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Resumo:
O príncipe, uma Obra fantástica de Nicolau Maquiavel, nos seus 26 capítulos desdobra e apresenta algumas caraterísticas a serem observadas pelo príncipe que deseja manter-se no poder.
Texto enviado ao JurisWay em 11/11/2016.
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Se os políticos fazem negócios ao invés de política, quem faz política de fato? O povo?
Uma releitura da Obra “O Príncipe”- Nicolau Maquiavel.
Uma releitura de O Príncipe de Nicolau Maquiavel.
Por Apolinário da Cunha, graduado em filosofia - UFPI. Graduado em Educação Física - UESPI, Pós-graduado em Atividade Física e Saúde – ISEPRO, Pós-graduado em Docência do Ensino Superior – IFPI. Diácono da Diocese de Parnaíba
Contato: apolinario.cunha@bol.com.br
A perspectiva filosófica da obra O príncipe.
O presente trabalho tem como objetivo conhecer, em linhas gerais, numa perspectiva filosófica o conteúdo tratado na obra de Nicolau Maquiavel denominada O príncipe, cuja principal reflexão acontece sobre a ação política no contexto e na atmosfera italiana, local por excelência do desenrolar do olhar do mencionado filósofo, ao mesmo tempo em que procurará fazer uma conexão com os principados atuais. Eis o porque da provocação do título apresentado acima.
Durante as reflexões realizadas, serão apresentados alguns pontos da obra em abordagem, considerando seu contexto e sua atmosfera, ao mesmo tempo em procurará demonstrar a visão do filósofo italiano para sua época, num ligeiro paralelo e provocação aos modos políticos dos quais chamaremos de principados dos tempos atuais, referindo-se ao cenário social do Brasil, ainda engatinhante na democracia, bem como em boa parte do mundo que caminha tão embaraçadamente sem saber para onde, numa verdadeira autofagia coletiva.
Portanto, o referido trabalho fundamenta-se numa reflexão filosófica, ocasião em que procuraremos levar ao leitor uma cogitação informativa da referida obra, numa releitura moderna, considerando os pontos e contra pontos do cenário político atual em que vive o mundo e em especial o Brasil. Concluiremos esta produção, expondo alguns pontos relevantes que auxiliará na reflexão política bem como na observação do papel do príncipe, sem deixar pensar na qualidade da cidadania que faz e sustenta ou não o principado contemporâneo e como este se encontra atualmente.
O príncipe, uma Obra fantástica de Nicolau Maquiavel, nos seus 26 capítulos desdobra e apresenta algumas caraterísticas a serem observadas pelo príncipe que deseja manter-se no poder. Maquiavel tornou-se tão influente em todas as épocas que seu nome
ainda hoje é usado como palavra própria cujo significado é a capacidade de atingir o
fim, não importando os meios. Por isso é que se diz que certas pessoas são
maquiavélicas, para dizer que são habilidosas, calculistas ou mesmo perigosas em suas
astúcias para chegar ao pretendido, especialmente no que se refere a poder, não
importando os caminhos percorridos. Porém, convém destacar que o mesmo Maquiavel
dentre outros aspectos, falou e aconselhou não somente como o Príncipe devia fazer
para conquistar o poder, mas especialmente e o mais relevante: como nele se manter.
Este é, portanto a parte mais destacável e crucial na obra supramencionada.
Nascido em Florença, Maquiavel (1469-1527) foi o mais importante historiador,
filósofo, dramaturgo, diplomata e cientista político italiano do Renascimento. Porém, é
na condição de filósofo que se pretende enfatizar e refletir neste trabalho sobre este tão
espetacular personagem que não somente à sua época, mas ainda hoje influencia e
haverá de influenciar de alguma forma, muitas gerações futuras.
Quem é o destinatário da obra?
A obra de Maquiavel é destinada a um príncipe, que esteja governando um
estado e este o aconselha como manter o governo de forma eficiente. Embora se deva
destacar que alguns estudiosos afirmam que na verdade de forma geniosa, Maquiavel
estava direcionando suas palavras aos súditos, como que lhes abrindo os olhos para a
forma inerte em que se encontravam enquanto estavam sendo governados pela mão, ao
mesmo tempo em que denunciava a crueldade e dureza do príncipe em relação aos
governados e assim quem sabe despertar os submissos uma revolta tal que fosse capaz
de gerar um príncipe mais próximo dos sentimentos do povo. Quem sabe, do seu
próprio meio, honrando sua história. Que fosse capaz de fato de representar seus
anseios. Por isso, a mencionada obra é dedicada a Lorenzo de Medici, figura que
Maquiavel revela sem subterfúgios no último capítulo, que desejaria que por causa de
suas tantas virtudes, especialmente pela sensibilidade com a qual sentia as aspirações do
povo governasse a Itália, depois de tantos desenganos e desapontamentos, como, aliás,
se ver ainda hoje em muitos reinos da política atual. E diz então o filósofo, referindo ao
seu grande sonho político de sua época: “[...] agora, quase sem vida, a Itália espera por
quem lhe possa curar as feridas e ponha fim à pilhagem na Lorbandia, à rapacidade e à
extorsão no reino de Nápoles e na Toscana, curando-a das chagas abertas há tanto
tempo. Pede a Deus que lhe envie alguém capaz de libertá-la dessa insolência, dessa
Bárbara crueldade”. O que faz então lançar-se um questionamento ao cenário dos reinos
de hoje. Será que não existem também reinos quase sem vida na atualidade social,
precisando ser curados das feridas geradas pela pilhagem, pela corrupção e tantos outros
males sociais, estes oriundos de inescrupulosos príncipes que fazem da política um
negócio lucrativo ao invés de serviço que possa promover a dignidade do homem?
Maquiavel, parecendo notar certa oportunidade de mudança naquele principado
ainda abertamente menciona: “Não se deve, portanto deixar que se perca esta
oportunidade: a Itália, depois de tanto tempo, precisa encontrar seu libertador”. E
completando sua revelação sobre Lorenzo de Medici expressa: ”Que vossa ilustre
família possa, portanto, assumir esta tarefa com coragem e as esperanças inspiradas por
uma causa justa, de forma que, sob sua bandeira, nossa pátria volte a se levantar”. Fato
que terminou acontecendo. Lorenzo de Médici, fazia parte de uma das famílias mais
influentes e poderosas da Itália. Era muito eloquente e possuía o sentimento de seus
valores. Conviveu desde cedo com outros artistas e intelectuais, que terminaram
despertando nele o interesse pela filosofia e pelas Belas Artes, tornando-se cada vez
mais um homem culto, sensível, sofisticado e amado pelo povo, características que
faltam tanto aos príncipes que se conhece hoje. Ora se boa parte dos príncipes de hoje
verdadeiramente não gostam nem de educação de qualidade, porque certamente esta
liberta e destampa a visão do povo e este pode enxergar mais além de sua ignorância, o
que poderia questionar a forma de governar do príncipe, muito menos gostará tais
príncipes de outra coisa que não seja o negócio lucrativo da política, cuja matéria-prima
é o voto mal refletido e, portanto, disponibilizado aos negociantes sem qualquer
cuidado. Tal é a ignorância dos votantes que nem sabem do poder que tem, pois
ignoram sua própria cidadania, são miseráveis acostumados a patrocinarem e manterem
os disparates do príncipe que com os mesmos jargões chegam sucessivas vezes ao cume
do principado, do poder, pela incapacidade dos súditos de questionarem sobre a relação
da ação do príncipe e os deveres e direitos reais dos governados.
A atmosfera de O príncipe
O que ocorreu na atmosfera da obra de Maquiavel, é que Lorenzo Governou
Florença com grande sabedoria, causando bem-estar naquela cidade, o que lhe deu
muita fama entre os demais governantes, reunindo grande apoio dos mais pobres,
instituindo por isso, um poder quase absoluto, exatamente pela capacidade do
mencionado príncipe lidar com as questões sociais, especialmente daquelas relacionadas
ao povo pobre, excluído e marginalizado de sua época além de desenvolver
intensamente a cultura ao atrair para seu governo e sua corte filósofos, poetas,
pensadores e artistas, criando assim um ambiente de constante animação e esplendor em
Florença, conforme o desejo de Maquiavel. Fato que infelizmente pouco ou nada se ver
nos principados atuais, pois a principal mola que move certos poderes contemporâneos
é o lucro pelo lucro, que faz continuar o poder pelo poder, numa ligeira sensação de que
todos os atos ilícitos praticados por tais príncipes e sua caterva, valem muito a pena. O
que em muitos casos, infelizmente é uma dolorosa e angustiante verdade.
A pretensão deste trabalho.
O presente trabalho pretende fazer uma releitura dos pensamentos de Maquiavel,
buscando contextualizá-lo de alguma maneira na política atual brasileira em todas as
suas instâncias. Visto que em muitos rincões, tal qual a Itália à época de Maquiavel,
precisa-se urgentemente de libertadores e de Príncipes menos cruéis e mais sintonizados
com o povo e seus anseios. Pois se verificarmos com uma crítica mais aguçada esta
relação entre governos e governados em todas as instâncias de poder nos tempos atuais,
notaremos uma pífia qualidade neste aspecto em que o governado parece acostumado a
ser aquele que elege descompromissadamente o governo e pronto, limitando-se de
quando em quando tecer simplórias observações ao então príncipe eleito. Tudo termina
com o final da campanha política, onde os que votaram equivocadamente passarão os
próximos anos amargando sua má e desastrosa decisão política (DPC) – depressão póscampanha.
Quanto aos demais, estes também sofrerão igual infortúnio. Somente terão
algum privilégio, aqueles que Maquiavel sabiamente nomeia como bajuladores, dos
quais nenhum principado está isento, nem hoje nem nunca, pois são estes os
encarregados de iludir o príncipe de que tudo está muito bem, sem nunca discordar do
mesmo que esbaldado na ilusão do poder, pensa ser assim mesmo e não deseja nem por
perto aqueles que lhe poderia dizer a verdade, pois seria uma ameaça ao seu reinado de
mentiras e ilusões que o deixa em estado permanente de alucinação e delírio. Tal é o
poder do poder dado ao príncipe despreparado cuja ilusão ludibriou sua mente.
A política para Maquiavel.
Para Maquiavel, a política era uma única coisa: conquistar e manter o poder ou a
autoridade. E apenas uma coisa verdadeiramente interessava para a conquista e a
manutenção do poder: ser calculista. O que para muitos príncipes atuais, no entanto,
manter-se no poder parece insustentável, não por não serem calculistas – ao contrário,
alguns o são até demais – mas porque os tempos são outros e o que o príncipe de
Maquiavel não contava, por exemplo, era com os avanços cibernéticos, sobretudo das
chamadas redes sociais onde tudo se propaga na mesma velocidade em que acontece,
como os príncipes de hoje estão sujeitos. Fato que fez da democracia hodierna algo mais
ágil e as pessoas podem facilmente mobilizar-se em prol do que quiserem e isto precisa
ser considerado.
Muitos príncipes estão dando seus últimos suspiros. Eis porque muitas ações que
acontecem no mundo real nasceram em apenas alguns minutos neste mundo tão
poderoso que são as redes sociais eletrônicas. Ademais, o que Maquiavel falou a
respeito da manutenção do poder, pelo príncipe, não o disse de forma aleatória, mas
considerou exatamente o que este mesmo príncipe deveria praticar – o que parece que
muitos “ príncipes” atuais, considerando sua embriaguez pelo poder e pelos negócios
lucrativos advindos daí, não estão nenhum pouco dispostos a fazer. Especialmente
quando se refere a qualquer tipo de moral ou ética. Aliás, Maquiavel afirmava que todo
o julgamento moral deve ser secundário na conquista, consolidação e manutenção do
poder e neste aspecto, muitos dos “ príncipes” de hoje o fazem com observação ímpar e
extrema, em alguns casos, com fanatismo doentio.
Bom seria mesmo se o povo, especialmente os que têm habilidade com as redes
sociais eletrônicas, conhecesse a mesma fonte, a mesma arma de argumentos de
Maquiavel. Certamente nunca mais se teria príncipes incompetentes e quem sabe assim
o povo seria um príncipe e então poder-se-ia dizer o seguinte pensamento também de
Maquiavel: - O príncipe, isto é, o povo, tem de ser como a raposa e o leão "porque o
leão não se sabe proteger das víboras, nem a raposa dos lobos", já que aquele outro
príncipe que não é o povo leva também tão a sério e faz o que igualmente diz a seguir
Maquiavel: “O príncipe deve violar a palavra e todas as regras de fé, caridade,
humanidade e religião embora as louve em palavras, porque os homens admiram a
fachada da virtude e não se importam de ser iludidos pelos poderosos”. Admiram o
êxito e, se a aparência for boa, não buscam a realidade que está por detrás (cap.
XVIII): O que tem de príncipes altamente religiosos e cuidadosos com o povo, nem que
seja apenas enquanto estão em campanha! "A massa é conquistada com aparências e
êxito".
Será que é assim ainda hoje? Não obstante, Maquiavel na sua mais famosa obra,
paradoxalmente expressa vários conselhos e fala de uma força excepcional capaz de
derrubar O príncipe. Que força seria esta e de onde surgiria tal energia? O povo sabe e
conhece muito bem esta força que vez por outra se manifesta de alguma forma.
Maquiavel mostra no capítulo III da supramencionada obra que o povo tem sempre o
desejo de mudança, desejo de melhoria; mas as pessoas, segundo o filósofo, mudam
com grande facilidade de governantes esperando tal mudança, que, no pensar de
Maquiavel, é sempre para pior. Traduzindo para os tempos atuais, talvez pela qualidade
da matéria-prima do poder democrático. A saber, o voto; que é dado, vendido ou
trocado e lá em cima barganhado, como mercadoria; tornando o príncipe cada vez mais
poderoso e principalmente mais rico, pois esta é a meta-dorsal de quem aspira poder, a
fim de que a cada quadriênio que volte ao povo que ainda não sabe ser príncipe, o
engane com mais profissionalismo e requinte, com ferramentas cada vez mais
sofisticadas e habilidosas.
Há de se dizer que basicamente dois vícios acometem o príncipe de hoje: O
poder e o mais ter, e ao povo dois vícios o acompanham também: a ingenuidade e a
falta de envolvimento não necessariamente nesta ordem. Observou em certo momento
Maquiavel: Note-se que é preciso tratar bem os homens ou então aniquilá-los. Eles se
vingarão de pequenas injurias, mas não poderão vingar-se de agressões graves; por isso,
só podemos injuriar alguém se não temermos sua vingança. Talvez Maquiavel diria
hoje “ Se o príncipe pode maltratar seu povo, seu povo pode vingar-se pelo voto cada
vez mais lapidado na próxima eleição”. Se um erro na escolha do príncipe ocorreu,
procura-se consertar na próxima vez e continuar o progresso, sobretudo do voto, da
participação, do envolvimento.
Se o povo conseguir ser cada vez mais crítico, perceberá que os ensinamentos de
Maquiavel nos mostram que O Príncipe, sempre mais que tudo, deve manter o povo
inconsciente, enganados com a situação de que tudo está bem e de que o Príncipe é
bom; quando este não pode dar essas impressões ao povo, segundo Maquiavel, o
príncipe aniquila impiedosamente este mesmo povo para que seu poderio continue,
pois se não for assim e tão somente assim, o povo se revoltará, derrubando - o na
primeira oportunidade, sendo igualmente impiedoso, neste sentido. Em alguns
principados isto já está acontecendo, alguns poderes já cheiram mal.
Há de se dizer que Inteligente é o príncipe que sempre procura estar bem com
seu povo, pois este último tendo consciência ou não, é sempre a força maior; apesar de
sempre ser a classe inferior. O que seria de um reino sem povo? Quem pagaria os
tributos? Quem trabalharia para sustentar os luxos e os desatinos do Príncipe, que, aliás,
em alguns lugares é crescente, tanto quanto um empreendimento, um negócio bem
lucrativo? Quem seria governado? O Príncipe só é Príncipe quando tem a quem
governar, mas há nos tempos atuais, príncipes que simplesmente são ignorados pelo seu
povo e apenas cumprem mandatos sem política de verdade fazer. Muitos destes,
chegaram ao poder, como menciona o capítulo 7 desta mesma obra em ou por somente
troca de dinheiro ou então pelo carisma ou graça alheia porque ele mesmo não possui
nenhuma. Maquiavel alerta que com muita dificuldade alguém se mantém no poder, a
não ser que, conforme já foi dito, a pessoa que chegou lá, tenha tanta virtude que saiba
conservar o que a sorte lhe concedeu tão subitamente. Fato que não ocorre com tanta
frequência em alguns principados atuais e muitos destes “reinos”, já cheiram ruinas,
cujo reerguimento é simplesmente impossível, pela carência extrema de raízes, pois
estas não foram de nenhuma maneira a preocupação do príncipe desatinado.
As maneiras de se chegar ao poder.
Se certos príncipes almejam o poder, mas não possui os requisitos necessários
para ascender a tal posto, evidentemente que somente pela traição ou pelo crime se
poderia chegar ao cargo pretendido. Maquiavel cita dois exemplos de pessoas que se
tornaram Príncipes por meio do crime. O primeiro, foi o de Agátocles, o siciliano que
se tornou rei de Siracusa tendo começado em situação das mais baixas e abomináveis.
Filho de um oleiro teve sempre vida criminosa. Não obstante, não se pode chamar de
valor o assassínio dos seus compatriotas, a traição dos amigos, a conduta sem fé ou
piedade. Destaca-se que estes foram apenas os métodos que o levaram ao poder, mas
não à glória. Poder e glória nem sempre se equivalem. A desumanidade e crueldade
bárbara, juntamente com as atrocidades incontáveis que praticou, especialmente para
chegar ao poder e nele se esbaldar, certamente não permitem nomeá-lo entre os homens
mais famosos. Pouco se sabe sobre o tirano Agátocles, além de suas tiranias, com um
final infeliz e que depois de sua morte, seus bens foram confiscados e a democracia
restaurada. Será que ainda há príncipes assim na política atual?
Após tantas traições e tão grande crueldade que o fez ter êxito na conquista,
Maquiavel ressalta que Agátocles usou da crueldade apenas uma vez: para chegar ao
poder. Quando chegou lá, foi diminuindo sua crueldade de modo a ser querido por seu
povo. Ao contrário de certos príncipes dos tempos atuais que não somente gostam de ser
cruéis, como faz progredir sucessiva e initerruptamente tanto sua crueldade pessoal
quanto sua fome de poder e paixão desenfreada pelo dinheiro. De modo que a política
passou a ser um meio (muito) lucrativo de fazer negócio, de vender, trocar e comprar.
Os que “governam” são os mesmos que fazem negócio com o que é do povo. Isto é,
desviado para si o que seria para todos. Em tese, a política não deveria ser um meio
lucrativo, mas não há quem não pense primeiro em seus negócios e depois em seus
negócios novamente, para finalmente criar meios e estratégias que pareçam ao povo,
repito que ainda não aprendeu a ser príncipe, de que estão fazendo política, quando na
verdade, esta é apenas uma pequena parte do grande negócio que infelizmente o povo
não consegue nem imaginar, quanto menos entender e acessar. Sobre isso, Maquiavel
diz que a natureza dos povos é lábil, isto é, pouco estável, que escorrega e cai sem muito
trabalho: é fácil de persuadi-los de uma coisa, mas é difícil que mantenham sua opinião.
E que convém ordenar tudo que, quando não mais acreditarem, se lhes possa fazer crer
pela força.
O segundo exemplo de como chegar ao poder pelo crime, trazido por Maquiavel
é o de Oliverotto de Fermo que com tamanha crueldade chegou ao poder, e lá se
manteve cruel, o que fez com que pouco tempo depois, este fosse derrubado do poder e
morto por César Borgia O Príncipe deve sempre agir pensando no povo, pois na
verdade é o povo quem detêm o poder e a força. Com um monarca cruel, o povo se
torna amedrontado e injuriado, acabando por se reunir e destruir seu poderio. Porém
quando os benefícios vêm, o povo se sente feliz e quer bem o monarca, o que diminui
consideravelmente a possibilidade de conspiração. Ademais, deve O Príncipe nas
épocas convenientes do ano, distrair o povo com festas e espetáculos. Destaca – se em
que neste ponto os príncipes de hoje são bem eficientes e muito engenhosos,
considerando que em muitos reinos há mais festas do que cuidados reais com o povo.
Fala-se aqui daqueles minimamente básicos que são sempre postergados. A balbúrdia
das festas que ensurdece, parece ser a mesma que anestesia e faz o povo esquecer-se do
que lhe falta. Esta é, portanto uma estratégia fácil e barata dos príncipes inescrupulosos
ganharem o povo. Reitero: que ainda não aprendeu a ser príncipe.
Quanto mais barulho, mais povo aparentemente contente e o príncipe também,
pois é neste ínterim que o mesmo planeja ao pé de orelhas seus atos truculentos em prol
de si mesmo. Bem que o povo deveria aprender a fazer política de verdade ao invés de
aceitar ser apenas um bolo feito de massa que é mexida e manobrada conforme o desejo
dos grandes, que fazem sempre das migalhas a parte do povo. Convém então lembrar
que: “ O principado é constituído ou pelo povo ou pelos grandes, conforme uma ou
outra destas partes tenha oportunidade: vendo os grandes não lhes ser possível resistir
ao povo, começam a emprestar prestígio a um dentre eles e o fazem príncipe para
poderem, sob sua sombra, dar expansão ao seu apetite; o povo, também, vendo não
poder resistir aos poderosos, volta a estima a um cidadão e o faz príncipe para estar
defendido com a autoridade do mesmo”.
A relação entre governo e governados, deveria ser sempre harmoniosa pois
sempre o que se deve contar para o Príncipe é o que seus súditos dizem, pensam e
sentem por ele. Se o povo sente ódio ou desprezo, e ainda por cima, não o teme, o
perigo é iminente e seu poder será perdido facilmente. É notório e ao mesmo tempo
lamentável que alguns príncipes atuais não levam isso muito a sério e fazem tudo de
acordo com seus pensamentos inebriados pelo poder, sem preocupar-se com as
consequências que certamente virão, cedo ou tarde; muitas destas, em ocasião em que o
príncipe esteja despreparado e sem o prestígio ou os poderes de antes que o mantinha
aparentemente forte mas que agora sem gozo algum, terá que enfrentar todos os frutos
brotados de cada semente plantada outrora, quando erroneamente se imaginava poder
tudo. O maior desatino de um príncipe é imaginar poder tudo a todo tempo.
Os tipos de mentes.
No capítulo 22, Maquiavel distingue três tipos de mente: a primeira é aquela que
compreende as coisas por si; a segunda, compreende as coisas demonstradas por
outrem; a terceira nada consegue discernir. Nem sozinha, nem com ajuda dos outros. E
então Maquiavel conclui dizendo que: o primeiro tipo é o melhor de todos; a segunda
também é muito boa, enquanto a terceira, de nada serve, é inútil. De que tipo será a
mente de muitos dos conhecidos príncipes atuais e/ou de seus ministros? Certo é que
adestrar-se a ponto de amadurecer seja qual for a mente que se tenha, demanda tempo.
Aliás, o tempo era para Maquiavel um elemento indispensável ao Príncipe tanto que
dizia ele: “ o tempo vai determinar como cada Príncipe deve agir, contudo deve-se agir
no tempo certo e sempre preparado para quando a sorte variar. O príncipe deve ser
impetuoso e cauteloso com a sorte”. Porém, qual Príncipe em meio aos inebriantes
poderes, que julga serem seus, pensará em tais conselhos? Seria a mesma coisa de se
dizer a alguém que muito aprecia vinho: - Amigo, já está bom, convém que você pare
agora! E depois de sucessivas outras garrafas este ainda desejar beber tantas outras, pois
já está tão inebriado que somente isso faz sentido. Nada mais.
O desejo maior de Maquiavel
Por fim, o desejo de Maquiavel fica bem explícito, finalizando sua Obra, no
capítulo 26 : a libertação de sua Itália. Diz ele dentre outras coisas: _ agora, quase sem
vida, a Itália espera por quem lhe possa curar as feridas e ponha fim à pilhagem na
Lombardia, à rapacidade e à extorsão no reino de Nápoles e na Toscana, curando-lhe
das chagas abertas há tanto tempo. E pede a Deus que lhe envie alguém capaz de
libertá-la dessa insolência, dessa bárbara crueldade. Seu desejo ainda é que Lorenzo de
Medici se torne soberano e reine com êxito na Itália e finaliza dizendo: “Que vossa
ilustre família possa, portanto, assumir esta tarefa com coragem e as esperanças
inspiradas por uma causa justa, de forma que, sob sua bandeira, nossa pátria volte a se
levantar”. Ao que faz compreender que assim como a Itália de ontem, muitos
principados de hoje estejam sendo surrupiados por seus príncipes inescrupulosos que
por um acaso qualquer, chegaram onde estão e daí jamais deseja sair. Visto que há
príncipes que, por suas inescrupulosas formas de ser, nunca o seriam, não fosse alguns
fatores simplesmente incompreensíveis: o oportunismo visualizado por estes na
vacância deixada pelos realmente virtuosos, somado ao desinteresse de quem queira
tornar-se novo príncipe.
Dito de outra forma, enquanto o virtuoso e bom cidadão não assume a vaga
social no reino, visto que não carregam em si interesse algum para a ação política, os
oportunistas trapaceadores, transvertidos de príncipes assumirão com toda certeza tal
vaga que jamais seria assumida por eles, não fosse o medo ou a indiferença dos
verdadeiros vocacionados ao principado. Assim, estando à espreita, aquele que nunca o
seria príncipe, torna-se com facilidade pela oportunidade exageradamente concedida. E
necessário se faz dizer que todo principado tem o príncipe que merece e que a qualidade
do material que torna e mantém o príncipe, faz toda a diferença. Quantos principados
atuais encontram-se como a Itália observada por Maquiavel! Porém há de se dizer, os
poderes são voláteis e facilmente escapam daqueles que os querem deter. A forma mais
rápida de findar qualquer poder é desarmonizando governo e governados. O tempo
passa, mas não há quem se esqueça disso. Sábio é o príncipe que sabe que o poder que
por ele é exercido, não lhe pertence e que o verdadeiro poder é serviço e bem comum e
não lucro. Quando será que nascerá um príncipe assim, capaz de fazer a verdadeira
política e não negócios escusos na política?
Neste aspecto, assim como Maquiavel apreciava o tempo, os cidadãos atuais
devem fazer valer igualmente as circunstâncias do presente rumo a tais mudanças
necessárias no grande reino, que é a sociedade, do qual fazemos todos indistintamente
parte. Afinal de contas, fazer politica não é fazer negócios ou colher privilégios e sim
participar ativamente dos acontecimentos sociais aqui e agora. As sucessivas campanhas
políticas deveriam servir para que os cidadãos tivessem a oportunidade de refletir sobre
o que realmente significa participação coletiva e qual o valor-poder do voto no reino
chamando democracia.
Referência Bibliográfica:
MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. 2. Ed. Tradução: Roberto Grassi. Rio de Janeiro.
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