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Aplicação da excludente de culpabilidade no delito de infanticídio


Autoria:

Caroline Reis David Araújo


Bacharel em Direito, graduada pela UNIPAC. Pós-graduada em Direito Previdenciário pelo Damásio Educacional.

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Resumo:

o infanticídio que tem como seu objeto jurídico a proteção à vida humana extra-uterina (antes da saída do ventre da mãe).Este delito possui elementos normativos que estão elencados no próprio tipo penal.

Texto enviado ao JurisWay em 14/02/2017.



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1. Introdução                 

 

O infanticídio existe no Código Penal desde 1820, presente no artigo 198, nos seguintes termos: “Se a própria mãe matar o filho recém-nascido para ocultar sua desonra: pena de prisão com trabalho por 1 a 3 anos”.

            Com o decorrer dos anos e com a renovação do Código Penal em 1890, o artigo referente ao infanticídio teve algumas modificações e apresentou a seguinte tipificação: “Matar recém-nascido, isto é, infante, nos sete primeiros dias do seu nascimento, quer empregando meios diretos e ativos quer recusando à vítima os cuidados necessários à manutenção da vida e a impedir sua morte. Pena de prisão cellular por seis a vinte e quatro anos. Parágrafo Único: Se o crime for perpretado pela mãe, para occultar a desonra própria: pena de prisão cellular por três a nove anos.” (art. 298)

            Vale ressaltar, que a pena cominada para o infanticídio em 1890 foi a mesma dada ao homicídio, dessa forma, tornou-se injustificável existir dois tipos de crimes. Existia somente uma diferenciação e esta era em relação ao sujeito ativo. Se a ação fosse praticada pela mãe, a pena seria abrandada em três anos a nove anos.

            Em 1940 com veio a consagração final do infanticídio, com a seguinte previsão: “Matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após”.

O infanticídio conceitua-se pelo do verbo matar, do mesmo modo que é o delito de homicídio, que tem como significado acabar com a vida alheia. É o ato de agir da própria mãe, que ocorre durante ou logo após o parto resultando no óbito do próprio filho.

O delito em comento pode ser praticado pelo meio comissivo, sendo aquele que é intencional, como por exemplo: fraturas cranianas, enforcamento, estrangulamento entre outros, ou pelo meio omissivo, sendo aquele que a mãe deve agir para impedir o resultado, como exemplo: deixar de amamentar a criança, abandonar o filho em lugar ermo, no entanto, todos estes atos para provocar a sua morte.

Assim, tem-se:

1."matar" ( núcleo verbal, tirar a vida alheia);

 2. sob a influencia do estado puerperal (situação de alterações e transtornos mentais, advindas das dores físicas capazes de alterar temporariamente o psiquismo da mulher previamente sã de modo a levá-la a agir violentamente contra o próprio filho durante o seu nascimento ou logo após o parto);

3. o próprio filho ( se a mãe, conferindo a criança, acreditando ser dela, e vem a matar, comete o crime de infanticídio, artigo 123 do CPB. Porém, se a identidade da criança, não foi conferida,  houve erro quanto à pessoa artigo 20 § 3º do CPB, contudo, responderá pelo crime de homicídio, artigo 121 do CPB).

 

            No que tange ao sujeito passivo do delito, o artigo faz referencia ao filho. Este possui uma denominação diferente em virtude do “tempo” em que é cometido o delito. Se o delito ocorrer durante o parto, o filho será denominado “ser nascente” e se ocorrer logo após este será denominado “recém-nascido” ou “neonato”.

            O infanticídio somente ocorre se o ser nascente tiver vida e um dos meios como é caracterizado como sinal de vida é a respiração, sendo considerado um sinal de atividade funcional, mesmo que seja de forma mínima.

             Já o sujeito ativo do delito é a própria mãe, entretanto, este delito não pode ser considerado um crime de mão própria, pelo fato do mesmo pode ter co-autoria ou/e partícipe para a prática do ato.

            No que tange a culpabilidade da mãe infanticida sabe-se que é passível de diversos questionamentos, pelo fato de ser utilizado o critério biopsicológico e sendo assim, cada caso concreto deverá ter uma analise específica. Tema este que será abordado no presente trabalho.


2. Do delito de infanticídio

 

O infanticídio conceitua-se pelo do verbo matar, do mesmo modo que é o delito de homicídio, que tem como significado acabar com a vida alheia. É o ato de agir da própria mãe, que ocorre durante ou logo após o parto resultando no óbito do próprio filho.

O delito em comento pode ser praticado pelo meio comissivo a exemplo de fraturas cranianas, enforcamento, estrangulamento entre outros, ou pelo meio omissivo, sendo aquele que a mãe deve agir para impedir o resultado, como exemplo: deixar de amamentar a criança, abandonar o filho em lugar ermo, no entanto, todos estes atos para provocar a sua morte.

No que tange ao sujeito passivo do delito, o artigo faz referencia ao filho. Este possui uma denominação diferente em virtude do “tempo” em que é cometido o delito. Se o delito ocorrer durante o parto, o filho será denominado “ser nascente” e se ocorrer logo após este será denominado “recém-nascido” ou “neonato”.

O infanticídio somente ocorre se o ser nascente tiver vida e um dos meios como é caracterizado como sinal de vida é a respiração, sendo considerado um sinal de atividade funcional, mesmo que seja de forma mínima.

Já o sujeito ativo do delito é a própria mãe, entretanto, este delito não pode ser considerado um crime de mão própria, pelo fato do mesmo pode ter co-autoria ou e partícipe para a prática do ato. Tema este que será abordado a diante com maior relevância.

Em relação à culpabilidade, deve ser observado o estado puerperal, e neste sentido, é primordial que sejam feitas algumas averiguações.

De acordo com Deltron Croce e Delton Croce Júnior (2007, p. 571), as averiguações são as seguintes:

 

a) A existência de parto, e, em caso afirmativo, se ele é recente, pois se antigo descaracterizará, evidentemente, o delito;

b) Confirmado o parto recente, as condições em que o mesmo ocorreu;

c) Se a imputada, após o crime, escondeu ou não o filho morto;

d) Se ela tem lembrança do ocorrido;

e) Se ela simula o ocorrido;

f) Se não é portadora de antecedentes psicopáticos, agravados pela gestação, o parto e o puerpério, pois, se for, a reprimenda não será a prevista no artigo 123, mas, sim a descrita no artigo 26, ou parágrafo único, do Código Penal.[1]

 

Para averiguar a ocorrência deste delito faz-se necessário distinguir puerpério de estado puerperal que define a prática delitiva de homicídio ou infanticídio.


2.1. Bem jurídico tutelado

 

A priori, verifica-se que o bem jurídico tutelado é a vida, como ocorre no homicídio, no caso em questão protege-se a vida do filho.

Insta dizer que fazendo uma comparação com o delito de homicídio surgi duas particularidades a relação dos sujeitos com o crime e em relação ao período de vida que o legislador destinou-se a proteger.

Em relação aos sujeitos do crime, figura no pólo passivo sempre o filho, nascido ou recém-nascido e no pólo ativo pode figurar a mãe que esteja sob influência do estado puerperal e a mesma pode ainda contar com uma ajuda de um terceiro.

O infanticídio possui uma elementar normativa, que entende-se ser o “estado puerperal”, caso o fato típico não venha a possuir esta elementar normativa, ficará caracterizado outro crime, no caso em questão, se a mãe cometer o delito esta deverá responder por homicídio.

Este posicionamento não afasta a possibilidade de existir o concurso de agentes. Com base no artigo 29 do Código Penal, a pessoa que ajude ou auxilie para a prática do delito incide nas penas a este cominadas.

Tem-se também o artigo 30 do Código Penal diz que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam, salvo quando estas forem elementares do crime.

No delito de infanticídio, existem diversas discussões doutrinárias com relação à comunicabilidade ou não da elementar normativa do delito referente à influência do estado puerperal.

Assim, tem-se o posicionamento majoritário sobre a comunicação do estado puerperal com o partícipe e o co-autor.  Segundo Damásio, (2005, p. 112) a co-autoria pode ser classificada em três hipóteses. Sendo assim:

 

1ª) a mãe e o terceiro realizam a conduta do núcleo tipo “ matar” ( pressupondo o elemento subjetivo específico); 2ª) a mãe mata a criança contando com a participação acessória do terceiro; 3ª) o terceiro mata a criança com a participação meramente acessória da mãe. Examinemos as três situações: 1ª) ambos matam a criança: se tomarmos o homicídio como fato, haverá a seguinte incongruência: se a mãe mata a filha sozinha, a pena é menor; se com o auxílio de terceiro, de maior gravidade deverá responder por esse delito, sob pena de quebra do princípio unitário que vige no concurso de pessoas; 2ª)  a mãe mata a criança: o fato principal é Infanticídio, a que acede a conduta do terceiro, que também deve responder por esse delito. Solução diversa só ocorreria se houvesse texto expresso a respeito; 3ª) o terceiro mata a criança, contando com a participação acessória da mãe: o crime não pode ser de homicídio, uma vez que, se assim fosse, haveria outra incongruência: se induzisse ou intigasse o terceiro a executar a morte do sujeito passivo, responderia  por delito mais grave (participação no homicídio).

 

Assim, conclui-se que o terceiro envolvido responde pelo delito de infanticídio. E que o estado puerperal, sendo o elemento essencial para o delito, então assim comunica-se com o co-autor.

Com isso, afirma-se que o co-autor responde pelo delito de infanticídio e que atualmente neste sentido a doutrina é bastante clara.

 


2.2. Consumação e tentativa

 

No delito do infanticídio a consumação ocorre no momento da morte do recém-nascido ou do neonato. Depende somente provar que o feto estava vivo, no momento em que a mãe realiza a conduta de matar o filho, dessa forma, consuma-se o delito.

O delito em comento sendo um crime material permite-se a tentativa, ocorrendo após a mãe ter iniciado os atos de execução e por circunstancias alheias à sua vontade não conseguiu concluí-los.

Ressalta-se que se o feto já estiver morto e mãe venha a praticar todos os atos executórios, não sofrerá nenhuma pena, pelo fato de se tratar de crime impossível.

Caso a mãe venha a provocar a morte de seu filho antes do início do parto, responderá pelo delito de aborto, presente no artigo 124 do Código Penal. Se a mãe matar o filho “durante ou logo após o parto”, não estando presente a influência do estado puerperal, ou se for muito tempo após o parto, a mãe responderá pelo delito de homicídio.           

 

2.3. Sujeito ativo

 

O delito de infanticídio tem como atribuição de crime próprio, onde se exige que aquele que o pratica tenha uma condição especial para ser enquadrada.

Assim, de forma expressa pelo Código Penal, somente a mãe será tipificada como sujeito ativo do delito.

Para Fernando Capez (2004, p. 135), “sujeito ativo é a pessoa humana que pratica a figura típica descrita na lei, isolada ou conjuntamente com outros autores. O conceito abrange não só aquele que pratica o núcleo da figura típica (quem mata, subtrai etc.), como também o partícipe, que colabora de alguma forma na conduta típica,[...]”

 Segundo Damásio de Jesus (2004, p. 427) relata quanto ao sujeito ativo no infanticídio que a “autora só pode ser a mãe. Trata-se de crime próprio, uma vez que não pode ser cometido por qualquer pessoa”.

O artigo 123 do Código Penal é omisso em relação a participação de terceiros na realização do delito. Por causa desta lacuna, deve ser aplicado o artigo 30 do Código Penal, ou seja, o Código Penal prevê a comunicabilidade das elementares ao terceiro que participar em concurso de pessoas no infanticídio.

Segundo Cleber Masson (2010, p. 61), “cuida-se de crime próprio, pois somente pode ser praticado pela mãe. Admite, todavia, coautoria e participação”.

Tendo a mesma linha de pensamento afirma CAPEZ (2009, p. 115) que “trata-se de crime próprio. Somente a mãe puérpera, ou seja, a genitora que se encontra sob influência do estado puerperal, pode praticar o crime em tela. Nada impede, contudo, que terceiro responda por esse delito na modalidade de concurso de pessoas.”

De forma contrária do homicídio, o infanticídio, por ser considerado um crime próprio, possui sujeito ativo específico, no caso a mãe. Entretanto existe a possibilidade de responder pelo delito de infanticídio a terceira pessoa que venha a praticar os atos com a mãe, atuando como co-autor ou então partícipe.


2.4. Sujeito passivo

 

No pólo passivo pode figurar o nascente e o neonato. Mas para que possa haver o delito a criança é imprescritível que a criança esteja viva e que a morte venha ser causada pela mãe, somente por ela ou com ajuda de terceiros.

Quanto ao sujeito passivo, Greco (2009, p. 48/49) diz que pode ser formal ou material:

 

SUJEITO PASSIVO FORMAL – é sempre o Estado, que sofre danos toda vez que suas leis são desobedecidas.

SUJEITO PASSIVO MATERIAL – é o titular do bem jurídico tutelado sobre o qual recai a conduta criminosa. Em alguns casos, pode ser o Estado. Ex.: crimes contra a Administração Pública”.

 

Mirabete (2004, p. 125) entende ser o sujeito passivo “o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado pela conduta criminosa”.

Ressaltando que a criança deverá nascer com vida para que se possa consumar o delito, caso contrário será considerado crime impossível.

 

2.5. Concurso de pessoas

 

            Percebe-se que o concurso de pessoas no delito de infanticídio também é um ponto de diversas divergências doutrinárias. Tendo como base o estado puerperal, a co-autoria tem dois posicionamentos.

            Para os juristas Nelson Hungria e Heleno Cláudio Fragoso, o estado puerperal é considerado uma circunstância fisiopsicológica personalíssima, assim, terceiros não podem ter o benefício presente no artigo 123 do Código Penal.

            O outro posicionamento é defendido por Frederico Marques e Magalhães Noronha, é aquele que admiti a comunicabilidade a todos os agentes que pratiquem o delito em questão.

            Observa-se que o artigo 30 do Código Penal, trata das circunstâncias incomunicáveis do crime, entretanto, ocorre a comunicabilidade quando existirem circunstâncias ou condições elementares do crime.

            Pode-se destacar que segundo Frederico Marques (2004, apud GLÁUCIO RIBEIRO, 2004, p. 119):

 

que o benefício limita-se aos terceiros partícipes, pois, se estes provocarem a morte do que está nascendo ou do recém-nascido sem a cooperação da parturiente, não se pode aplicar o dispositivo do artigo 30 do Código Penal, motivo pelo qual responderão por homicídio.

 

             Sendo assim, quando há a participação do terceiro como co-autor utiliza-se o artigo 30 do Código Penal, entretanto, quando o terceiro é o partícipe do delito deve ser utilizado o artigo 29 do Código Penal, que visa não praticar os atos executórios do delito, mas concorre de qualquer modo para o delito seja realizado.

            Dessa forma, percebe-se que existe uma diferença entre autor, co-autor e partícipe. Sendo os dois primeiros aqueles que executam o comportamento descrito no núcleo do tipo e o partícipe é aquele que concorda com a conduta da realização do crime, visando praticar atos diversos do autor.

            Com isso, os autores, co-autores e partícipes respondem pelo mesmo delito, em virtude, do artigo 29 do Código Penal. Apenas é utilizada uma penalidade diferenciada para o partícipe.

            Entretanto, observa-se que ao término do artigo em comento é citado “na medida de sua culpabilidade”. Assim, percebe-se que existe um fato comum a todos que participam do delito, mas os mesmos serão responsabilizados na medida da sua culpa. Com isso, percebe-se que há a mitigação do princípio da unidade do crime.


2.6. Causas morte

 

No que tange a causas morte, verifica-se que a mesma pode ocorrer de diversas formas, podendo ser até mesmo a morte natural. No entanto, o questionamento realizado no presente estudo, são as causas morte no delito de infanticídio.

Segundo Maggio (2001, p. 40/41) afirma que “durante o parto, a morte criminosa do nascente é menos freqüente, porém, é possível na fase de coroamento cefálico, por contusão craniana ou por perfuração das fontanelas e, após a exteriorização da cabeça, por obstrução direta dos orifícios externos das vias respiratórias”. [2]

Nas palavras de Capez :

 

Trata-se de crime de forma livre, que pode ser praticado por qualquer meio comissivo, por exemplo, enforcamento, estrangulamento, afogamento. Fraturas cranianas; ou qualquer meio omissivo, por exemplo, deixar de amamentar a criança, abandonar recém-nascido em lugar ermo, com o fim de provocar a sua morte.”[3]

 

Insta dizer que dentre as diversas causas da morte do recém-nascido, existem algumas que são consideradas mais importantes. Isto pode ser verificado com as palavras de Hélio Gomes, que faz uma exposição das causas mortes mais importantes.

 

a)Fraturas do crânio - resultantes de golpes ou da projeção da cabeça contra uma parede ou assoalho; b) Sufocação – (ato de sufocar, de impedir a respiração), podem ocorrer por diversos processos, tais como: obturar o nariz e a boca com as mãos, travesseiros ou almofadas, comprimir o tórax com o peso do próprio corpo; confinar o recém-nascido em caixas ou baús; e, mais raramente, o enterramento vivo do recém-nascido; c)Estrangulamento pode ser feito com a mão causando também a sufocação, ou com um laço feito com a utilização do próprio cordão umbilical; d) Submersão – ocorre quando o recém-nascido é imerso em aparelhos sanitários ou qualquer outro recipiente contendo substância líquida; e) Feridas – causadas geralmente por instrumentos cortantes, visando a mutilações e despedaçamentos, para facilitar a ocultação dos despojos; f) Queimaduras - geralmente são acidentais, porém no Infanticídio é mais comum com o emprego do fogo para fazer desaparecer o cadáver, embora a utilização de ácido sulfúrico é capaz de fazer desaparecer um corpo mesmo adulto; g) Envenenamento - é considerada uma forma excepcional, porém, é admitida a possibilidade do derramamento de substâncias dentro da boca, através de esponjas embebidas em veneno; h) Falta de cuidado para manter a vida –caracteriza a modalidade de Infanticídio por omissão, ou seja, pela falta de ligadura do cordão umbilical, a privação de alimento bem como deixar mucosidades na boca do neonato. [4]

 

Como já foi abordado anteriormente, o delito infanticídio para ser constituído não necessita apenas da presença do estado puerperal, mas sim, que seja cometido o delito durante ou após o parto.


2.7. Agravantes

 

No crime em apreço, as agravantes não são impostas. Pelo fato de existir o “bis in idem”, ou seja, não pode existir a repetição de uma sanção sobre o mesmo fato.

Dessa forma, não há incidência das agravantes previstas no artigo 61, II e “h” do Código Penal, o mesmo versa sobre o delito cometido contra descendente e contra criança. Assim, verifica-se que no delito do infanticídio já possui o mesmo contexto pertinente ao artigo acima referenciado.

Greco (2010, p. 226) em sua obra faz o seguimento questionamento:

 

Tratando-se de crime de Infanticídio, como o fato narrado no tipo penal diz respeito à conduta da mãe que, influenciada pelo Estado Puerperal, causa a morte de seu próprio filho, durante o parto ou logo após, caberia a aplicação da circunstância agravante prevista no art. 61, II, e, segunda figura (ter cometido o crime contra descendente)?”

 

E a resposta não poderia ser outra, senão:

 

Não, pois, caso contrário, estaríamos fazendo uso do chamado ‘bis in idem’, pois que a própria redação contida no caput do art. 61 do Código Penal diz serem “circunstancias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualifiquem o crime. Na infração penal em estudo, a condição de filho é elementar constitutiva do delito de Infanticídio, razão pela qual a pena não poderá ser agravada no segundo momento do critério trifásico previsto pelo art. 68 do Código Penal.

 

Contudo, verifica-se que as agravantes não podem ser utilizadas no delito em comento, pelo fato de não constituírem ou qualificarem o delito.

 

2.8. Pena e ação penal

 

O artigo 123 do Código Penal prevê a pena para aquele que pratica o delito de infanticídio que é detenção de dois a seis anos.

A ação penal é a pública incondicionada, ou seja, não necessita de representação.

A autoridade ao tomar conhecimento do fato, deve instaurar inquérito policial de ofício, independente da provocação de qualquer pessoa. O Promotor Público, ao receber o inquérito policial, deve iniciar a ação penal através de oferecimento da denúncia. Para se instaurar o procedimento criminal, não deve este se subordinar a qualquer condição de procedibilidade (DAMASIO, 2005).

A Constituição Federal prevê no artigo 5º, inciso XXXVIII, “d” e o artigo 74, parágrafo 1º do Código de Processo Penal, afirmam que a competência para julgar o delito em comento é o Tribunal do Júri, pelo fato de se tratar de crime doloso contra a vida.

Insta dizer que, a mãe após consumar o delito, venha a destruir o cadáver ou parte dele, esta responderá em concurso material pelos delitos descritos nos artigos 123 e 211 do Código Penal.

No que tange ao abandono do recém-nascido, logo após o parto, a parturiente irá praticar o delito de infanticídio apenas, pelo fato de que o delito de abandono já estar presente no artigo 123 do Código Penal, sendo assim há a absolvição pelo delito de infanticídio.


2.9. Elemento normativo temporal

 

O elemento normativo temporal presente no delito é o termo “durante ou logo após o parto”. Observa-se somente será configurado o delito quando a mãe estiver sob influência do estado puerperal e quando ocorrer durante ou logo após o parto. Vale ressaltar que não pode existir uma demora significativa e que ainda haja a comprovação da que a mãe estava sob influência do estado puerperal.

No que tange a expressão “durante o parto”, não há divergências sobre o conceito, pelo fato de compreender que se trata de um termo bastante claro e objetivo. E assim, sabe-se que este termo faz referência ao início até o término do parto.

Entretanto, no que se refere ao termo “logo após” existem diversos posicionamentos, pelo fato do termo ser subjetivo e não delimitar um período correto para se apurado.

               A doutrina tende para o entendimento que o parto deve coincidir com a duração do estado puerperal. Assim, não mais estando presentes os sintomas do estado puerperal, deve se considerar que chegou ao término o prazo para alegar a questão temporal.

Nesse sentido, tem-se o posicionamento de Magalhães Noronha (2000, apud RIBEIRO 2004, p. 89):

 

A lei não fixou prazo, como outrora alguns códigos faziam, porém, não se lhe pode dar uma interpretação mesquinha, mais ampla, de modo que abranja o variável período de choque puerperal. É essencial que a parturiente não haja entrado ainda na fase da bonança, em que predomina o instinto materno.

 

Tendo sido findada a fase em que a mãe tinha perturbações psíquicas causadas pelo estado puerperal, vindo a mesma adentrar em uma fase de calmaria, não existem mais motivos para se falar no delito de infanticídio. Com isso, verificam-se os requisitos necessários para se configurar o delito de homicídio.

 

[...] a conclusão lógica é que nenhuma das elementares – nem a personalíssima nem a temporal – pode ser avaliada isoladamente. Ambas devem ser analisadas individualmente, é evidente, mas devem ser avaliadas conjuntamente. A elementar logo após o parto só alcançará seu verdadeiro sentido se estiver subordinada à elementar anterior – sob a influência do estado puerperal. (RIBEIRO, 2004, p. 90)

 

            A doutrina de uma forma majoritária tem afirmado que deve existir uma interpretação mais ampla, para que assim possa compreender todo o período do estado puerperal.      


2.10. Tipo objetivo

 

Da mesma forma que acontece no homicídio, a figura típica do infanticídio está no núcleo do verbo matar. Mas neste caso, trata-se de matar a o ser nascente ou recém-nascido, enquanto a autora deve ser a mãe, esta que deve estar sob influência do estado puerperal e a influência devem ocorrer durante ou logo após o parto.

Como já foi citado anteriormente, trata-se de um crime próprio, haja vista que possui sujeitos específicos, somente a mãe pode cometê-lo e ainda deve ser contra seu próprio filho nascente ou recém-nascido.

 

2.11. Forma delituosa

 

O delito em comento admite apenas a forma dolosa, ou seja, quando a mãe tem a vontade de por fim a própria vida do filho.

Dessa forma, está presente o dolo, sendo admitido na sua forma direta, quando a mãe quer o resultado, ou eventual, quando a mãe não quer diretamente o resultado, mas assume o risco de produzi-lo.

Entretanto existe uma diferença entre o dolo homicida e o dolo infanticida, segundo MAGGIO (2001, p. 99) “O dolo homicida distingue-se do infanticida porque neste último a vontade do agente é impulsionada por uma influência anímica (proveniente da alma ou do psíquico) que não existe no dolo homicida”.

Todavia, o ponto que mais possui questionamento é a verdadeira culpabilidade da mãe.

A pergunta pertinente é se a mulher que venha matar culposamente seu filho, estando sob a influência do estado puerperal, no parto ou logo após, irá responder por infanticídio na modalidade culposa?

A previsão da modalidade culposa não foi esculpida em nenhum texto legal, de que se trata o delito de infanticídio.

Este assunto é o ponto central de diversas divergências doutrinárias, que entendem que a mãe deve responder por homicídio culposo, tendo em vista seu comportamento imprudente ou negligente.

Entretanto, para Mirabete (2007, p. 22) “a influência do estado puerperal não equivale à incapacidade psíquica e a puérpera responde pelo ato culposo, qualquer que seja ele.”

Contudo, existe outra posição doutrinária que compactua que se a mãe age de forma culposa, esta não deve responder por homicídio culposo e nem por infanticídio, tendo em vista que seu juízo mental não estar compatível com os acontecimentos do momento, mas deve se observar a presença do estado puerperal, que assim irá comprovar os distúrbios psíquicos da mãe.

De acordo com Masson (2010, p. 62), entende-se:

 

[...] a mãe não responde por crime nenhum, nem por homicídio culposo, nem por infanticídio. Isso porque a previsibilidade objetiva do crime culposo, aferida de acordo com o juízo do homem médio, é incompatível com os abalos psicológicos do estado puerperal. De fato, uma pessoa assim afetada não pode ser considerada detentora de inteligência e prudência medianas.

 

 

Ressalta-se que, caso a mãe venha a matar o próprio filho de forma culposa, sem a presença do estado puerperal, esta deverá responder por homicídio culposo, ou seja, para o doutrinador acima citado, o estado puerperal é que delimitada os requisitos para que assim possam enquadrar ou não, a mãe em um delito.


3. Estado puerperal

 

            Com o advento do Código Penal de 1940, a tipificação do motivo honra foi abandonada e com isso, passou-se a admitir o critério fisiopsicológico, ocorrendo assim a ligação da influência do estado puerperal ao tipo penal e tal influencia é tornou-se determinante para a tipificação do delito.

O estado puerperal é considerado como as consequências psíquicas referentes as circunstâncias do parto, ocasionadas possivelmente pela convulsão, emoção causada pelo choque físico, dentre outros e que assim, venham a ocasionar perturbações mentais.

            A influência do estado puerperal tem a concepção de ser o conjunto das perturbações psicológicas e físicas que a mulher pode ter em virtude do parto, e com isso praticar o delito de infanticídio.

            A corrente do pensamento jurídico penal deve ser tratada com mais atenção, pelo fato da mãe ter pouca capacidade de raciocínio sobre tal ato.

            Esse é outro ponto que possui diversas divergências não somente pelo conceito, mas sim pela sua duração e até em que ponto o estado puerperal pode influenciar realmente na conduta da mãe.

            Uma definição simples de estado puerperal é apresentada por Damásio de Jesus, ele afirma que “(...) conjunto das perturbações psicológicas e físicas sofridas pela mulher em face do fenômeno parto.”[5]

            A partir da definição de Damásio, percebe-se que para ele todas as mulheres que passarem pelo acontecimento do parto, irão apresentar certas perturbações tanto física como emocional, sendo estas supridas com o passar do tempo dentro de uma normalidade, que deve ser mantida por fatores de ordem interna (fisiopsíquico) e externa (sócio-econômicos, culturais).

            Considera-se o estado puerperal o período pós-parto ocorrido entre a expulsão da placenta e a volta ao estado normal anterior a gravidez.

            Dessa forma, com a expulsão da placenta, inicia-se a fase denominada puerpério, ou seja, uma depressão física e psíquica sofrida pela mulher logo após ou durante o parto. Tais perturbações podem continuar aproximadamente em torno de quarenta dias, entretanto, esta estipulação de tempo não é considerada como regra, em virtude de ser um elemento subjetivo e sendo assim, não há como limitar o período em que a mulher possa dar início a uma depressão e o momento do seu término é impreciso.

            Essa depressão pode cessar em pouco tempo se a parturiente tiver um devido acompanhamento médico e familiar, mas ressalta-se que a mesma deve ter uma vontade própria para não deixar ser influenciada por esse período delicado e assim não agravante a depressão.

            Todavia, algumas mulheres não conseguem admitir que estão em um período depressivo (puerpério) em virtude do parto e com isso, acabam realizando atos contra a sua vontade, como o delito em comento. Assim, tem-se o conceito de Mirabete (1997, p. 89):

 

Puerpério é o período que vai da dequitação (isto é, do deslocamento e expulsão da placenta) à volta do organismo materno às condições pré-gravídicas (...) Nele se incluem os casos em que a mulher, mentalmente sã, mas abalada pela dor física do fenômeno obstétrico, fatigada, enervada, sacudida pela emoção, vem a sofrer um colapso do senso moral, uma liberação de impulsos maldosos, chegando isso a matar o próprio filho. (...) podemos dizer até ‘normal’ da mulher que, sob o trauma da parturição e dominada por elementos psicológicos peculiares, se defronta com o produto talvez não desejado, e temido, de suas entranhas.[6]

           

            O puerpério pode ser divido em três fases, que são: Puerpério imediato, que é o período compreendido entre o primeiro e o décimo dia ; Puerpério tardio, que é o período compreendido entre o décimo e o quadragésimo quinto dia; e o Puerpério remoto, que é o período compreendido entre o quadragésimo quinto dia, até o momento em que o organismo da mulher retorne à normalidade de sua função reprodutiva. 

                Ressalta-se que a definição conhecida para o estado puerperal e o puerpério independentes de divergências doutrinaria, são eminentemente técnicas, ou seja, médicas. Ambos necessitam de laudos médicos para serem diagnosticados e comprovados.

            Para o Código Penal, não há nenhuma distinção entre o estado puerperal e o puerpério, tal definição somente para os fins científicos.


3.4. Análise do elemento psicológico e do elemento fisiopsicológico

 

            Parte-se da premissa que o infanticídio tem como elemento essencial para a sua culpabilidade o elemento psicológico. Sabe-se que este pode influenciar de diversas formas e graus no decorrer pós-parto.

            Ressalta-se que esse elemento psicológico não pode ser considerado como uma atitude única e exclusiva da mãe infanticida, ou seja, fatores externos possuem um imenso incentivo para que o ato ilícito seja praticado.

            À principio a mãe ao praticar o delito de infanticídio, tinha como objetivo resguardar a sua honra, e o critério utilizado era somente com base na honra, e por isso, passou a ter diversos questionamentos, pelo fato do bem jurídico vida ser mais importante que a honra.

            Não há que se questionar no que tange a comparação dos bens jurídicos vida e honra, tendo em vista que a vida sempre será o bem jurídico tutelado de suma importância, entretanto, estando a mãe em situação errônea e como conseqüência a mesma passa por momentos de perturbações e não pode contar com o apoio familiar e nem da sociedade, como esta irá conduzir a sua vida?

Sendo assim, o fator psicológico tem como objetivo demonstrar que cada mulher tem uma conduta diferenciada em relação ao fenômeno parto e a partir daí diversas conclusões podem ser retiradas.

            Tem-se o posicionamento de Bittencourt (2009, p.266): “que faz referência ao critério psicológico possuir uma pretensão para justificar o desejo de reservar a honra pessoal, podendo ser utilizado como exemplo, a necessidade de ocultar a maternidade indesejada.”

Ressalta-se que esta foi a corrente utilizada pelos doutrinadores até o advento do Código Penal, e com base neste contexto o fator fisiopsicológico foi atribuído ao delito, tentando assim evitar com as injustiças.

Já na corrente fisipsicológica o fator da honra e da prenhez ilegítima não estão mais relacionados a corrente psicológica somente, atualmente o critério utilizado é o estado puerperal.

Com isso, em virtude da influência do estado puerperal o privilégio do delito em questão foi ampliado, abrangendo assim os casos de prenhez legítima em que a mãe venha sofrer distúrbios fisiológicos e psíquicos ou morais.

 Sabe-se que o período do estado puerperal é bastante variável, podendo ocorrer somente por algumas horas ou então por alguns dias, e como regra, regride de forma espontânea e não deixa seqüelas. Para que um legista consiga identificar os elementos para concluir uma perícia são bastante complexos, pelo fato de que os sintomas já podem ter desaparecidos.

Com base nesta corrente, percebe-se que não só os elementos psicológicos são levados em consideração, mas também os elementos físicos que por muito tempo não foi questionado e nem teve relevância para o artigo em comento.


 4. Culpabilidade no infanticídio

 

A priori deve ser feito um breve relato do que seja um crime. O crime é composto por três elementos denominados: tipicidade; ilicitude e culpabilidade (reprovabilidade), sendo que essas possuem suas excludentes.

Para que fique caracterizado o crime os três elementos principais devem estar presentes na conduta do infrator, para que assim ele seja enquadrado em determinado crime previsto pelo Código Penal.

Conforme leciona Greco (2010, p. 85) “culpabilidade diz respeito ao juízo de censura, ao juízo de reprovabilidade que se faz sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente”

Observa-se que a culpabilidade pode ter a sua conduta reprovada ou censurada, sendo que a reprovada é aquela que não é aceita pela sociedade, ou seja, são os atos determinados como ilícitos no Código Penal e a censurada é aquela quando o agente podia ter agido de outra forma perante o fato que se encontrava.

 Com isso, passa-se a abordar a culpabilidade da mãe no delito de infanticídio, que estar previsto no artigo 123 do Código Penal. Esse artigo é considerado como uma forma privilegiada do homicídio.

 Assim, para que a mãe responda pelo delito, a mesma deve estar sob influência do estado puerperal, durante ou logo após o parto. Neste caso, estão presentes duas inquisições, que são: elemento subjetivo e a exclusão de culpabilidade em virtude do estado puerperal, já que este estado é caracterizado como um transtorno psicológico da mãe.

Esse artigo é alvo de diversos questionamentos, pelo fato do mesmo possuir muitas lacunas em seu texto. Existem alguns pontos que são mais questionados, sendo eles: a duração do estado puerperal e como delimitar a duração do “durante ou logo após”.

No entanto, existe um questionamento bastante intrigante que é a culpabilidade da mãe. Até que ponto a mesma é ciente dos seus atos? Se ela não tem consciência dos seus atos, então porque a mesma deve ser responder ou cumprir a pena prevista pelo artigo 123 do Código Penal?

Segundo Damásio Evangelista de Jesus (2005, p. 109), afirma que:

 

“nenhum delito pode ser caracterizado quando a mãe atua com culpa no seu ato, sob a influência do estado puerperal, tendo em vista que a parturiente, perturbada psicologicamente, não tem discernimento do que seja agir de acordo com as cautelas comuns impostas aos seres humanos.”

 

Já, Fernando Capez (2010, p. 266), aduz que o “elemento subjetivo da culpa, traz algumas deficiências de ordem pessoal da mãe que por isso devem ser observadas em sede de culpabilidade, mas não no fato típico e, por isso, a mãe deveria ser enquadrada no homicídio culposo”.

De uma forma mais clara, tem-se o posicionamento do Promotor Rogério Grecco, que combate o ponto principal do texto do artigo 123 do Código Penal, que trata da influência do estado puerperal, e assim, confronta o posicionamento defendido por Damásio.

 

pelo que se verifica da exposição feita pelo renomado tratadista, tenta-se afastar a responsabilidade pelo delito culposo erigindo-se a existência do estado puerperal, o que, segundo entendemos, não se justifica. Pode a parturiente, ainda que influenciada pelo estado puerperal, cuja ocorrência é comum, mesmo não querendo a morte de seu filho, deixar de tomar os cuidados necessários à manutenção de sua vida, agindo, pois, culposamente, caso a inobservância ao seu dever objetivo de cuidado venha a produzir a morte de seu próprio filho.

 

E ainda ressalta que:

 

Em suma, a influência do estado puerperal não tem o condão de afastar a tipicidade do comportamento praticado pela parturiente que se amolda, em tese, ao delito de homicídio culposo, embora tal fato deva influenciar o julgador no momento da fixação da pena-base, quando da análise das circunstâncias judiciais.

 

Assim, verifica-se que a influência do estado puerperal não deve ser utilizada para definir o enquadramento do delito, e sim, deve ser verificado no momento em que for fixada a pena-base de acordo com as análises das circunstancias judiciais e do entendimento do magistrado.

Por fim, far-se-á necessário considerar que em algum momento o estado puerperal será analisado de uma forma mais minuciosa, podendo ser considerado como um estado de depressão ou de transtorno psicológicos. Vale ressaltar que existem diversos graus que delimitam o estado puerperal, e através destes graus que deve ser baseada a pena-base e as circunstâncias judiciais para que haja ou não uma condenação.

 

5.0. Imputabilidade e inimputabilidade

 

            Observa-se que a imputabilidade é aquela que ocorre como um nexo entre o agente e a ação com isso imputa-se determinado ato.

            Segundo Sanzo Brodt (1996, apud GRECCO, 2010, p. 377), a imputabilidade tem o seguinte conceito:

 

a imputabilidade é constituída por dois elementos: um intelectual (capacidade de entender o caráter ilícito do fato), outro volitivo (capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento). O primeiro é a capacidade (genérica) de compreender as proibições ou determinações jurídicas. Bettiol diz que o agente deve poder ‘prever as repercussões que a própria ação poderá acarretar no mundo social’, deve ter, pois, ‘a percepção do significado ético-social do próprio agir’. O segundo, a ‘ capacidade de dirigir a conduta de acordo com o entendimento ético-jurídico. Conforme Bettiol, é preciso que o agente tenha condições de avaliar o valor do motivo que o impele à ação e, do outro lado, o valor inibitório da ameaça penal.

 

                No que tange a inimputabilidade, sabe-se que o Direito Penal possui duas hipóteses nas quais o agente pode se enquadrar como inimputável. A primeira é aquela que o agente será inimputável em virtude de uma doença mental e a segunda é aquela em que o agente será inimputável em virtude da sua imaturidade natural.

            No entanto, enfatiza-se a inimputabilidade por doença mental, que é o tema do presente trabalho.

            Com base no artigo 26 do Código Penal, percebe-se se o agente possuir doença mental de forma incompleta, retardada ou esteja em desenvolvimento, o referido artigo o isenta da pena.  Com isso, sabe-se que o Código Penal utilizou o critério biopsicológico para poder aferir a inimputabilidade do agente.

            Insta dizer, que a nomenclatura de doença mental é alvo de muitas críticas e que na visão de Nelson Hungria (1958, apud Grecco, 2010, p. 378) deveria ser utilizada a expressão alienação mental.

 

O titulo ‘alienação mental’, ainda que tivesse um sentido incontroverso em psiquiatria, prestar-se-ia, na prática judiciária, notadamente no tribunal dos juízes de fato, a deturpações e mal-entendidos. Entre gente que não cultiva a ciência psiquiátrica, alienação mental pode ser entendida de modo amplíssimo, isto é, como todo estado de quem está fora de si, alheio a si, ou de quem deixa de ser igual a si mesmo, seja ou não por causa patológica. [...] A preferência pela expressão ‘doença mental’ veio de que esta, nos tempos mais recentes, já superado em parte o critério de classificação a que aludia Gruhle, abrange todas as psicoses, quer as orgânicas e tóxicas, quer a funcionais (funcionais propriamente ditas e sintomáticas), isto é, não só as resultantes de processo patológico instalado no mecanismo cerebral precedentemente são (paralisia geral progressiva, sífilis cerebral, demência senil, arteriosclerose cerebral, psicose traumática etc.) e as causadas por venenos ab externo (alcoolismo, morfinismo, cocainismo,, saturnismo etc) ou toxinas metabólicas (consecutivas a transtornos do metabolismo produzidos por infecções agudas, enfermidades gerais etc.), como também as que representam perturbações mentais ligadas ao psiquismo normal por transições graduais ou que assentam, como diz Bumke, muito verossimilmente sobre anomalias não tanto da estrutura quanto da função do tecido nervoso ou desvios puramente quantitativos, que nada mais traduzem que variedades da disposição física normal, a que correspondem funcionalmente desvios da normal conduta psíquica (esquizofrenia, loucura circular, histeria paranóia).

               

                Dessa forma, nota-se que o critério utilizado foi o biológico, pelo fato de fazer referência a doença mental em qual que seja seu estado. Contudo, mesmo a doença mental sendo comprovada, essa não será utilizada de forma imediata para ser conduzida a inimputabilidade.

            Assim, existe a necessidade de se verificar se ao tempo da ação ou omissão, o agente era incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, que no caso será analisado o critério psicológico.

            Ressalta-se que se o agente provar a sua total inimputabilidade, esse deverá ser absolvido, com base no artigo 386, inciso VI do Código de Processo Penal, de acordo com a nova redação que lhe foi dada pela Lei nº 11.690, de 9 de junho de 2008. Entretanto, deve ser aplicada uma medida de segurança, sendo assim, observa-se que existe uma sentença impropriamente absolutória.

            Observa-se que no parágrafo único do artigo 26 do Código Penal, prevê uma redução de pena de um a dois terços, para o agente que em virtude de perturbação mental ou doença mental em desenvolvimento, completo ou retardado que venha a praticar algum ato ilícito.

            Nota-se assim, uma diferença existente entre o caput e o parágrafo único do artigo 26 do Código Penal. O caput do artigo absolve o agente, mas é aplicada uma medida de segurança e o parágrafo único visa a diminuir a pena, em virtude do agente não ser inteiramente incapaz de entender o ato.

 

5.1. Imputabilidade da mãe infanticida

 

No que tange a imputabilidade, insta dizer que são as situações de antijuricidade, que tem como objetivo justificar ou diminuir o ato criminal, pelo fato do agente não ter a plena razão da consciência e assim pode ser feita a qualificação de uma forma melhor identificando o dolo e a culpa na consecução do tipo penal.

Percebe-se que as excludentes criminais podem aumentar a rigorosidade da culpabilidade do agente, que pode ser pela omissão ou pelos atos agravantes para a realização do delito.

Referente a imputabilidade temos o conceito de Capez (2010, p. 331), “é a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. O agente deve ter condições físicas, psicológicas, morais e mentais de saber que está realizando um ilícito penal.”

Todavia, não é apenas o entendimento da capacidade plena que o agente deve ter o controle da sua vontade, o agente imputável não é somente aquele que tem a ciência de sua conduta, mas também aquele que tem a capacidade de executar suas próprias vontades de acordo com seu entendimento.

Ainda com base nas palavras de Capez (2010, p. 325) têm-se os conceitos de doença mental e desenvolvimento mental incompleto, referente ao infanticídio.

 

Doença mental: é a perturbação mental ou psíquica de qualquer ordem, capaz de eliminar ou afetar a capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou a de comandar a vontade de acordo com esse entendimento. Desenvolvimento mental incompleto: é o desenvolvimento que ainda não se concluiu, devido à recente idade cronológica do agente ou à sua falta de convivência em sociedade, ocasionando imaturidade mental e emocional. No entanto, com a evolução da idade ou o incremento das relações sociais, a tendência é a de ser atingida a plena potencialidade. É o caso dos menores de 18 anos (CP, art. 27) e dos silvícolas inadaptados à sociedade, os quais têm condições de chegar ao pleno desenvolvimento com o acúmulo das experiências hauridas no cotidiano.

 

Com base nos conceitos citados anteriormente, observa-se que faz parte da doença mental, a psicose, e assim, a psicose puerperal estar inserida neste rol que pode ser capaz de influenciar a capacidade de entendimento da mulher.

A psicose puerperal é aquela em que a mulher passa por um momento de extrema agitação e como conseqüência a mesma começa a ter confusão, despersonalização, insônia, irritabilidade e também pode apresentar alguns distúrbios transitórios. Um quadro de depressão profunda pode aparecer em razão dos motivos narrados acima e com isso, existe uma possibilidade de que a mãe venha cometer o delito, mas sem ter ciência do seu ato e não ser capaz de ser responsabilizada por ele, e assim, torna-se imputável.

No entanto, os fatores que influenciam na intensidade da depressão da mãe, servem como base para a caracterização da incidência para determinar se houve a inimputabilidade, a semi-imputabilidade ou a imputabilidade.

Segundo o professor Almeida Júnior (1946, p. 407/409) podem-se dividir em três grupos as psicoses que podem advir do puerpério.

 

No primeiro se inclui as psicopatias ocasionadas por esse estado e as preexistentes que despertam ou se acentuam em conseqüência do choque obstétrico, tais como a esquizofrenia, psicose maníaco-depressiva e psicoses histéricas, e é certo que nesse caso esta isenta de pena nos termos do artigo 26, caput, do Código Penal. (...) O segundo grupo compreende os ‘casos em que a mãe é levada ao delito, não por alienação, mas por semi-alienação mental’ (artigo 26, parágrafo único do Código penal). (...) E o terceiro grupo afinal, compreende os casos em que a mulher, mentalmente sã, mas abalada pela dor física do fenômeno obstétrico, fatigado, enervado, sacudido pela emoção, vem a sofre um colapso senso moral, uma libertação de impulsos maldosos, chegando por isso a matar o próprio filho.

 

Dessa forma foram apresentadas do ponto de vista forense as hipóteses em que a mãe pode ser enquadrada em virtude do estado puerperal. Pelo ponto de vista psicológico a mãe é passível de apresentar a alienação mental, semi- alienação e o surto.

Insta dizer que para que haja a comprovação de qualquer uma das hipóteses citadas no parágrafo anterior, é imprescindível que exista um laudo médico que faça ser comprovado a ocorrência do delito em razão das perturbações pertencentes a mãe.

Ensina-nos Hélio Gomes (1989, p. 380/381):

 

O exame mental pode ser necessário nos casos de psicose puerperais ou de estados psicopáticos agravados pela gestação, o parto e o puerpério... Além disso, o perito terá de julgar da influencia que o estado puerperal possa ter desempenhado na produção do delito, o que será muito difícil, pois o exame se realizará, quase sempre, bastante tempo depois do crime, quando nenhum elemento semiótico existirá mais.[7]

 

 Vale ressaltar que existe uma diferença entre surto e a psicose presente na alienação da mãe, sendo que o primeiro tem uma duração breve de inconsciência e o segundo possui um momento mais amplo no que se refere ao primeiro.

Quando ocorre o surto, este não tem um motivo aparentemente justificável, já no caso da psicose é um resultado de alguma doença, perturbação em que a mãe possui e assim, necessita de cuidado e de um acompanhamento médico. Quando ocorrem as psicoses puerperais pode ocasionar a total rejeição do próprio filho.

No caso da existência da depressão pós-parto há uma grande diferença do surto e da psicose, porque neste caso, a mãe apresenta estar deprimida e não se considera ser capaz de cuidar do próprio filho e a mesma vem apresentar sintomas de insônia, falta de higiene pessoal, disfunção intestinal e pensamentos que venham a diminuir sua potencialidade para exercer o papel de mãe.

Um ponto de suma importância é que se a mãe infanticida estiver sob o efeito de psicose durante o ato cometido, esta não se arrepende do ocorrido e ainda continua a apresentar os sintomas da psicose, como: delírios, alucinações e a total inconsciência do ato errôneo cometido perante a sociedade.

Caso a mãe infanticida estiver semi-consciente, em virtude de aspectos externos e internos, esta apresenta arrependimento do ato realizado e assim vem a necessitar de tratamentos psiquiátricos para se recuperar do ocorrido.

Observa-se que é necessário que haja uma relação de causalidade entre a morte do nascente ou do neonato com o estado puerperal. Tendo em vista, que tal relação não é meramente objetiva, mas também possui sua relação subjetiva, até porque a relação subjetiva é exigida pelo Código Penal.

            O delito de infanticídio na sua relação subjetiva é remetido ao artigo 26, parágrafo único do Código Penal, este que versa pela inimputabilidade.

            Dessa forma, Damásio (1999, p.137) observa que podem ocorrer três formas de conseqüências para mãe que causou a morte do próprio filho.

 

1.ª)  Se, em decorrência do estado puerperal, a mulher vem a ser portadora de doença mental, causando a morte do próprio filho, aplica-se o artigo 26, caput, do Código Penal: exclusão da culpabilidade pela inimputabilidade causada pela doença mental.

 2.ª) Se, em conseqüência da influência do estado puerperal, a mulher vem a sofrer simplesmente perturbação da saúde mental, que não lhe retire a inteira capacidade de entendimento e de autodeterminação, aplica-se o disposto no artigo 26, parágrafo único, do Código Penal. Neste caso, desde que se prove que tenha sido portadora de uma perturbação psicológica patológica, como delírio ou psicose, responde por infanticídio com a pena atenuada.

3.ª) É possível que, em conseqüência do puerpério, a mulher venha a sofrer uma simples influencia psíquica, que não se amolde à regra do artigo 26, parágrafo único, do Código Penal. Neste caso, responde pelo delito de infanticídio, sem atenuação da pena.”

 

Com isso nota-se a suma importância do critério fisiopsicológico, pelo fato da mãe infanticida estar sob a influência do estado puerperal, não ter a capacidade para discernir o caráter lícito ou ilícito da sua ação. Ressaltando que tal critério é o adotado pelo Código Penal como ser verificado no artigo 26.

 

Artigo 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

 De uma forma clara e precisa Bitencourt (2009, p. 353), descreve sobre o reconhecimento da incapacidade do agente.

 

Para o reconhecimento da existência de incapacidade é suficiente que o agente não tenha uma das duas capacidades: de entendimento ou autodeterminação. É evidente que, se falta a primeira, ou seja, não tem capacidade de avaliar os próprios atos, de valorar sua conduta, positiva ou negativamente, em cotejo com a ordem jurídica, o agente não sabe e não pode saber a natureza valorativa do ato que pratica. Faltando essa capacidade, logicamente também não tem a de autodeterminação, porque a capacidade de autocontrole pressupõe a capacidade de entendimento.

 

                Com a falta de discernimento do ato foi cometido pela parturiente, em um quadro de depressão, irritabilidade ou ansiedade, sendo assim, a agente tem entendimento do que ato que praticou, ou seja, a agente é imputável.

 

6. Metodologia

 

O presente trabalho buscou mostrar de forma expositiva argumentativa um aprofundamento na questão da imputabilidade da mãe infanticida, utilizando-se de fundamentos do direito penal e de posicionamentos doutrinários.

Utilizou-se primariamente livros, doutrinas, artigos científicos e internet, constituindo-se basicamente em pesquisa bibliográfica.

Observa-se que o presente trabalho foi desenvolvido com base na compilação, sendo aquela que consiste na exposição do pensamento de diversos autores e permite que o estudante possa expor a sua opinião em relação ao tema, e conseqüentemente o estudante pode extrair conclusões sobre os assuntos abordados.

Dessa forma demonstrou-se aqui a forma como a imputabilidade é vista atualmente pelo Direito Penal, e argumentou-se sobre a sua aplicabilidade em relação a mãe infanticida.


7.Discussão

 

            Com base no que foi abordado no presente trabalho, faz-se à necessário ressaltar os casos em que a agente possivelmente será considerada imputável.

            Considerando que a agente por causa do seu quadro de neurose aguda, passa a ter um comportamento diferenciado, e assim, vem apresentando quadros de irritabilidade, depressão, ansiedade ou inquietação. Essa deve ser considerada imputável, pelo fato de que no momento do delito ela tinha a capacidade de entender seus atos.

            Quando fala-se em estado puerperal o entendimento que se tem, é que a agente estar em um quadro de depressão pós-parto, e essa estando em depressão não tem discernimento dos atos e assim, pode ser diagnosticada como uma doença mental, dependendo do grau em ela se encontra.

            Observa-se então o entendimento do estado puerperal não tem uma concepção certa e definida. Podendo ter sido amenizada com a mudança da nomenclatura para alienação mental, assim o elemento normatizo seria mais fácil de ser definido.

            No que tange a doença mental, a agente que a possui deve ser considerada inimputável, com base no artigo 26, parágrafo único do Código Penal.

No que tange ao terceiro envolvido, sabe-se que esse responderá pelo delito de infanticídio juntamente com a mãe, entretanto havendo a imputabilidade da mãe, o terceiro a meu ver não poderia ser considerado inocente, visto que, o mesmo não teve nenhuma influência dos elementos normativos pertencentes ao infanticídio e mesmo assim cometeu o delito. Sendo assim, o terceiro deverá responder pelo delito de homicídio doloso ou culposo.

 

8. Considerações finais

 

            A conduta consistente no ato de matar, sob o estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após, constitui o tipo penal de infanticídio. Conceito de ordem da Psiquiatria, o puerpério deve ser analisado sob a perspectiva do Direito Penal na análise da imputabilidade da agente.

            Uma vez verificada que a conduta típica se deu sem a presença do elemento normativo do tipo, não há que falar em crime de infanticídio, mas de homicídio doloso. O crime de infanticídio exige da autora dos fatos a prática da conduta sob a influência do puerpério, ou seja, de uma condição que tem condão de desestabilizar a sua condição psíquica.

            O ordenamento jurídico-penal impõe o afastamento da culpabilidade do agente que, dada sua condição psíquica, não tem condições de, no momento dos fatos, entender o caráter ilícito dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

            Verifica-se que o tipo penal parece, em um primeiro momento, conflitar com o fenômeno da culpabilidade. A princípio, o legislador tipifica a conduta de alguém que pratica o tipo sob a influência de uma perturbação de cunho psíquico e, em outro momento, ordena o afastamento da culpabilidade quando as condições psíquicas influenciam o autor dos fatos no conhecimento da capacidade de entendimento ou de querer.

            O reconhecimento da culpabilidade é de extrema importância, porque somente é possível a aplicação da pena em concreto se o agente for considerado culpável. Como demonstrado a parturiente que sofre de puerpério pode apresentar duas formas na manifestação de distúrbio psiquiátrico: psicose ou neurose aguda.

            Quando acometida por psicose puerperal, a parturiente, que no momento sofre com alucinações e delírios relacionados ao recém nascido ou neonato, possui grande possibilidade de provocar a morte do objeto dos seus delírios. Quando o resultado morte é provocado, resta evidente que o mesmo ocorrera por agente que, ao tempo dos fatos era inteiramente incapaz de conhecer o caráter ilícito dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. As alucinações e delírios, que na verdade configuram apreciações distorcidas da realidade, são suficientes para afastar a imputabilidade da agente e, por conseguinte, o reconhecimento da sua inimputabilidade.

            Pode ocorrer ainda a possibilidade de a parturiente praticar o delito em intervalo de lucidez. Nessa situação, ainda que constatado o acometimento de psicose puerperal, a parturiente responderá pelo crime em tela porque na ocasião dos fatos encontrava-se plenamente capaz de entender o caráter ilícito dos fatos e de autodeterminar-se de acordo com esse entendimento.

            Quando o puerpério se manifestar através do quadro de neurose aguda no qual se consubstancia através de um comportamento traçado pela irritabilidade, depressão, ansiedade ou inquietação, não há que reconhecer qualquer causa que justifique o afastamento da culpabilidade da agente. Sob o puerpério nessas condições, a agente mantém plena a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de autodeterminação e, portanto, é plenamente imputável.

 

Referências

 

ANDRADE, Estela Fasciani, ROCHA, Bernadete. Infanticídio: Um crime de Difícil Caracterização, disponível  em: http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1667&idAreaSel=4&seeArt=yes, Acesso em: 28/02/2014.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. Ed. 9º. São Paulo: Saraiva, 2009.

____________, Cezar Roberto, Código Penal Comentado. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Vade mecum. São Paulo: Saraiva, 2008.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. 20ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1997. Volume 2 . Parte Especial.

REZENDE, Jorge de, Obstetrícia. 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991.

RIBEIRO, Gláucio Vasconcelos. Infanticídio: crime típico; figura autônoma; concurso de agentes. São Paulo: Pillares, 2004.

GRECO, Rogério, Código Penal Comentado. 6ª ed. Niterói – RJ: Impetus, 2012.

GROCE, Delton e Júnior, Delton Groce. Manual de medicina legal. Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004.

MAGGIO, Vicente de Paula Rodrigues. Infanticídio. Bauru, São Paulo. Ed. Edripo, 2001.

MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – parte especial, vol.II, São Paulo: Método, 3ª Ed. Ver. Atual. e ampl., 2010ª

MIRABETE, Julio Fabrinni. Manual de Direito Penal. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 1997.

 



[1] Delton Croce e Delton Croce Júnior, Manual de Medicina Legal, Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004.

[2] MAGGIO, Vicente de Paula Rodrigues. Infanticídio e morte culposa do recém-nascido. pag. 40/41

[3] CAPEZ,Fernando, Curso de Direito Penal: parte geral, pag. 210

[4] GOMES, Helio, citado Poe Maggio Vicente de Paula Rodrigues. Infanticídio e morte culposa do recém-nascido.  pag. 114/115

[5] Damásio Evangelista de Jesus, Direito Penal, 20ª Ed. Rev. Atual, São Paulo, Saraiva, 1997, vol.2, Parte Especial.

[6] MIRABETE, Julio Fabrinni, Manual de Direito Penal, 12ªed., São Paulo, Atlas, 1997, vol.2, p.89

[7] Hélio Gomes, Medicina Legal, 27ª Ed., Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1989, pags. 380/3811. Introdução                 

 

O infanticídio existe no Código Penal desde 1820, presente no artigo 198, nos seguintes termos: “Se a própria mãe matar o filho recém-nascido para ocultar sua desonra: pena de prisão com trabalho por 1 a 3 anos”.

            Com o decorrer dos anos e com a renovação do Código Penal em 1890, o artigo referente ao infanticídio teve algumas modificações e apresentou a seguinte tipificação: “Matar recém-nascido, isto é, infante, nos sete primeiros dias do seu nascimento, quer empregando meios diretos e ativos quer recusando à vítima os cuidados necessários à manutenção da vida e a impedir sua morte. Pena de prisão cellular por seis a vinte e quatro anos. Parágrafo Único: Se o crime for perpretado pela mãe, para occultar a desonra própria: pena de prisão cellular por três a nove anos.” (art. 298)

            Vale ressaltar, que a pena cominada para o infanticídio em 1890 foi a mesma dada ao homicídio, dessa forma, tornou-se injustificável existir dois tipos de crimes. Existia somente uma diferenciação e esta era em relação ao sujeito ativo. Se a ação fosse praticada pela mãe, a pena seria abrandada em três anos a nove anos.

            Em 1940 com veio a consagração final do infanticídio, com a seguinte previsão: “Matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após”.

O infanticídio conceitua-se pelo do verbo matar, do mesmo modo que é o delito de homicídio, que tem como significado acabar com a vida alheia. É o ato de agir da própria mãe, que ocorre durante ou logo após o parto resultando no óbito do próprio filho.

O delito em comento pode ser praticado pelo meio comissivo, sendo aquele que é intencional, como por exemplo: fraturas cranianas, enforcamento, estrangulamento entre outros, ou pelo meio omissivo, sendo aquele que a mãe deve agir para impedir o resultado, como exemplo: deixar de amamentar a criança, abandonar o filho em lugar ermo, no entanto, todos estes atos para provocar a sua morte.

Assim, tem-se:

1."matar" ( núcleo verbal, tirar a vida alheia);

 2. sob a influencia do estado puerperal (situação de alterações e transtornos mentais, advindas das dores físicas capazes de alterar temporariamente o psiquismo da mulher previamente sã de modo a levá-la a agir violentamente contra o próprio filho durante o seu nascimento ou logo após o parto);

3. o próprio filho ( se a mãe, conferindo a criança, acreditando ser dela, e vem a matar, comete o crime de infanticídio, artigo 123 do CPB. Porém, se a identidade da criança, não foi conferida,  houve erro quanto à pessoa artigo 20 § 3º do CPB, contudo, responderá pelo crime de homicídio, artigo 121 do CPB).

 

            No que tange ao sujeito passivo do delito, o artigo faz referencia ao filho. Este possui uma denominação diferente em virtude do “tempo” em que é cometido o delito. Se o delito ocorrer durante o parto, o filho será denominado “ser nascente” e se ocorrer logo após este será denominado “recém-nascido” ou “neonato”.

            O infanticídio somente ocorre se o ser nascente tiver vida e um dos meios como é caracterizado como sinal de vida é a respiração, sendo considerado um sinal de atividade funcional, mesmo que seja de forma mínima.

             Já o sujeito ativo do delito é a própria mãe, entretanto, este delito não pode ser considerado um crime de mão própria, pelo fato do mesmo pode ter co-autoria ou/e partícipe para a prática do ato.

            No que tange a culpabilidade da mãe infanticida sabe-se que é passível de diversos questionamentos, pelo fato de ser utilizado o critério biopsicológico e sendo assim, cada caso concreto deverá ter uma analise específica. Tema este que será abordado no presente trabalho.


2. Do delito de infanticídio

 

O infanticídio conceitua-se pelo do verbo matar, do mesmo modo que é o delito de homicídio, que tem como significado acabar com a vida alheia. É o ato de agir da própria mãe, que ocorre durante ou logo após o parto resultando no óbito do próprio filho.

O delito em comento pode ser praticado pelo meio comissivo a exemplo de fraturas cranianas, enforcamento, estrangulamento entre outros, ou pelo meio omissivo, sendo aquele que a mãe deve agir para impedir o resultado, como exemplo: deixar de amamentar a criança, abandonar o filho em lugar ermo, no entanto, todos estes atos para provocar a sua morte.

No que tange ao sujeito passivo do delito, o artigo faz referencia ao filho. Este possui uma denominação diferente em virtude do “tempo” em que é cometido o delito. Se o delito ocorrer durante o parto, o filho será denominado “ser nascente” e se ocorrer logo após este será denominado “recém-nascido” ou “neonato”.

O infanticídio somente ocorre se o ser nascente tiver vida e um dos meios como é caracterizado como sinal de vida é a respiração, sendo considerado um sinal de atividade funcional, mesmo que seja de forma mínima.

Já o sujeito ativo do delito é a própria mãe, entretanto, este delito não pode ser considerado um crime de mão própria, pelo fato do mesmo pode ter co-autoria ou e partícipe para a prática do ato. Tema este que será abordado a diante com maior relevância.

Em relação à culpabilidade, deve ser observado o estado puerperal, e neste sentido, é primordial que sejam feitas algumas averiguações.

De acordo com Deltron Croce e Delton Croce Júnior (2007, p. 571), as averiguações são as seguintes:

 

a) A existência de parto, e, em caso afirmativo, se ele é recente, pois se antigo descaracterizará, evidentemente, o delito;

b) Confirmado o parto recente, as condições em que o mesmo ocorreu;

c) Se a imputada, após o crime, escondeu ou não o filho morto;

d) Se ela tem lembrança do ocorrido;

e) Se ela simula o ocorrido;

f) Se não é portadora de antecedentes psicopáticos, agravados pela gestação, o parto e o puerpério, pois, se for, a reprimenda não será a prevista no artigo 123, mas, sim a descrita no artigo 26, ou parágrafo único, do Código Penal.[1]

 

Para averiguar a ocorrência deste delito faz-se necessário distinguir puerpério de estado puerperal que define a prática delitiva de homicídio ou infanticídio.


2.1. Bem jurídico tutelado

 

A priori, verifica-se que o bem jurídico tutelado é a vida, como ocorre no homicídio, no caso em questão protege-se a vida do filho.

Insta dizer que fazendo uma comparação com o delito de homicídio surgi duas particularidades a relação dos sujeitos com o crime e em relação ao período de vida que o legislador destinou-se a proteger.

Em relação aos sujeitos do crime, figura no pólo passivo sempre o filho, nascido ou recém-nascido e no pólo ativo pode figurar a mãe que esteja sob influência do estado puerperal e a mesma pode ainda contar com uma ajuda de um terceiro.

O infanticídio possui uma elementar normativa, que entende-se ser o “estado puerperal”, caso o fato típico não venha a possuir esta elementar normativa, ficará caracterizado outro crime, no caso em questão, se a mãe cometer o delito esta deverá responder por homicídio.

Este posicionamento não afasta a possibilidade de existir o concurso de agentes. Com base no artigo 29 do Código Penal, a pessoa que ajude ou auxilie para a prática do delito incide nas penas a este cominadas.

Tem-se também o artigo 30 do Código Penal diz que as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam, salvo quando estas forem elementares do crime.

No delito de infanticídio, existem diversas discussões doutrinárias com relação à comunicabilidade ou não da elementar normativa do delito referente à influência do estado puerperal.

Assim, tem-se o posicionamento majoritário sobre a comunicação do estado puerperal com o partícipe e o co-autor.  Segundo Damásio, (2005, p. 112) a co-autoria pode ser classificada em três hipóteses. Sendo assim:

 

1ª) a mãe e o terceiro realizam a conduta do núcleo tipo “ matar” ( pressupondo o elemento subjetivo específico); 2ª) a mãe mata a criança contando com a participação acessória do terceiro; 3ª) o terceiro mata a criança com a participação meramente acessória da mãe. Examinemos as três situações: 1ª) ambos matam a criança: se tomarmos o homicídio como fato, haverá a seguinte incongruência: se a mãe mata a filha sozinha, a pena é menor; se com o auxílio de terceiro, de maior gravidade deverá responder por esse delito, sob pena de quebra do princípio unitário que vige no concurso de pessoas; 2ª)  a mãe mata a criança: o fato principal é Infanticídio, a que acede a conduta do terceiro, que também deve responder por esse delito. Solução diversa só ocorreria se houvesse texto expresso a respeito; 3ª) o terceiro mata a criança, contando com a participação acessória da mãe: o crime não pode ser de homicídio, uma vez que, se assim fosse, haveria outra incongruência: se induzisse ou intigasse o terceiro a executar a morte do sujeito passivo, responderia  por delito mais grave (participação no homicídio).

 

Assim, conclui-se que o terceiro envolvido responde pelo delito de infanticídio. E que o estado puerperal, sendo o elemento essencial para o delito, então assim comunica-se com o co-autor.

Com isso, afirma-se que o co-autor responde pelo delito de infanticídio e que atualmente neste sentido a doutrina é bastante clara.

 


2.2. Consumação e tentativa

 

No delito do infanticídio a consumação ocorre no momento da morte do recém-nascido ou do neonato. Depende somente provar que o feto estava vivo, no momento em que a mãe realiza a conduta de matar o filho, dessa forma, consuma-se o delito.

O delito em comento sendo um crime material permite-se a tentativa, ocorrendo após a mãe ter iniciado os atos de execução e por circunstancias alheias à sua vontade não conseguiu concluí-los.

Ressalta-se que se o feto já estiver morto e mãe venha a praticar todos os atos executórios, não sofrerá nenhuma pena, pelo fato de se tratar de crime impossível.

Caso a mãe venha a provocar a morte de seu filho antes do início do parto, responderá pelo delito de aborto, presente no artigo 124 do Código Penal. Se a mãe matar o filho “durante ou logo após o parto”, não estando presente a influência do estado puerperal, ou se for muito tempo após o parto, a mãe responderá pelo delito de homicídio.           

 

2.3. Sujeito ativo

 

O delito de infanticídio tem como atribuição de crime próprio, onde se exige que aquele que o pratica tenha uma condição especial para ser enquadrada.

Assim, de forma expressa pelo Código Penal, somente a mãe será tipificada como sujeito ativo do delito.

Para Fernando Capez (2004, p. 135), “sujeito ativo é a pessoa humana que pratica a figura típica descrita na lei, isolada ou conjuntamente com outros autores. O conceito abrange não só aquele que pratica o núcleo da figura típica (quem mata, subtrai etc.), como também o partícipe, que colabora de alguma forma na conduta típica,[...]”

 Segundo Damásio de Jesus (2004, p. 427) relata quanto ao sujeito ativo no infanticídio que a “autora só pode ser a mãe. Trata-se de crime próprio, uma vez que não pode ser cometido por qualquer pessoa”.

O artigo 123 do Código Penal é omisso em relação a participação de terceiros na realização do delito. Por causa desta lacuna, deve ser aplicado o artigo 30 do Código Penal, ou seja, o Código Penal prevê a comunicabilidade das elementares ao terceiro que participar em concurso de pessoas no infanticídio.

Segundo Cleber Masson (2010, p. 61), “cuida-se de crime próprio, pois somente pode ser praticado pela mãe. Admite, todavia, coautoria e participação”.

Tendo a mesma linha de pensamento afirma CAPEZ (2009, p. 115) que “trata-se de crime próprio. Somente a mãe puérpera, ou seja, a genitora que se encontra sob influência do estado puerperal, pode praticar o crime em tela. Nada impede, contudo, que terceiro responda por esse delito na modalidade de concurso de pessoas.”

De forma contrária do homicídio, o infanticídio, por ser considerado um crime próprio, possui sujeito ativo específico, no caso a mãe. Entretanto existe a possibilidade de responder pelo delito de infanticídio a terceira pessoa que venha a praticar os atos com a mãe, atuando como co-autor ou então partícipe.


2.4. Sujeito passivo

 

No pólo passivo pode figurar o nascente e o neonato. Mas para que possa haver o delito a criança é imprescritível que a criança esteja viva e que a morte venha ser causada pela mãe, somente por ela ou com ajuda de terceiros.

Quanto ao sujeito passivo, Greco (2009, p. 48/49) diz que pode ser formal ou material:

 

SUJEITO PASSIVO FORMAL – é sempre o Estado, que sofre danos toda vez que suas leis são desobedecidas.

SUJEITO PASSIVO MATERIAL – é o titular do bem jurídico tutelado sobre o qual recai a conduta criminosa. Em alguns casos, pode ser o Estado. Ex.: crimes contra a Administração Pública”.

 

Mirabete (2004, p. 125) entende ser o sujeito passivo “o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado pela conduta criminosa”.

Ressaltando que a criança deverá nascer com vida para que se possa consumar o delito, caso contrário será considerado crime impossível.

 

2.5. Concurso de pessoas

 

            Percebe-se que o concurso de pessoas no delito de infanticídio também é um ponto de diversas divergências doutrinárias. Tendo como base o estado puerperal, a co-autoria tem dois posicionamentos.

            Para os juristas Nelson Hungria e Heleno Cláudio Fragoso, o estado puerperal é considerado uma circunstância fisiopsicológica personalíssima, assim, terceiros não podem ter o benefício presente no artigo 123 do Código Penal.

            O outro posicionamento é defendido por Frederico Marques e Magalhães Noronha, é aquele que admiti a comunicabilidade a todos os agentes que pratiquem o delito em questão.

            Observa-se que o artigo 30 do Código Penal, trata das circunstâncias incomunicáveis do crime, entretanto, ocorre a comunicabilidade quando existirem circunstâncias ou condições elementares do crime.

            Pode-se destacar que segundo Frederico Marques (2004, apud GLÁUCIO RIBEIRO, 2004, p. 119):

 

que o benefício limita-se aos terceiros partícipes, pois, se estes provocarem a morte do que está nascendo ou do recém-nascido sem a cooperação da parturiente, não se pode aplicar o dispositivo do artigo 30 do Código Penal, motivo pelo qual responderão por homicídio.

 

             Sendo assim, quando há a participação do terceiro como co-autor utiliza-se o artigo 30 do Código Penal, entretanto, quando o terceiro é o partícipe do delito deve ser utilizado o artigo 29 do Código Penal, que visa não praticar os atos executórios do delito, mas concorre de qualquer modo para o delito seja realizado.

            Dessa forma, percebe-se que existe uma diferença entre autor, co-autor e partícipe. Sendo os dois primeiros aqueles que executam o comportamento descrito no núcleo do tipo e o partícipe é aquele que concorda com a conduta da realização do crime, visando praticar atos diversos do autor.

            Com isso, os autores, co-autores e partícipes respondem pelo mesmo delito, em virtude, do artigo 29 do Código Penal. Apenas é utilizada uma penalidade diferenciada para o partícipe.

            Entretanto, observa-se que ao término do artigo em comento é citado “na medida de sua culpabilidade”. Assim, percebe-se que existe um fato comum a todos que participam do delito, mas os mesmos serão responsabilizados na medida da sua culpa. Com isso, percebe-se que há a mitigação do princípio da unidade do crime.


2.6. Causas morte

 

No que tange a causas morte, verifica-se que a mesma pode ocorrer de diversas formas, podendo ser até mesmo a morte natural. No entanto, o questionamento realizado no presente estudo, são as causas morte no delito de infanticídio.

Segundo Maggio (2001, p. 40/41) afirma que “durante o parto, a morte criminosa do nascente é menos freqüente, porém, é possível na fase de coroamento cefálico, por contusão craniana ou por perfuração das fontanelas e, após a exteriorização da cabeça, por obstrução direta dos orifícios externos das vias respiratórias”. [2]

Nas palavras de Capez :

 

Trata-se de crime de forma livre, que pode ser praticado por qualquer meio comissivo, por exemplo, enforcamento, estrangulamento, afogamento. Fraturas cranianas; ou qualquer meio omissivo, por exemplo, deixar de amamentar a criança, abandonar recém-nascido em lugar ermo, com o fim de provocar a sua morte.”[3]

 

Insta dizer que dentre as diversas causas da morte do recém-nascido, existem algumas que são consideradas mais importantes. Isto pode ser verificado com as palavras de Hélio Gomes, que faz uma exposição das causas mortes mais importantes.

 

a)Fraturas do crânio - resultantes de golpes ou da projeção da cabeça contra uma parede ou assoalho; b) Sufocação – (ato de sufocar, de impedir a respiração), podem ocorrer por diversos processos, tais como: obturar o nariz e a boca com as mãos, travesseiros ou almofadas, comprimir o tórax com o peso do próprio corpo; confinar o recém-nascido em caixas ou baús; e, mais raramente, o enterramento vivo do recém-nascido; c)Estrangulamento pode ser feito com a mão causando também a sufocação, ou com um laço feito com a utilização do próprio cordão umbilical; d) Submersão – ocorre quando o recém-nascido é imerso em aparelhos sanitários ou qualquer outro recipiente contendo substância líquida; e) Feridas – causadas geralmente por instrumentos cortantes, visando a mutilações e despedaçamentos, para facilitar a ocultação dos despojos; f) Queimaduras - geralmente são acidentais, porém no Infanticídio é mais comum com o emprego do fogo para fazer desaparecer o cadáver, embora a utilização de ácido sulfúrico é capaz de fazer desaparecer um corpo mesmo adulto; g) Envenenamento - é considerada uma forma excepcional, porém, é admitida a possibilidade do derramamento de substâncias dentro da boca, através de esponjas embebidas em veneno; h) Falta de cuidado para manter a vida –caracteriza a modalidade de Infanticídio por omissão, ou seja, pela falta de ligadura do cordão umbilical, a privação de alimento bem como deixar mucosidades na boca do neonato. [4]

 

Como já foi abordado anteriormente, o delito infanticídio para ser constituído não necessita apenas da presença do estado puerperal, mas sim, que seja cometido o delito durante ou após o parto.


2.7. Agravantes

 

No crime em apreço, as agravantes não são impostas. Pelo fato de existir o “bis in idem”, ou seja, não pode existir a repetição de uma sanção sobre o mesmo fato.

Dessa forma, não há incidência das agravantes previstas no artigo 61, II e “h” do Código Penal, o mesmo versa sobre o delito cometido contra descendente e contra criança. Assim, verifica-se que no delito do infanticídio já possui o mesmo contexto pertinente ao artigo acima referenciado.

Greco (2010, p. 226) em sua obra faz o seguimento questionamento:

 

Tratando-se de crime de Infanticídio, como o fato narrado no tipo penal diz respeito à conduta da mãe que, influenciada pelo Estado Puerperal, causa a morte de seu próprio filho, durante o parto ou logo após, caberia a aplicação da circunstância agravante prevista no art. 61, II, e, segunda figura (ter cometido o crime contra descendente)?”

 

E a resposta não poderia ser outra, senão:

 

Não, pois, caso contrário, estaríamos fazendo uso do chamado ‘bis in idem’, pois que a própria redação contida no caput do art. 61 do Código Penal diz serem “circunstancias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualifiquem o crime. Na infração penal em estudo, a condição de filho é elementar constitutiva do delito de Infanticídio, razão pela qual a pena não poderá ser agravada no segundo momento do critério trifásico previsto pelo art. 68 do Código Penal.

 

Contudo, verifica-se que as agravantes não podem ser utilizadas no delito em comento, pelo fato de não constituírem ou qualificarem o delito.

 

2.8. Pena e ação penal

 

O artigo 123 do Código Penal prevê a pena para aquele que pratica o delito de infanticídio que é detenção de dois a seis anos.

A ação penal é a pública incondicionada, ou seja, não necessita de representação.

A autoridade ao tomar conhecimento do fato, deve instaurar inquérito policial de ofício, independente da provocação de qualquer pessoa. O Promotor Público, ao receber o inquérito policial, deve iniciar a ação penal através de oferecimento da denúncia. Para se instaurar o procedimento criminal, não deve este se subordinar a qualquer condição de procedibilidade (DAMASIO, 2005).

A Constituição Federal prevê no artigo 5º, inciso XXXVIII, “d” e o artigo 74, parágrafo 1º do Código de Processo Penal, afirmam que a competência para julgar o delito em comento é o Tribunal do Júri, pelo fato de se tratar de crime doloso contra a vida.

Insta dizer que, a mãe após consumar o delito, venha a destruir o cadáver ou parte dele, esta responderá em concurso material pelos delitos descritos nos artigos 123 e 211 do Código Penal.

No que tange ao abandono do recém-nascido, logo após o parto, a parturiente irá praticar o delito de infanticídio apenas, pelo fato de que o delito de abandono já estar presente no artigo 123 do Código Penal, sendo assim há a absolvição pelo delito de infanticídio.


2.9. Elemento normativo temporal

 

O elemento normativo temporal presente no delito é o termo “durante ou logo após o parto”. Observa-se somente será configurado o delito quando a mãe estiver sob influência do estado puerperal e quando ocorrer durante ou logo após o parto. Vale ressaltar que não pode existir uma demora significativa e que ainda haja a comprovação da que a mãe estava sob influência do estado puerperal.

No que tange a expressão “durante o parto”, não há divergências sobre o conceito, pelo fato de compreender que se trata de um termo bastante claro e objetivo. E assim, sabe-se que este termo faz referência ao início até o término do parto.

Entretanto, no que se refere ao termo “logo após” existem diversos posicionamentos, pelo fato do termo ser subjetivo e não delimitar um período correto para se apurado.

               A doutrina tende para o entendimento que o parto deve coincidir com a duração do estado puerperal. Assim, não mais estando presentes os sintomas do estado puerperal, deve se considerar que chegou ao término o prazo para alegar a questão temporal.

Nesse sentido, tem-se o posicionamento de Magalhães Noronha (2000, apud RIBEIRO 2004, p. 89):

 

A lei não fixou prazo, como outrora alguns códigos faziam, porém, não se lhe pode dar uma interpretação mesquinha, mais ampla, de modo que abranja o variável período de choque puerperal. É essencial que a parturiente não haja entrado ainda na fase da bonança, em que predomina o instinto materno.

 

Tendo sido findada a fase em que a mãe tinha perturbações psíquicas causadas pelo estado puerperal, vindo a mesma adentrar em uma fase de calmaria, não existem mais motivos para se falar no delito de infanticídio. Com isso, verificam-se os requisitos necessários para se configurar o delito de homicídio.

 

[...] a conclusão lógica é que nenhuma das elementares – nem a personalíssima nem a temporal – pode ser avaliada isoladamente. Ambas devem ser analisadas individualmente, é evidente, mas devem ser avaliadas conjuntamente. A elementar logo após o parto só alcançará seu verdadeiro sentido se estiver subordinada à elementar anterior – sob a influência do estado puerperal. (RIBEIRO, 2004, p. 90)

 

            A doutrina de uma forma majoritária tem afirmado que deve existir uma interpretação mais ampla, para que assim possa compreender todo o período do estado puerperal.      


2.10. Tipo objetivo

 

Da mesma forma que acontece no homicídio, a figura típica do infanticídio está no núcleo do verbo matar. Mas neste caso, trata-se de matar a o ser nascente ou recém-nascido, enquanto a autora deve ser a mãe, esta que deve estar sob influência do estado puerperal e a influência devem ocorrer durante ou logo após o parto.

Como já foi citado anteriormente, trata-se de um crime próprio, haja vista que possui sujeitos específicos, somente a mãe pode cometê-lo e ainda deve ser contra seu próprio filho nascente ou recém-nascido.

 

2.11. Forma delituosa

 

O delito em comento admite apenas a forma dolosa, ou seja, quando a mãe tem a vontade de por fim a própria vida do filho.

Dessa forma, está presente o dolo, sendo admitido na sua forma direta, quando a mãe quer o resultado, ou eventual, quando a mãe não quer diretamente o resultado, mas assume o risco de produzi-lo.

Entretanto existe uma diferença entre o dolo homicida e o dolo infanticida, segundo MAGGIO (2001, p. 99) “O dolo homicida distingue-se do infanticida porque neste último a vontade do agente é impulsionada por uma influência anímica (proveniente da alma ou do psíquico) que não existe no dolo homicida”.

Todavia, o ponto que mais possui questionamento é a verdadeira culpabilidade da mãe.

A pergunta pertinente é se a mulher que venha matar culposamente seu filho, estando sob a influência do estado puerperal, no parto ou logo após, irá responder por infanticídio na modalidade culposa?

A previsão da modalidade culposa não foi esculpida em nenhum texto legal, de que se trata o delito de infanticídio.

Este assunto é o ponto central de diversas divergências doutrinárias, que entendem que a mãe deve responder por homicídio culposo, tendo em vista seu comportamento imprudente ou negligente.

Entretanto, para Mirabete (2007, p. 22) “a influência do estado puerperal não equivale à incapacidade psíquica e a puérpera responde pelo ato culposo, qualquer que seja ele.”

Contudo, existe outra posição doutrinária que compactua que se a mãe age de forma culposa, esta não deve responder por homicídio culposo e nem por infanticídio, tendo em vista que seu juízo mental não estar compatível com os acontecimentos do momento, mas deve se observar a presença do estado puerperal, que assim irá comprovar os distúrbios psíquicos da mãe.

De acordo com Masson (2010, p. 62), entende-se:

 

[...] a mãe não responde por crime nenhum, nem por homicídio culposo, nem por infanticídio. Isso porque a previsibilidade objetiva do crime culposo, aferida de acordo com o juízo do homem médio, é incompatível com os abalos psicológicos do estado puerperal. De fato, uma pessoa assim afetada não pode ser considerada detentora de inteligência e prudência medianas.

 

 

Ressalta-se que, caso a mãe venha a matar o próprio filho de forma culposa, sem a presença do estado puerperal, esta deverá responder por homicídio culposo, ou seja, para o doutrinador acima citado, o estado puerperal é que delimitada os requisitos para que assim possam enquadrar ou não, a mãe em um delito.


3. Estado puerperal

 

            Com o advento do Código Penal de 1940, a tipificação do motivo honra foi abandonada e com isso, passou-se a admitir o critério fisiopsicológico, ocorrendo assim a ligação da influência do estado puerperal ao tipo penal e tal influencia é tornou-se determinante para a tipificação do delito.

O estado puerperal é considerado como as consequências psíquicas referentes as circunstâncias do parto, ocasionadas possivelmente pela convulsão, emoção causada pelo choque físico, dentre outros e que assim, venham a ocasionar perturbações mentais.

            A influência do estado puerperal tem a concepção de ser o conjunto das perturbações psicológicas e físicas que a mulher pode ter em virtude do parto, e com isso praticar o delito de infanticídio.

            A corrente do pensamento jurídico penal deve ser tratada com mais atenção, pelo fato da mãe ter pouca capacidade de raciocínio sobre tal ato.

            Esse é outro ponto que possui diversas divergências não somente pelo conceito, mas sim pela sua duração e até em que ponto o estado puerperal pode influenciar realmente na conduta da mãe.

            Uma definição simples de estado puerperal é apresentada por Damásio de Jesus, ele afirma que “(...) conjunto das perturbações psicológicas e físicas sofridas pela mulher em face do fenômeno parto.”[5]

            A partir da definição de Damásio, percebe-se que para ele todas as mulheres que passarem pelo acontecimento do parto, irão apresentar certas perturbações tanto física como emocional, sendo estas supridas com o passar do tempo dentro de uma normalidade, que deve ser mantida por fatores de ordem interna (fisiopsíquico) e externa (sócio-econômicos, culturais).

            Considera-se o estado puerperal o período pós-parto ocorrido entre a expulsão da placenta e a volta ao estado normal anterior a gravidez.

            Dessa forma, com a expulsão da placenta, inicia-se a fase denominada puerpério, ou seja, uma depressão física e psíquica sofrida pela mulher logo após ou durante o parto. Tais perturbações podem continuar aproximadamente em torno de quarenta dias, entretanto, esta estipulação de tempo não é considerada como regra, em virtude de ser um elemento subjetivo e sendo assim, não há como limitar o período em que a mulher possa dar início a uma depressão e o momento do seu término é impreciso.

            Essa depressão pode cessar em pouco tempo se a parturiente tiver um devido acompanhamento médico e familiar, mas ressalta-se que a mesma deve ter uma vontade própria para não deixar ser influenciada por esse período delicado e assim não agravante a depressão.

            Todavia, algumas mulheres não conseguem admitir que estão em um período depressivo (puerpério) em virtude do parto e com isso, acabam realizando atos contra a sua vontade, como o delito em comento. Assim, tem-se o conceito de Mirabete (1997, p. 89):

 

Puerpério é o período que vai da dequitação (isto é, do deslocamento e expulsão da placenta) à volta do organismo materno às condições pré-gravídicas (...) Nele se incluem os casos em que a mulher, mentalmente sã, mas abalada pela dor física do fenômeno obstétrico, fatigada, enervada, sacudida pela emoção, vem a sofrer um colapso do senso moral, uma liberação de impulsos maldosos, chegando isso a matar o próprio filho. (...) podemos dizer até ‘normal’ da mulher que, sob o trauma da parturição e dominada por elementos psicológicos peculiares, se defronta com o produto talvez não desejado, e temido, de suas entranhas.[6]

           

            O puerpério pode ser divido em três fases, que são: Puerpério imediato, que é o período compreendido entre o primeiro e o décimo dia ; Puerpério tardio, que é o período compreendido entre o décimo e o quadragésimo quinto dia; e o Puerpério remoto, que é o período compreendido entre o quadragésimo quinto dia, até o momento em que o organismo da mulher retorne à normalidade de sua função reprodutiva. 

                Ressalta-se que a definição conhecida para o estado puerperal e o puerpério independentes de divergências doutrinaria, são eminentemente técnicas, ou seja, médicas. Ambos necessitam de laudos médicos para serem diagnosticados e comprovados.

            Para o Código Penal, não há nenhuma distinção entre o estado puerperal e o puerpério, tal definição somente para os fins científicos.


3.4. Análise do elemento psicológico e do elemento fisiopsicológico

 

            Parte-se da premissa que o infanticídio tem como elemento essencial para a sua culpabilidade o elemento psicológico. Sabe-se que este pode influenciar de diversas formas e graus no decorrer pós-parto.

            Ressalta-se que esse elemento psicológico não pode ser considerado como uma atitude única e exclusiva da mãe infanticida, ou seja, fatores externos possuem um imenso incentivo para que o ato ilícito seja praticado.

            À principio a mãe ao praticar o delito de infanticídio, tinha como objetivo resguardar a sua honra, e o critério utilizado era somente com base na honra, e por isso, passou a ter diversos questionamentos, pelo fato do bem jurídico vida ser mais importante que a honra.

            Não há que se questionar no que tange a comparação dos bens jurídicos vida e honra, tendo em vista que a vida sempre será o bem jurídico tutelado de suma importância, entretanto, estando a mãe em situação errônea e como conseqüência a mesma passa por momentos de perturbações e não pode contar com o apoio familiar e nem da sociedade, como esta irá conduzir a sua vida?

Sendo assim, o fator psicológico tem como objetivo demonstrar que cada mulher tem uma conduta diferenciada em relação ao fenômeno parto e a partir daí diversas conclusões podem ser retiradas.

            Tem-se o posicionamento de Bittencourt (2009, p.266): “que faz referência ao critério psicológico possuir uma pretensão para justificar o desejo de reservar a honra pessoal, podendo ser utilizado como exemplo, a necessidade de ocultar a maternidade indesejada.”

Ressalta-se que esta foi a corrente utilizada pelos doutrinadores até o advento do Código Penal, e com base neste contexto o fator fisiopsicológico foi atribuído ao delito, tentando assim evitar com as injustiças.

Já na corrente fisipsicológica o fator da honra e da prenhez ilegítima não estão mais relacionados a corrente psicológica somente, atualmente o critério utilizado é o estado puerperal.

Com isso, em virtude da influência do estado puerperal o privilégio do delito em questão foi ampliado, abrangendo assim os casos de prenhez legítima em que a mãe venha sofrer distúrbios fisiológicos e psíquicos ou morais.

 Sabe-se que o período do estado puerperal é bastante variável, podendo ocorrer somente por algumas horas ou então por alguns dias, e como regra, regride de forma espontânea e não deixa seqüelas. Para que um legista consiga identificar os elementos para concluir uma perícia são bastante complexos, pelo fato de que os sintomas já podem ter desaparecidos.

Com base nesta corrente, percebe-se que não só os elementos psicológicos são levados em consideração, mas também os elementos físicos que por muito tempo não foi questionado e nem teve relevância para o artigo em comento.


 4. Culpabilidade no infanticídio

 

A priori deve ser feito um breve relato do que seja um crime. O crime é composto por três elementos denominados: tipicidade; ilicitude e culpabilidade (reprovabilidade), sendo que essas possuem suas excludentes.

Para que fique caracterizado o crime os três elementos principais devem estar presentes na conduta do infrator, para que assim ele seja enquadrado em determinado crime previsto pelo Código Penal.

Conforme leciona Greco (2010, p. 85) “culpabilidade diz respeito ao juízo de censura, ao juízo de reprovabilidade que se faz sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente”

Observa-se que a culpabilidade pode ter a sua conduta reprovada ou censurada, sendo que a reprovada é aquela que não é aceita pela sociedade, ou seja, são os atos determinados como ilícitos no Código Penal e a censurada é aquela quando o agente podia ter agido de outra forma perante o fato que se encontrava.

 Com isso, passa-se a abordar a culpabilidade da mãe no delito de infanticídio, que estar previsto no artigo 123 do Código Penal. Esse artigo é considerado como uma forma privilegiada do homicídio.

 Assim, para que a mãe responda pelo delito, a mesma deve estar sob influência do estado puerperal, durante ou logo após o parto. Neste caso, estão presentes duas inquisições, que são: elemento subjetivo e a exclusão de culpabilidade em virtude do estado puerperal, já que este estado é caracterizado como um transtorno psicológico da mãe.

Esse artigo é alvo de diversos questionamentos, pelo fato do mesmo possuir muitas lacunas em seu texto. Existem alguns pontos que são mais questionados, sendo eles: a duração do estado puerperal e como delimitar a duração do “durante ou logo após”.

No entanto, existe um questionamento bastante intrigante que é a culpabilidade da mãe. Até que ponto a mesma é ciente dos seus atos? Se ela não tem consciência dos seus atos, então porque a mesma deve ser responder ou cumprir a pena prevista pelo artigo 123 do Código Penal?

Segundo Damásio Evangelista de Jesus (2005, p. 109), afirma que:

 

“nenhum delito pode ser caracterizado quando a mãe atua com culpa no seu ato, sob a influência do estado puerperal, tendo em vista que a parturiente, perturbada psicologicamente, não tem discernimento do que seja agir de acordo com as cautelas comuns impostas aos seres humanos.”

 

Já, Fernando Capez (2010, p. 266), aduz que o “elemento subjetivo da culpa, traz algumas deficiências de ordem pessoal da mãe que por isso devem ser observadas em sede de culpabilidade, mas não no fato típico e, por isso, a mãe deveria ser enquadrada no homicídio culposo”.

De uma forma mais clara, tem-se o posicionamento do Promotor Rogério Grecco, que combate o ponto principal do texto do artigo 123 do Código Penal, que trata da influência do estado puerperal, e assim, confronta o posicionamento defendido por Damásio.

 

pelo que se verifica da exposição feita pelo renomado tratadista, tenta-se afastar a responsabilidade pelo delito culposo erigindo-se a existência do estado puerperal, o que, segundo entendemos, não se justifica. Pode a parturiente, ainda que influenciada pelo estado puerperal, cuja ocorrência é comum, mesmo não querendo a morte de seu filho, deixar de tomar os cuidados necessários à manutenção de sua vida, agindo, pois, culposamente, caso a inobservância ao seu dever objetivo de cuidado venha a produzir a morte de seu próprio filho.

 

E ainda ressalta que:

 

Em suma, a influência do estado puerperal não tem o condão de afastar a tipicidade do comportamento praticado pela parturiente que se amolda, em tese, ao delito de homicídio culposo, embora tal fato deva influenciar o julgador no momento da fixação da pena-base, quando da análise das circunstâncias judiciais.

 

Assim, verifica-se que a influência do estado puerperal não deve ser utilizada para definir o enquadramento do delito, e sim, deve ser verificado no momento em que for fixada a pena-base de acordo com as análises das circunstancias judiciais e do entendimento do magistrado.

Por fim, far-se-á necessário considerar que em algum momento o estado puerperal será analisado de uma forma mais minuciosa, podendo ser considerado como um estado de depressão ou de transtorno psicológicos. Vale ressaltar que existem diversos graus que delimitam o estado puerperal, e através destes graus que deve ser baseada a pena-base e as circunstâncias judiciais para que haja ou não uma condenação.

 

5.0. Imputabilidade e inimputabilidade

 

            Observa-se que a imputabilidade é aquela que ocorre como um nexo entre o agente e a ação com isso imputa-se determinado ato.

            Segundo Sanzo Brodt (1996, apud GRECCO, 2010, p. 377), a imputabilidade tem o seguinte conceito:

 

a imputabilidade é constituída por dois elementos: um intelectual (capacidade de entender o caráter ilícito do fato), outro volitivo (capacidade de determinar-se de acordo com esse entendimento). O primeiro é a capacidade (genérica) de compreender as proibições ou determinações jurídicas. Bettiol diz que o agente deve poder ‘prever as repercussões que a própria ação poderá acarretar no mundo social’, deve ter, pois, ‘a percepção do significado ético-social do próprio agir’. O segundo, a ‘ capacidade de dirigir a conduta de acordo com o entendimento ético-jurídico. Conforme Bettiol, é preciso que o agente tenha condições de avaliar o valor do motivo que o impele à ação e, do outro lado, o valor inibitório da ameaça penal.

 

                No que tange a inimputabilidade, sabe-se que o Direito Penal possui duas hipóteses nas quais o agente pode se enquadrar como inimputável. A primeira é aquela que o agente será inimputável em virtude de uma doença mental e a segunda é aquela em que o agente será inimputável em virtude da sua imaturidade natural.

            No entanto, enfatiza-se a inimputabilidade por doença mental, que é o tema do presente trabalho.

            Com base no artigo 26 do Código Penal, percebe-se se o agente possuir doença mental de forma incompleta, retardada ou esteja em desenvolvimento, o referido artigo o isenta da pena.  Com isso, sabe-se que o Código Penal utilizou o critério biopsicológico para poder aferir a inimputabilidade do agente.

            Insta dizer, que a nomenclatura de doença mental é alvo de muitas críticas e que na visão de Nelson Hungria (1958, apud Grecco, 2010, p. 378) deveria ser utilizada a expressão alienação mental.

 

O titulo ‘alienação mental’, ainda que tivesse um sentido incontroverso em psiquiatria, prestar-se-ia, na prática judiciária, notadamente no tribunal dos juízes de fato, a deturpações e mal-entendidos. Entre gente que não cultiva a ciência psiquiátrica, alienação mental pode ser entendida de modo amplíssimo, isto é, como todo estado de quem está fora de si, alheio a si, ou de quem deixa de ser igual a si mesmo, seja ou não por causa patológica. [...] A preferência pela expressão ‘doença mental’ veio de que esta, nos tempos mais recentes, já superado em parte o critério de classificação a que aludia Gruhle, abrange todas as psicoses, quer as orgânicas e tóxicas, quer a funcionais (funcionais propriamente ditas e sintomáticas), isto é, não só as resultantes de processo patológico instalado no mecanismo cerebral precedentemente são (paralisia geral progressiva, sífilis cerebral, demência senil, arteriosclerose cerebral, psicose traumática etc.) e as causadas por venenos ab externo (alcoolismo, morfinismo, cocainismo,, saturnismo etc) ou toxinas metabólicas (consecutivas a transtornos do metabolismo produzidos por infecções agudas, enfermidades gerais etc.), como também as que representam perturbações mentais ligadas ao psiquismo normal por transições graduais ou que assentam, como diz Bumke, muito verossimilmente sobre anomalias não tanto da estrutura quanto da função do tecido nervoso ou desvios puramente quantitativos, que nada mais traduzem que variedades da disposição física normal, a que correspondem funcionalmente desvios da normal conduta psíquica (esquizofrenia, loucura circular, histeria paranóia).

               

                Dessa forma, nota-se que o critério utilizado foi o biológico, pelo fato de fazer referência a doença mental em qual que seja seu estado. Contudo, mesmo a doença mental sendo comprovada, essa não será utilizada de forma imediata para ser conduzida a inimputabilidade.

            Assim, existe a necessidade de se verificar se ao tempo da ação ou omissão, o agente era incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, que no caso será analisado o critério psicológico.

            Ressalta-se que se o agente provar a sua total inimputabilidade, esse deverá ser absolvido, com base no artigo 386, inciso VI do Código de Processo Penal, de acordo com a nova redação que lhe foi dada pela Lei nº 11.690, de 9 de junho de 2008. Entretanto, deve ser aplicada uma medida de segurança, sendo assim, observa-se que existe uma sentença impropriamente absolutória.

            Observa-se que no parágrafo único do artigo 26 do Código Penal, prevê uma redução de pena de um a dois terços, para o agente que em virtude de perturbação mental ou doença mental em desenvolvimento, completo ou retardado que venha a praticar algum ato ilícito.

            Nota-se assim, uma diferença existente entre o caput e o parágrafo único do artigo 26 do Código Penal. O caput do artigo absolve o agente, mas é aplicada uma medida de segurança e o parágrafo único visa a diminuir a pena, em virtude do agente não ser inteiramente incapaz de entender o ato.

 

5.1. Imputabilidade da mãe infanticida

 

No que tange a imputabilidade, insta dizer que são as situações de antijuricidade, que tem como objetivo justificar ou diminuir o ato criminal, pelo fato do agente não ter a plena razão da consciência e assim pode ser feita a qualificação de uma forma melhor identificando o dolo e a culpa na consecução do tipo penal.

Percebe-se que as excludentes criminais podem aumentar a rigorosidade da culpabilidade do agente, que pode ser pela omissão ou pelos atos agravantes para a realização do delito.

Referente a imputabilidade temos o conceito de Capez (2010, p. 331), “é a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. O agente deve ter condições físicas, psicológicas, morais e mentais de saber que está realizando um ilícito penal.”

Todavia, não é apenas o entendimento da capacidade plena que o agente deve ter o controle da sua vontade, o agente imputável não é somente aquele que tem a ciência de sua conduta, mas também aquele que tem a capacidade de executar suas próprias vontades de acordo com seu entendimento.

Ainda com base nas palavras de Capez (2010, p. 325) têm-se os conceitos de doença mental e desenvolvimento mental incompleto, referente ao infanticídio.

 

Doença mental: é a perturbação mental ou psíquica de qualquer ordem, capaz de eliminar ou afetar a capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou a de comandar a vontade de acordo com esse entendimento. Desenvolvimento mental incompleto: é o desenvolvimento que ainda não se concluiu, devido à recente idade cronológica do agente ou à sua falta de convivência em sociedade, ocasionando imaturidade mental e emocional. No entanto, com a evolução da idade ou o incremento das relações sociais, a tendência é a de ser atingida a plena potencialidade. É o caso dos menores de 18 anos (CP, art. 27) e dos silvícolas inadaptados à sociedade, os quais têm condições de chegar ao pleno desenvolvimento com o acúmulo das experiências hauridas no cotidiano.

 

Com base nos conceitos citados anteriormente, observa-se que faz parte da doença mental, a psicose, e assim, a psicose puerperal estar inserida neste rol que pode ser capaz de influenciar a capacidade de entendimento da mulher.

A psicose puerperal é aquela em que a mulher passa por um momento de extrema agitação e como conseqüência a mesma começa a ter confusão, despersonalização, insônia, irritabilidade e também pode apresentar alguns distúrbios transitórios. Um quadro de depressão profunda pode aparecer em razão dos motivos narrados acima e com isso, existe uma possibilidade de que a mãe venha cometer o delito, mas sem ter ciência do seu ato e não ser capaz de ser responsabilizada por ele, e assim, torna-se imputável.

No entanto, os fatores que influenciam na intensidade da depressão da mãe, servem como base para a caracterização da incidência para determinar se houve a inimputabilidade, a semi-imputabilidade ou a imputabilidade.

Segundo o professor Almeida Júnior (1946, p. 407/409) podem-se dividir em três grupos as psicoses que podem advir do puerpério.

 

No primeiro se inclui as psicopatias ocasionadas por esse estado e as preexistentes que despertam ou se acentuam em conseqüência do choque obstétrico, tais como a esquizofrenia, psicose maníaco-depressiva e psicoses histéricas, e é certo que nesse caso esta isenta de pena nos termos do artigo 26, caput, do Código Penal. (...) O segundo grupo compreende os ‘casos em que a mãe é levada ao delito, não por alienação, mas por semi-alienação mental’ (artigo 26, parágrafo único do Código penal). (...) E o terceiro grupo afinal, compreende os casos em que a mulher, mentalmente sã, mas abalada pela dor física do fenômeno obstétrico, fatigado, enervado, sacudido pela emoção, vem a sofre um colapso senso moral, uma libertação de impulsos maldosos, chegando por isso a matar o próprio filho.

 

Dessa forma foram apresentadas do ponto de vista forense as hipóteses em que a mãe pode ser enquadrada em virtude do estado puerperal. Pelo ponto de vista psicológico a mãe é passível de apresentar a alienação mental, semi- alienação e o surto.

Insta dizer que para que haja a comprovação de qualquer uma das hipóteses citadas no parágrafo anterior, é imprescindível que exista um laudo médico que faça ser comprovado a ocorrência do delito em razão das perturbações pertencentes a mãe.

Ensina-nos Hélio Gomes (1989, p. 380/381):

 

O exame mental pode ser necessário nos casos de psicose puerperais ou de estados psicopáticos agravados pela gestação, o parto e o puerpério... Além disso, o perito terá de julgar da influencia que o estado puerperal possa ter desempenhado na produção do delito, o que será muito difícil, pois o exame se realizará, quase sempre, bastante tempo depois do crime, quando nenhum elemento semiótico existirá mais.[7]

 

 Vale ressaltar que existe uma diferença entre surto e a psicose presente na alienação da mãe, sendo que o primeiro tem uma duração breve de inconsciência e o segundo possui um momento mais amplo no que se refere ao primeiro.

Quando ocorre o surto, este não tem um motivo aparentemente justificável, já no caso da psicose é um resultado de alguma doença, perturbação em que a mãe possui e assim, necessita de cuidado e de um acompanhamento médico. Quando ocorrem as psicoses puerperais pode ocasionar a total rejeição do próprio filho.

No caso da existência da depressão pós-parto há uma grande diferença do surto e da psicose, porque neste caso, a mãe apresenta estar deprimida e não se considera ser capaz de cuidar do próprio filho e a mesma vem apresentar sintomas de insônia, falta de higiene pessoal, disfunção intestinal e pensamentos que venham a diminuir sua potencialidade para exercer o papel de mãe.

Um ponto de suma importância é que se a mãe infanticida estiver sob o efeito de psicose durante o ato cometido, esta não se arrepende do ocorrido e ainda continua a apresentar os sintomas da psicose, como: delírios, alucinações e a total inconsciência do ato errôneo cometido perante a sociedade.

Caso a mãe infanticida estiver semi-consciente, em virtude de aspectos externos e internos, esta apresenta arrependimento do ato realizado e assim vem a necessitar de tratamentos psiquiátricos para se recuperar do ocorrido.

Observa-se que é necessário que haja uma relação de causalidade entre a morte do nascente ou do neonato com o estado puerperal. Tendo em vista, que tal relação não é meramente objetiva, mas também possui sua relação subjetiva, até porque a relação subjetiva é exigida pelo Código Penal.

            O delito de infanticídio na sua relação subjetiva é remetido ao artigo 26, parágrafo único do Código Penal, este que versa pela inimputabilidade.

            Dessa forma, Damásio (1999, p.137) observa que podem ocorrer três formas de conseqüências para mãe que causou a morte do próprio filho.

 

1.ª)  Se, em decorrência do estado puerperal, a mulher vem a ser portadora de doença mental, causando a morte do próprio filho, aplica-se o artigo 26, caput, do Código Penal: exclusão da culpabilidade pela inimputabilidade causada pela doença mental.

 2.ª) Se, em conseqüência da influência do estado puerperal, a mulher vem a sofrer simplesmente perturbação da saúde mental, que não lhe retire a inteira capacidade de entendimento e de autodeterminação, aplica-se o disposto no artigo 26, parágrafo único, do Código Penal. Neste caso, desde que se prove que tenha sido portadora de uma perturbação psicológica patológica, como delírio ou psicose, responde por infanticídio com a pena atenuada.

3.ª) É possível que, em conseqüência do puerpério, a mulher venha a sofrer uma simples influencia psíquica, que não se amolde à regra do artigo 26, parágrafo único, do Código Penal. Neste caso, responde pelo delito de infanticídio, sem atenuação da pena.”

 

Com isso nota-se a suma importância do critério fisiopsicológico, pelo fato da mãe infanticida estar sob a influência do estado puerperal, não ter a capacidade para discernir o caráter lícito ou ilícito da sua ação. Ressaltando que tal critério é o adotado pelo Código Penal como ser verificado no artigo 26.

 

Artigo 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

 De uma forma clara e precisa Bitencourt (2009, p. 353), descreve sobre o reconhecimento da incapacidade do agente.

 

Para o reconhecimento da existência de incapacidade é suficiente que o agente não tenha uma das duas capacidades: de entendimento ou autodeterminação. É evidente que, se falta a primeira, ou seja, não tem capacidade de avaliar os próprios atos, de valorar sua conduta, positiva ou negativamente, em cotejo com a ordem jurídica, o agente não sabe e não pode saber a natureza valorativa do ato que pratica. Faltando essa capacidade, logicamente também não tem a de autodeterminação, porque a capacidade de autocontrole pressupõe a capacidade de entendimento.

 

                Com a falta de discernimento do ato foi cometido pela parturiente, em um quadro de depressão, irritabilidade ou ansiedade, sendo assim, a agente tem entendimento do que ato que praticou, ou seja, a agente é imputável.

 

6. Metodologia

 

O presente trabalho buscou mostrar de forma expositiva argumentativa um aprofundamento na questão da imputabilidade da mãe infanticida, utilizando-se de fundamentos do direito penal e de posicionamentos doutrinários.

Utilizou-se primariamente livros, doutrinas, artigos científicos e internet, constituindo-se basicamente em pesquisa bibliográfica.

Observa-se que o presente trabalho foi desenvolvido com base na compilação, sendo aquela que consiste na exposição do pensamento de diversos autores e permite que o estudante possa expor a sua opinião em relação ao tema, e conseqüentemente o estudante pode extrair conclusões sobre os assuntos abordados.

Dessa forma demonstrou-se aqui a forma como a imputabilidade é vista atualmente pelo Direito Penal, e argumentou-se sobre a sua aplicabilidade em relação a mãe infanticida.


7.Discussão

 

            Com base no que foi abordado no presente trabalho, faz-se à necessário ressaltar os casos em que a agente possivelmente será considerada imputável.

            Considerando que a agente por causa do seu quadro de neurose aguda, passa a ter um comportamento diferenciado, e assim, vem apresentando quadros de irritabilidade, depressão, ansiedade ou inquietação. Essa deve ser considerada imputável, pelo fato de que no momento do delito ela tinha a capacidade de entender seus atos.

            Quando fala-se em estado puerperal o entendimento que se tem, é que a agente estar em um quadro de depressão pós-parto, e essa estando em depressão não tem discernimento dos atos e assim, pode ser diagnosticada como uma doença mental, dependendo do grau em ela se encontra.

            Observa-se então o entendimento do estado puerperal não tem uma concepção certa e definida. Podendo ter sido amenizada com a mudança da nomenclatura para alienação mental, assim o elemento normatizo seria mais fácil de ser definido.

            No que tange a doença mental, a agente que a possui deve ser considerada inimputável, com base no artigo 26, parágrafo único do Código Penal.

No que tange ao terceiro envolvido, sabe-se que esse responderá pelo delito de infanticídio juntamente com a mãe, entretanto havendo a imputabilidade da mãe, o terceiro a meu ver não poderia ser considerado inocente, visto que, o mesmo não teve nenhuma influência dos elementos normativos pertencentes ao infanticídio e mesmo assim cometeu o delito. Sendo assim, o terceiro deverá responder pelo delito de homicídio doloso ou culposo.

 

8. Considerações finais

 

            A conduta consistente no ato de matar, sob o estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após, constitui o tipo penal de infanticídio. Conceito de ordem da Psiquiatria, o puerpério deve ser analisado sob a perspectiva do Direito Penal na análise da imputabilidade da agente.

            Uma vez verificada que a conduta típica se deu sem a presença do elemento normativo do tipo, não há que falar em crime de infanticídio, mas de homicídio doloso. O crime de infanticídio exige da autora dos fatos a prática da conduta sob a influência do puerpério, ou seja, de uma condição que tem condão de desestabilizar a sua condição psíquica.

            O ordenamento jurídico-penal impõe o afastamento da culpabilidade do agente que, dada sua condição psíquica, não tem condições de, no momento dos fatos, entender o caráter ilícito dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

            Verifica-se que o tipo penal parece, em um primeiro momento, conflitar com o fenômeno da culpabilidade. A princípio, o legislador tipifica a conduta de alguém que pratica o tipo sob a influência de uma perturbação de cunho psíquico e, em outro momento, ordena o afastamento da culpabilidade quando as condições psíquicas influenciam o autor dos fatos no conhecimento da capacidade de entendimento ou de querer.

            O reconhecimento da culpabilidade é de extrema importância, porque somente é possível a aplicação da pena em concreto se o agente for considerado culpável. Como demonstrado a parturiente que sofre de puerpério pode apresentar duas formas na manifestação de distúrbio psiquiátrico: psicose ou neurose aguda.

            Quando acometida por psicose puerperal, a parturiente, que no momento sofre com alucinações e delírios relacionados ao recém nascido ou neonato, possui grande possibilidade de provocar a morte do objeto dos seus delírios. Quando o resultado morte é provocado, resta evidente que o mesmo ocorrera por agente que, ao tempo dos fatos era inteiramente incapaz de conhecer o caráter ilícito dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. As alucinações e delírios, que na verdade configuram apreciações distorcidas da realidade, são suficientes para afastar a imputabilidade da agente e, por conseguinte, o reconhecimento da sua inimputabilidade.

            Pode ocorrer ainda a possibilidade de a parturiente praticar o delito em intervalo de lucidez. Nessa situação, ainda que constatado o acometimento de psicose puerperal, a parturiente responderá pelo crime em tela porque na ocasião dos fatos encontrava-se plenamente capaz de entender o caráter ilícito dos fatos e de autodeterminar-se de acordo com esse entendimento.

            Quando o puerpério se manifestar através do quadro de neurose aguda no qual se consubstancia através de um comportamento traçado pela irritabilidade, depressão, ansiedade ou inquietação, não há que reconhecer qualquer causa que justifique o afastamento da culpabilidade da agente. Sob o puerpério nessas condições, a agente mantém plena a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de autodeterminação e, portanto, é plenamente imputável.

 

Referências

 

ANDRADE, Estela Fasciani, ROCHA, Bernadete. Infanticídio: Um crime de Difícil Caracterização, disponível  em: http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=1667&idAreaSel=4&seeArt=yes, Acesso em: 28/02/2014.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. Ed. 9º. São Paulo: Saraiva, 2009.

____________, Cezar Roberto, Código Penal Comentado. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Vade mecum. São Paulo: Saraiva, 2008.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

JESUS, Damásio Evangelista de. Direito Penal. 20ª ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 1997. Volume 2 . Parte Especial.

REZENDE, Jorge de, Obstetrícia. 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991.

RIBEIRO, Gláucio Vasconcelos. Infanticídio: crime típico; figura autônoma; concurso de agentes. São Paulo: Pillares, 2004.

GRECO, Rogério, Código Penal Comentado. 6ª ed. Niterói – RJ: Impetus, 2012.

GROCE, Delton e Júnior, Delton Groce. Manual de medicina legal. Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004.

MAGGIO, Vicente de Paula Rodrigues. Infanticídio. Bauru, São Paulo. Ed. Edripo, 2001.

MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado – parte especial, vol.II, São Paulo: Método, 3ª Ed. Ver. Atual. e ampl., 2010ª

MIRABETE, Julio Fabrinni. Manual de Direito Penal. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 1997.



[1] Delton Croce e Delton Croce Júnior, Manual de Medicina Legal, Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2004.

[2] MAGGIO, Vicente de Paula Rodrigues. Infanticídio e morte culposa do recém-nascido. pag. 40/41

[3] CAPEZ,Fernando, Curso de Direito Penal: parte geral, pag. 210

[4] GOMES, Helio, citado Poe Maggio Vicente de Paula Rodrigues. Infanticídio e morte culposa do recém-nascido.  pag. 114/115

[5] Damásio Evangelista de Jesus, Direito Penal, 20ª Ed. Rev. Atual, São Paulo, Saraiva, 1997, vol.2, Parte Especial.

[6] MIRABETE, Julio Fabrinni, Manual de Direito Penal, 12ªed., São Paulo, Atlas, 1997, vol.2, p.89

[7] Hélio Gomes, Medicina Legal, 27ª Ed., Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1989, pags. 380/381

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