no Brasil é uma garantia constitucional, já que no seu artigo 133, há a previsão da indispensabilidade do advogado na administração da Justiça. Para assegurar o dispositivo citado o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (EOAB) garante, entre os direitos do advogado, a inviolabilidade profissional, visando, sobretudo, o sigilo dos dados de clientes.

A inviolabilidade profissional é um direito que afiança ao advogado a possibilidade de trabalhar com maior segurança, já que lhes são asseguradas a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de suas correspondências e comunicações. Constitui, portanto, mais uma garantia à sociedade que se vale dos serviços advocatícios do que uma garantia ao advogado propriamente dito.

A inviolabilidade abrange a imunidade profissional, a proteção ao sigilo profissional e a proteção aos meios de trabalho.

A imunidade profissional está prevista no parágrafo 2º do artigo 7º do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB), e significa a liberdade de expressão do advogado.

Ainda pensando na relação que o advogado deve estabelecer com o cliente o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil (CED), em capítulo próprio, trata do direito ao sigilo profissional.

O sigilo profissional é um dever deontológico que está relacionado com a ética, com a moral de determinada profissão, abrange a obrigação de se manter segredo sobre tudo que o profissional venha a tomar conhecimento.

A obrigação de guardar segredo não depende de pedido expresso pelo cliente, sempre que a natureza dos fatos forem relevantes o advogado está obrigado à guardar segredo. Ademais a relação entre cliente e advogado se pauta na confiança que aquele deposita neste, não sendo possível o patrocínio de qualquer causa sem esse pressuposto.

O dever de sigilo profissional, não está para o advogado, só em relação ao cliente, mas também para com os colegas e a própria Ordem dos Advogados, por isso o EAOAB dentro do capítulo que trata das infrações e sanções disciplinares elenca como infração a violação, sem justa causa, ao sigilo profissional (EAOAB, art. 34, VII), devendo se considerar a justa causa levando-se em conta o interesse social sobre o interesse privado.

O presente trabalho se apresentará através do método dedutivo-indutivo, partindo de uma premissa geral, que é a inviolabilidade e o sigilo profissional do advogado, seguindo para o particular, onde se constatará as diferenças entre os termos à partir da observação de fatos concretos.

Este estudo será desenvolvido através de pesquisas documentais da Constituição Federal (CRFB), do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOAB), do Código de Ética e Disciplina da OAB (CED), da novel Lei 11.767/08, juntamente com arquivos que podem ser encontrados de modo público ou particular em bibliotecas, sites da internet, Tribunais de Ética, etc.

Outra forma de elaboração da pesquisa será a bibliográfica em livros, doutrinas, artigos e outros meios de informação como periódicos (revistas, boletins, jornais), além de outras pesquisas que podem ser encontradas em sites da internet, objetivando apresentar um quadro atual completo e expressivo da realidade abordada, com a finalidade de contextualizar e compreender o tema estudado.

 


2     A PROFISSÃO DO ADVOGADO E SUA REGULAMENTAÇÃO

 

 

Nesse primeiro capítulo traçaremos uma linha introdutória a cerca do surgimento da profissão do advogado e sua regulamentação em nosso país, abordando desde as primeiras escolas da advocacia até as mais atuais e a regulamentação abrangendo as lutas da classe para firmar essa conquista.

É indispensável, nesse primeiro momento, a compreensão de como surgiu a profissão de advogado, de quando se deu sua regulamentação e as conseqüentes mudanças ao longo do tempo para entendermos a importância da inviolabilidade e do sigilo profissional dos advogados no Brasil.

 

 

2.1      SURGIMENTO DO CURSO DE DIREITO E DA PROFISSÃO DO ADVOGADO NO BRASIL

 

 

Antes de iniciarmos o assunto deste tópico temos que ter bem claro em mente que advogado é a pessoa licenciada em Direito e autorizada pelas instituições competentes (no Brasil, a Ordem dos Advogados) a exercer tal profissão.

Ramos (2001, p. 26) explica que a palavra advogado deriva da expressão “ad vocatus” que significa “interceder a favor de”. No Direito Romano, o litigante chamava em juízo terceira pessoa para falar a seu favor ou defender seus interesses, daí a utilização do termo advogado.

Madeira (2002 apud MAMEDE, 2003, p. 29, grifo do autor) explica a etimologia da palavra advogado:

 

muitos exerceram atividades de auxílio às partes nas questões judiciais desde a Roma mais antiga. Mas, até que a atividade se torne uma profissão com regras jurídicas e disciplinares próprias, decorrerão séculos. Enquanto isso não acontece, nos termos advocatus transitam a esmo vários conceitos, jurídicos ou não, como os de patronus, patronus causarum, togatus, causidicius, orator, iuris peritus, scolasticus.

 

E continua, explicando que a capacidade postulatória não era estendida à qualquer pessoa:

 

A capacidade postulatória, todavia, não era um direito universal, dela estando excluídos escravos (lembrando-se de que servus este res, isto é, que o escravo é uma coisa), crianças e até mulheres. (MADEIRA, 2002 apud MAMEDE, 2003, p. 30).

 

Ainda hoje o advogado é um servidor da sociedade, que permite a cada pessoa postular suas pretensões jurídicas e exercer seus direitos. Por isso, o advogado foi elevado constitucionalmente à condição de indispensável à administração da justiça e instrumento básico para assegurar a defesa dos interesses das partes em juízo.

Por ser considerado indispensável à administração da justiça e instrumento de garantia da defesa de interesses dos cidadãos é que, após a Proclamação da Independência, em 07 de setembro de 1822, se iniciaram as discussões a cerca das instalações dos cursos jurídicos no Brasil.

A primeira proposta de criação dos cursos jurídicos foi apresentada por José Feliciano Fernandes Pinheiro, mas essa proposta não chegou a sair do papel, porque Dom Pedro I dissolveu a Assembléia Constituinte e, com isso, abafou a discussão sobre a instalação da universidade de direito no Brasil (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, [200-?].

Somente em meados de 1825 é que o Imperador Dom Pedro I aprovou o primeiro curso jurídico do Brasil a ser ministrado no Rio de Janeiro, mas esse curso nunca chegou a ser implantado. Embora não tenha sido implantado seus estatutos, elaborados por Luis José de Carvalho e Melo (Visconde da Cachoeira), serviram de base para as instalações das Faculdades de Direito de São Paulo e Olinda, que foram aprovadas após a retomada da questão pelo Parlamento do Brasil Império.

 

Os mesmos estatutos elaborados pelo Visconde da Cachoeira, por ocasião do decreto que tencionara criar o curso jurídico do Rio de Janeiro, regulariam os cursos de Olinda e São Paulo. O Curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Academia de São Paulo, que começou a funcionar em 1º de março de 1828 e o Curso de Ciências Jurídicas e Sociais de Olinda, inaugurado em 15 de maio de 1828, representaram marcos referenciais da nossa história, cujo propósito era a formação da elite administrativa brasileira (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

 

Portanto, o primeiro curso de ciências jurídicas começou a funcionar em 1° de março de 1828, em São Paulo. Logo em seguida, em 15 de maio de 1828 foi inaugurado, no Convento de São Bento, o curso de Ciências Jurídicas e Sociais de Olinda, sendo que posteriormente foi transferido para o Recife.

Pasold (2001, p. 32) explica que no início, os cursos tinham duração de cinco anos e sua estrutura curricular abordava as disciplinas de Direito Natural, Direito Público, Análise da Constituição do Império, Direito das Gentes e Diplomacia no primeiro ano de curso; no ano seguinte prosseguiam-se os estudos da matéria do ano anterior acrescidas de Direito Público e Eclesiástico; no terceiro ano do curso eram ministradas as disciplinas de Direito Pátrio Civil e Direito Pátrio Criminal; no ano seguinte prosseguiam-se os estudos de Direito Pátrio Civil com a disciplina de Direito Mercantil e Marítimo; no último ano estudavam-se as disciplinas de Economia Política, Teoria e Prática do Processo.

Várias modificações parciais foram surgindo ao longo do tempo com intuito de melhorar cada vez mais o aprendizado dos estudantes, Pasold (2001) destaca entre as mudanças a de 1901, chamada Reforma Epitáfio, que mantinha a duração do curso em cinco anos e incluiu algumas disciplinas no currículo, dentre as quais a de Filosofia do Direito, Direito Administrativo, Medicina Pública, entre outras.

 

Em 1901 ocorreu a Reforma Epitácio, mantendo o curso com a duração de cinco anos, e estabelecendo um currículo no qual constam as seguintes matérias:

-Filosofia do Direito; Direito Romano; Direito Público e Constitucional; Direito Internacional Público e Privado e Diplomacia; Direito Civil; Direito Criminal; Direito Comercial; Economia Política; Ciência das Finanças e Contabilidade do Estado; Teoria e Prática do Processo Civil, Comercial e Criminal; Ciência da Administração e Direito Administrativo; Medicina Pública; e Legislação Comparada do Direito Privado (PASOLD, p. 32-33).

 

Várias outras mudanças surgiram no decorrer dos anos sempre com o intuito de oportunizar um aprendizado melhor aos discentes, incluindo entre as disciplinas inclusive a possibilidade de estágio e a disciplina de Prática Forense.

Recentemente, o Conselho Nacional de Educação editou a Lei 9.131/95, onde se estabelece as diretrizes curriculares para os cursos de graduação e determina avaliações periódicas das instituições e dos cursos superiores para a apuração da qualidade e eficiência de suas atividades de ensino, pesquisa e extensão. Além dessas avaliações a Ordem dos Advogados do Brasil, realiza duas vezes ao ano uma prova para aferir o conhecimento adquirido durante o curso de direito e disponibilizar para à sociedade somente advogados minimamente qualificados.

Concluindo, temos que o primeiro curso jurídico começou a funcionar no Brasil, após muitas lutas, em 1827, nas cidades de São Paulo e Olinda. Atualmente, temos uma infinidade de cursos espalhados por todo o território, sendo este um dos cursos mais procurados pelos brasileiros, principalmente por proporcionar ao graduado muitas áreas de atuação, podendo o bacharel exercer função de advogado, juiz, representante do Ministério Público, delegado de polícia, Procurador da Republica, dentre outros cargos técnicos em entidades públicas ou privadas que exigem a formação em direito. Ademais, pode, ainda, como advogado, após aprovação em exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) atuar nas diversas áreas existentes, tais como, civil, penal, comercial, previdenciário, trabalhista, ambiental, etc.

 

 

2.2      A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

 

 

Com a criação dos cursos de direito de Olinda e São Paulo e, ainda, com os advogados provenientes dos cursos das universidades européias, os advogados brasileiros começaram a pensar na criação de um órgão de classe que os aconselhasse (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

Segundo o Codex, II, 7.13 (apud PELLIZZARO,1997, p. 139) a palavra ordem é de origem romana; desde o século V, em Roma, já se fazia referência à uma corporação de advogados, que era chamada de collegium, ordo, consortitum, onde um número limitado de advogados se inscreviam por ordem de antiguidade.

No Brasil, primeiramente, o Superior Tribunal de Justiça criou o Instituto dos Advogados Brasileiros, inspirado nos portugueses que em 1838 aprovaram o Estatuto da Associação dos Advogados de Lisboa, qual tinha como objetivo elaborar estudos e articulação política para a criação da Ordem dos Advogados de Portugal.

 

Profundamente influenciados pelo estatutos da associação portuguesa, “inclusive no que dizia respeito à finalidade primordial da instituição: a constituição da Ordem dos Advogados”, um grupo de advogados, reunidos na casa do Conselheiro Teixeira de Aragão, organizou os estatutos do Instituto dos Advogados Brasileiros. Submetido à apreciação do Governo Imperial, recebeu aprovação pelo Aviso de 7 de agosto de 1843. O art. 2.º dos estatutos da nova instituição dispunha: “O fim do Instituto é organizar a Ordem dos Advogados, em proveito geral da ciência da jurisprudência”(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

 

Somente quase um século depois da criação do Instituto dos Advogados Brasileiros, e com muitas lutas, é que a classe de advogados conseguiu, em pleno regime ditatorial, criar a Ordem dos Advogados Brasileiros.

 

A instituição da Ordem dos Advogados do Brasil ocorreu, então, quase um século após a fundação do Instituto dos Advogados, por força do art. 17 do Decreto n.º 19.408, de 18 de novembro de 1930, assinado por Getúlio Vargas, chefe do Governo Provisório, e referendado pelo ministro da Justiça Osvaldo Aranha (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200?).

 

Nesse contexto, a Ordem dos Advogados Brasileiros representava uma aspiração de consciência pública nacional que assegura aos inscritos seus deveres e direitos, a manutenção da dignidade da classe e sua defesa contra os que maculam a justiça.

A Ordem dos Advogados do Brasil está prevista no Título II do Estatuto da Advocacia nos artigos 44 e seguintes, é órgão autônomo e independente caracterizado juridicamente como serviço público, dotado de personalidade jurídica e forma federativa.

A autonomia e a independência da OAB consagra-se no § 1º do artigo 44, quando o referido artigo menciona que “a OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico”. Nessa seara a OAB, por exemplo, não está obrigada a prestar contas ao Tribunal de Contas da União, já que está subordinada somente à lei, não tem, portanto, dependência hierárquica de qualquer órgão ou entidade, sujeitando-se somente ao controle jurisdicional.

A natureza jurídica da Ordem é de serviço público, sendo dotada de personalidade jurídica, ou seja, é ente jurídico, criado por lei, dotado de direitos e obrigações no mundo social.

Quanto ao Serviço público, no direito administrativo ele é entendido como aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob a dependência estatal e com a finalidade de satisfazer a coletividade ou simples conveniências do Estado. O serviço público que caracteriza a Ordem dos Advogados Brasileiros é tido por parte da doutrina como sui generis, sendo entendido como essencial ou independe ou federal.

Pellizzaro (1997, p. 141) diz que o serviço público prestado pela OAB é essencial para a comunidade e, por isso, deve sujeitar-se as regras que regem a Administração Pública, com total observância aos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade.

Sodré (1991, p. 261), por outro lado, entende que o serviço público que caracteriza a Ordem é “federal, descentralizado, com isenção de impostos sobre seus serviços e o exercício de seus cargos, com direito de impor contribuições aos seus membros, com o poder de punir, etc.”.

Já Lobo (apud RAMOS, 2001, p.  453) entende que a Ordem constitui categoria sui generis, pois se submete ao direito público no que se refere ao poder de polícia administrativa da profissão, e ao direito privado, quando se refere às demais finalidades, caracterizado, portanto, como serviço público independente, por não ser considerada nem autarquia nem entidade totalmente privada.

Ainda que a OAB não preste serviços diretamente à comunidade, dada sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência de determinado grupo social e do próprio Estado, deve-se considerar a OAB como serviço público essencial que se submete às regras da Administração Pública e, como tal, deve respeitar os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade. Ademais, o serviço prestado pela Ordem ora é de caráter público, atuando como autarquia na defesa dos interesses do cidadão e fazendo o controle e a fiscalização dos profissionais à ela vinculados, sendo regida pelo Direito Administrativo, nesse caso; ora é considerada uma associação civil onde seus profissionais, prestadores de serviços advocatícios, são regidos pelo Direito Civil, pela CLT e pelo EAOAB.

Mamede (2003, p. 401), explica de forma bem simples sobre a natureza hibrida da OAB:

 

Essa natureza hibrida se reflete na própria instituição. Por sua estrutura privada, a Ordem contrata seu pessoal pelo regime da CLT, e não por concurso público e regime estatutário. Seu patrimônio não é composto por bens público (de uso comum do povo, de uso especial ou dominicais), e suas contas não estão submetidas ao Tribunal de Contas, mas aos próprios inscritos na Ordem. Todavia, por constituir serviço público, a OAB goza de imunidade tributária total em relação a seus bens, rendas e serviços; por outro lado, os atos conclusivos de seus órgãos, quando reservados ou de administração interna, devem ser publicados na imprensa oficial ou afixados no fórum, na integra ou em resumo.

 

Ainda sobre a OAB, temos que analisar a sua organização, no plano nacional, sob a forma federativa. Dizer que a OAB tem forma federativa significa que o órgão pode ser dividido em sub-unidades autônomas, limitando-se aos ditames estatutários que lhes são impostos, nos dizeres de Pellizzaro (1197, p. 142):

 

Inspirado na Federação ou Estado Federal, o legislador caracterizou a OAB, como um órgão dirigido por um poder central denominado Conselho Federal, unido indissoluvelmente e aos Conselhos Seccionais, Subseções e Caixas de Assistência dos Advogados, constituindo uma única pessoa jurídica.

Há, assim, uma só OAB, embora seja descentralizada em sub-unidades federadas,  que gozam de autonomia administrativa e para consecução das suas finalidades, dentro dos limites estatutários que lhes são impostos.

 

Assim, a divisão jurídico-territorial em Seccionais da OAB conseqüentemente lhe dá a autonomia típica de qualquer ente federado, tanto é assim que o § 2º do artigo 45 confere aos Conselhos Seccionais personalidade jurídica própria e “jurisdição sobre os respectivos territórios dos Estados Membros, do Distrito Federal e dos Territórios”.

Para concluir, temos que a Ordem dos Advogados do Brasil surgiu em 1930, como ente representativo de uma classe, visando assegurar aos inscritos seus deveres e direitos, a manutenção da dignidade da classe e sua defesa contra os que maculam a justiça. Enquanto ente representativo constitui-se de órgão autônomo e independente caracterizado juridicamente como serviço público, dotado de personalidade jurídica e forma federativa.

 

 

2.3      ESTATUTO DA ADVOCACIA E DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

 

 

O termo Estatuto deriva do latim statutumm e statuere, que significa estabelecer, constituir, fundar. Nos dizeres de Pellizzaro (1997, p. 20):

 

Em sentido amplo, significa a lei ou regulamento em que se estabelecem as noras jurídicas institucionais ou orgânicas de uma coletividade, corporação pública ou particular.

 

Segundo o site WIKIPÉDIA (2008) o Estatuto da OAB é definido como:

 

Um conjunto de normas do ordenamento jurídico brasileiro que estabelece os direitos e os deveres dos advogados, bem como os fins e a organização da OAB, tratando dos estagiários, das caixas de assistência aos advogados, das eleições internas da entidade e dos seus processos disciplinares.

 

O primeiro projeto do Estatuto foi apresentado em 1956, tendo sido aprovado por unanimidade no Conselho Federal da OAB e encaminhado ao Ministro da Justiça, Nereu Ramos, a fim de ser aprovado pelo Congresso Nacional como se fosse um projeto governamental. Esse primeiro projeto tramitou durante anos no Congresso e foi alvo de várias tentativas de modificação, mas em 27 de abril de 1963 o Estatuto da Ordem, Lei n.º 4.215, foi promulgado e iniciou sua vigência em 11 de junho do mesmo ano. Dos registros históricos a cerca do fato colhe-se o seguinte trecho:

 

Na posse de Nehemias Gueiros na presidência da OAB, em 11 de agosto de 1956, houve a presença, inédita até aquela data (e que só viria a se repetir em 1998, na posse de Reginaldo Oscar de Castro), no recinto da Ordem, de um presidente da República. Juscelino Kubitschek de Oliveira, acompanhado do ministro da Justiça, Nereu Ramos, compareceu à solenidade e assinou mensagem ao Congresso, encaminhando como projeto do governo, sem nenhuma alteração, o anteprojeto do Estatuto aprovado pelo Conselho Federal da OAB, que tramitou por seis anos e foi alvo de muitas tentativas de modificação. Em outubro de 1960, foi discutido o parecer do deputado Pedro Aleixo ao projeto do Estatuto da Ordem, constatando-se que houve inovações no tocante aos atos privativos dos advogados, e o Conselho decidiu pleitear a aprovação do projeto em sua forma original. Em 29 de novembro, o Conselho tomou conhecimento de que a Câmara votara o projeto, que seria enviado ao Senado. O Estatuto da Ordem – Lei n.º 4.215 - recebeu sanção em 27 de abril de 1963, sendo comemorado no Conselho o início da vigência em sessão de 11 de junho, com pronunciamento de Nehemias Gueiros, relator da comissão de implementação (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

 

Esse primeiro Estatuto criou novos cargos na diretoria do Conselho Federal, sendo estes de vice-presidente, subsecretário e tesoureiro, que foram eleitos em outubro de 1963.

Com o passar dos anos esse primeiro Estatuto, representação de uma classe que muito batalhou para ter seus pilares instrumentalizados, ficou ultrapassado, principalmente depois da instituição da nova Constituição de 1988, totalmente voltada aos princípios da dignidade humana. Por isso, fez-se necessário, então, nesse contexto a elaboração de um novo estatuto que atendesse às necessidades do novo profissional da advocacia, um advogado-empregado que passou a ter encargos, necessitar de proteção diante do empregador, constituir sociedades e independência técnico-profissional que a Lei 4.215/63 não abarcava, e que agora passavam a ter singular importância para a corporação (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

Diante disso, no final da década de oitenta o projeto de um novo Estatuto começou a ser elaborado, mas foi considerado insatisfatório, pois optava apenas por atualizar o Estatuto já existente, não atendendo todas as necessidades dessa nova classe de advogados que agora já não era mais composta por uma maioria de profissionais liberais.

 

A proposta de elaboração de um novo Estatuto - que atendesse às novas necessidades que a realidade impunha à advocacia brasileira e que projetasse ao futuro o adequado disciplinamento da profissão, coerente com as transformações que se vinham manifestando no panorama nacional - procurava rever, redefinir e atualizar os aspectos profissionais da atividade do novo advogado; um advogado-empregado, que começou a representar a considerável parcela desses profissionais, seja na iniciativa privada, seja em órgãos públicos. Questões como encargos, proteção diante do empregador, sociedade de advogados e grau de independência técnico-profissional, que não eram contemplados na Lei n.º 4.215/63, por exemplo, passaram a ter importância singular para a corporação (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

 

Posteriormente, durante o mandato de Marcelo Lavenère, priorizando-se a elaboração do novo Estatuto, os advogados de todo o País foram mobilizados para que enviassem propostas e sugestões ao anteprojeto. A partir dessas propostas, em 12 de abril de 1992, o Conselho Federal aprovou o novo texto e o enviou ao Congresso Nacional.

Esse novo projeto ainda tramitou pela Câmara durante dois anos, tendo sido aprovado, com o acréscimo de algumas emendas, ao final de maio de 1994, depois, em junho de 1994 foi aprovado pelo Senado, sem mais emendas, e o então presidente, Itamar Franco, o sancionou em julho de 1994, sob o número de lei 8.906.

Com o advento da nova lei concretizavam-se as idéias de lutas pela cidadania e a reafirmação da destinação democrática dos advogados brasileiros, que trouxe consigo vários pontos inovadores:

 

Vários foram os pontos inovadores do novo Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, como a obrigatoriedade do exame de ordem para ingresso na advocacia; a garantia de inviolabilidade do advogado no exercício profissional e indispensabilidade do advogado para postulação perante o Poder Judiciário, regulamentando o art. 133 da Constituição; a criação de Tribunais de Ética e Disciplina em todos os Conselhos Estaduais; a simplificação das hipóteses de incompatibilidade e impedimento para o exercício da advocacia e o disciplinamento da atividade advocatícia do advogado empregado, inclusive quanto à advocacia pública (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 200-?).

 

Esse novo Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB) pode ser definido como um conjunto de normas dentro do ordenamento jurídico que visa estabelecer os direitos e os deveres dos advogados, e ainda os fins e a organização da OAB, abordando os estagiários, as caixas de assistência aos advogados, as eleições internas da entidade e os seus processos disciplinares.

O estagiário é aquele que se encontra em período de aprendizado da profissão e está regularmente inscrito na OAB, podendo realizar atos em conjunto com advogados e sob responsabilidade deste, está previsto no parágrafo 2º do artigo 3º do Estatuto, bem como, no artigo 9º do referido diploma legal. Cardella (2005, p. 15) ao comentar sobre o § 2º do artigo 3º explica:

 

O § 2º do Estatuto permite que o estagiário, regularmente inscrito, possa praticar atos, entretanto, em conjunto com o profissional e sob responsabilidade deste, pois o exercício do estágio não constitui uma atividade profissional, e sim uma função de aprendizagem prática pedagógica. Então, qualquer ato privativo praticado por estagiário, pode gerar nulidade absoluta, uma vez que ele não pode ser considerado profissional do Direito. Esses atos podem caracterizar até mesmo infração penal por exercício ilegal de profissão e acarretar medidas no âmbito administrativo perante a Seccional da OAB.

 

Apesar da possibilidade de nulidade absoluta dos atos praticados por estagiários e da caracterização de infração penal e sanção administrativa, o Estatuto prevê em seu artigo 29, § 1º, incisos do I ao III, situações em que o estagiário está apto a praticar atos isoladamente, por exemplo, a retirada de autos em cartório e assinatura da respectiva carga.

Quanto aos estagiários, vale ressaltar ainda, que ficam sujeitos as mesmas causas de incompatibilidades e/ou impedimentos previstas ao advogado, nesse sentido decisão do Conselho Federal da OAB:

 

Estagiário. Inscrição. Incompatibilidade. A incompatibilidade para o exercício da advocacia é extensiva ao estagiário (art. 9º, parágrafo 3º, da Lei 8.906/94) (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2002).

 

As Caixas de Assistência dos Advogados são instituições destinadas a auxiliar e amparar os inscritos na OAB. São órgãos dotados de personalidade jurídica própria, criadas pelo Conselho Seccional aos quais se vinculam (EAOAB, art. 45). Ramos (2001, p. 519), explica sobre a finalidade assistencial das caixas:

 

A finalidade assistencial da Caixa de Assistência dos Advogados é alcançada pela prestação de inúmeros serviços, que vão desde a simples formalização de convênios que estabeleçam algumas facilidades específicas aos advogados, até a instituição de uma série de benefícios.

 

Quanto às eleições internas da entidade pode-se dizer que é “a outorga de mandato coletivo para desempenhar uma função ou ocupar um cargo numa instituição organizada” (PELLIZZARO, 1997, p. 187). A eleição está prevista no artigo 63 do Estatuto, cabendo ao Regulamento Geral estabelecer a forma e os critérios para realização da mesma.

Em regra todos os advogados regularmente inscritos na OAB podem votar ou ser votados, devendo ser observadas algumas condições para candidatura, quais sejam, comprovação de situação regular junto a OAB; não ocupação de cargo ou função pública incompatíveis com a advocacia, seja em caráter permanente ou temporário; não ter sofrido sanção por infração disciplinar, exceto se reabilitado; exercício comprovado de advocacia por mais de cinco anos (EAOAB, art. 63, § 2º). Vale ressaltar que o voto é obrigatório e sua ausência não justificada sujeita o infrator ao pagamento de multa de 20% do valor de uma anuidade.

O novo Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB), agora em consonância com o artigo 133 da Constituição Federal de 1988, criou ainda os Tribunais de Ética e Disciplina nos Conselhos, responsabilizando-os pela punição disciplinar dos inscritos na OAB.

Estruturalmente o Estatuto se compõe de quatro títulos, a saber: I – Da Advocacia; II – Da Ordem dos Advogados do Brasil; III – Do Processo na OAB; IV – Das Disposições Gerais e Transitórias.

O Título I, Da Advocacia, está dividido em nove capítulos e é composto por 43 artigos, que abrangem a atividade da advocacia, os direitos do advogado, a inscrição na OAB, a sociedade de advogados, advogado empregado, honorários advocatícios, incompatibilidades e impedimentos, ética do advogado e infrações e sanções disciplinares.

No Titulo II, Da Ordem dos Advogados do Brasil, temos seis capítulos que abordam os temas relativos aos órgãos que compõem a OAB, as eleições e os mandatos para os respectivos órgãos, além dos fins e organização da OAB.

O Título que trata do Processo na OAB, divide-se em três capítulos que abordam os processos disciplinares e os recursos cabíveis.

E, por fim, o Titulo IV, Disposições Gerais e Transitórias, está contido em capítulo único que vai do artigo 78 a 87, onde se determina a competência do Conselho Federal para editar o regulamento geral, se aplica aos servidores da Ordem o regime trabalhista, etc.

Pasold (2001, p. 73-74) diz que as normas existentes no Estatuto compõem-se de regras substantivas e adjetivas, estando as adjetivas fundamentalmente no Título III. Em outra dimensão classifica as normas como sendo compostas por regras de política geral corporativa, de organização, de condutas de caracterização infracional e de sanção.

Em síntese, podemos dizer que o primeiro Estatuto foi instituído em 1963 (Lei 4.215) com a finalidade de estabelecer os direitos e deveres dos advogados, bem como os fins e a organização da OAB. Posteriormente, a Lei 8.906/94, veio substituir esse primeiro Estatuto, e atuar de forma mais condizente com a nova Constituição de 1988.

  

 

2.4      CÓDIGO DE ÉTICA

 

 

A palavra “ética” tem origem direta da palavra grega ethiké e indireta do latim ethica.

Ética nada mais é do que um campo de reflexões filosóficas que tem por objeto a moral, as relações entre os seres humanos e seu modo de ser e pensar. É o estudo do que consideRamos moralmente correto em determinado tempo e espaço.

Filosoficamente falando, ética é aquele comportamento considerado bom, e o que é bom, tanto para o indivíduo como para a sociedade como um todo, depende de determinadas circunstâncias. Bucci (2000 apud WIKIPÉDIA, 2008) ao abordar o tema explica:

 

A ética pode ser descrita como um saber escolher entre o “bem” e o “bem” (ou entre o “mal” e o “mal”), levando-se em conta o interesse da maioria da sociedade. A moral por sua vez, delimita o que é bom e o que é ruim no comportamento dos indivíduos para uma convivência civilizada; a ética é o indicativo do que é mais ou menos justo diante de possibilidades de escolhas que afetem outras pessoas.

 

Portanto, a ética é o estudo da moral e, conseqüentemente, é preceito fundamental da advocacia, já que o advogado é o maior defensor das garantias fundamentais do ser humano em um Estado Democrático de Direito. Assim, a ética na advocacia deve ser entendida como um conjunto de princípios que regem a conduta dos advogados no exercício profissional.

Osório (1992 apud PELLIZARO, 1997, p. 105) deixa bem claro o que são normas éticas, assim dizendo:

 

As normas éticas cuja infração é sancionável disciplinarmente embora não constituam ilícito civil, penal ou contravencionista, são a rigor normas disciplinares de cuja observância prestam conta os profissionais aos órgãos a que estão subordinados (Conselhos).

De sua infração não decorre mais apenas a censura moral, mas penas materiais que podem ir desde a advertência até a suspensão de atividades e eliminação do quadro profissional. São então, comandos jurídicos impostos pelo direito, e cuja eficácia prática é controlada pelo Estado. Embora através de órgãos descentralizados formados pelos próprios profissionais, segundo as varias leis que disciplinam as profissões regulamentadas.

 

O Estatuto da Advocacia em seu artigo 33 preceitua que o advogado deve cumprir os deveres consignados no Código de Ética, tais deveres tratam do relacionamento do advogado com, a comunidade, com o cliente, outros profissionais, e ainda, a publicidade, a recusa do patrocínio, o deve de assistência jurídica, o dever geral de urbanidade e os procedimentos disciplinares.

Dessa forma, visando orientar a conduta do advogado no seu exercício profissional e regulamentar os processos disciplinares o Código de Ética dos Advogados (CED) foi instituído e, dentre outras funções, estabelece a punição de censura á infringencia das normas por ele estabelecida. Cardella (2005, p. 73-74) sabiamente explica a função do CED:

 

O Código de Ética e Disciplina, entre outras finalidades, estabelece regras deontológicas, como se verifica pelo parágrafo único do artigo 33 do Estatuto, que norteiam o advogado no seu exercício profissional, para não ser apenas um mero profissional liberal. Destacam-se do referido parágrafo os seus deveres para com a comunidade, sua função social, as relações com o seu cliente e com o colega, a observância às formas de publicidade admitidas, a recusa do patrocínio, o compromisso de assistência judiciária aos necessitados, o dever de urbanidade, e os procedimentos disciplinares. Essas regras devem acompanhar o advogado no seu dia-a-dia, em seus escritório, na rua, no foro e em todos os espaços públicos em que sua conduta possa enaltecer ou desprestigiar a classe que representa.

 

O Código de Ética e Disciplina foi editado pelo presidente do Conselho Federal da OAB em, e divide-se em duas partes, uma que trata especificamente da ética do advogado e a outra que apresenta as regras para o processo disciplinar. Ao abordar a ética do advogado o CED divide-se nos seguintes capítulos: as regras deontológicas fundamentais, as relações com o cliente, o sigilo profissional, a publicidade, os honorários profissionais, o dever de urbanidade e disposições gerais.

As regras deontológicas fundamentais, previstas nos artigos 1º ao 7º do CED, tratam da conduta do advogado, elencando inúmeros deveres atinentes às funções públicas e sociais da advocacia de forma exemplificativa (não é, portanto, taxativo).

O relacionamento com o cliente, abordados nos artigos 8º ao 24 do CED, versam sobre “uma real confiança do cliente em seu advogado e uma independência deste em relação àquele antes da aceitação da causa” (CARDELLA, 2005, p. 159), essa relação entre cliente e advogado deve se dar de forma muito clara, devendo o cliente sempre ser informado dos riscos e das conseqüências de eventuais lides. O advogado deve atuar como um conciliador, evitando litígios desnecessários.

No Capítulo III, Título I do CED, discute-se o dever de sigilo profissional, que é inerente à profissão do advogado e deve ser respeitado mesmo diante de juízes e tribunais, salvo algumas exceções admitidas por lei.

Nos artigos 28 a 34 o CED define as regras para a publicidade, pois ao advogado é vedado a mercantilização de seu serviço, devendo seus anúncios ser feito de forma moderada e discreta, com caráter meramente informativo. Sendo vedada a divulgação de suas atividades em conjunto com qualquer outra no mesmo local, preservando-se absoluta separação em relação ao exercício da advocacia para melhor se preservar a liberdade e independência do advogado (CARDELLA, 2005, p. 171).

O capítulo que trata dos honorários profissionais (CED, artigos 35 a 43) é regido pelo princípio da livre negociação, devendo ser contratado por escrito e fixar valores não inferiores ao estabelecido na tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, sob pena de infringir em falta ética. Mamede (2003, p. 299) explica que os honorários podem ser convencionais, sucumbenciais ou arbitrados e constituem créditos advindos do trabalho advocatício.

O capítulo VI aborda o dever de urbanidade, ou seja, o tratamento de conveniência social, de respeito entre o advogado e as pessoas que o cercam. Urbanidade, segundo Cardella (2005, p. 187), “é sinônimo de civilidade, cortesia”.

Para finalizar o Título I do CED, o artigo 47 institui a competência do Tribunal de Ética e Disciplina ou do Conselho Federal para dirimir questão de ordem ética profissional relevante para o exercício da profissão. E o artigo 48 enfatiza a necessidade do Presidente do Tribunal de Ética, do Conselho Seccional ou da Subseção, de informar ao advogado quando estiver transgredindo norma do Código de Ética, do Estatuto, do Regulamento Geral ou dos Provimentos do Conselho Federal.

O Título II do CED aborda as regras para o processo disciplinar, institui a competência do Tribunal de Ética e Disciplina e o procedimento dos processos disciplinares. Além do CED os procedimentos disciplinares estão previstos no Estatuto da OAB, nos Regulamentos e Provimentos do Conselho Federal, podendo ser instituído inclusive de ofício pelas autoridades administrativas.

O Código de Ética, portanto, é um conjunto de normas que visa orientar a conduta do advogado durante o exercício profissional e regulamentar os processos disciplinares, os quais podem estabelecer aos advogados, que infringirem as normas estatutárias, pena de censura, suspensão e, até, exclusão do quadro da OAB.

 

 

2.5      REGRAS DEONTOLÓGICAS

 

 

A advocacia é indispensável à Administração da Justiça, pois é dever do advogado ser defensor do Estado Democrático de direito, da cidadania, da moralidade, da justiça e da paz social. Sendo, pois, figura indispensável na sociedade, a conduta do advogado vai além dos deveres institucionais previstos pelo Estatuto da Advocacia e da OAB, pelo Regimento Geral do Estatuto, pelos Provimentos e pelo Código de Ética e Disciplina, devendo “preservar a dignidade da profissão e engrandecer a imagem de respeitabilidade da advocacia perante a sociedade e os poderes constituídos” (CARDELLA, 2005, p. 155) e, com esse fim, surgem as regras deontológicas.

Deontologia é o conjunto de regras e princípios que norteiam a conduta do homem, cidadão ou profissional, freqüentemente é utilizada para designar ética profissional ou a moral do exercício de determinada profissão.

Carlin (2007, p. 42) explica a etimologia do termo deontologia dizendo que:

 

Deontologia vem de dois vocábulos gregos e significa, etimologicamente, deontas, o que é obrigatório, aquilo que é preciso fazer (são os deveres de uma profissão) e logos é o conhecimento transmitido mediante provas, é o discurso prático sobre uma matéria (logos: ciência ou estudo).

 

A deontologia é inerente às profissões, opera no campo profissional instituindo regras e princípios que norteiam a conduta do profissional, nos dizeres de Carlin (2007, p. 43):

 

Ela [a deontologia] opera, por excelência, no campo profissional. Requer normas reagrupadas em textos, estatutos ou códigos, exigindo, em seu estudo, noções de disciplina, falta e sanção, entendidas coletivamente, posto que destinadas ao conjunto da profissão. Não raro ela se acha utilizada para designar ética profissional ou a moral do exercício de uma profissão, resultado da reflexão dos profissionais sobre uma prática. Mesmo quando impulsionada pelos poderes públicos, é uma autodisciplina.

 

As regras deontológicas inerente a profissão de advogado estão presentes no Estatuto da OAB, em seus Regulamentos e, de forma expressa, no Capítulo I do CED. Tratam especificamente da conduta do advogado, alcançando a categoria de obrigação a cumprir decorrente do valor e da importância que se atribui a determinadas condições e comportamentos dos advogados, sob pena de se aplicar sanções disciplinares pelo seu descumprimento.

Logo no artigo primeiro do CED temos uma determinação de exercício da advocacia observando-se os princípios da moral individual, social e profissional. Dessa forma, o advogado, além de obedecer a princípios institucionais, deve respeitar os princípios da moral individual, ou seja, sua consciência pessoal, social e profissional.

O artigo 2º do CED trata da indispensabilidade do advogado à administração da justiça e elenca nos incisos do parágrafo único os deveres éticos do advogado, por exemplo, dever de preservar em sua conduta a honra, a nobreza e a dignidade da profissão; dever de atuar com destemor, decoro, independência, honestidade, veracidade, lealdade, dignidade, boa-fé; entre outros.

O Direito como instrumento mitigador das desigualdades e do encontro de soluções justas é tratado no artigo 3º do CED, que aborda ainda a lei como meio para garantia da igualdade de todos.

A liberdade e independência do advogado funcionário é assunto do artigo 4º, que o legitima, inclusive, a recusa “do patrocínio de causa concernente a lei ou direito que também lhe seja aplicável, ou contrarie expressa orientação sua, manifestada anteriormente”. Assim Cardella (2005, p. 156) explica:

 

O advogado que for vinculado o cliente mediante uma relação empregatícia ou que tiver contrato permanente de prestação de serviço, ou mesmo que for integrante de departamento jurídico, assessoria jurídica em órgão Público ou Privado, deve zelar, sempre, pela sua liberdade e independência, sendo legítima sua recusa de patrocínio quando também faça jus a algum direito ou possa, direta ou indiretamente, contrariar orientação anteriormente dada (artigo 4º do CED).

 

Depois o CED trata dos procedimentos de mercantilização que são expressamente proibidos, conforme o disposto no artigo 5º, ainda que não tenham natureza lucrativa, pois o que se proíbe é a associação à outra atividade, seja ela qual for. Pasold (2001, p. 172) explica que na advocacia não se pode tratar as coisas como se fossem mercadorias a serem negociadas.

Os anúncios dos serviços advocatícios devem ser feitos com descrição e moderação, devendo ter condão meramente informativo, pois o artigo 7º do CED veda a captação de clientela. Lobo (1994 apud BARBOSA, 2000) ao comentar o dispositivo estatutário que trata do assunto assim explica:

 

IV – A quarta hipótese complementa a anterior, porque veda quaisquer formas que se utilizem para angariar ou captar causas, com ou sem ajuda de terceiros. O advogado não pode oferecer seus serviços ao cliente potencial como se fosse uma mercadoria. Por isso, a publicidade deve ser realizada de modo genérico e com moderação, sem promessa de resultados a causas determinadas. O uso de mala direta, por exemplo, apenas é admissível para comunicar a instalação do escritório ou mudanças de endereços.

Para o Estatuto, nenhuma forma de captação de clientela é admissível; o advogado deve ser procurado pelo cliente, nunca procurá-lo.

 

Dessa forma, a publicidade não pode ofender a classe dos profissionais, devendo ser feita de forma moderada, sem a intenção de atrair o cliente para o escritório, pois o advogado não deve procurar o cliente, mas este, sim, deve buscar o advogado.

É proibido, ainda, ao advogado falsear deliberadamente a verdade ou agir de má-fé em juízo (CED, art. 6º). Tal proibição não atinge somente o nível profissional, mas pessoal do advogado que deve limitar-se a expor os fatos de forma real perante o juízo, não lhe sendo permitido criar situações ou simplesmente incrementá-las para um melhor convencimento. Á esse respeito já se manifestou o Conselho Federal da OAB, assim dizendo:

 

FALSEAMENTO DA VERDADE. ATITUDE DELIBERADA DO ADVOGADO. AFRONTA AO ART. 6º DO CÓDIGO DE ÉTICA. Advogado que deliberadamente expõe em juízo fatos que não guardam nenhuma relação com a verdade fática pratica infração ao CED, pois afronta o disposto no seu art. 6º. Aplicação da pena de advertência (art. 36, II do EAOAB), convertida em advertência por ofício reservado (art. 36, parágrafo único, c/c art. 40, inciso I, tudo do EAOAB) (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2000).

 

Ao concluirmos, temos que as regras deontológicas, dentro de um contexto profissional, são formadas por um conjunto de ordenamentos que norteiam a conduta do profissional. Aos advogados, as regras deontológicas estão presentes no Estatuto da OAB, em seus Regulamentos e no Código de Ética e Disciplina, tais regras constituem obrigações que devem ser cumpridas, a fim de se preservar determinadas condições e comportamentos por parte dos advogados, sendo que seu descumprimento gera sanção disciplinar ao que não observá-la.

 


3     INVIOLABILIDADE PROFISSIONAL DO ADVOGADO

 

 

Estudado a origem dos cursos de direito no Brasil e sua regulamentação, resta agora discursar sobre as questões relevantes que atingem o profissional. Neste trabalho monográfico nos deteremos em abordar a inviolabilidade e o sigilo profissional do advogado, dois institutos que muito se confundem na prática, mas que possuem diferenças fundamentais ao profissional da advocacia.

Para se compreender a inviolabilidade é necessário entender o caráter constitucional que é dado ao profissional da advocacia, para isso nos próximos capítulos abordaremos a definição e o conceito da inviolabilidade, o status constitucional da advocacia, o princípio da inviolabilidade jurídica e a inviolabilidade do profissional da advocacia, seja em seu local de trabalho ou de seus dados e comunicações.

 

 

3.1      DEFINIÇÃO E CONCEITO

 

 

Inviolabilidade é uma palavra de origem latina (inviolabilis) e significa que não se pode ou deve violar, juridicamente falando significa o “que está legalmente protegido contra qualquer violência e acima da ação da justiça” (FERREIRA, 2004), é uma prerrogativa que confere à certas pessoas e lugares isenção de ação da justiça.

Na advocacia o exercício profissional prestado pelo advogado constitui um múnus público, isto é, uma função pública, dada a essencialidade do serviço, e constitui, também, função social, pois desempenha importante serviço de organização e desenvolvimento da sociedade. Pellizzaro (1997, p. 31) bem define essa profissão:

 

[...] o advogado se caracteriza no livre exercício de sua atividade profissional como órgão que integra a ordem jurídica, de caráter privado indispensável ao atendimento das necessidades especiais da sociedade sendo inviolável por seus atos e manifestações nos limites da lei.

 

A inviolabilidade do profissional de advocacia é um direito que garante ao advogado, enquanto profissional que exerce um múnus público, a possibilidade de trabalhar com maior segurança. Constituindo-se, assim, mais uma garantia à sociedade que se vale dos serviços advocatícios do que uma garantia ao advogado propriamente dito.

Muito se tem discutido na mídia a respeito da inviolabilidade profissional do advogado, principalmente, no que tange seu local de trabalho e documentos ali guardados, e para melhor entender a posição pátria em relação ao tema se faz necessário um breve estudo de como esse instituto é tratado em países como a Alemanha, Itália, Portugal e Estados Unidos.

No direito alemão não existe uma regra explícita quanto ao tema, mas é proibida a apreensão de documentos oriundos de comunicação entre o advogado e cliente, a interceptação de conversas e a violação do segredo profissional, conforme disposto na Lei Processual Penal Alemã.

O Código de Procedimento Criminal Alemão trata da apreensão de documentos confiados a pessoas que devam manter sigilo, abrangendo especificamente as comunicações escritas entre acusado e advogado, as anotações que o advogado faz sobre matérias confiadas à ele pelo acusado e outros objetos que são abrangidos pelo direito de fornecer prova. Ressaltando-se que a limitação para apreensão somente ocorre se os objetos estiverem na posse real do advogado, excetuando-se os casos de suspeita de participação na conduta criminosa ou de receptação.

O Código de Processo Penal, o Código de Processo Civil e a Lei Profissional do Advogado Italiano definem os critérios das prerrogativas profissionais de forma a proteger mais os profissionais (incluindo seu local de trabalho) do que seus clientes.

A busca e apreensão em escritórios de advogados italianos somente são permitidas quando o advogado estiver sendo processado, ou se houver ordem para descobrir traços ou outras evidências materiais de crimes, ou quando houver ordem para busca de coisas ou indivíduos que estejam especificados no mandado. Observando-se que os documentos somente podem ser analisados se constituírem corpo de delito e a diligência deve ser acompanhada pelo Presidente ou Conselheiro dos representantes dos advogados locais.

Há ainda previsão da obrigação e do direito de testemunhar revelando informações adquiridas em conexão com a profissão, capitulando como crime a divulgação do segredo profissional (AZAMBUJA, 2005, p. 6).

Em Portugal também existem previsões expressas na legislação a cerca de interceptação e gravação de conversas ou comunicações entre o acusado e seu defensor, excepcionando os casos em que exista fundadas razões que as constituam como objeto ou elemento de crime. Do regramento Português temos:

 

CPP, art. 180, nº. 2 – Nos casos referidos no numero anterior [apreensão operada em escritório de advogado ou em consultório médico] não é permitida, sob pena de nulidade, a apreensão de documentos abrangidos pelo segredo profissional, ou abrangidos por segredo profissional médico, salvo se eles mesmos constituírem objecto ou elemento de um crime.

 

Além do Código de Processo Penal a Lei Profissional Portuguesa, correspondente ao EOAB no Brasil, também trata do sigilo profissional de documentos e outros materiais relacionados direta ou indiretamente ao sigilo (Lei Profissional Portuguesa, art. 81, nº. 4), proibindo, inclusive, a apreensão de correspondências trocadas entre advogados e clientes, ou aqueles que lhes tenha solicitado parecer, ainda que não o tenha dado ou já recusado (Lei Profissional Portuguesa, art. 60).

Investigações em escritórios de advocacia somente podem ser feita com um mandado, devendo a diligência ser presidida por um juiz na presença do advogado investigado e de um representante da Ordem dos Advogados.

Outra legislação que trata do assunto é a Norte Americana, que se refere ao tema como privilege attorney client, que “significa, resumidamente, a liberdade de não ser obrigado a fornecer provas para instruir processo judicial, em situação que, normalmente, essa obrigação aparece”[1].

Azambuja (2005, p. 1) cita o doutrinador Sullivan (para demonstrar as hipóteses a que se aplica o privilégio:

 

o afirmado detentor do privilégio é ou irá tornar-se um cliente; (2) a pessoa para quem a comunicação é feita (a) é um advogado ou seu subordinado e (b) em conexão com a comunicação está agindo como advogado; (3) a comunicação está relacionada com um fato que está sendo informado (a) pelo cliente (b) sem a presença de estranhos (c) com o propósito de assegurar em primeiro lugar (i) uma opinião jurídica ou (ii) serviços jurídicos ou (iii) assistência em procedimentos legais e não (d) com o propósito de cometer um crime ou ilícito civil e (4) o privilégio foi invocado e não abdicado pelo cliente[2].

 

As exceções são as circunstâncias em que a atuação do advogado ultrapassa o âmbito da simples assistência jurídica, passando a atuar este como co-autor ou partícipe de ações que visem um ilícito.

 

É claro e óbvio que a finalidade do privilégio é proteger a tutela do segredo e confiança entre o advogado e seu cliente, de modo que somente possa ser rompida essa proteção caso haja o que os norte-americanos chamam de “razoável relação” entre a o crime/fraude e a comunicação entre o advogado e o cliente. De qualquer forma, a parte que invoca um privilege deve provar a ocorrência de seus elementos essenciais  (AZAMBUJA, 2005, p. 2).

 

A jurisprudência norte americana também tem acatado a tese de que perde o sentido de privilege se o próprio cliente divulgar a terceiro o conteúdo das comunicações com seu advogado.

No Brasil a primeira lei a abordar a inviolabilidade do advogado, protegendo-o das possíveis ofensas que podem ser ditas no calor da discussão em juízo, foi o Código Penal de 1940 em seu artigo 142, inciso I:

 

CP, art. 142 - Não constituem injúria ou difamação punível:

I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador;

 

Posteriormente, dando-se ao advogado o ‘status’ de função pública (ou múnus público) a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 133, expressamente referenciou a inviolabilidade profissional do advogado:

 

Art. 133 - O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

 

Além disso, a Constituição Federal trouxe em seu artigo 5º inciso LVII o princípio da presunção de inocência, prevendo que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo; e os princípios da inviolabilidade domiciliar (inciso XI) e de correspondências (inciso XII) visando maior segurança jurídica aos procedimentos investigativos não só contra o advogado, mas, principalmente, em relação a todo cidadão.

Visando regulamentar o disposto na Constituição e para garantir o pleno desempenho da atividade advocatícia o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil trata da inviolabilidade logo no artigo 2º onde é assegurado ao advogado, no exercício da profissão, a inviolabilidade de seus atos e manifestações[3]. E ainda no capítulo que trata dos direitos do advogado dá mais ênfase ao tema, assim dispondo:

 

EAOAB, Art. 7º - São direitos do advogado:

II - ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca ou apreensão determinada por magistrado e acompanhada de representante da OAB;

 

A inviolabilidade por atos e manifestações ocorre de forma interna, atuando no âmbito dos processos e tribunais, bem como de forma externa, em seu local de trabalho ou onde estiver desempenhando o papel de advogado, em outras palavras, compreende: seu escritório ou local de trabalho, seus arquivos e dados, suas correspondências e comunicações.

A inviolabilidade abrange a imunidade profissional, a proteção ao sigilo profissional e a proteção aos meios de trabalho.

Segundo Ramos (2001, p. 112), a imunidade profissional pode ser entendida como a garantia da liberdade de expressão do advogado. Está prevista no parágrafo 2º do artigo 7º do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB):

EAOAB, § 2º, art. 7º – O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, a difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.

 

Desta forma, ao advogado também se assegura a possibilidade de autocrítica, respeitando-se os limites da liberdade que lhe é concedida para os fins de fazer atuar o Direito, e buscar a Justiça.

Ramos (2001, p. 112) sabiamente traz o apontamento de Soler para complementar o conceito de imunidade profissional, que assim diz:

[...] na realidade, seria difícil, senão impossível, conciliar o princípio constitucional da ampla defesa com ressalvas e limitações que, afinal, acabariam por anular o próprio mandamento supremo.

 

Além da imunidade profissional, a inviolabilidade compreende a proteção ao sigilo profissional que se refere aos fatos dos quais o advogado toma conhecimento ou às confidências que lhes são feitas no exercício de sua profissão, devendo este, também, guardar segredo quanto aos documentos que lhes são confinados e ao que sabe através do conteúdo dos mesmos. O sigilo profissional será explanado, de foram mais contundente, no próximo capítulo.

Outra conseqüência da inviolabilidade é a proteção aos meios de trabalho, que abrange seu escritório ou local de trabalho, seus arquivos e dados, suas correspondências e suas comunicações, incluindo-se nesse quesito as telefônicas, os e-mails, os fax, etc. Apreciando o tema, o Dr. Milton Basaglia, assim se manifestou:

ESCRITÓRIO - INVIOLABILIDADE DO LOCAL – EXTENSÃO. O advogado tem, como direito intocável, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins. O direito à inviolabilidade se estende a todos os meios e instrumentos de trabalho profissional, onde quer que eles se encontrem, ainda que em trânsito. Inclui, portanto, na hipótese dos advogados de empresa, aqueles situados no domicílio ou sede de seu constituinte ou assessorado (...). (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 1996).

 

Tanto cuidado ao assegurar o direito de inviolabilidade dos advogados se dá em função de garantias constitucionais como a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal que, em nome das partes conflitantes, devem ser resguardados. Nos dizeres de Pellizzaro (1997, p. 32):

Estas prerrogativas [inviolabilidade do advogado] que representam a necessária proteção decorrem do fato de que o profissional do direito milita em área de notória turbulência social intermediando o interesse conflitante das partes justificando-se por isso a proteção especial prevista em lei.

 

Concluindo, a inviolabilidade profissional é uma garantia que o advogado tem onde estão legalmente protegidos contra qualquer ato que os impeça efetivamente de exercerem sua profissão com segurança.

 

 

3.2      STATUS CONSTITUCIONAL DA ADVOCACIA

 

 

A profissão de advogado tem acento constitucional no artigo 133, que o considera indispensável à administração da justiça e, por isso, tem ele responsabilidades além das estritamente privativas, por ser um prestador de serviço de interesse coletivo e seus atos constituírem um múnus público, tem maior responsabilidade perante a sociedade que anseia pelo total cumprimento de seus direitos.

CRFB/88, art. 133 - O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.

 

O múnus público da advocacia está na importância que constitui seu encargo, transcendendo a atividade privada e tendo como finalidade o bem comum.

Esse dispositivo constitucional dá ao advogado um status que exige do profissional, no exercício da profissão, plena observação da lealdade processual, da ética, da boa-fé e da legalidade. Para Grinover (1196, p. 220):

 

O advogado aparece como integrante da categoria dos juristas, tendo perante a sociedade a sua função específica e participando, ao lado dos demais, do trabalho de promover a observância da ordem jurídica e o acesso dos seus clientes à ordem jurídica justa.

 

Não existe outro profissional que tenha o mesmo status, que se desdobra no compromisso assumido com a coletividade, que excede os deveres corporativos de defesa da cidadania. O status constitucional é uma prerrogativa que garante o direito do cliente quando, por exemplo, se exige, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, que se respeite a inviolabilidade do local de trabalho do advogado, bem como de seus dados e comunicações.

Verifica-se, também, essa prerrogativa de defender a cidadania quando se confere aos advogados o direito de se comunicar com seus clientes, pessoal e reservadamente, ao se acharem presos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que incomunicáveis. O mesmo se dá com o ingresso livre dos advogados nas prisões, ainda que fora do horário de expediente, são mais os direitos do cliente que se quer resguardar do que um ato próprio, é a busca pela efetividade da justiça.

Vale ressaltar que essa inviolabilidade não é total, já que só é válida para os atos e manifestações do advogado durante o exercício profissional e dentro dos limites da lei. Pasold (2001, p. 70) diz que os limites da lei são de duas ordens: os da lei em sentido genérico, que abrange todos os dispositivos jurídicos (civil, penal, tributário, administrativo, etc.); os da lei em sentido específico, que são estabelecidos pela Lei 8.906/94.

Além da questão de inviolabilidade para prestação de serviços, o texto constitucional traz outro ponto importante a ser destacado que é a indispensabilidade do advogado à administração da justiça, ou seja, salvo exceções de lei, qualquer processo judicial deve ser acompanhado de um advogado para que se dê maior segurança às partes em relação ao devido processo legal e a ampla defesa, preceitos também constitucionais que garantem a democracia. Nos dizeres de Pasold (2001, p. 68):

 

Apesar de algumas interpretações de ordem restritiva – raras, sejam as de ordem doutrinária, sejam as de ordem jurisprudencial -, é muito difícil não perceber que a intenção clara e precisa do legislador constituinte transformou-se em letra de redação incisiva, dispondo sobre o caráter essencial do Advogado para a Administração da Justiça.

 

Ramos (2001, p. 106) explica que a inviolabilidade:

 

É outra garantia ao pleno exercício profissional, cujo destinatário é menos o advogado, e mais a sociedade que se vale dos seus serviços. Com efeito, as garantias constitucionais de ampla defesa, contraditório, e devido processo legal, exigem mais do que a liberdade.

 

Assim, a advocacia é a única profissão que tem acento na Constituição Federal, em função da suma importância que representa na construção de um Estado Democrático de Direito, garante-se com isso a inviolabilidade de seus dados e comunicações, bem como, seu local de trabalho, o sigilo e a liberdade profissional no exercício de seu labor, que são necessários ao bom desempenho da função a ser exercida sempre no caminho da ética, da boa-fé e da legalidade na busca pelo bem comum.

 

 

3.3      PRINCÍPIO DA INVIOLABILIDADE JURÍDICA

 

 

A inviolabilidade, como já dito, é uma palavra de origem latina (inviolabilis) que juridicamente falando significa o “que está legalmente protegido contra qualquer violência e acima da ação da justiça” (FERREIRA, 2004), é uma prerrogativa que confere à certas pessoas e lugares isenção de ação da justiça.

Dessa forma, o conceito de inviolabilidade guarda a idéia de excepcionalidade, pois para que se configure a inviolabilidade é necessário antes que exista locais ou manifestações passíveis de violação, nos dizeres de Mamede (2003, p. 70):

[...] no conceito jurídico de inviolabilidade tem-se pressuposta a existência de um padrão anterior, devidamente estabelecido, já que dele é a exceção. Se alguns ambientes são invioláveis, isso pressupõe a existência de diversos outros nos quais o ingresso ou trânsito é livre; se algumas manifestações são invioláveis, outras estão há mercê das conseqüências habituais do Direito”.

 

A inviolabilidade constitui-se de situações em que se asseguram a vida, a liberdade de crença, a propriedade, a casa, etc., pois, via de regra, sustentam o Estado Democrático de Direito, já que, na sua maioria, são garantias fundamentais como o direito a vida, a assistência religiosa, a função social da propriedade.

Assim, pode-se dizer que a inviolabilidade está sempre relacionada a um direito maior que visa garantir o Estado Democrático de Direito, por exemplo, quando a Constituição diz que “a casa é asilo inviolável do individuo” (art. 5º, XI), na verdade o que se quer é salvaguardar a liberdade de relações familiares, a liberdade de domicílio.

Nos dizeres de Mamede (2003, p. 73):

 

O instituto da inviolabilidade traduz uma especialidade também no grau de proteção que é dado a uma situação, a revelar que o bem jurídico protegido é considerado muito valioso, que especial atenção lhe é dada pela ordem jurídica como forma de alcançar seus objetivos maiores.

 

A inviolabilidade não pode ser tratada como um privilégio, já que este traduz uma situação jurídica particular em que as normas são destinadas à pessoas certas, enquanto que a inviolabilidade não está vincula à pessoa, mas à situações. Destarte, não é o indivíduo que é inviolável, mas a situação a que ele está sujeito.

A Constituição Federal distingue algumas situações que são elevadas à condição de invioláveis, excluindo-as das rotinas jurídicas comuns, à título exemplificativo podemos citar o caput do artigo 5º que trata da inviolabilidade, dos brasileiros e estrangeiros residentes aqui, no que tange a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade.

Ao prever a inviolabilidade da vida a Constituição assegura tanto o direito de continuar vivo, quanto o direito de viver dignamente no que concerne a subsistência (MORAES apud MAMEDE, 2003, p. 76); a inviolabilidade da vida é pressuposto para outros direitos fundamentais, tais como a liberdade (seja ela de agir, de se locomover, de se reunir ou associar, de trabalhar, etc.) ou a igualdade (de crença, de raça ou cor, de sexo, etc.). Muitos outros são os direitos invioláveis, previstos constitucionalmente: a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (art. 5º, inc. X); a casa (inc. XI); as correspondências, as comunicações telegráficas, dados e comunicações telefônicas (inc. XII); etc.

Ao profissional da advocacia a inviolabilidade é o meio através do qual se pode resguardar a liberdade de expressão do advogado que é indispensável ao pleno desenvolvimento de suas funções; a inviolabilidade garante, acima de tudo, o sigilo profissional e protege os meios de trabalho do advogado. É em função da inviolabilidade que ocorre a exclusão da punibilidade em decorrência do cometimento de certos atos, nos dizeres de Pellizzaro (1997, p. 32):

 

A inviolabilidade exclui os crimes de difamação e de injúria capitulados pelos Arts. 139 e 140 do Código Penal, cometido pelo advogado no exercício da profissão quer por atos ou manifestações.

 

Importante destacar que a inviolabilidade somente existe como garantidor de um Estado Democrático de Direito e, sendo assim, subverter essa ordem é o mesmo que criar uma situação de privilégio de um (ou poucos) em detrimento de uma comunidade.

Para concluir, podemos dizer que a inviolabilidade é uma exceção a atos e manifestações que são passíveis de violação; a inviolabilidade está sempre relacionada a um direito maior que visa garantir a democracia e suas normas não estão vinculadas às pessoas, mas à situações, já que não se deve aplicar a inviolabilidade ao indivíduo, mas à situação à que ele está vinculado.

 

 

3.4      INVIOLABILIDADE NO EXERCÍCIO DA ADVOCACIA

 

 

Dada a importância da profissão do advogado a Constituição Federal expressamente menciona a indispensabilidade do advogado à Administração da Justiça e, com o fim de assegurar que essa justiça aconteça, dentro dos limites do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, é assegurado ao advogado sua inviolabilidade no exercício da advocacia. Assim, nos dizeres de Silva (2004, p. 582):

 

A inviolabilidade do advogado, prevista no art. 133, não é absoluta. Ao contrário, ela só o ampara em relação aos seus atos e manifestações no exercício da profissão, e assim mesmo, nos termos da lei. Equivoca-se quem pensa que a inviolabilidade é privilégio do profissional. Na verdade, é uma proteção do cliente que confia a ele documentos e confissões de esfera íntima, de natureza conflitiva e, não raro, objeto de reivindicação e até de agressiva cobiça alheia, que precisam ser resguardados e protegidos de maneira qualificada.

 

Sendo o advogado indispensável à Administração da justiça e pessoa imprescindível ao Estado Democrático de Direito tem assegurado a exceção aos seus atos e manifestações previstos tanto na Constituição Federal (art. 133) quanto na Lei 8.906/94 (art. 2º, § 3º), lei esta que disciplina a classe de advogados no Brasil. Contudo esta inviolabilidade não é absoluta, pois está restrita aos limites da lei.

Para Pasold (2001, p. 70) a inviolabilidade da advocacia se apresenta sob duas restrições: a primeira diz respeito a sua totalidade, já que somente abrange atos e manifestações do advogado no exercício da profissão, limitando-se à prática da advocacia; a segunda trata da limitação que é imposta por lei, seja ela em sentido genérico (estabelecida por dispositivos jurídicos de ordem civil, penal, administrativo, tributário, etc.) ou específico (aqueles estabelecidos na Lei 8.906/94).

Com o fim de se assegurar ao profissional da advocacia maior amplitude para exercer seu munus público o legislador o amparou, então, com a inviolabilidade, impondo limites jurídicos à inviolabilidade no exercício da advocacia, quais sejam: a boa-fé; a pertinência, técnica ou temática, e a proporcionalidade.

Para que se possam beneficiar da inviolabilidade é necessário que os advogados atuem de forma a assegurar a boa-fé, que é fundamental no que diz respeito à um preceito constitucional insculpido no artigo 1º, a dignidade da pessoa humana.

Boa-fé está diretamente ligada à intenção das pessoas na prática de determinados atos, nenhum ato pode desrespeitar a dignidade da pessoa humana, devendo os atos serem praticados de maneira adequada, sem fraude, sem intenção de prejudicar qualquer pessoa, com honestidade.

O princípio da boa-fé é apresentado pela doutrina sob duas formas: a objetiva e a subjetiva. Reale (2003, p.3) distingue a boa-fé objetiva da subjetiva dizendo que esta última corresponde a uma atitude psicológica, é uma decisão de vontade da parte que opta por agir ou não em conformidade com o direito; aquela, por sua vez, deve ser entendida como modelo de conduta que impõe diretrizes no trato negocial, em suas palavras:

Em primeiro lugar, importa registrar que a boa-fé apresenta dupla faceta, a objetiva e a subjetiva. Esta última – vigorante, v.g., em matéria de direitos reais e casamento putativo – corresponde, fundamentalmente, a uma atitude psicológica, isto é, uma decisão da vontade, denotando o convencimento individual da parte de obrar em conformidade com o direito. Já a boa-fé objetiva apresenta-se como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e leal. Tal conduta impõe diretrizes ao agir no tráfico negocial, devendo-se ter em conta, como lembra Judith Martins Costa, “a consideração para com os interesses do alter, visto como membro do conjunto social que é juridicamente tutelado”. Desse ponto de vista, podemos afirmar que  a boa-fé objetiva se qualifica como normativa de comportamento leal. A conduta, segundo a boa-fé objetiva, é assim entendida como noção sinônima de “honestidade pública”.

 

Dessa mesma forma, afirma Cruz (2008, p.1):

 

A “boa-fé subjetiva” é elemento do suporte fático de alguns fatos jurídicos; é fato, portanto. A boa-fé objetiva é uma norma de conduta: impõe e proíbe condutas, além de criar situações jurídicas ativas e passivas.

 

De qualquer sorte, a boa-fé exige que a pessoa, quer em juízo, quer fora dele, tenha sua conduta examinada dentro de um conjunto concreto de circunstâncias em cada caso, não podendo o juiz dizer quem age ou não com boa-fé sem colher elementos suficientes a comprovar o ato, nos dizeres de Mamede (2003, p. 86):

 

A aplicação da regra, todavia, exige do jurista redobrado cuidado e virtude exegética (bonus iudex), evitando erros que podem produzir efeitos nefastos sobre a pessoa. Esses erros podem manifestar-se tanto na investigação subjetiva, quanto na investigação objetiva do ato. No plano subjetivo, é fundamental que a afirmação de ilicitude do ato jurídico por má-fé seja cuidadosa, arrolando elementos que suficientemente comprovem a assertiva, tal qual exigido pelo artigo 93, IX, da Constituição Federal. É preciso não cair no vício da opinião, não deixar-se levar pelo império do achismo irresponsável. Deve-se cuidar para que o exame da finalidade do agir jurídico seja cauteloso, calçando-se em elementos concretos que permitam descortinar a intencionalidade de forma mais segura possível, impedindo que a aplicação da lei seja instrumento de injustiça.

 

A fim de se assegura com maior eficácia a justiça, além de estar pautado na boa-fé o advogado deve atuar de forma pertinente com a causa que trabalha. A pertinência exigida é de dois tipos: técnica e temática.

A pertinência técnica está relacionada ao efetivo exercício da advocacia, em outras palavras, significa dizer que os atos ou manifestações praticados pelo advogado deve estar diretamente relacionado com a causa que ele trabalha. A pertinência temática, por sua vez, relaciona-se com o ato ou argumento versado. Mamede (2003, p. 87-90) distingue os dois tipos de pertinência em função relação com a forma ou meio e objeto da demanda, assim diz:

 

Por pertinência técnica tem-se a adequação do meio aos fins a que, pretensamente, se destinaria o ato ou manifestação.

[...]

Como se não bastasse a necessidade de pertinência técnica, faz-se necessário, ainda, haver pertinência temática, vale dizer, que o ato ou argumento manejado, não obstante guarde pertinência de forma e meio, esteja efetivamente relacionado com o objeto da demanda, ou seja,  com a causa do que se pede e o que é discutido no feito.

 

Dessa maneira, não pode o advogado querer beneficiar-se da inviolabilidade quando debate sua causa na rua ou na imprensa (pertinência técnica) ou, ainda, quando alega algo que não está em discussão ou ofende o juiz da causa. Nesse ínterim decisão do Tribunal de Ética de Santa Catarina:

 

Advogado. Inviolabilidade e Imunidade Judiciária. Limites. (art. 133 da Constituição Federal e § 2° do art. 7°, do Estatuto da Advocacia e da OAB Lei 8.906/94). A invocação da imunidade constitucional e a deferida no próprio estatuto é submetida aos limites da lei. O advogado que utiliza linguagem excessiva e desnecessária, fora dos limites razoáveis da discussão da causa e da defesa de direitos, fere as regras deontológicas. Perpetração de ofensa de ordem pessoal ou moral. Impropriedade dos termos através de expressões truculentas e ofensivas. Ferimento do dever de urbanidade. Cometida a infração ética. Decisão por maioria de votos. (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2002a).

 

Além da boa-fé e da pertinência, técnica e temática, é necessário que o advogado haja com certa proporcionalidade nos seus atos e manifestações, pois os excessos podem caracterizar uma ofensa, nos dizeres de Mamede (2003, p. 90):

 

A narrativa de fatos pertinentes à demanda, ainda que negativa à reputação, à dignidade ou ao decoro, não constituirá delito se construída adequadamente, no plano da discussão jurídica.

 

Neste sentido recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

 

DIREITO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. IMPUTAÇÃO, EM PEÇA PROCESUAL, DOS CRIMES DE PREVARICAÇÃO E ABUSO DE AUTORIDADE AO JUIZ. ADVOGADO. INVIOLABILIDADE. LIMITES. - O advogado goza de uma situação jurídica de liberdade, necessária à sua função combativa contra quem quer que viole o ordenamento jurídico, inclusive quando age em detrimento das decisões e normas emanadas do próprio Estado, sem que seja legítima ou legal qualquer possibilidade de perseguição, tanto na esfera penal quanto na civil. - Esta inviolabilidade, contudo, não é absoluta. O art. 133 da CF recepcionou e incorporou o art. 142, I, do CP, e, de conseqüência, situou a inviolabilidade no campo da injúria e da difamação, não alcançando a calúnia. - Porém, também esta regra não é absoluta. Se as alegações imputadas de caluniosas estiverem no contexto da defesa dos interesses e direitos do constituinte em juízo, havendo boa-fé, evidencia-se a ausência de dolo, razão pela qual não há crime, tampouco responsabilidade civil por danos morais. - Na espécie, constata-se que inexistiu imputação direta de crime ao Juiz. As afirmações surgiram no encadeamento de idéias da peça recursal, com o claro intuito de reforçar a alegação de que o Juiz vinha desrespeitando decisão do Tribunal, fato esse que, se confirmado, implicaria inclusive no provimento do recurso. Tratou-se, se tanto, de forma impolida de expressão, mas que constitui excesso admissível no cotidiano forense. Recurso conhecido e provido (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2008.

 

De toda sorte, temos que deixar claro que a inviolabilidade assegurada aos advogados está limitada aos seus atos e manifestações e à lei. Além de estar em conformidade com a lei os atos e manifestações devem ser praticados com boa-fé, pertinência e proporcionalidade, sob pena de não se aplicar á esse profissional a regra da inviolabilidade.

 

 

3.5      INVIOLABILIDADE DOS ESCRITÓRIOS E DAS COMUNICAÇÕES

 

 

O advogado não é inviolável apenas por seus atos e manifestações, tem também assegurado seu escritório e suas comunicações. Essa inviolabilidade do escritório e de comunicações é fundamental para garantia do sigilo profissional e da liberdade profissional.

A Constituição Federal prevê entre os direitos fundamentais a inviolabilidade de domicílio e de comunicações (CF, art. 5º, inc. XI e XII), com o fim de assegurar a liberdade individual e privacidade de cada cidadão, não seria menos cuidadosa ao assegurar para o advogado a inviolabilidade de seu escritório e comunicações, já que este é o principal agente na construção da cidadania, por isso em seu artigo 133 o coloca como indispensável à administração da justiça e inviolável por seus atos e manifestações.

Além de inviolável por seus atos e manifestações, como previsto constitucionalmente, o advogado, segundo a Lei 8.906/94 em seu artigo 7º, inciso II, é inviolável em seu escritório, ou local de trabalho, estendendo-se essa inviolabilidade aos seus arquivos e dados, correspondências e comunicações telefônicas ou afins.

Ressalte-se aqui que a referida Lei 8.906/94 sofreu recente alteração no dispositivo que trata da inviolabilidade dos escritórios e comunicações, sendo que para melhor compreensão do tema essas alterações serão apresentadas posteriormente, por hora temos que compreender o significado das expressões escritórios ou local de trabalho e comunicações.

Quando a lei prevê a inviolabilidade do local de trabalho, garante-se a inviolabilidade de qualquer ambiente em que o advogado esteja a trabalhar, Mamede (2003, p. 193) assim explica à esse respeito:

 

É preciso estar atento para o alcance da previsão. Quando o legislador fala em escritório ou local de trabalho, cria uma referência ampla: não interessa qual seja o local onde o advogado trabalhe, ele é considerado inviolável. Pode ser todo um prédio, um andar, uma sala ou um conjunto de salas, um ambiente em sua casa ou em casa alheia ou, até, ambientes ou locais que estejam localizados em prédios de empresas ou outros clientes. Dessa maneira, se o advogado tem uma sala na empresa para a qual trabalhe (como autônomo ou como empregado), essa sala é inviolável, se o advogado tem uma única e singela mesa, disposta no escritório ou em qualquer outro lugar pertencente a outrem, seja ou não seu cliente, essa mesa é inviolável.

 

E, na mesma página, continua ensinando sobre a inviolabilidade dos arquivos e dados do advogado, que devem ser invioláveis onde quer que ele se encontre:

 

[...] considerando que o legislador ainda se referiu à inviolabilidade de seus arquivos e dados, estarão eles acobertados pela regra em todo e qualquer ambiente e situação que se encontrem. Pode-se, conseqüentemente, compor um sem-números de situações: a pasta ou bolsa onde são carregados seus documentos e anotações, o carro onde estes são transportados, sua casa ou de parentes (desde que ali trabalhe ou guarde qualquer elemento de trabalho), entre outras tantas.

 

A garantia constitucional e legal da inviolabilidade de arquivos e dados abrange, inclusive, o computador utilizado pelo advogado para trabalhar. E, segundo o texto de redação da Lei 8.906/94, prevê-se ainda a inviolabilidade “de suas correspondências e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins”, com a finalidade de se ter maior liberdade na defesa da cidadania. Nesse sentido, comentário de Busato (2006, p. 19):

 

É o direito do cliente que está em pauta, quando se exige, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, que se respeite a inviolabilidade do local de trabalho do advogado, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas e afins, salvo em caso de busca ou apreensão determinadas por magistrado.

 

Com a nova redação dada pela Lei 11.767, de 07 de agosto de 2008, o artigo 7º, inciso II do Estatuto da Advocacia, assegura-se ao advogado não apenas a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, mas de forma clara, prevê a inviolabilidade “de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática (mensagens via e-mail), desde que relativas ao exercício da advocacia”.

Essa nova redação não deixa margens à possíveis violações que podiam ser feitas em razão de omissão na norma estatutária, restringindo a permissão da quebra da inviolabilidade quando se tratar de busca e apreensão cujo objetivo seja apreender elementos de prova de um suposto crime cometido pelo próprio advogado ou com a participação dele.

Assim, nos parágrafos 6º e 7º da Lei 11.767/08 aborda-se as possibilidades de quebra da inviolabilidade e a forma de cumprimento do mandado de busca e apreensão:

L. 8.906/94, art. 7º, § 6º - Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes.

L. 8.906/94, art. 7º, § 7º - A ressalva constante do § 6o deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade.

 

Antes dessa nova redação o que se previa era apenas a necessidade de busca e apreensão determinada por magistrado, sem ter, inclusive, o cumprimento do mandado que ser acompanhado por representante da OAB, esse poder atribuído ao magistrado enfraquecia a inviolabilidade do advogado igualando-a a de qualquer outro domicílio (CF, art. 5º, XI) ou comunicação (CF, art. 5º, XII), que é relativa, ou seja, para ser quebrada basta que o juiz a autorize.

O que distinguia a inviolabilidade dos escritórios de advocacia e dos domicílios ou comunicações era o bem tutelado: na inviolabilidade dos domicílios o que se quer proteger é o direito de propriedade, nas comunicações é a liberdade individual e a privacidade de cada cidadão, enquanto que na inviolabilidade dos escritórios de advocacia o que se previa era o resguardo do sigilo profissional e a liberdade de defesa. Assim, explica Lopes (2008, p. 1):

 

É que o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei 8.906/94) dispunha (antes de viger a Lei 11.767/08) ser inviolável o local de trabalho do advogado, até que um magistrado não autorizasse a busca e apreensão no local (art. 7º, II). Esse poder atribuído ao juiz enfraquecia a inviolabilidade do local e o igualava a qualquer outro domicílio (CF, art. 5º, XI), cuja inviolabilidade é relativa.

Muito embora a inviolabilidade dos escritórios de advocacia e dos domicílios em geral fosse a mesma (pois violáveis por decisão judicial), as essências dessa quase blindagem eram e continuam sendo distintas. Enquanto que a inviolabilidade dos domicílios em geral visa resguardar o direito de propriedade, a inviolabilidade dos escritórios de advocacia visa assegurar a liberdade de defesa e do sigilo profissional do advogado, muito embora a inviolabilidade antes prevista não prestasse a isso

 

Esse tipo de busca e apreensão era muito genérica e deixava margens à invasão de dados sigilosos de clientes que nada tinham a ver com o objeto da demanda investigada, pois a decisão judicial não delimitava as situações em que essa inviolabilidade poderia ocorrer, muito menos quais os objetos ou documentos poderiam ser apreendidos. Portanto essa inviolabilidade prevista no inciso II do artigo 7º do Estatuto em nada garantia a liberdade de defesa e do sigilo profissional do advogado, pois autorizava-se a busca de provas para incriminar o cliente investigado e, conseqüentemente, outros clientes que nada tinham a ver com a investigação tinham seus documentos ou objetos também violados.

Lopes (2008, p. 1-2) explica que situações como essas demonstravam a existência de falha na norma que afrontavam não apenas o direito a liberdade de defesa e do sigilo profissional, mas também a imagem do próprio advogado, já “que na visão dos maus informados, ele era o investigado, quando na verdade, através dele se investigava outrem”.

Por fim, vale ressaltar que com a redação da nova lei, os juízes não poderão autorizar violações aos escritórios de advocacias, bem como aos instrumentos de trabalho do advogado (incluindo as comunicações telefônicas e afins), sem que o investigado seja o próprio advogado e para garantir ainda mais, quando a busca e apreensão for decretada não poderá divulgar informações dos clientes, sob pena de se considerar ilícita a prova. Dessa forma, os postulados constitucionais da ampla defesa e da indispensabilidade do advogado à administração da justiça estão garantidos de forma mais eficaz.

 

 

 

 


4     SIGILO PROFISSIONAL NA ADVOCACIA

 

 

Discorrido sobre o instituto da inviolabilidade, resta estudar o sigilo profissional do advogado, outro instituto muito importante no dia-a-dia do advogado que deve sempre ser respeitado.

Neste capítulo vamos especificar o sigilo profissional, definindo e conceituando o termo, entendendo as determinações éticas do sigilo e os casos em que se excepciona a regra para se permitir que esse sigilo possa ser quebrado.

 

 

4.1      DEFINIÇÃO E CONCEITO

 

 

O “segredo” de modo geral é entendido como aquilo que se quer ocultar, conseqüentemente, tudo aquilo que é notório, de conhecimento público ou não tiver caráter oculto não pode ser considerado segredo.

Carlos (2004, p. 2) explica que o conceito legal de segredo se compõe pelo elemento fático e normativo e os ilustra da seguinte forma:

 

O primeiro traduz-se na circunstância de dever tratar-se de facto(s) desconhecido(s) da generalidade das pessoas e que, conseqüentemente, não seja(m), sem mais, acessíveis a qualquer um.

O segundo significa que, a coberto do segredo, estão factos em relação aos quais a pessoa a quem respeitem tenha um interesse objectivamente fundado na sua reserva.

 

Assim, o segredo profissional somente existe quando o que se quer ocultar não é notório e tão pouco de conhecimento público, devendo o transmitente ou terceiro ter interesse na sua confidencialidade.

O dever de guardar segredo, existente entre as diversas classes profissionais do mundo, significa sigilo profissional. Exemplo claro de sigilo profissional está entre os médicos que têm em seu Código Deontológico da Ordem dos Médicos (CDOM) no Capítulo V do Título II vários dispositivos que tratam do assunto, a destacar o artigo 68[4] que aborda no âmbito do segredo profissional a preservação da intimidade de pessoas, evitando prejuízo ou dano à integridade moral destas. Abrange, o dever de sigilo, todos os fatos que tenha chegado ao conhecimento do médico no exercício de seu trabalho, ou em função dele, existindo obrigação de segredo quer o serviço solicitado tenha, ou não, sido prestado e quer seja, ou não, remunerado. Saliente-se que o dever de sigilo profissional do médico está restrito à necessidade de preservação da intimidade do paciente, não podendo ser utilizado como meio de ocultar informações necessárias à procedimentos investigatórios que pretendam apurar a prática de crime

Outro ramo onde comumente nos depaRamos com o dever de sigilo é a contabilidade. Os contadores estão obrigados à manter segredo sobre o que souberem em razão do exercício profissional lícito, conforme disposição do inciso II do artigo 2º do Código de Ética do Contabilista (CEC)[5]:

Sá (2008, p. 2), ao comentar o assunto diz que o trabalho do contador se pauta na confiança e isto exige sigilo, “trata-se de uma condição de respeito humano, de dignidade do ser”. Ressalte-se que o resguardo do interesse do cliente não significa conivência para o errado e nem conluio para a fraude.

Já na advocacia, o sigilo profissional é um dever deontológico fundamental ao qual o advogado se obriga, constituindo ponto essencial de sua atividade e condição de plena dignidade, Carlin (2005, p. 167) assim o define:

 

[...] Podemos definir segredo como sendo tudo que o cliente manifesta ao advogado em tom de confidência e que deve sempre ser resguardado para que o profissional possa gerar uma segurança indispensável ao seu cliente e deva ter nele a certeza de que seus segredos estarão a salvo de divulgação em qualquer situação.

 

Dessa forma, sendo a relação entre cliente e advogado pautada na confiança que um deposita no outro, não se pode conceber o patrocínio de qualquer causa sem esse pressuposto. Carlos (2004, p. 3) a esse respeito, sabiamente, coloca que “o segredo é o ‘preço’ que o Advogado tem de pagar pela confiança que nele é depositada pelo cliente”.

Mamede (2003, p. 361) explica que o sigilo é inerente à profissão do advogado, assim como os médicos, os psicólogos, os químicos e tantos outros profissionais estão obrigados à guardar segredo, o advogado também está. O ilustre doutrinador ainda elucida que o advogado deve preservar toda a informação que adquirir em razão de seu ofício, ainda que em depoimento judicial (CED, art. 26).

Desse modo, o segredo profissional do advogado se refere aos fatos dos quais toma conhecimento ou às confidências que lhes são feitas no exercício de sua profissão. Sendo também obrigado a guardar segredo quanto aos documentos que lhes são confinados e ao que sabe através do conteúdo dos mesmos. Assim preleciona o referido autor:

 

[...] Esse dever [de sigilo] alcança tanto os fatos que tenham sido narrados pelo cliente para o profissional, como também por expressa disposição do artigo 27, parágrafo único do Código de Ética, “as comunicações epistolares entre advogado e cliente”. Deve-se acrescentar, por óbvio, todo e qualquer elemento que tenha sido confiado ao causídico e cuja divulgação exponha a intimidade do cliente, sem a autorização deste: fitas cassete, fitas de vídeo, documentos, etc. (MAMEDE, 2003, p. 362)

 

Com isso, temos que a simples presença física do cliente no escritório do advogado enseja o dever de sigilo profissional, não dependendo de pedido expresso pelo cliente, pois, sempre que a natureza dos fatos não for de notório conhecimento e tenha relevância, o advogado está obrigado a guardar segredo. Nos dizeres de Carlos (2004, p. 3):

O segredo pode ter a sua génese na vontade do depositante, ou, na própria natureza do facto confiado. Significa isto que em determinadas situações, a existência da obrigação de guardar segredo não depende do pedido de confidência expressamente formulado pelo cliente ao Advogado. Mesmo que este pedido não haja sido formulado, o Advogado está obrigado a guardar segredo, sempre que a natureza dos factos revelados assim o justifique. Aliás, note-se, o sigilo principia logo pelo “facto” da simples presença física do cliente no escritório do Advogado.

 

Essa obrigação de guardar segredo não está limitada a um determinado período, se prolongando no tempo de forma indefinida, conforme preleciona o doutrinador Mamede (2003, p. 362):

 

Não há dever de sigilo apenas na Constancia da prestação do serviço. Ao contrario, prolonga-se no tempo, indefinidamente, assim como prolonga-se no espaço: o que se ouviu, em virtude da condição de advogado (o que não se limita às conversas com o cliente ou constituinte) deve ser preservado.

 

E vai além da obrigação para com o cliente ou constituinte, estendendo-se à outras confidências feitas por adversários, colegas ou terceira pessoa:

 

Esta obrigação é vinculativa DURANTE e DEPOIS do patrocínio, ou da prestação dos serviços requerida e estende-se às confidências dos clientes, às do adversário, às dos colegas, às que resultam de entrevistas para conciliar ou negociar, às de terceiras pessoas -- desde que feitas ao Advogado NO EXERCÍCIO DA SUA PROFISSÃO -- bem como aos documentos confidenciais ou íntimos confiados ao Advogado. (RIBEIRO, 2003)

 

A natureza da jurídica do sigilo profissional, nessa seara, transcende um dever de natureza puramente contratual (estabelecido entre cliente e advogado), assumindo natureza pública, já que representa uma obrigação que atinge o cliente, outros advogados, a Ordem e a comunidade como um todo: “trata-se de um manifesto interesse público, diretamente ligado à função de Advogado como servidor da Justiça” (CARLOS, 2004, p. 4)

O sigilo profissional, enquanto preceito de natureza pública, é regulamentado pela Constituição Federal (art. 5º, inc. XII e XIV), pelo Código Civil (art. 144) e Processo Civil (art. 363), pelo Código Penal (art. 154), pelo Estatuto da OAB (art. 34), entre outros ordenamentos.

O dispositivo constitucional trata do sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e afins, excepcionando-se a comunicação telefônica que pode ser violada se fundada em ordem judicial para investigação criminal ou instrução processual penal. Nesse dispositivo (CRFB, art. 5º, XII) o legislador resguarda a liberdade de manifestação do pensamento e o direito à intimidade do indivíduo. Nos dizeres de Silva (2004, p. 436):

 

Trata-se de garantia constitucional que visa assegurar o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e telefônicas (art. 5º, XII), que são meios de comunicação interindividual, formas de manifestação do pensamento de pessoa a pessoa, que entram no conceito mais amplo de liberdade de pensamento em geral (art. 5º, IV). Garantia também do sigilo das comunicações de dados pessoais, a fim de proteger a esfera intima do indivíduo.

 

Além de resguardar a liberdade de manifestação do pensamento e o proteger a esfera íntima da pessoa, a Constituição no artigo 5º, inciso XIV, também enumera como sendo inviolável o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional, como meio da se assegurar a liberdade de informação. Silva (2004, p. 245) explica que, nesse caso, a intenção do legislador é resguardar o direito do jornalista ou comunicador social de não informar a fonte da notícia divulgada.

E a Constituição resguarda, ainda, o segredo profissional, obrigando quem exerce uma profissão regulamentada a guardar segredo com fidelidade (MONRREAL apud SILVA, 2004, p. 207).

O Código Civil e o Código de Processo Civil também abordam o segredo profissional, desobrigando os profissionais, vinculados ao sigilo, de depor sobre os fatos dos quais deva manter segredo, inclusive, podendo abster-se da apresentação de documentos ou coisas em juízo.

No Brasil não existe uma relação de profissões que estão vinculadas ao dever de sigilo, porém todas as que estão devem respeitar o disposto no artigo 154 do Código Penal[6], sob pena de serem responsabilizadas pelos danos causados advindos dessa revelação.

O Estatuto da OAB também garante o respeito ao sigilo profissional, através da inviolabilidade profissional consagrada no art. 7º, inciso II do Estatuto, do direito de conferência com qualquer cliente, conforme disposição do art. 7º, inciso III, e do direito de recusar-se a testemunhar em qualquer processo no qual interfira (art. 7º, XIX), constituindo infração disciplinar a violação, sem justa causa, do mesmo (EAOAB, art. 34). Ribeiro (2003) à esse respeito diz:

 

O assunto é largamente regulamentado no Estatuto da Advocacia e da OAB, que garante o respeito pelo sigilo profissional: inviolabilidade do escritório ou local de trabalho, de correspondência e comunicações, direito de conferenciar com qualquer cliente pessoal e reservadamente, mesmo se detidos ou presos ou mesmo se considerados “incomunicáveis” e a recusa de testemunhar, em processo no qual intervenha e sobre fatos relacionados com cliente ou ex-cliente, mesmo que com o consentimento do próprio, ou ainda sobre qualquer fato que considere profissionalmente sigiloso.

À semelhança do Direito Penal, também aqui a violação do sigilo profissional, consubstancia infração punível: (Art. 34) Constitui infração disciplinar violar, sem justa causa, sigilo profissional; (EOAB).

 

Dessa forma, constituindo o sigilo uma prerrogativa inerente à profissão, ela deve ser entendida, não como uma vantagem, mas como uma garantia de ordem pública que está, acima de tudo, ligada ao direito de ampla defesa de qualquer cidadão.

 

 

 

4.2      AS DETERMINAÇÕES ÉTICAS DO SIGILO PROFISSIONAL

 

 

Enquanto norma garantidora da amplitude de defesa o sigilo profissional trás em seu bojo algumas determinações éticas que devem ser estudadas, mas para tanto é necessário compreendermos o significado da palavra ética.

Ética são os princípios que guiam a conduta humana, é uma palavra de origem grega, “ethos”, e significa “modo de ser” ou “caráter”. Deve, portanto, ser pensada como o reflexo de atos da consciência, envolve a convicção e a vontade de quem age. Marilena Chaui (1999, apud KREMER, 2002, p. 14) ao definir ética diz que:

Para que haja conduta ética é preciso que exista o agente consciente, isto é, aquele que conhece a diferença entre o bem e o mal, certo e errado, permitido e proibido, virtude e vício. A consciência moral não só conhece tais diferenças, mas também reconhece-se como capaz de julgar o valor dos atos e das condutas e de agir em conformidade com os valores morais, sendo por isso responsáveis por suas ações e seus sentimentos e pelas conseqüências do que faz e sente. Consciência e responsabilidade são condições indispensáveis a vida ética.

 

Quando agimos conscientemente de forma correta, ou de acordo com o que a sociedade espera de nós estamos agindo de maneira ética, mas quando agimos de modo errado, ou contra os costumes da sociedade (ou comunidade), somos anti-éticos e, por isso, podemos ser punidos. É nesse contexto que surge a ética profissional, ou seja, o modo de ser, a conduta que os profissionais devem manter em relação ao desempenho de suas atividades.

Segundo De Plácido e Silva (1996, apud KREMER, 2002, p. 15) a expressão ética profissional é usada:

 

[...] para indicar a soma de deveres, que estabelece a norma de conduta do profissional no desempenho de suas atividades e em suas relações com o cliente e todas as demais pessoas com quem possa ter trato [...]. Em regra, ética profissional é fundada no complexo de normas, estabelecidas pelos usos e costumes, mas pode ser instituída pelos órgãos a que se defere autoridade para dirigir e fiscalizar a profissão.

 

Estas regras, normalmente, fazem recomendações de natureza moral, com o fim de levar os profissionais a agirem em conformidade com os princípios morais, e isso se dá através da deontologia.

A palavra deontologia vem do grego “Deon” ou “Deontos” e significa “o que fazer” e “Logos” que significa “tratado”, assim, “deontologia” pode ser traduzida como a “Ciência dos Tratados” (PINTO, 2006).

Nos dizeres de Costa (2003 apud PINTO, 2006) deontologia pode ser definida como sendo um conjunto de normas jurídicas onde a maioria tem conteúdo ético e regulam o exercício de determinada profissão.

A deontologia, segundo Carlin (ano, p. 43), é institucional e inerente à profissão:

Ela opera, por excelência, no campo profissional. Requer normas reagrupadas em textos, estatutos ou códigos, exigindo em seu estudo, noções de disciplina, falta e sanção, entendidas, coletivamente, posto que destinadas ao conjunto da profissão. Não raro ela se acha utilizada para designar ética profissional ou a moral no exercício de uma profissão, resultando da reflexão dos profissionais sobre sua prática. Mesmo quando impulsionada pelos poderes públicos, é uma autodisciplina.

 

Podemos, então, dizer que deontologia abrange as regras que regulam o exercício das profissões. E, no caso do advogado, deontologia pode ser entendida como o conteúdo de regras contidas no Código de Ética, onde se encontram as normas jurídicas reguladoras da conduta dos profissionais dessa área.

O sigilo profissional é um poder/dever deontológico fundamental, pois está entre as regras do Código de Ética e o seu descumprimento pode trazer graves e irreparáveis prejuízos aos seus constituintes.

Constitui poder o sigilo profissional, porque cabe somente aos advogados a avaliação e decisão de quebra desse sigilo, e é entendido como um dever porque constitui uma obrigação onde o interesse social está acima do interesse privado. Fernandes (2004 apud CARDELLA, 2005, p.  86) esclarece que os advogados são os únicos juízes da necessidade de violação do sigilo. Assim, conforme entendimento de Ramos (2001, p. 371):

 

A avaliação, pois, da justa causa, para fins de justificar a violação do sigilo profissional, implica na análise subjetiva de inúmeras possibilidades, todas elas lastreadas pelos princípios morais vigentes, o que exige do intérprete redobrada cautela. De modo geral, a justa causa é encontrada sempre que, no caso particular, o interesse social se destaca acima do interesse privado. E esta regra se justifica exatamente pela natureza pública da função desempenhada pelo advogado, que antes de tudo tem compromisso inarredável para com o interesse social.

 

Ser fiel ao cliente é um dever do advogado e, por isso, o Código de Ética lhe dá animus de direito, podendo o advogado invocar sigilo profissional ao recusar-se a prestar testemunho, conforme disposição do artigo 26 do CED[7].

Não se pode esquecer que a relação cliente/advogado é baseada na confiabilidade estabelecida e essa confiança, com certeza, deixa de existir quando há quebra do sigilo profissional, ainda que não traga prejuízos para qualquer das partes, a confiança estabelecida não mais se restituirá com a quebra do sigilo, além disso, tal atitude pode trazer desprestígio à classe.

O Ministro Cesar Asfor Rocha a esse respeito se pronunciou:

 

O sigilo profissional é exigência fundamental da vida social que se deve ser respeitado como princípio de ordem pública, por isso mesmo que o Poder Judiciário não dispõe de força cogente para impor a sua revelação, salvo na hipótese de existir específica norma de lei formal autorizando a possibilidade de sua quebra, o que não se verifica na espécie. O interesse público do sigilo profissional decorre do fato de se constituir em um elemento essencial à existência e à dignidade de certas categorias, e à necessidade de se tutelar a confiança nelas depositada, sem o que seria inviável o desempenho de suas funções, bem como por se revelar em uma exigência da vida e da paz social. (BRASIL, 1998)

 

Ademais, a constituição em seu artigo 5º, inciso LXIII diz que o indiciado, ou o acusado não pode ser compelido a fazer prova contra si mesmo. Tem, portanto, o direito de permanecer calado. Essa regra não seria válida se o advogado fosse obrigado a trazer elementos para a condenação de seu constituinte, quebrando a garantia constitucional do silêncio, podendo ainda criar um clima de desconfiança entre a parte e seu procurador, o que acaba por violar uma garantia constitucional de ampla defesa (MAMEDE, 2003, p. 231).

O sigilo profissional não abarca apenas o poder, que abrange suas determinações éticas, mas também inclui deveres, quais serão discutidos à seguir.

 

 

 

 

 

 

4.3      DEVER DO SIGILO

 

 

O dever de guardar sigilo é algo antigo nas profissões. A referência mais próxima e clássica é o juramento de Hipócrates, o maior médico da Antigüidade, que jurou conservar em segredo o que no exercício da profissão ou durante a vida tomasse conhecimento[8] e esse juramento, feito por Hipócrates, se estendeu aos advogados no direito romano.

Esse dever de guardar sigilo ressurgiu posteriormente no Código Penal Francês de 1890, que dispunha em seu artigo 378 sobre o caráter punitivo de quem violasse o dever de guardar segredo no exercício da profissão. Outros Códigos, seguindo essa mesma linha de raciocínio, também passaram a tipificar penalmente a violação do segredo, como o espanhol (1822), o toscano (1853), sardo (1859), chegando até os tempos modernos com a inserção deste instituto no Código de Procedimento Civil da República do Chile (Dec. 2004/76, art. 360, I); Código Processo Civil e Comercial da Nação, da Argentina (Lei 17.454/67, art. 444); bem como no Paraguai, no art. 335 do Código Processual Civil.

No Brasil, a violação do segredo surge nas Ordenações Filipinas, onde se previam como crime lesa-majestade a violação de correspondências. E, posteriormente, o Código Criminal do Império tipificava criminalmente a revelação de segredo por funcionário. Contudo, só em 1890 o Código Penal em seu artigo 192 trazendo maior abrangência ao tema, abarca a violação do segredo profissional como crime de direitos individuais.

Atualmente o dever de sigilo está contemplado, em nosso ordenamento jurídico, nos artigos 154 e 325 do Código Penal, no novo Código Civil Brasileiro, em seu artigo 229, no Código de Processo Civil, nos artigos 347, 363 e 406.

Aos profissionais da advocacia o dever de sigilo está expresso no corpo do texto do artigo 26 e 27 do Código de Ética:

 

CEDOAB, Art. 26 - O advogado deve guardar sigilo, mesmo em depoimento judicial, sobre o que saiba em razão de seu ofício, cabendo-lhe recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou tenha sido advogado, mesmo que autorizado ou solicitado pelo constituinte.

CEDOAB, Art. 27 - As confidências feitas ao advogado pelo cliente podem ser utilizadas nos limites da necessidade da defesa, desde que autorizado aquele pelo constituinte.

Parágrafo único. Presumem-se confidenciais as comunicações epistolares entre advogado e cliente, as quais não podem ser reveladas a terceiros.

 

E diante da importância da não violação do sigilo, sem as devidas causas justificadoras, o Estatuto da OAB, transformou a possibilidade de desrespeito à essa norma em infração disciplinar (art. 34, VII) passível de censura (art. 36, I).

Deve, portanto, o advogado manter sigilo sobre os fatos que toma conhecimento em razão de sua profissão, seja esse conhecimento obtido através de confidências feitas pelo cliente, ou através de documentos, ou por terceiros. Desde que a informação interesse à causa que foi confiada pelo cliente, deve ser preservada em nome do sigilo profissional (RAMOS, 2001, p. 369).

O dever de guardar sigilo deve compreender qualquer demanda, seja ela judiciária, civil ou administrativa. Devendo respeitar, inclusive, o sigilo da simples consulta, assessoria ou qualquer outra informação que toma conhecimento por ser advogado. Nos dizeres do doutrinador Mamede (2003, p. 232):

 

Não se deve compreender por demanda apenas a representação judicial; o sigilo abarca toda e qualquer representação, judiciária, civil ou administrativa. Mesmo na prestação de serviços advocatícios no plano das relações privadas, negociais, está abarcada pelo poder/dever de guardar sigilo, a justificar-se a prerrogativa de recusar-se a depor.

 

Ou como ensina Ribeiro (2003) a obrigação de sigilo abrange tudo que o advogado tomar conhecimento no exercício de sua profissão e nenhuma autoridade (ou qualquer outra pessoa) poderá isentá-lo de cumprir essa obrigação.

A obrigação de manter sigilo sobre tudo que coletar durante o exercício da profissão, não se dá somente durante a prestação do serviço, se prolongando no tempo e no espaço, e não se restringe às confidências feitas ao advogado pelo cliente, mas abrange também as confidências dos outros profissionais e até de documentos entregues ao advogado. Nas palavras de Ribeiro (2003):

 

Esta obrigação é vinculativa DURANTE e DEPOIS do patrocínio, ou da prestação dos serviços requerida e estende-se às confidências dos clientes, às do adversário, às dos colegas, às que resultam de entrevistas para conciliar ou negociar, às de terceiras pessoas -- desde que feitas ao Advogado NO EXERCÍCIO DA SUA PROFISSÃO -- bem como aos documentos confidenciais ou íntimos confiados ao Advogado.

 

Essa obrigação de guardar sigilo sobre as informações de clientes não se limita ao profissional, mas estende-se aos colaboradores e empregados do que, em razão da função que ocupam, tomam conhecimento dos fatos, podendo em caso de violação, com dolo ou culpa grave, ser o empregado despedido por justa causa. Além disso, estende-se também aos advogados substabelecidos e a terceiros que tomem conhecimento do fato (RIBEIRO, 2003, v.11, ano9).

O dever de sigilo é tão imponente em seu conteúdo que abarca até mesmo depoimentos relativos à parte adversa quando envolver conflito de interesses, conforme decisão do Tribunal de Ética de São Paulo:

CONFLITO DE INTERESSES ENTRE CLIENTES – SUPERVENIÊNCIA. Sobrevindo conflito de interesses entre clientes, o advogado, com prudência e discernimento, deve renunciar a um dos mandatos, na forma do art. 18 do Código de Ética e Disciplina. Obrigação de manter o sigilo profissional sobre fatos e circunstâncias da causa, sob pena de sanções éticas. Precedentes.(ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2008).

 

Guardar segredo não depende de expresso pedido do cliente, devendo, sempre que a natureza dos fatos não for de notório conhecimento e tenha relevância, ser resguardado pelo advogado. Para Carlos (2004, p. 3):

 

O segredo pode ter a sua gênese na vontade do depositante, ou, na própria natureza do fato confiado. Significa isto que em determinadas situações, a existência da obrigação de guardar segredo não depende do pedido de confidência expressamente formulado pelo cliente ao Advogado. Mesmo que este pedido não haja sido formulado, o Advogado está obrigado a guardar segredo, sempre que a natureza dos fatos revelados assim o justifique. Aliás, note-se, o sigilo principia logo pelo “fato” da simples presença física do cliente no escritório do Advogado

 

O sigilo profissional é, pois, um dever ético e disciplinar que implica sanções aos que o descumprem. Dentro das regras que determinam o sigilo profissional, existem as exceções que possibilitam sua violação de forma a não constituir infração ética e disciplinar, quais serão estudadas no próximo tópico.

 

 

4.4      CASOS EXCEPCIONAIS

 

 

O artigo 34 do Estatuto da Advocacia em seu inciso VII prevê como infração disciplinar a violação, sem justa causa, do sigilo profissional, dessa forma, incorre em infração disciplinar o advogado que viole o dever de manter reservadas para si tudo quanto vier a saber de seu cliente.

A justa causa justificadora da violação do sigilo profissional implica, segundo Ramos (2001, p. 371), na análise subjetivas de inúmeras possibilidades todas elas lastreadas pelos princípios morais vigentes, o que exige do intérprete redobrada cautela.

De modo geral a justa causa é encontrada sempre que, no caso em particular, o interesse social se destaca acima do interesse privado. E esta regra se justifica exatamente pela natureza pública da função desempenhada pelo advogado, que antes de tudo tem o compromisso inarredável para com o interesse social.

 

Sendo assim, algumas situações admitem a quebra da obrigação de preservar o sigilo profissional, em razão da justa causa ou do estado de necessidade. Devendo essa avaliação e decisão resultar da consciência profissional do advogado.

Caracteriza-se a justa causa excepcionada no tipo disciplinar as hipóteses previstas no Código de Ética, artigos 25 e 27[9], quais sejam: grave ameaça à vida e à honra de terceiro, ou diante de afronta do advogado pelo cliente, ou, ainda, diante de confidências feitas pelo cliente ao advogado que possam ser utilizadas como defesa.

A grave ameaça ao direito à vida e à honra é abordada sabiamente por Serrano ( 1953 apud RAMOS, 2001, p. 371) ao explicar que se alguém pode perecer para não revelar um segredo profissional, se pode manchar sua honra ao decidir manter a inviolabilidade, ou se por silenciar uma confidência toda uma sociedade corre risco, impõem-se a quebra de sigilo; advertindo que pertence ao foro íntimo do profissional, “sem possibilidade de coação externa”, a decisão pela quebra ou não do sigilo.

Igualmente se justifica a violação pelo fato do advogado ser afrontado pelo cliente onde se vê obrigado, em defesa própria, a revelar segredo que aquele lhe confiou; sendo que neste caso o segredo revelado deve guardar relações com a causa havida entre procurador e constituinte. Neste sentido já decidiu o Tribunal de Ética de São Paulo:

 

SIGILO PROFISSIONAL - QUEBRA POR ADVOGADO, EM CAUSA PRÓPRIA, PARA SUA DEFESA, NA PROPOSITURA DE AÇÃO TRABALHISTA CONTRA EX-EMPREGADOR. A quebra de sigilo é possível, de forma excepcional, por justa causa (art. 34, VII, do Estatuto da Ordem) e em defesa própria, porém sempre restrito ao interesse da causa. O advogado não pode transmitir informações que recebeu, em sigilo profissional, para o benefício de terceiros ou para fazer denúncias, sob pena de quebra do sigilo profissional, que consiste em dever profissional. Desaconselhável, no caso, a advocacia em causa própria. Inteligência do artigo 25 do Código de Ética. (ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, 2003).

 

Segundo o doutrinador Mamede (2003, p. 362) outra possibilidade de violação do sigilo profissional são as confidências feitas ao advogado pelo cliente que podem ser utilizadas para composição de defesa, desde que absolutamente necessárias, devendo para tanto existir autorização do constituinte:

 

Por fim, as confidências feitas ao advogado pelo cliente podem ser utilizadas para a composição da defesa, desde que absolutamente necessárias, havendo imperiosa necessidade de autorização do constituinte (artigo 27). De todo recomendável, por certo, que o profissional colha tal autorização por escrito, garantindo, assim, prova inequívoca a justificar seu ato (grifo meu).

 

Advirta-se ainda que a violação do dever de preservar o sigilo pode decorrer da obrigação de depor, já que o sigilo que acoberta o advogado quando é chamado para prestar depoimento não é absoluto, nos dizeres de Cardella (2005, p. 167):

 

O artigo 26 do CED considera dever do advogado guardar sigilo sobre o que saiba em razão de seu ofício, cabendo-lhe recusar a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou tenha sido advogado, mesmo quando autorizado ou até mesmo solicitado pelo próprio constituinte, devendo, porém, o advogado sempre atender o chamamento judicial, mas diante do magistrado recusar-se a depor.

 

Por fim, ressalte-se que a quebra do sigilo fora dos limites legais caracteriza infração disciplinar punível com censura e, eventualmente, multa. Além disso, é considerada crime punível com detenção de seis meses a dois anos, ou multa; e ilícito civil pelo qual o advogado é obrigado à indenizar os danos econômicos e morais decorrentes de seu comportamento.

 

 


5     DA DISTINÇÃO ENTRE A INVIOLABILIDADE E O SIGILO PROFISSIONAL

 

 

A inviolabilidade, como visto, significa que não se pode ou deve violar algo/alguém, é uma prerrogativa que confere a certas pessoas e lugares isenção de ação. Mamede (2003, p. 73) assim explica a cerca da inviolabilidade:

 

O instituto da inviolabilidade traduz uma especialidade também no grau de proteção que é dado a uma situação, a revelar que o bem jurídico protegido é considerado muito valioso, que especial atenção lhe é dada pela ordem jurídica como forma de alcançar seus objetivos maiores.

 

Na advocacia a inviolabilidade é um direito que possibilita ao advogado trabalhar com maior segurança, pois é através dela que se resguarda a liberdade de expressão do advogado, instrumento indispensável ao regular desenvolvimento de suas funções. Ademais, a inviolabilidade do advogado abrange a imunidade profissional, a proteção aos meios de trabalho do advogado e a proteção ao sigilo profissional.

A imunidade é entendida como a garantia da liberdade de expressão do advogado (RAMOS, 2001, p. 112), que deve atuar respeitando os limites da liberdade que lhe é concedido para fazer atuar o direito e buscar a Justiça.

A proteção ao local e aos meios de trabalho abrange o escritório onde o advogado preste seus serviços e seus arquivos e dados, correspondências e comunicações telefônicas ou afins. Mamede (2003, p. 82) explica que a inviolabilidade se justifica pela função social da advocacia e pelo tipo de atuação que se espera do advogado.

A proteção ao sigilo profissional compreende os fatos dos quais o advogado toma conhecimento ou às confidências que lhes são feitas no exercício de sua profissão, devendo este, também, guardar segredo quanto aos documentos que lhes são confinados e ao que sabe através do conteúdo dos mesmos. Para Pellizzaro (1997, p. 50-51) a garantia do sigilo profissional e da inviolabilidade do local de trabalho do advogado se dá em razão de ser o advogado mandatário do cliente que se torna confessor e depositário de atos e fatos de foro íntimo, em suas palavras:

 

Resulta pois definitivamente colocado sob proteção local especial na condição de inviolável o sigilo profissional, o escritório ou o local de trabalho do advogado, seus arquivos e dados, suas correspondências, comunicações onde se inclui expressamente a telefônicas e afins. Constituindo-se pois nos termos da lei, crime a transgressão deste preceito legal.

 

Dessa forma, temos que a inviolabilidade, enquanto norma de proteção à liberdade de defesa e do sigilo profissional, é um direito que deve ser assegurado à todo advogado no exercício de sua profissão a fim de se dar maior efetividade a democracia. Busato (2006, p. 20) ao comentar sobre as prerrogativas do advogado esclarece que “se o advogado não pode atuar com independência e liberdade, o que está em risco é a democracia – e com ela a cidadania”.

Com o fim de se assegurar ao profissional da advocacia maior amplitude para exercer seu munus público o legislador o amparou, com a inviolabilidade, impondo, contudo, limites jurídicos aos atos e manifestações do advogado, quais sejam: a boa-fé; a pertinência, técnica ou temática, e a proporcionalidade.

A boa-fé está diretamente ligada à intenção das pessoas na prática de determinados atos, nenhum ato pode desrespeitar a dignidade da pessoa humana, devendo os atos ser praticados de maneira adequada, sem fraude, sem intenção de prejudicar qualquer pessoa.

Exige, a boa-fé, que a pessoa, quer em juízo, quer fora dele, tenha sua conduta examinada dentro de um conjunto concreto de circunstâncias em cada caso, não podendo o juiz dizer quem age ou não com boa-fé sem colher elementos suficientes a comprovar o ato, nos dizeres de Mamede (2003, p. 86):

 

A aplicação da regra, todavia, exige do jurista redobrado cuidado e virtude exegética (bonus iudex), evitando erros que podem produzir efeitos nefastos sobre a pessoa. Esses erros podem manifestar-se tanto na investigação subjetiva, quanto na investigação objetiva do ato. No plano subjetivo, é fundamental que a afirmação de ilicitude do ato jurídico por má-fé seja cuidadosa, arrolando elementos que suficientemente comprovem a assertiva, tal qual exigido pelo artigo 93, IX, da Constituição Federal. É preciso não cair no vício da opinião, não deixar-se levar pelo império do achismo irresponsável. Deve-se cuidar para que o exame da finalidade do agir jurídico seja cauteloso, calçando-se em elementos concretos que permitam descortinar a intencionalidade de forma mais segura possível, impedindo que a aplicação da lei seja instrumento de injustiça.

 

A pertinência técnica está relacionada ao efetivo exercício da advocacia, em outras palavras, significa dizer que os atos ou manifestações praticados pelo advogado deve estar diretamente relacionado com a causa que ele trabalha. A pertinência temática, por sua vez, relaciona-se com o ato ou argumento versado. Á esse respeito Mamede (2003, p. 90) comenta:

 

[...] a inviolabilidade no exercício da advocacia, ,bem como a imunidade judiciária, é garantia jurídica à atuação do advogado, cuja perfeita configuração exige respeito, antes de mais nada, à discussão travada na demanda. Pode-se falar, via de conseqüência, em “uma regra da pertinência”: a afirmação deve guardar relação com o mérito dos debates em torno dos quais se constrói o litígio.

 

Por isso, ao julgar acórdão versando sobre o tema, o Tribunal de Ética de Santa Catarina (AC nº 031/2002), decidiu que não pode o advogado querer beneficiar-se da inviolabilidade quando debate sua causa na rua ou na imprensa (pertinência técnica) ou, ainda, quando alega algo que não está em discussão ou ofende o juiz da causa.

Além da boa-fé e da pertinência, técnica e temática, é necessário que o advogado haja com certa proporcionalidade nos seus atos e manifestações, pois os excessos podem caracterizar uma ofensa, nos dizeres de Mamede (2003, p. 90):

 

A narrativa de fatos pertinentes à demanda, ainda que negativa à reputação, à dignidade ou ao decoro, não constituirá delito se construída adequadamente, no plano da discussão jurídica.

 

Assim, a inviolabilidade assegurada aos advogados está limitada aos seus atos e manifestações e à lei, sob pena de ser quebrada por ordem judicial. Ressalte-se que uma recente alteração no artigo 7º do Estatuto, introduzida pela Lei 11.767/2008, trouxe maior segurança quanto à quebra da inviolabilidade, porque limita o poder do magistrado e dos agentes que efetivam as buscas em escritórios de advocacia; exige-se, agora, que a quebra da inviolabilidade se efetive somente quando o investigado for o próprio advogado, vedando a divulgação de informações dos clientes, sob pena de se tornar a prova ilícita e ser desconsiderada no processo.

Lopes (2008, p. 2) elucida que essa nova diretriz assegura à todos maior eficácia na garantia dos postulados constitucionais de ampla defesa, com os meios a ela inerentes, e da indispensabilidade do advogado à administração da justiça. Diz ainda que a inviolabilidade do advogado é absoluta e, não mais, relativa:

 

Portanto, ao pretenderem buscar informações de pessoas que não os advogados, os magistrados não possuem mais o poder de determinar buscas e apreensão em escritórios que defendam os interesses dessas pessoas, pois, nesse ponto, vige uma inviolabilidade absoluta desses estabelecimentos.

 

Ademais, a inviolabilidade, enquanto direito, não gera sanções ao advogado, pois seu cumprimento independe da sua vontade, ao contrário, a inviolabilidade deve ser entendida como preceito que resguarda o sigilo profissional, garantindo aos clientes dos advogados o direito à liberdade de defesa e de resguardo de seus dados e informações.

O sigilo profissional, por sua vez, é um dever deontológico fundamental ao qual o advogado se obriga. É, portanto, é instrumento mínimo da relação de confiabilidade entre cliente e profissional que visa resguardar a dignidade da pessoa, nos dizeres de Carlos (2004, p. 3):

 

O segredo profissional é um dos deveres deontológicos fundamentais, senão “o mais fundamental”, a que o Advogado está adstrito, constituindo a “pedra angular” da sua atividade, “ponto de honra” do Advogado e condição da sua plena dignidade.

 

Na advocacia, o sigilo profissional se refere aos fatos dos quais o advogado toma conhecimento ou às confidências que lhes são feitas no exercício de sua profissão, devendo, pois, o advogado manter sigilo sobre os fatos que toma conhecimento seja em razão de demanda judiciária, civil ou administrativa. Devendo respeitar, inclusive, o sigilo da simples consulta, assessoria ou qualquer outra informação que toma conhecimento por ser advogado.

 

Em suma, pode dizer-se que a obrigação de segredo tem por objeto TUDO O QUE O ADVOGADO TEM CONHECIMENTO NO EXERCÍCIO DA SUA PROFISSÃO e ninguém (autoridade ou outra pessoa) pode isentá-lo desse dever (RIBEIRO, 2003).

 

Importante ressaltar que a obrigação do sigilo profissional não se dá somente durante a prestação de serviço, prolongando-se no tempo e no espaço. Nos dizeres de Mamede (2003, p. 362):

 

Não há dever de sigilo apenas na constância da prestação do serviço. Ao contrário, prolonga-se no tempo, indefinidamente, assim como prolonga-se no espaço: o que se ouviu, em virtude da condição de advogado (o que não se limita às conversas com cliente ou constituinte), deve ser preservado.

 

Essa obrigação de guardar sigilo sobre as informações de clientes não se limita ao profissional, mas se estende, inclusive, aos colaboradores e empregados do advogado que, em razão da função que desempenham, tomam conhecimento dos fatos, podendo em caso de violação, com dolo ou culpa grave, ser o empregado despedido por justa causa. Além disso, estende-se também aos advogados substabelecidos e a terceiros que tomem conhecimento do fato. Nos dizeres de Ribeiro (2003):

 

A obrigação de segredo estende-se aos empregados e colaboradores do advogado que têm naturalmente conhecimento dos fatos no desempenho das suas funções, constituindo justa causa de despedimento, a violação com dolo ou culpa grave desse dever de sigilo, quando tal fato revelar que se tornou impossível a subsistência da relação laboral.

É ainda extensível aos advogados substabelecidos e a terceiros que sejam eventualmente consultados para melhor desempenho da sua função de defensor ou patrono, operando automaticamente a extensão da confiança quando:

a) a revelação é indispensável para permitir a elaboração de um parecer, relatório ou opinião (inexistência de outro modo de obter resultado equivalente);

b) a revelação se limita aos fatos estritamente necessários;

c) os fatos revelados não têm um caráter íntimo ou de tal forma reservado que seja de prever a legítima oposição do titular do segredo à sua revelação;

d) haver garantia bastante de que o terceiro consultado não só manterá o segredo relativamente aos mesmos fatos, como recusará prestar serviços a quem possa beneficiar desse conhecimento;

e) haver garantia de independência do terceiro, nomeadamente o seu não envolvimento pessoal ou profissional na causa ou questão pendente ou em causas que com ela possam ter qualquer conexão.

 

O dever de sigilo é tão imponente em seu conteúdo que abarca até mesmo depoimentos relativos à parte adversa quando envolver conflito de interesses. Nos dizeres de Ribeiro (2003):

 

Esta obrigação [de sigilo] é vinculativa DURANTE e DEPOIS do patrocínio, ou da prestação dos serviços requerida e estende-se às confidências dos clientes, às do adversário, às dos colegas, às que resultam de entrevistas para conciliar ou negociar, às de terceiras pessoas -- desde que feitas ao Advogado NO EXERCÍCIO DA SUA PROFISSÃO -- bem como aos documentos confidenciais ou íntimos confiados ao Advogado.

 

A obrigação de guardar segredo não depende de pedido expresso pelo cliente, assim, sempre que a natureza dos fatos não for de notório conhecimento e tenha relevância o advogado está obrigado a guardar segredo. Para Carlos (2004, p. 3):

O segredo pode ter a sua gênese na vontade do depositante, ou, na própria natureza do fato confiado. Significa isto que em determinadas situações, a existência da obrigação de guardar segredo não depende do pedido de confidência expressamente formulado pelo cliente ao Advogado. Mesmo que este pedido não haja sido formulado, o Advogado está obrigado a guardar segredo, sempre que a natureza dos fatos revelados assim o justifique. Aliás, note-se, o sigilo principia logo pelo “fato” da simples presença física do cliente no escritório do Advogado.

 

A lei apresenta os casos em que se admite a quebra do sigilo profissional, quais sejam: grave ameaça ao direito à vida e à honra; ou no caso de afronta direta do cliente na qual o advogado se veja obrigado a revelar segredo profissional relativo a causa para se defender; ou ainda utilização do segrego para composição de defesa do próprio cliente.

Pode também ser quebrado o sigilo profissional nos casos de obrigação de depor, já que o sigilo que acoberta o advogado quando é chamada para depor não é absoluto.

Cardella (2005, p. 87) ao comentar o artigo 34 do Estatuto aborda as possibilidades de violação do sigilo profissional, assim dizendo:

 

Esse dispositivo impede que o advogado viole sigilo profissional, admitindo, no entanto, apenas quando houver justa causa; é o que ocorre quando o cliente autoriza o advogado a quebrar o sigilo ou quando não autorizado tenha por finalidade proteger interesses relevantes, considerados tais como:

a)          grave ameaça ao direito à vida;

b)          grave ameaça à honra de terceiro;

c)          quando o advogado sentir-se afrontado pelo próprio cliente.

O dever de sigilo inclui a recusa de depoimento judicial, mesmo que autorizado pelo constituinte, quando o advogado entender que deva preservá-lo.

 

A violação do sigilo profissional, fora dos limites legais, gera para o advogado sanção disciplinar punível com censura e, eventualmente, multa. Ademais, é considerado crime punível com detenção de seis meses a dois anos, ou multa; e ilícito civil pelo qual o advogado é obrigado à indenizar os danos econômicos e morais decorrentes de seu comportamento. Nos dizeres de Mamede (2003, p.  362-363):

Nunca é demais ressaltar que a quebra do sigilo, fora dos angustos limites nos quais é permitida, caracteriza não só infração disciplinar punível com censura e, eventualmente, multa. Caracteriza, como visto, crime, além de ilícito, civil, pelo qual deverá o advogado indenizar os danos econômicos e morais decorrentes de seu comportamento, aplicando-se à hipótese os artigos 186 c/c 927 do código Civil.

 

Dessa forma, temos que a principal distinção entre a inviolabilidade e o sigilo está em:

a)     ser entendido o primeiro como um direito, uma /prerrogativa, enquanto o segundo é um dever, uma obrigação.

 

b)    enquanto direito (ou prerrogativa) a inviolabilidade não gera sanções ao profissional, ao contrário, traz à sua atuação segurança jurídica;

 

c)    enquanto dever (ou obrigação de não revelar segredo), o sigilo gera sanção disciplinar, civil e penal ao profissional que violar o sigilo sem justa causa.

 

6     CONCLUSÃO

 

 

Ao concluirmos nosso trabalho, temos que a profissão de advogado no Brasil surgiu muito antes de se iniciarem os cursos de direito, que só começaram a funcionar em 1828. Ao longo dos anos o curso passou por grandes mudanças, visando sempre o melhor preparo dos profissionais.

A regulamentação da profissão de advogado também foi conquistada com muitas lutas, somente quase duas décadas após o surgimento da Ordem dos Advogados do Brasil é que se conseguiu aprovar no Congresso Nacional o primeiro projeto do Estatuto da OAB (lei 4.215). e, posteriormente, em 1994, visando atender os novos interesses da classe de advogados e em conformidade com a nova Constituição de 1988, um novo Estatuto da OAB foi criado (lei 8.906).

O princípio da inviolabilidade trata de uma garantia constitucional (CF, art. 133), que está regulamentado pelo Estatuto da Ordem dos Advogados (EOAB, art. 7°, II), onde se estipula a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações.

Ocorre que antes da entrada em vigor da lei 11.767/08 muito pouco se assegurava com o princípio da inviolabilidade jurídica, pois a mesma inviolabilidade destinada aos advogados era reservada aos cidadãos no que tange seu lar, suas correspondências, seus dados telefônicos, etc.. Dessa forma, mesmo tendo a prerrogativa da inviolabilidade muitos magistrados expediam, no interesse de uma investigação, mandados de busca e apreensão para os escritórios ou locais de trabalho dos advogados, causando grandes transtornos, já que a apreensão de arquivos impedia a continuidade dos trabalhos e, por vezes, expunha os dados de clientes que nenhuma relação mantinha com o inquérito, além de prejudicar a credibilidade dos advogados que são expostos a tais medidas.

Enquanto prerrogativa constitucionalmente assegurada a inviolabilidade abrange o sigilo profissional do advogado, que é entendido como um poder/dever deontológico fundamental onde o advogado se obriga a resguardar o interesse do cliente. O sigilo profissional é um poder/dever deontológico porque é uma norma que regula a conduta do profissional do advogado e que opera no campo da ética, já que cabe apenas ao advogado determinar a necessidade de violar, ou não, o sigilo. Ademais, o seu descumprimento, além de gerar uma sanção ética, pode trazer prejuízos irreparáveis aos seus constituintes.

Dentro desse ínterim discute-se, neste trabalho monográfico, quais os limites assegurados pelo princípio da inviolabilidade no que tange ao sigilo profissional dos advogados, que com o advento da nova lei 11.767/08 trouxe grandes inovações nesse campo e maior segurança jurídica tanto ao profissional da advocacia quanto ao seu constituinte.

 

 


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[1] ROTHSTEIN; RAEDER; GRUTIP, 1997 apud AZAMBUJA, 2005, p. 1.

[2] Idem.

[3] Lei 8.906/94, art. 2, § 3º- No exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos e manifestações, nos limites desta lei.

[4] CDOM, Artigo 68.º (Âmbito do segredo profissional): 1. O segredo profissional abrange todos os fatos que tenham chegado ao conhecimento do Médico no exercício do seu mister ou por causa dele, e compreende especialmente: a) Os fatos revelados diretamente pelo doente, por outrem a seu pedido ou terceiro com quem tenha contatado durante a prestação de cuidados ou por causa dela; b) Os fatos apercebidos pelo Médico, provenientes ou não da observação clínica do doente ou de terceiros; c) Os fatos comunicados por outro Médico obrigado, quanto aos mesmos, a segredo profissional. 2. A obrigação de segredo existe quer o serviço solicitado tenha ou não sido prestado e quer seja ou não remunerado. 3. O segredo é extensivo a todas as categorias de doentes, incluindo os assistidos por instituições prestadoras de cuidados de saúde. É expressamente proibido ao Médico enviar doentes para fins de diagnóstico ou terapêutica a qualquer entidade não vinculada a segredo profissional Médico a menos que para tal obtenha o seu consentimento expresso ou que o envio não implique revelação do segredo.

[5] CEC - Art. 2º - São deveres do contabilista: [...] II – guardar sigilo sobre o que souber em razão do exercício profissional lícito, inclusive no âmbito do serviço público, ressalvados os casos previstos em lei ou quando solicitado por autoridades competentes, entre estas os Conselhos Regionais de Contabilidade;

[6] CP, Art. 154 – Revelar alguém, sem justa causa, segredo de que tenha ciência em razão de função, ministério, ofício, ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem. (Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.). Parágrafo único. Somente se procede mediante representação.

[7] CED-OAB, Art. 26 - O advogado deve guardar sigilo, mesmo em depoimento judicial, sobre o que saiba em razão de seu ofício, cabendo-lhe recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou tenha sido advogado, mesmo que autorizado ou solicitado pelo constituinte.

[8] O juramento de Hipócrates se deu no seguintes temos: "O que, no exercício ou fato do exercício (da Medicina) e no comércio da vida eu vir ou ouvir, que não seja necessário revelar, conservarei em segredo" ou "calar-me-ei e considerarei tudo isto como um segredo" (HIPÓCRATESapud PAULA, 2002)

[9] CED-OAB, Art. 25 - O sigilo profissional é inerente à profissão, impondo-se o seu respeito, salvo grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado se veja afrontado pelo próprio cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo, porém sempre restrito ao interesse da causa.

CED-OAB, Art. 27 - As confidências feitas ao advogado pelo cliente podem ser utilizadas nos limites da necessidade da defesa, desde que autorizado aquele pelo constituinte.

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