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A Responsabilidade Da Pessoa Jurídica Na Legislação Ambiental Brasileira: O Caso Do Rompimento Da Barragem Do Fundão Em Mariana No Estado De Minas Gerais


Autoria:

Jaqueline Pereira De Oliveira


Graduanda em Direito pela Faculdade UNA de Uberlândia, atuo atualmente na área previdenciária, pretendo um destaque no ramo do Direito Ambiental, e para esse feito venho fazendo pesquisas e escrevendo do assunto, que considero de extrema importância para a sociedade, pois dependemos exclusivamente do meio ambiente ecologicamente equilibrado para que tenhamos uma vida saudável.

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Resumo:

O presente artigo tem por objetivo fazer uma análise crítica sobre a responsabilidade da pessoa jurídica em casos de danos ou lesão ao meio ambiente, frente á evolução da legislação ambiental no Brasil, utilizando como exemplo a mineradora Samarco

Texto enviado ao JurisWay em 22/06/2018.

Última edição/atualização em 25/06/2018.



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1 INTRODUÇÃO

 

Nenhuma Constituição Federal promulgada ou outorgada no Brasil trouxe tantas inovações em relação ao meio ambiente como a Carta Magna de 1988. Preocupado com a degradação ambiental e com a qualidade de vida da população, o legislador constituinte criou um capítulo específico para o meio ambiente. Por essa razão, ambientalistas e operadores do direito denominam essa constituinte como “a Constituição Verde” (MACHADO, 2014).  

Nesse diapasão, dentre as inovações trazidas pela Carta Magna a que se relaciona com o objeto desta pesquisa é o art. 225 § 3º, o qual dispõe que as condutas e atos lesivos praticados contra o meio ambiente, por pessoas físicas ou jurídicas as sujeitarão às sanções penais, civis e administrativas (BRASIL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988).

Essas inovações faziam-se necessárias, pois em regra são as organizações empresariais que causam maiores danos ambientais através de suas atividades. Um exemplo disso é o recente caso do rompimento da Barragem do Fundão em Mariana, no Estado de Minas Gerais, que resultou em diversas mortes e em danos ambientais de proporções significativas, sendo considerado na atualidade como um dos maiores desastres ambientais que já ocorreu no Brasil. As consequências socioambientais, econômicas e de saúde fizeram com que fosse instituído um processo contra a empresa a fim de apurar as responsabilidades e aplicar as sanções previstas em lei.

Assim, o objetivo geral deste artigo é o de analisar a responsabilidade da pessoa jurídica face à ocorrência dos crimes ambientais tipificados pela Lei nº 9.605/98, que regulamentou o art. 225 § 3º da Constituição Federal. Quanto aos objetivos específicos buscou-se: estabelecer a definição de poluidor e comentar sobre a responsabilidade objetiva no contexto da Lei nº 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente; analisar as disposições da Constituição Federal de 1988 no que tange à responsabilização da pessoa jurídica; descrever como a lei de crimes ambientais tipifica a responsabilização da pessoa jurídica na degradação ambiental e, por fim, comentar sobre um caso recente de degradação ambiental de grande vulto no Brasil que foi o rompimento da Barragem do Fundão em Mariana, Minas Gerais, inclusive a denúncia do crime, a tipificação penal e as responsabilidades apuradas na denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal.

Considerando que a pessoa jurídica vem revestida de especificidades não sendo de fato “uma pessoa”, como ela pratica o crime ambiental e de que maneira ela e seus dirigentes são responsabilizados? Eis que estes são os questionamentos a serem respondidos ao longo  deste artigo.

A escolha do tema justifica-se por sua relevância social e científica, e também pelo interesse pessoal em analisar um assunto em evidência, especialmente quando ocorrem desastres ambientais de magnitude considerável, como é o caso do rompimento da barragem Samarco em Mariana. Ademais, é preciso sempre buscar trazer novas visões sobre a Lei de Crimes Ambientais, sendo que a análise de casos recentes auxilia na observância da aplicabilidade da lei. 

Quanto ao método utilizado na elaboração do artigo em tela, A pesquisa bibliográfica é o tipo de pesquisa adequada ao tema proposto, a qual será precedida de pesquisas na doutrina, referentes ao Direito Constitucional, Direito Ambiental e a Lei de Crimes Ambientais. Para Marconi e Lakatos (2010), a pesquisa bibliográfica exerce um papel primordial nas pesquisas acadêmicas, sendo essencial para validar os argumentos dos pesquisadores.

 

2 A POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE E A DEFINIÇÃO DE POLUIDOR

 

A Lei nº 6.938 de 1981 foi promulgada com a finalidade de instituir a Política Nacional do Meio Ambiente e criar mecanismos legais para a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental. Dentre as inovações trazidas pela Lei é preciso fazer menção à definição de poluidor do meio ambiente, nos seguintes moldes:

 

Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental (BRASIL, LEI Nº 6.938/81).

 

            Assim, pela redação dada ao inciso IV do artigo 3º da Lei nº 6.938/80, o legislador pátrio determina quem é o poluidor do meio ambiente. Com base nessa definição pode-se inferir que poluidor é a pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, cuja atividade promova de forma direta ou indireta a degradação do meio ambiente.

A existência da pessoa jurídica da forma como se vê nos dias atuais tem relação direta com a necessidade do homem de conjugar esforços para a realização de empreendimentos, ou seja, da polarização de atividades em torno de uma determinada empresa. É através da pessoa jurídica que o homem consegue superar suas limitações e transcende a brevidade de sua vida, segundo informa Venosa (2010).

            De acordo com a explanação de Miranda (2015), a pessoa jurídica em termos de definição é o ente formado pelo conjunto de bens e pessoas a quem o direito confere personalidade jurídica, estando essa inserida em dois grupos: de direito público e de direito privado.

            Segundo as disposições do Código Civil em vigor, as pessoas jurídicas de direito privado são as associações, as sociedades, as fundações as organizações religiosas e os partidos políticos, conforme reza o artigo 44 do referido diploma legal. Já as pessoas jurídicas de direito público, conforme a dicção dos artigos 41 e 42 são a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as Autarquias. Qualquer dessas pessoas por meio de suas atividades pode causar dano ao meio ambiente. 

            Ao fazer menção ao termo “de forma direta ou indireta”, o legislador pátrio nos mostra que o poluidor pode promover a degradação ambiental direta ou indiretamente. Assim, existem dois tipos de poluidor, o direto e o indireto.

            O poluidor direto, no caso a pessoa jurídica, é aquele que dá causa direta à poluição, ao passo que o poluidor indireto é aquele que contribuiu para a degradação ambiental, mas sem dar causa a ela de forma direta.

            Nos últimos anos, em razão da intensificação da degradação ambiental, percebe-se um fenômeno no ordenamento jurídico brasileiro que é a responsabilização administrativa, penal e civil deste poluidor nos crimes ambientais. Compreender quem é esse poluidor é de suma importância para a devida responsabilização em relação à degradação ambiental.

            Tanto é verdade que:

A ausência da compreensão do poluidor indireto e dos limites de sua responsabilização gera indesejável insegurança jurídica, especialmente pelo fato de se presumir demasiadamente nessa seara, deixando as possibilidades de responsabilização ao sabor do intérprete. Por outro lado, a responsabilização do poluidor indireto é fundamental para garantir uma adequada proteção ao meio ambiente, pois insere dever de cuidado que deve reger a vida em sociedade, ao trazer a responsabilidade civil ambiental àquele que não praticou o ato, mas é responsável por ele evitando-se que o poluidor indireto tire vantagem da degradação ambiental efetuada pelo poluidor direto (FARIAS, 2017, p.22).

 

            Nesse sentido, a interpretação doutrinária e jurisprudencial da legislação ambiental tem auxiliado na definição do poluidor indireto, que é aquele que se beneficia da atividade poluente de alguma forma, que consome o produto proveniente de uma atividade que degrada o meio ambiente ou ainda, que favorece a criação de elementos para que a poluição ocorra.

 

2.1 A Lei nº 6.938/81 e a responsabilidade objetiva

 

Uma questão de essencial importância em relação às disposições da Lei nº 6.938/81, diz respeito à configuração da responsabilidade objetiva no que tange à degradação ambiental.

 

Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

§1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente (BRASIL, (LEI Nº 6.938/81).

 

A redação dada ao §1º do artigo 14 da lei em epígrafe deixa claro que, na ocorrência de danos ao meio ambiente, o poluidor é obrigado a reparar o dano ou a indenizar, não havendo a necessidade de comprovação de culpa em relação a esse aspecto, ou seja, basta o nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o fato danoso, respaldado no risco da atividade. Nesse sentido, o tipo de responsabilidade a que o legislador pátrio faz referência é a objetiva, espécie de responsabilidade civil que tem amparo legal no artigo 927, parágrafo único do Código Civil e que tem influência na legislação ambiental por força do artigo supracitado e das disposições contidas no artigo 225, § 3º da Constituição Federal.

No Código Civil:

 

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente da culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para o direito de outrem (BRASIL, CÓDIGO CIVIL).

 

            Nessa modalidade de responsabilidade, não é preciso haver prova da culpa para a sua caracterização. Basta que a atividade seja de risco para o meio ambiente, para que ocorra a incidência da responsabilidade objetiva.

            Assim, enquanto na responsabilidade subjetiva é necessário à comprovação da existência de culpa, bem como o dano e o nexo de causalidade entre um e outro, na responsabilidade objetiva bastará a existência do dano e o nexo de causalidade em relação ao poluidor.

Oportuno esclarecer que a responsabilidade civil objetiva em matéria ambiental (que independe da existência de culpa), é um mecanismo que tem por objetivo responsabilizar por danos ao meio ambiente e assim garantir a defesa de um meio ambiente saudável em caso de dano ou lesão, especialmente para a atividade potencialmente poluidora ou que implique em risco, como é o caso da mineração. Tem, pois, como fundamento a teoria do risco integral, segundo o qual o poluidor que exerce uma atividade de risco para o meio ambiente deve suportar os riscos dos prejuízos que essa atividade porventura possa causar no caso de um desastre ambiental, não se admitindo excludentes de responsabilidade (CAVALIERI FILHO, 2014, p.27).

 

Como se acentua, em matéria de meio ambiente, a responsabilidade pelos danos ambientais seguem critérios mais contundentes e específicos, trata-se de uma responsabilidade objetiva, onde se leva em conta o risco da atividade, ou seja, uma vez ocorrido o dano basta a comprovação do nexo de causalidade entre ação e omissão.

 

4 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A RESPONSABILIZAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA NA DEGRADAÇAO AMBIENTAL

 

 

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi a primeira das Cartas Magnas já promulgadas ou outorgadas a abordar a questão ambiental no Brasil, tendo dedicado um capítulo inteiro só para tratar de assuntos de relevância ambiental (MORAIS, 2016).  

Considerado como um bem de uso coletivo e inserto no âmbito dos diretos difusos, o legislador constituinte determinou no caput do artigo 225 que todos têm direito a um meio ambiente sadio e equilibrado, sendo que, no alcance deste objetivo a sociedade e o Poder Público tem a obrigação de defender o meio ambiente.

 

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem como uso comum do povo e essencial para à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 3° As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (BRASIL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988).

 

 

Dentre as disposições contidas no artigo 225 da Constituição Federal, chama atenção a redação dada ao § 3° do artigo em epígrafe, pois é consenso doutrinário e jurisprudencial que isso representou uma verdadeira inovação, posto que, doravante, tanto as pessoas físicas quanto as jurídicas serão responsabilizadas pelas condutas lesivas praticadas contra o meio ambiente. Observe que, mesmo havendo a devida reparação administrativa e civil (recomposição do meio ambiente lesado ou indenização) a responsabilidade penal não deixará de incidir sobre aquele que lesou o meio ambiente. 

No entendimento de Machado e Ferraz (2014), o legislador constituinte estabeleceu ao mesmo tempo a responsabilidade penal, civil e administrativa daquele que causar dano ao meio ambiente. Ou seja, pessoas físicas e jurídicas que causarem dano ao meio ambiente estão sujeitas a três espécies de responsabilidade: civil, penal e administrativa.

A responsabilidade civil decorre da prática de um ato ilícito que cause dano a outrem, sendo que o agente causador do dano tem o dever de repará-lo, através da indenização. O principal objetivo da responsabilidade civil é restabelecer o equilíbrio jurídico-econômico para a vítima do dano. Essa responsabilidade pode ser subjetiva, ou seja, depende de comprovação da culpa do agente, ou objetiva, que independe da comprovação da culpa, conforme explicado anteriormente. Oportuno esclarecer que, como regra geral os pressupostos para a caracterização da responsabilidade civil são a culpa, o dolo e o nexo de causalidade (CAVALIERI FILHO, 2014).

A responsabilidade penal da pessoa física e jurídica, que é uma das maiores inovações da Constituição Federal de 1988, trouxe inúmeros debates no tocante à pessoa jurídica, uma vez que não é possível, tecnicamente no sentido prisional, retirar a liberdade da pessoa jurídica, como ocorre com a pessoa física em relação à degradação ambiental.

A discussão gira em torno do fato da pessoa jurídica ser sujeito ativo do crime e poder ser responsabilizada legalmente. Há consenso na doutrina que a pessoa jurídica pode ser responsabilizada penalmente, mas jamais ser sujeito ativo do crime. Em razão disso, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu a seguinte possibilidade:

 

Art. 173 [...]

§ 3º. A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular (BRASIL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL).

 

Assim, pela redação dada ao §3º do artigo 173 da Constituição Federal, verifica-se que os dirigentes da empresa estão sujeitos a responder pelos atos praticados contra a ordem econômica, financeira e economia popular, cabendo à legislação específica estabelecer a responsabilidade para as empresas.  Essa legislação é a Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, conhecida como Lei de Crimes Ambientais que dispões sobre as sanções e responsabilidades aplicáveis a pessoa jurídica, como forma de cumprir as disposições da Constituição Federal nesse aspecto e que será comentada em maiores detalhes em momento oportuno.

            Outra espécie de responsabilidade é a administrativa, que consiste na capacidade das pessoas jurídicas de direito público de impor sanções contra determinadas condutas aos administrados, inclusive às empresas. Esse poder, segundo Mukai (2008), é inerente à Administração de todas as entidades estatais, ou seja, União, Estados, Distrito Federal e Municípios, dentro dos limites institucionais dos mesmos. A Lei de Crimes Ambientais cuidou também de tipificar as sanções em relação a esse tipo de responsabilidade.

            Como regra geral, a Constituição Federal de 1988 e suas disposições relacionadas ao meio ambiente representam um grande avanço segundo a doutrina e jurisprudência. No entanto, como bem assinala Milaré (2016), isso por si só não basta para promover a proteção ambiental.

            Para imprimir maior efetividade às disposições da Constituição Federal fazia-se necessário criar uma legislação para fazer cumprir as disposições constitucionais, por esse motivo foi sancionada a Lei nº 9.605/98.   

 

4.1 A Lei de Crimes Ambientais e a responsabilização da pessoa jurídica

 

            Com o objetivo de regulamentar o artigo 225 § 3° da Carta Magna, entrou em vigor, nos seus aspectos penais, a Lei 9.605/98, também conhecida como a Lei de Crimes Ambientais.

            Para reforçar o que o legislador constituinte estabeleceu, a Lei 9.605/98 no que diz respeito à responsabilização das pessoas jurídicas assim dispõe:

 

Art. 3º. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou beneficio da sua entidade. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato (BRASIL; LEI Nº 9.605/98).

 

A interpretação deste artigo leva a concluir que o legislador pátrio se preocupou em reforçar quais as espécies de responsabilidade que as pessoas jurídicas estão sujeitas, com relação aos danos causados ao meio ambiente. No que tange à responsabilidade penal é preciso reiterar que a pessoa jurídica não é sujeito ativo no estrito senso da palavra, mas isso não a exime de sofrer as sanções estabelecidas na lei.

No entendimento de Miranda (2015), o que se percebe em relação à Lei em comento é a determinação da responsabilidade pessoal e penal da pessoa jurídica, sendo que a pessoal se dirige aos dirigentes da empresa que deram causa à degradação ambiental.

Conforme as palavras da autora:

 

A responsabilidade pessoal e responsabilidade penal da pessoa jurídica são duas realidades irredutíveis entre si, inconciliáveis, incapazes de síntese final ou de recíproca subordinação. A pessoa jurídica não conta com capacidade penal ou de ação. O velho societas delinquere non potest continua vigente. Estamos diante da Teoria da Dupla Imputação que consiste simplesmente na responsabilização criminal não apenas da pessoa jurídica, mas também do indivíduo, pessoa física que agiu em nome do ente coletivo. Nada mais é do que a possibilidade de responsabilizar simultaneamente o ente coletivo e a pessoa física (MIRANDA, 2015, p. 22).

               

Com efeito, eis que esse é o sentido da Lei de Crimes Ambientais no tocante à responsabilização da pessoa jurídica que causa danos ao meio ambiente. A tendência em admitir ação penal contra a pessoa jurídica é cada vez maior nos tribunais do Brasil. Abaixo é apresentado um exemplo de ação acolhendo a tese de responsabilização penal da pessoa jurídica:

 

APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME AMBIENTAL – POLUIÇÃO DO MEIO AMBIENTE – MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS – DELITO DE PERIGO – NÃO NECESSIDADE DA DEMONSTRAÇÃO E DA EFETIVAÇÃO DO DANO À SAÚDE HUMANA – LEI QUE TUTELA A QUALIDADE DE VIDA – INTERPRETAÇÃO EM FAVOR DO BEM COMUM – PENA CORRETAMENTE APLICADA – RECURSO DESPROVIDO. A lei dos crimes ambientais inovou o Direito Brasileiro, quando admitiu expressamente a responsabilidade ambiental penal da pessoa jurídica, para coibir e penalizar os chamados crimes empresariais ao meio ambiente. O dano ambiental quando comprovado mediante prova pericial de contaminação de rio que abastece a comunidade, a responsabilidade do causador do dano é imposição legal inafastável. Com muito maior rigor, nos casos de reincidência (Apelação Criminal n. 2002.009942-8, de Cunha Porã).

 

            Como se observa, a sentença dada pelos tribunais superiores demonstra a tendência em se aplicar a Lei de Crimes Ambientais ao poluidor do meio ambiente, inclusive a responsabilidade penal. Convém ainda esclarecer que, a depender do caso concreto as três espécies de responsabilidade podem ser aplicadas cumulativamente ao poluidor do meio ambiente, conforme demonstrado na decisão abaixo:

APELAÇÃO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. AÇÃO PENAL E AÇÃO CIVIL. COISA JULGADA. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. PODA DE ÁRVORES SEM A DEVIDA AUTORIZAÇÃO E SEM A DEVIDA OBSERVÂNCIA DOS PROCEDIMENTOS TÉCNICOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CONDENAÇÃO À REPARAÇAO DO DANO CIVIL (Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Apelação nº 10024044265635022. 4ª. Câmara Civil, 04/12/2013, Relator Dárcio Lobardi Mendes)

 

O egrégio tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais entendeu pela não ocorrência de Bis in Idem, e pela aplicabilidade de duas espécies de responsabilidade, consoante a Lei de Crimes Ambientais.

 

5. O LICENCIAMENTO AMBIENTAL DA SAMARCO E AS RECOMENDAÇÕES DOS ORGÃOS ESTATAIS

           

Antes de analisar como se deu o licenciamento ambiental da empresa Samarco, responsável pela tragédia que ocorreu em Mariana no Estado de Minas Gerais é preciso, primeiramente, comentar sobre o significado e aplicabilidade do licenciamento ambiental, inclusive no que diz respeito ao regramento legal e competência para a sua realização.

            Doutrinariamente, o licenciamento ambiental é definido como um instrumento que possibilita exercer o controle prévio sobre as atividades empresariais que façam uso dos recursos naturais e que apresenta risco potencial para a qualidade ambiental.

A Resolução nº 237 de 1997 do Conama, traz a definição legal de licenciamento ambiental:

 

Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições: I - Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. II - Licença Ambiental: ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental (BRASIL, RESOLUÇÃO Nº 237 DE 1997, CONAMA).

 

Para o Ministério do meio Ambiente, o licenciamento ambiental é um instrumento de Política Nacional do Meio Ambiente que foi estabelecido através da Lei nº 6.938/1981 e que tem por objetivo principal, promover a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental, bem como assegurar o desenvolvimento socioeconômico de forma sustentável.

            Com base nas definições aqui apresentadas, é possível concluir que o licenciamento ambiental é um procedimento administrativo obrigatório, realizado pelo órgão ambiental competente, que pode ser federal, estadual ou municipal, cuja atribuição é fazer uma análise acerca das propostas apresentadas pelos empreendimentos (empresas) que em suas atividades utilizam os recursos ambientais. Se a análise for favorável, a empresa consegue o licenciamento por meio da Administração Pública, que a concede. Assim, no âmbito da Política Nacional do Meio Ambiente o licenciamento ambiental é a ferramenta adequada para gerenciar e controlar de forma preventiva os recursos ambientais, segundo os preceitos da Lei nº 6.938/81.

Tem, ainda, um caráter pedagógico, pois através dos estudos ambientais relacionados ao licenciamento ambiental é possível realizar intervenções sustentáveis no meio ambiente.

Ademais, com o licenciamento ambiental é possível analisar, de antemão, a viabilidade ou inviabilidade de empreendimentos, como, por exemplo, a construção de usinas de energia elétrica, barragens, e de outros empreendimentos cuja atividade tenha potencial para causar danos ao meio ambiente. De acordo com o entendimento doutrinário, o licenciamento ambiental sem dúvida alguma é um dos principais instrumentos de análise de impacto ambiental e de adoção de medidas mitigadoras para a prevenção de danos ao meio ambiente.

            Segundo apontamentos de Metaxas (2015), a Lei nº 6.938 de 1981 foi uma das primeiras legislações ambientais a introduzir o conceito de licenciamento ambiental e de instituí-lo como um instrumento da politica nacional de meio ambiente.

            Conforme assinala Sirvinkas (2014), o licenciamento ambiental é imprescindível para os empreendimentos que utilizam recursos naturais, já que fornece parâmetros de análise de impactos ambientais. Devido aos seus propósitos, está em harmonia com o desenvolvimento sustentável e não se confunde com a licença ambiental, que, segundo o artigo 1º, inciso II da Resolução CONAMA Nº 001, de 23 de janeiro de 1986, é um ato administrativo praticado pelo órgão ambiental competente com a finalidade de condicionar, restringir, e fixar medidas de controle ambiental que devem ser cumpridas pelo empreendedor, para a instalação, concepção do empreendimento ou atividade utilizadora de recurso ambiental.

            Na mineração, que é uma atividade de alto impacto ambiental, o licenciamento ambiental se faz imprescindível, sendo obrigatória a realização do Estudo de Impacto Ambiental e outros estudos específicos, sem os quais os princípios da prevenção e da precaução não se efetivam, conforme se depreende da leitura o julgado abaixo.

 

AMBIENTAL. AGRAVO DE INSTRTUMENTO. ATIVIDADE DE MINERAÇAO. APARENTE AUSÊNCIA DE ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL. PRAZO DA AUTORIZAÇAO AMBIENTAL DE FUNCIONAMENTO EXPIRADO. PRINCIPIOS DA PREVENÇÃO E DA PREUCAUÇÃO – TUTELA ANTECIPADA – REQUISITOS PRESENTES-DEFERIMENTO. [...] Segundo ordenamento jurídico brasileiro, todo e qualquer empreendimento que implique em intervenção ao meio ambiente (...) deve ser precedido de estudo de impacto ambiental, de maior ou menor complexidade, bem como autorização/licença do órgão ambiental competente. (Agravo de Instrumento CV 1.004.12.013468-5001, Relator (a): Des (a) Versiani Penna, 5º Câmara Cível, julgamento em 20/06/2013, publicação da súmula em 28/06/2013 – preliminares rejeitadas – recurso não provido).

 

            Veja que se trata de um instrumento da politica ambiental sem o qual a atividade se torna inviabilizada.

No que se refere ao rompimento da Barragem do Fundão em Mariana Minas Gerais, cabe destacar que a causa direta foi o não seguimento das recomendações propostas no licenciamento ambiental.

Oportuno esclarecer que, em 2015 foi feito um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da barragem do Fundão, estudo esse realizado por Brandt Meio Ambiente, Indústria, Comércio e Serviços LTDA., no qual foi identificado os riscos e perigos na construção da barragem, inclusive a empresa apontou a necessidade de fiscalização e monitoramento contínuos, bem como a necessidade de previsão de comunicação social entre a empresa Samarco e a população sobre a operação da barragem (FARIA; BOTELHO, 2016).

 

5.1 O rompimento da barragem do Fundão em Mariana

 

            Segundo Faria e Botelho (2016), as atividades desenvolvidas pelas empresas mineradoras tem condão de gerar uma quantidade significativa de detritos, sendo que esses precisam ser acumulados em barragens apropriadas para a contenção dos grandes volumes de detritos que são produzidos diariamente.

            Nos últimos tempos, com a expansão sem precedentes da indústria e da sociedade de consumo, ocorreu um aumento de mineradoras em todo o mundo. De certa forma a atividade mineradora exerce importante papel para o desenvolvimento econômico e tecnológico. Mas, se de um lado as atividades das mineradoras beneficiam o crescimento econômico, de outro, tem um potencial significativo para ocasionar desastres ambientais, devido aos detritos produzidos pelo processo de lavra e benefiamento (FARIA; BOTELHO, 2016).

            Na condução de suas atividades, as empresas mineradoras precisam construir barragens para contenção desses detritos. Nesse sentido, a literatura conceitua a barragem como uma estrutura (parede) que tem por objetivo fazer a contenção de detritos, resíduos ou reservatório de água. A construção de uma barragem requer conhecimentos e habilidades quanto aos métodos corretos e técnicas corretas para a contenção dos detritos, bem como monitoramento e acompanhamento pelas mineradoras desde a fase inicial de criação da barragem, para que isso não resulte em desastres ambientais, como ocorreu na Barragem do Fundão em Mariana, em Minas Gerais.

            Segundo Faria e Botelho (2016), a Barragem de Rejeitos do Fundão (BRF), juntamente com a Pilha de Rejeitos da Cava do Germano e a Barragem de Germano integravam de forma conjunta o sistema de disposição de rejeitos da Samarco Mineração, localizada no Município de Mariana, no Estado de Minas Gerais. Entrou em operação em 2008 e conforme o relatório elaborado por Auditores Fiscais do Trabalho com a finalidade de levantar as causas do rompimento da barragem, a mesma era composta por 70% de detritos onerosos e 30% de lama (FARIA; BOTELHO, 2016).

O referido sistema, segundo demonstram os estudos ambientais, desde a implantação da Barragem do Fundão já apresentava riscos de desastres ambientais devido a uma deterioração progressiva da capacidade de suporte do volume de detritos armazenados. Apesar de ter conhecimento disso e da necessidade de correção de falhas apontadas por empresas de consultoria técnicas contratadas para analisar a barragem, as recomendações propostas, dentre as quais a redução imediata dos rejeitos, e correções das falhas encontradas na construção da barragem não foram realizadas e isso acabou resultando no desastre ambiental de Mariana que atingiu não apenas o meio ambiente natural, mas em perdas de vidas humanas da população local e dos trabalhadores que se encontravam no local. Esse desastre ocorreu em 5 de novembro de 2015. (FARIA; BOTELHO, 2016)

Oportuno esclarecer, do ponto de vista ambiental, que a classificação em relação ao risco de ocorrência de um desastre ambiental foi de categoria III, sendo essa considerada a maior em conformidade com a legislação brasileira. Para se chegar a essa classificação foram analisados a “função da altura do maciço, volume do reservatório, ocupação humana a jusante, interesse ambiental e instalações à jusante da barragem” (FARIA; BOTELHO, 2016).

Assim, considerando os antecedentes do rompimento da Barragem do Fundão de Mariana em Minas Gerais, pode-se inferir pela interceptação dos estudos publicados em torno deste acontecimento, dentre os quais o de Faria e Botelho (2016), que de fato se tratava de uma “tragédia anunciada”, até porque, tais desastres não são incomuns de ocorrerem com as mineradoras. No entanto, no Brasil, esse desastre foi um dos maiores em termos de perda de vidas humanas e de prejuízos para o meio ambiente na história da mineração brasileira (FARIA; BOTELHO, 2015).

Esse acontecimento despertou o interesse de alguns estudiosos do direito em analisar quais seriam as causas do acidente:

 

Esse acidente de trabalho ampliado e sua consequente catástrofe ambiental revelam falhas nos processos de gestão da empresa, licenciamento, fiscalização, monitorização e do sistema de emergência, que foram incapazes de garantir a segurança da barragem, da própria empresa e das populações afetadas, o que nos permite concluir pela insustentabilidade da gestão ocupacional e ambiental adotadas (FARIA; BOTELHO, 2016, p.02)

 

            De fato, a forma como a empresa conduziu suas atividades, especialmente no que tange à sua conduta para o cometimento do crime ambiental está devidamente explicada na denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, que será comentada seguidamente.

 

6 A DENÚNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DE MINAS GERAIS

 

            A denúncia do Ministério Público Federal do Estado de Minas Gerais, proposto pela Procuradoria da República nos Estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Força Tarefa Rio Doce, cujo objetivo foi o de promover o Procedimento Investigatório Criminal, reúne informações consistentes e detalhadas acerca das pessoas apontadas como responsáveis pelo desastre ambiental, mormente das circunstâncias do crime no âmbito da legislação ambiental e do Código Penal, tendo em vista que o desastre resultou em morte da população local e dos trabalhadores que se encontravam na barragem, estabelece a autoria dos crimes, a omissão da empresa neste processo, além da imputação dos crimes e sua individualização para cada uma das pessoas citadas na referida denúncia.

            Em relação aos fatos criminosos e seus impactos ambientais, a denúncia apresenta em detalhes como ocorreu o rompimento da Barragem do Fundão de Mariana, Minas gerais, narrando toda a dinâmica do desastre ambiental, as áreas atingidas pelo desastre, inclusive a denúncia conta com imagens ilustrativas para demonstrar os efeitos dos impactos ambientais com o rompimento da barragem.

            A referida denúncia tipifica os crimes relacionados a esse evento, quais sejam: crime de poluição qualificado, crimes contra a fauna, crimes contra a flora, crimes contra o ordenamento urbano e patrimônio cultural, crimes contra a administração ambiental etc. A investigação e análise de cada um desses crimes é fundamentado na legislação ambiental.

            Em relação aos crimes no âmbito do Código Penal, a denúncia do Ministério Público Federal de Minas Gerais relacionou os seguintes: crime de inundação; crime de desabamento e de desmoronamento; crime de homicídio e de suas qualificadoras, frente às mortes relacionadas e tendo como nexo causal o rompimento da barragem; e os crimes de lesão corporal. Todos os crimes aqui citados e que efetivamente se deram em decorrência do crime ambiental, são devidamente fundamentados na legislação penal, conforme se depreende da leitura da denúncia em epígrafe.

            Quanto à questão da autoria, a denúncia apresenta um relato bem consistente acerca das origens, problemas e falhas de rejeitos do Fundão (SRF). Aponta, inicialmente, que a empresa Samarco Mineradora, ao decidir pela construção da barragem, assumiu uma situação típica de risco, ou seja, da possibilidade da atividade da empresa ocasionar danos físicos, patrimoniais às comunidades humanas e do ecossistema localizado próximo à barragem. Em um dos trechos da denúncia:

Considerando que risco é conceito de corte matemático (intangível) que traduz a probabilidade de ocorrência de determinado evento em dadas circunstâncias e que perigo é a potencialidade que possuem alguns corpos, objetos ou substâncias de causarem danos a outros objetos, corpos ou substâncias, resta claro, não apenas pelo senso comum, mas pelos estudos, coletas de dados, resgates históricos e formulações matemáticas realizados por ocasião do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) que, efetivamente, a barragem de Fundão representava, por inerência e escolha locacional, um perigo para os bens sobreditos, e que, por consequência, houve mensuração dos riscos (DENÚNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DE MINAS GERAIS). 

O crime ambiental acabou se concretizando com o rompimento da barragem, ocasionando danos patrimoniais e morais. Sua ocorrência foi potencializada pelo método escolhido para a construção da barragem, havendo evidências de má construção e não adequação de técnica de engenharia aos rejeitos da empresa mineradora.

Ainda, na denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal de Minas Gerais, as análises feitas em relação à construção dos diques 1 e 2, enfim, da barragem como um todo, deixa evidente que dentre as técnicas para a construção de barragens a empresa optou pela utilização da “mais insegura técnica construtiva de barragens, o alteamento a jusante e montante”.  

Pelo fato de ter ocorrido diversos problemas com a barragem desde a sua construção e que estão relatados com riqueza de detalhes e imagens na denúncia em epígrafe, a empresa não agiu da forma como deveria para corrigir as falhas encontradas e apontadas no relatório ITRB de dezembro de 2013. Ao deixar de agir, a empresa acabou se omitindo frente aos problemas para os quais se exigia uma resposta imediata, ou seja, cometeu crimes por ação e por omissão. 

Em relação aos crimes cometidos por cada uma das pessoas que foram inseridas na denúncia do Ministério Público Federal, foi discriminado o tipo penal incorrido, bem como a sanção para cada um dos crimes cometidos. Ao todo a denúncia configura-se como um documento legal primoroso quanto à descrição e elementos de prova do crime ambiental.

            Vale mencionar que o Estado, neste aspecto, também tem a sua parcela de culpa, pois não utilizou da forma como deveria o seu poder de policia. De acordo com a explanação de Mazza (2014), poder de policia se constitui como uma das três funções precípuas da Administração Pública moderna, e representa uma atividade estatal restritiva em relação aos interesses privados, de forma a impor limitações a liberdade das pessoas físicas e jurídicas sempre em favor do interesse público. No caso considerado, no mínimo o Estado foi omisso em relação à fiscalização. E de certa forma contribuiu coma tragédia ambiental que ocorreu na Barragem do Fundão em Mariana –MG.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O presente artigo buscou traçar alguns questionamentos, dentre os quais o crime ambiental praticado pela pessoa jurídica, ou seja, de que maneira ela e os seus dirigentes são responsabilizados, tendo como parâmetro de análise o desastre ambiental provocado pela mineradora Samarco com o rompimento da Barragem do Fundão em Mariana, MG, considerado um dos piores acontecimentos já registrados no âmbito da mineração.

Observou-se que a legislação ambiental no Brasil, desde a instituição da Política Nacional do Meio Ambiente em 1981 muito avançou no sentido de responsabilizar as empresas em relação aos danos ambientais, merecendo destaque as inovações da Constituição Federal de 1988 que passou a admitir também a responsabilização penal, e a Lei de Crimes Ambientais promulgada posteriormente, com a finalidade de cumprir este preceito constitucional.

Como visto no decorrer desta pesquisa, além dos dirigentes, gerentes e demais pessoas relacionadas aos danos ambientais que respondem pelos crimes, podendo inclusive serem presas pelos danos ocasionados ao meio ambiente, a empresa, pessoa jurídica também deve responder. Administrativamente, existem várias sanções para as empresas, inclusive a proibição de contratar com a Administração Pública.

No caso da mineradora Samarco, a denúncia do Ministério Público Federal fez um levantamento criterioso sobre os acontecimentos que resultaram no crime ambiental sem proporções na história recente do país, bem como a participação e responsabilidade de cada um dos envolvidos.

Ficou destacado que em matéria ambiental a responsabilidade das empresas é sempre objetiva, pois ao utilizar os recursos do meio ambiente elas assumem o risco de promover a degradação ambiental. Espera-se que todos os envolvidos no crime ambiental, e os responsáveis indiretos, sejam de fato punidos, conforme estabelecido na denúncia do MP, e que a punição sirva de exemplo para que as empresas mineradoras e o próprio Estado tomem os cuidados necessários para que desastres desta magnitude não mais aconteçam no país. 

 

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