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Da (In)constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS


Autoria:

Diego Bonetti


Bacharel em Direito. Especialista em Direito Tributário pelo Mackenzie São Paulo (2015/2016). Foi Estagiário do Ministério Público Federal (2011/2013). Advogado em São Paulo - atuante nas áreas cível, tributária e trabalhista (Desde 2014).

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Resumo:

Neste trabalho constata-se que a inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS desvirtua o conceito de 'faturamento', contraria a regra de incidência tributária prevista na Constituição e afronta o Sistema Tributário Nacional.

Texto enviado ao JurisWay em 03/08/2016.



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1. Introdução

 

O presente Trabalho de Curso tem por objetivo explicitar os contornos que tangem a questão constitucional-tributária da inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS. A matéria é objeto de controvérsia instaurada nos cinco Tribunais Regionais Federais e nos Tribunais Superiores do País. O tema divide também, por óbvio, representantes da Fazenda e expoentes da doutrina em Direito Tributário, com especial destaque para Roque Antonio Carrazza.

Na segunda parte do trabalho, intentamos abordar os principais aspectos estruturais do ICMS, as suas três hipóteses imponíveis possíveis[1] – operações de circulação de mercadorias, prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – e as demais dimensões da sua regra-matriz de incidência, com ênfase para o capítulo que trata da base de cálculo e alíquota do ICMS, notadamente a singular mecânica de incidência do imposto estadual em sua própria base de cálculo, e o regime constitucional da não-cumulatividade.

Prosseguindo, na terceira parte, anotamos breves comentários sobre a COFINS, enfatizando-se a sua natureza tributária, embora não se amolde a nenhuma das figuras tipificadas nos artigos 5º do Código Tributário Nacional e 145 da Constituição Federal. Paralelamente, relatamos os aspectos material e quantitativo possíveis da COFINS, acentuando-se que as contribuições sociais em comento incidem sobre operações mercantis ou prestação de serviços das quais resulta faturamento.

Logo após, na quarta parte, procuramos sintetizar as principais teses que conflitam em torno da (in)constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS. Intentamos contextualizar a discussão desde a sua gênese, ressaltando-se que o entendimento outrora pacificado no Superior Tribunal de Justiça encontrou divergência na mais Elevada Corte do País, inaugurando-se precedente favorável aos contribuintes, que culminou na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC-18), e no consequente deferimento de Medida Cautelar que determinou a suspensão de todos os feitos semelhantes, até decisão definitiva da ação constitucional. A ADC-18 encontra-se atualmente pendente de julgamento e não há previsão concreta para a data do reinício de sua apreciação.

Finalmente, depois de discorrermos sobre os principais contornos atrelados à questão, sem perder de vista os relevantes interesses metajurídicos envolvidos na matéria, uma vez que a prevalência do entendimento já manifestado no C. Supremo Tribunal Federal acarretaria uma suposta perda bilionária na arrecadação federal, sugerimos a conclusão que se afigura mais consentânea com a Constituição da República.


2. Aspectos elementares do ICMS

 

2.1. Competência tributária do ICMS

 

Preliminarmente, importa ressaltar que a análise dos tributos objeto deste estudo será feita mediante a metodologia denominada Regra-matriz de Incidência Tributária, formulada por Paulo de Barros Carvalho, a qual se encontra em seu livro Curso de Direito Tributário.

Trata-se de técnica eficiente, por meio da qual se promove a decomposição da norma jurídica instituidora do tributo, revelando os seus vários aspectos. Conforme anuncia o Professor Paulo, o método identifica, no antecedente da norma, a descrição do fato jurídico tributário (aspectos material, espacial e temporal). E, no consequente, revela os elementos necessários à identificação dos sujeitos da relação jurídica que se instala com a ocorrência do fato gerador (aspecto pessoal), bem assim o montante do tributo devido (aspecto quantitativo).[2]

Feita esta ressalva, passemos ao estudo do tema ao qual nos propomos. Porém, antes de iniciarmos propriamente os apontamentos sobre a estrutura do ICMS, indispensável tecermos algumas noções sobre o conceito de competência tributária.

Entende-se por competência tributária “a aptidão para criar tributos”.[3] Em outras palavras, “(...) é a habilidade privativa e constitucionalmente atribuída ao ente político para que este, com base na lei, proceda à instituição da exação tributária”[4].

Com a clareza de estilo, Roque Antonio Carrazza[5] aponta que o legislador constituinte pátrio prescreveu de modo exaustivo as áreas dentro das quais as pessoas políticas podem exercer a tributação, de modo que só podem atuar dentro dos estritos termos da competência tributária que lhes foi outorgada pela Constituição da República.    

Discorrendo sobre o tema, Eduardo Sabbag[6] recorda que a Carta Política consagrou o princípio do federalismo (art. 60, §4º, I, da CF/88), delimitando um sistema de partilha da competência tributária aos vários entes políticos da Federação.

Luciano Amaro[7] ensina que a criação de tributo depende de ser efetivamente exercitada a competência atribuída a este ou àquele ente político, como regra, mediante lei ordinária. Por força do princípio da legalidade tributária, a competência tributária implica o poder para inovar o ordenamento jurídico, criando ou modificando tributos. Destarte, conclui o autor, o poder de legislar está necessariamente implícito no poder de tributar, sendo despiciendo proclamar esta regra, como fez o artigo 6º do Código Tributário Nacional.

Obviamente, o titular da competência tributária não pode substancialmente modificá-la, nem delegá-la, nem renunciá-la. Como decorrência da rígida demarcação constitucional das várias competências tributárias, no caso de os respectivos entes titulares deixarem de exercê-las, por razões de política fiscal ou mesmo por simples omissão, essa inércia não implica deferir a intromissão de outro poder tributante.  

Sublinha Roque Carraza[8] que a competência tributária é um tema exclusivamente constitucional. O Código Magno traçou a norma-padrão ou regra-matriz de incidência a que o legislador ordinário é obrigado a levar em conta, quando cria in abstracto a exação. Logo, o legislador, ao exercitar a competência tributária de sua pessoa política, deve permanecer fiel ao arquétipo constitucional das várias espécies e subespécies de tributos (hipótese de incidência possível, sujeitos ativo e passivo, base de cálculo e até mesmo a alíquota possível).   

No que se refere aos impostos (tributos não vinculados a uma atuação estatal), continua o autor, a Magna Carta, nos artigos 153 a 156, estabeleceu a norma padrão de incidência daqueles que podem ser criados, em caráter exclusivo, pela União, pelos Estados, pelos Municípios e pelo Distrito Federal. Os Estados e o Distrito Federal são competentes para criar os impostos mencionados no artigo 155, incisos I a III, da Constituição (impostos sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos, sobre operações relativas à circulação de mercadorias, sobre a propriedade de veículos automotores etc.).    

Logo, o ICMS é um imposto de competência dos Estados-membros e do Distrito Federal, os quais, mediante lei ordinária e observadas as diretrizes constitucionais, podem instituí-lo ou sobre ele dispor[9]. Excepcionalmente a União também estará credenciada a criar o imposto, por força do que estabelecem os artigos 147 e 154, II, ambos da Constituição Federal.   

Realizada esta breve consideração sobre a competência tributária, passemos ao estudo da estrutura constitucional do ICMS.

 

2.2. Aspecto material (fato gerador)

 

2.2.1. Operação de circulação de mercadorias

 

A operação de circulação de mercadorias constitui a primeira hipótese de incidência do ICMS, prevista na Constituição Federal (art. 155, II, da CF/88). Frise-se que o dispositivo constitucional determina a incidência do tributo sobre “operações relativas à circulação de mercadorias”, envolvendo negócio jurídico mercantil, e não simplesmente sobre mercadorias ou quaisquer espécies de circulação.

Os mais renomados doutrinadores ensinam que tratar o ICMS como imposto sobre circulação ou sobre mercadorias significa deslocar o cerne da hipótese de incidência do tributo para seus aspectos adjetivos, em interpretação estranha à Constituição.

Preleciona Paulo de Barros Carvalho que

“operações, no contexto, exprimem o sentido de atos ou negócios hábeis para provocar a circulação de mercadorias. Adquire, neste momento, a acepção de toda e qualquer atividade, regulada pelo Direito, e que tenha a virtude de realizar aquele evento.”[10] 

Geraldo Ataliba ressalta que

“é a operação – e apenas esta – o fato tributado pelo ICMS. A circulação e a mercadoria são consequências e meros aspectos adjetivos da operação tributada. Prestam-se, tão só, a qualificar – dentro do universo possível das operações mercantis realizáveis – aquelas que ficam sujeitas ao tributo, ex vi de uma eficaz qualificação legislativa. Não é qualquer operação realizada que se sujeita ao ICMS. Destas, apenas poderão ser tributadas as que digam respeito à circulação atinente a uma especial categoria de bens: as mercadorias.”[11]

Esclarecem os autores que “circulação” é expressão a ser entendida como movimentações da titularidade dos bens (circulação jurídica), sem levar a fundo a significação física ou econômica, para efeitos de incidência do ICMS. Circular, para o Direito, expressa a transferência de propriedade ou posse (disponibilidade jurídica), proporcionando a mudança de titularidade dos bens (no caso, as mercadorias).

Roque Antonio Carrazza sugere que a sigla “ICMS” alberga pelo menos cinco impostos diferentes: a) o imposto sobre operações mercantis (operações relativas à circulação de mercadorias); b) o imposto sobre serviços de transporte interestadual e intermunicipal; c) o imposto sobre serviços de comunicação; d) o imposto sobre produção, importação, circulação, distribuição ou consumo de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos e de energia elétrica; e e) o imposto sobre a extração, circulação, distribuição ou consumo de minerais.[12] 

Em estudo encetado com José Eduardo Soares de Melo, o Professor Luiz Francisco Lippo apresenta entendimento diverso. No interior da sigla ICMS seriam encontráveis apenas três hipóteses distintas. Produtos como a energia elétrica, os combustíveis, os lubrificantes, e os minerais, que antes estavam fora do âmbito de incidência do imposto estadual, tratar-se-iam de mercadorias como quaisquer outras. Argumenta que:

“A hipótese de incidência tributária, como lembramos antes, é um fato abstratamente idealizado pelo legislador constituinte. Ora, o desenho abstrato traçado pelo legislador não nos permite fazer digressões outras que não aquelas incorporadas no Texto Maior. Bens como energia elétrica, combustíveis, lubrificantes, minerais, produtos que antes estavam fora do âmbito de incidência do imposto estadual, foram incorporados a ele. São mercadorias como quaisquer outras, de sorte que não podemos enquadrá-los em hipóteses de incidências distintas.”[13]   

Assentado que a incidência do ICMS dá-se sobre “operações relativas à circulação de mercadorias”, convém definir o que se entende por “mercadorias”.  

Aliomar Baleeiro[14] distingue “mercadoria” como espécie do gênero “produtos”, como “bem econômico que alguém, com o propósito deliberado de lucro, produz para vender ou compra para revender”.

Carvalho de Mendonça ensina:

“as coisas quando objeto de atividade mercantil, por outra quando objeto de troca de ´circulação econômica´, tomam o nome de mercadorias. Commercium quase commutatio mercium. A coisa, enquanto se acha na disponibilidade do industrial, que a produz, chama-se produto, manufato ou artefato; passa a ser mercadoria logo que é objeto de comércio do produtor ou do comerciante por grosso ou a retalho, que a adquire para revender ou a outro comerciante ou ao consumidor; deixa de ser mercadoria logo que sai da circulação comercial e se acha no poder ou propriedade do consumidor.”[15]

De acordo com o jurista Paulo de Barros Carvalho[16], o termo “mercadoria” no âmbito do ICM, deve ser entendido da mesma forma que entendem os comercialistas. Esclarece o autor que a natureza mercantil do produto não está nos requisitos que lhe são intrínsecos, mas na destinação que se lhe dê, e explica:

“a natureza mercantil do produto não está, absolutamente, entre os requisitos que lhe são intrínsecos, mas na destinação que se lhe dê. É mercadoria a caneta exposta à venda entre outras adquiridas para este fim. Não o será aquela que mantenho em meu bolso e se destina a meu uso pessoal. Não se operou a menor modificação na índole do objeto referido. Apenas a sua destinação veio a conferir-lhe atributos de mercadoria.”[17]

Em suma, José Eduardo Soares de Melo e Luiz Francisco Lippo assentam que:

“Não precisamos, pois, ir muito mais longe para concluirmos que o termo “mercadoria” posto no descritor da hipótese de incidência tributária do ICMS corresponde àqueles bens submetidos à mercancia pelo produtor, pelo industrial, pelo comerciante, pelo importador ou pelo exportador, prática esta regida pelos cânones do Direito Comercial.

A operação de circulação de mercadoria, que no nosso entender constitui a primeira das hipóteses de incidência do tributo estadual, assim, pode entendida como aquela atividade de mercancia, que efetivamente transfere juridicamente a propriedade de bens (corpóreos ou incorpóreos). Toda vez que esta situação jurídica ocorre, instala-se o vínculo obrigacional, que faz nascer para o sujeito passivo a obrigação tributária, e para o sujeito ativo (Estado Federado ou Distrito Federal), o correspondente crédito tributário.”[18]

 

 

 

 

2.2.2. Prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal

 

Há de se observar inicialmente que o ICMS não incide sobre o simples transporte interestadual ou intermunicipal, mas sobre a prestação onerosa do serviço de transporte interestadual ou intermunicipal.[19]

Salienta Roque Carrazza que o imposto sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, ora de competência dos Estados e do Distrito Federal, “descende” do antigo imposto federal sobre serviços de transporte (ISTR), salvo os estritamente municipais. Destaca o autor que o ICMS sobre serviços de transporte interestadual e intermunicipal (e também sobre os serviços de comunicação, como se verá a seguir) excepciona a regra geral segundo a qual compete aos Municípios instituir “impostos sobre serviços de qualquer natureza” (art. 156, III, da Constituição Federal). Portanto, deve o legislador estadual (ou distrital) cuidar para não invadir o vasto campo da tributação dos serviços pertencente aos Municípios.[20]  

O imposto abrange tanto o deslocamento de pessoas (transportes de passageiros), como o de cargas, valores, mercadorias etc.. Podem ser prestados por qualquer tipo de veículo (automóvel, caminhonete, caminhão, barco, avião, trem, e assim avante), sem olvidar os oleodutos, os vários tipos de encanamentos, as esteiras rolantes e os movidos à tração animal. Basta que o serviço seja objeto de contratação por regime de direito privado, caracterizado pela autonomia de vontades e pela igualdade das partes contratantes. Em princípio, o serviço público escapa ao ICMS, porém o próprio Texto Fundamental afasta a imunidade tributária referente aos serviços públicos que ensejarem cobrança de tarifa ou contraprestação dos usuários (art. 150, §3º, da Constituição Federal). Assim, uma empresa de ônibus, que circula entre dois Municípios, presta indubitavelmente um serviço público de transporte coletivo, mas nem por isso deixará de incidir na hipótese a tributação do ICMS.[21]

Argutamente observa José Eduardo Soares de Melo:

“É evidente que só se pode cogitar de “prestação de serviço” quando existem duas (o mais) pessoas (físicas ou jurídicas) nas qualidades de prestador e tomador (ou usuário) dos serviços, sendo uma heresia pensar-se em “serviço consigo mesmo”, como aliás, já foi pontificado pelo antigo TFR ao decretar a inconstitucionalidade do extinto ISTR (Imposto sobre Serviços de Transporte Rodoviário previsto no art. 3º, III, do Decreto-lei nº 1.438/75, com a redação do Decreto-lei nº 1.582/76), em transporte de carga própria (Arguição de Inconstitucionalidade em MS nº 89.825-RS – Rel. Min. Carlos Velloso – Revista de Direito Administrativo vol. 151, pp. 49/79).

Assim, incabível ICMS no transporte, pelo próprio contribuinte, tendo por objeto meras transferências a seus estabelecimentos.”[22] 

 

 

Examinando a tributação de serviços de transporte sucessivos, Roque Carrazza sublinha que “quando, porém, a prestação for interestadual, haverá em homenagem ao princípio federativo, tantas incidências de ICMS-Transporte, quantas forem as Unidades Federadas percorridas, sempre observado, evidentemente, o princípio da não cumulatividade.”[23]

Consultado acerca de situação peculiar envolvendo serviços de transporte sucessivos, assim entendeu o Fisco paulista:

                                      “a) “ICMS – Transporte interestadual de carga destinada a estabelecimento localizado em território paulista – Trajeto dividido em três trechos, sendo o primeiro interestadual por meio rodoviário, o segundo interno por meio aquaviário e o terceiro interno por meio rodoviário – Em cada trecho o serviço é prestado por uma transportadora diferente de forma independente das demais – Três prestações distintas entre si – Não há caracterização do transporte multimodal de cargas.” (Resposta à Consulta nº 676/2005 de 11.4.2006).”[24]  

Em análise de casos específicos de incidência e não incidência do imposto, acentua José Eduardo Soares de Melo que a transmissão de energia elétrica não pode ser considerada como “transporte” de mercadorias, para fins de incidência do ICMS. Explicita que “seu fornecimento, seja pela geradora, transmissora, distribuidora, comercializadora, corresponde a um fato gerador do ICMS, pela saída da mercadoria. Nunca pelo transporte...” [25]

Recorda que foi declarada a inconstitucionalidade do ICMS sobre a prestação de serviço de transporte aéreo de passageiros intermunicipal, interestadual, internacional e de transporte aéreo internacional de cargas pelas empresas aéreas nacionais, enquanto persistirem os convênios de isenção por empresas estrangeiras, conforme decisão do STF (ADIn nº 1.600-8 – Rel. p/ o acórdão Min. Nelson Jobim – Plenário – j. 26.11.2001 – DJU 1 de 17.12.2001, p. 1 e DJU 1 de 20.6.203, p.56).

Na venda de mercadorias sob a cláusula FOB (“free on board”) - pela qual o vendedor obriga-se a colocar a mercadoria a bordo do navio indicado pelo comprador - o segundo negócio jurídico (prestação de serviço de transporte) é totalmente estranho ao vendedor das mercadorias. O adquirente das mercadorias corresponde, rigorosamente, ao próprio remetente e ao mesmo destinatário, implicando nova incidência do ICMS (serviço de transporte), totalmente distinta da anterior operação jurídica (alienação).

Em voto do Juiz Luiz Baptista Pereira de Almeida Filho (TIT – Proc. DRT-2-2.377/90 – Ementário do TIT, 1996, p. 339), ponderou-se que:

“Na compra e venda de mercadoria, sob cláusula FOB, verifica-se a tradição simbólica. O recebimento da mercadoria pelo comprador ocorre no lugar da tradição simbólica, isto é, na fábrica (...) embora a mercadoria esteja fisicamente na fábrica do vendedor, essa mesma mercadoria já está incorporada ao patrimônio do comprador, por tradição simbólica ocorrida quando da fatura.”[26]

Assim, em relação à venda de mercadorias sob cláusula FOB, conclui o autor:

“Não há sustentação no argumento pertinente ao deslocamento da responsabilidade ao vendedor, pois choca-se com o princípio da capacidade contributiva (art. 145, §1º, da CF/88), uma vez que o substrato econômico ínsito ao negócio jurídico do serviço de transporte é totalmente estranho ao mesmo vendedor, porque sua capacidade econômica decorre do único negócio que realizara (venda das mercadorias).

Portanto, carece de embasamento jurídico a exigência dirigida ao vendedor relativamente ao imposto decorrente dos serviços de transporte, que só vincula (juridicamente) transportador e prestador de serviço.”[27]

 

2.2.3. Prestação de serviços de comunicação

 

De logo, ressalte-se que a Constituição Federal, ao outorgar aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS-Comunicação, não autorizou que tais entes tributassem, por meio de ICMS, simplesmente a comunicação ou os serviços de comunicação, mas, sim as “prestações (onerosas) de serviços de comunicação.”[28]

Roque Carrazza explica que:

“Ora, como não há imposto sobre serviço em potencial, o ICMS em tela só pode nascer da execução de uma obrigação de fazer (nunca de dar), isto é, do fato de uma pessoa, física ou jurídica, prestar, a título oneroso, serviços – no caso, de comunicação – a terceiros. Noutros falares, ele nasce quando, em razão de negócio jurídico firmado entre particulares, sob regime de direito privado (mas não trabalhista), serviços de comunicação forem efetivamente prestados.”[29]

E acrescenta o renomado autor:

“... o ICMS nasce de um estado de fato, qual seja, a prestação efetiva – nunca a potencial – dos serviços de comunicação. Noutros falares, seu fato imponível ocorre quando o serviço em questão for deveras prestado.

(...) a prestação potencial do serviço de comunicação é inidônea a ensejar o nascimento do dever de recolher ICMS. O tributo nasce do fato “prestar serviços de comunicação”. Somente o serviço efetivamente prestado abre espaço à tributação de que ora estamos cogitando. Em síntese, para fins de ICMS-Comunicação o fazer há de ser concreto e efetivo; não, meramente potencial.

(...) só há prestação efetiva de serviço de comunicação quando a comunicação for objeto do contrato celebrado entre o prestador e os fruidores, e, portanto, a remuneração havida decorra do cumprimento desta mesma avença.”[30]

 

Explanando-se a respeito do momento da prestação onerosa do serviço de comunicação (a que alude o artigo 155, II, da CF/88), salientou-se que esta ocorre quando há um emissor e um receptor da mensagem, e essencialmente, uma mensagem que ambos compreendam. Ademais, é mister que os sujeitos da mensagem (emissor e receptor) sejam determinados, e que tal relação interativa esteja vinculada diretamente pela onerosidade da prestação.[31]   

Destaca Roque Carrazza que “a comunicação, para fins de ICMS, exige, além da efetiva difusão da mensagem, a interação remunerada entre emissor e receptor, perfeitamente identificados”.[32]

Com efeito, o ICMS incide sobre prestações de serviços de comunicação (gênero do qual o serviço de telecomunicação é espécie). Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens não tipificam serviços de comunicação, para fins de ICMS. Por meio da comunicação por radiodifusão, propaga-se uma mensagem, enviando-a a um número indeterminável de pessoas, inexistindo interação entre o emissor e os receptores (público-alvo), e não havendo remuneração alguma entre eles para que a mensagem circule. Cotejando o tratamento que a Carta Suprema dispensa aos serviços de telecomunicação (modalidade de serviço de comunicação) e aos de radiodifusão sonora e de sons e imagens, infere-se que são fenômenos distintos, ao lume de nosso direito positivo.[33]

José E. S. Melo aponta que:

“O Serviço Especial por Assinatura (TVA) possui elementos distintos da apontada radiodifusão gratuita, uma vez que constitui prestação de serviço especial a assinante, mediante remuneração, consistente na distribuição de sons e imagens por sinais codificados, com a utilização de canais do espectro radioelétrico.

(...) O Consultor Geral da República definira a radiodifusão como o serviço aberto ao público em geral, distinguindo-se da TVA, de cunho elitista, na medida em que só é acessível a quem por ela pode pagar, inclusive quanto ao uso e manutenção do codificador de sinais (Parecer SR-93, de 21.6.89, Processo nº 400.00012/89-7, DOU de 23.6.89, p. 10.180).”[34]

A seguir complementa que:

O Serviço de TV a Cabo (Lei nº 8.977, de 6.1.95, regulamentada pelo Decreto nº 2.206, de 14.4.97, e mantida pela Lei nº 9.472/97, art. 212) ... também possui elementos distintos da radiodifusão, tendo como ponto marcante a fruição de específicos e diferenciados serviços, prestados de modo oneroso a tomadores identificados, e materializados em contrato. Essas características operacionais e legais permitem vislumbrar que apenas as comunicações televisivas – “Assinatura e a Cabo” – tipificam autênticos serviços de comunicação, sujeitando-se ao ICMS.”[35]

Finalmente, merece destaque a discussão acerca da prestação do serviço de acesso à Internet, para fins de incidência do ICMS. Acirrada controvérsia há em torno da tributação das atividades realizadas pelos denominados provedores de acesso.

Sustentando a tese da não incidência do ICMS, Paulo de Barros Carvalho (“Não-incidência do ICMS nas Atividades dos Provedores de Acesso à Internet”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 73, p.4), argumenta que:

 

“... os provedores de acesso à Internet não configuram o ´canal´ realizador da comunicação; não colocam à disposição do usuário os meios e modos necessários à transmissão e recepção de mensagens. Sua tarefa, por conseguinte, não é prestar serviço de comunicação, mas tornar mais eficiente o serviço comunicacional prestado por outra empresa. É simplesmente, um serviço de valor adicionado, ou seja, serviço agregado a outro serviço, este sim de comunicação. Não pode, por tais motivos, ser objeto de tributação pelo ICMS.”[36]

Em contraposição, alegando a incidência do ICMS na espécie, Marco Aurélio Greco (Internet e Direito, ob. cit., p. 132) afirma que:

“O serviço prestado pelo provedor de acesso é diferente do serviço prestado pela empresa de telefonia, pois a conexão à internet permite uma multiplicidade de conexões e uma multiplicidade de caminhos para a transmissão de mensagens. Sob este ângulo, o provedor de acesso atua como um instrumento, ou meio, para que o usuário possa ter acesso a um sistema de transferência de mensagens com tal flexibilidade. No âmbito da internet, só haverá transmissão de mensagem se houver um endereço lógico de origem e de destino e este endereço não é fornecido ao usuário pela empresa de telefonia. Portanto, o provedor fornece ´algo mais´ do que o viabilizado pela telefonia e algo que se insere como um meio diferenciado de realização de transmissão de mensagens.”[37]

Submetida a matéria à apreciação do E. Superior Tribunal de Justiça – STJ, decidiu-se que se trata de serviço de valor adicionado, uma vez que o provedor se utiliza da rede de telecomunicações que lhe dá suporte para viabilizar o acesso do usuário final à Internet. Conforme se assentou no voto vencedor, a prestação de serviços de conexão à Internet não cuida de prestação onerosa de serviços de comunicação ou de serviços de telecomunicação, mas de serviços de valor adicionado, em face dos princípios da legalidade e da tipicidade fechada, inerentes ao ramo do direito tributário, destarte deve ser afastada a aplicação do ICMS pela inexistência na espécie do fato imponível (Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 456.650-PR - Rel. p/ acórdão Min. Franciulli Neto – 1ª S. – j. 11.5.2005 – DJU 1 de 20.3.2006). Ademais, a jurisprudência do STJ consolidou-se na Súmula nº 334, com a seguinte redação: “O ICMS não incide no serviço dos provedores de acesso à internet.”[38]

 

 

2.3. Aspecto Temporal

 

Nos dizeres de Geraldo Ataliba, define-se o aspecto temporal da hipótese de incidência “como a propriedade que esta tem de designar (explícita ou implicitamente) o momento em que deve se reputar consumado (acontecido, realizado) um fato imponível – Hipótese de Incidência Tributária, Malheiros, São Paulo, 1993, p.87.”[39]

Paulo de Barros Carvalho sabiamente preleciona:

“(...) desponta a natural necessidade de que a norma tributária revele o marco de tempo em que se dá por ocorrido o fato, abrindo-se aos sujeitos da relação o exato conhecimento da existência de seus direitos e de suas obrigações.”

E arremata o eminente jurista:

“Compreendemos o critério temporal da hipótese tributária, como o grupo de indicações, contidas no suposto da regra, e que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra o devedor e credor, em função de um objeto – o pagamento de uma certa prestação pecuniária.”[40]

Tendo em vista a explanação da melhor doutrina acerca do que se entende por aspecto temporal da hipótese tributária, convém apontarmos o preciso instante no qual se considera ocorrido o fato – operação de circulação de mercadoria e prestação de serviços de transporte ou de comunicação - que deflagra a obrigação tributária do ICMS. 

Com o advento da Lei Complementar 87/1996 (artigo 12, I), elegeu-se a “saída” de mercadoria do estabelecimento do contribuinte como o momento em que se considera ocorrido o fato imponível do ICMS.

José E. S. Melo pondera o seguinte:

“Ao legislador compete estabelecer o momento em que se deve considerar acontecida a materialidade do tributo, previsto constitucionalmente. O instante do nascimento da obrigação tributária deve guardar efetivo vínculo com a matéria objeto de tributação, eis que todos os aspectos da norma são intrinsecamente vinculados.

... Constata-se que a “saída”, além de não estar explicitada no texto constitucional, por si só, não constitui situação exclusiva e fundamental para a compreensão do tributo, pois se torna imprescindível a anterior realização do negócio jurídico mercantil.”[41]

 

Em brilhante explanação sobre o tema - momento do nascimento da obrigação tributária (ICMS), Roque Carrazza assim elucida:

“Se a saída da mercadoria fosse realmente a hipótese de incidência do imposto em pauta, o comerciante furtado em mercadorias – como frisa Aliomar Baleeiro – teria não só que suportar os prejuízos, como pagar o ICMS devido por elas. E mais: se não levasse a notitia criminis ao conhecimento da autoridade fazendária estaria praticando uma evasão tributária, já que estaria escondendo do Fisco a ocorrência do fato imponível do ICMS.

... Outro exemplo, para extirpar de vez a propalada ideia de que o fato imponível do ICMS é a saída da mercadoria: durante uma inundação, mercadorias são levadas para fora do estabelecimento comercial, não por mãos humanas, mas pela força das águas (motivo de força maior). O comerciante deve pagar ICMS por este fato? É evidente que não.

... Portanto, a saída das mercadorias de um estabelecimento para outro, de uma mesma empresa, bem como a saída da mercadoria para retornar ao estabelecimento (no caso de reparos) não fazem nascer o ICMS, exatamente porque, nestes casos, inocorre operação mercantil, mas simples movimentação física.”[42]

 

E adiante, conclui o autor:

 

“É por isso que não se pode considerar ocorrido o fato imponível do ICMS: a) em momento anterior à ocorrência da operação mercantil; b) quando o fato verificado não configura operação mercantil; c) quando o bem móvel sai do estabelecimento comercial, industrial ou produtor para a ele tornar, como se dá no comodato; ou d) na consignação mercantil, em que o consignante remete mercadoria de sua propriedade para o consignatário, que a venderá, por sua conta e risco (há, aí, apenas movimentação física do bem móvel, não operação mercantil)... Melhor esclarecendo, o contribuinte do ICMS tem o direito subjetivo de só ser tributado após a ocorrência da operação mercantil.”[43]

 

Luiz F. Lippo, ao lado de José E. S. Melo, salienta que:

 

“A partir desta conclusão, podemos descartar que a hipótese de saída de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte, contida no inc. I do art. 12, da Lei Complementar nº 87/96, daria ensejo à incidência do ICMS. Inexistindo, na espécie, operação mercantil, inexiste a obrigação tributária correspondente. A afirmação se justifica porquanto o empresário, por exemplo, que possua dois estabelecimentos, ao transferir mercadorias de um para o outro não está reduzindo o seu patrimônio, o seu estoque. Está apenas o realocando de um lugar para outro.”[44]

 

Em seguida, arremata o ilustre Professor:

 

“As hipóteses de prestação de serviços de transportes interestadual e intermunicipal e de comunicação não discrepam das considerações acima destacadas. Tal como nas operações da circulação de mercadorias, no caso desses serviços, o momento da ocorrência da hipótese de incidência se verifica quando da efetiva conclusão dos mesmos pelo seu prestador. Concluída a entrega da carga em outro Município ou em outro Estado da Federação, com a recepção pelo seu destinatário; colocada a pessoa em outra localidade fora do Estado ou do Município, por qualquer via; realizada com sucesso a ligação telefônica; acionado o sistema de fornecimento de imagens televisivas por cabo, invariavelmente ter-se-á a ocorrência concreta do fato jurídico típico, a impor ao contribuinte a obrigação tributária. Assim, todas as descrições contidas no art. 12 da Lei Complementar nº 87/96, que discreparem disto, estarão fadadas à declaração de inconstitucionalidade.“[45]

 

 

2.4. Aspecto espacial

 

Consoante a lição de Geraldo Ataliba, designa-se como aspecto espacial “a indicação de circunstância de lugar – contida explícita ou implicitamente na h.i. (hipótese de incidência) – relevante para a configuração do fato imponível - Hipótese de Incidência Tributária, Malheiros, São Paulo, 1993, p. 97.”[46]

 

Paulo de Barros Carvalho vaticina:

 

“Reportando-nos à definição do locus facti, nas leis brasileiras podemos divisar três níveis de elaboração, no que toca às coordenadas de espaço dos antecedentes das regras tributárias... exações do estilo do IPI ou do ICMS apresentam pequena participação elaborativa, no que tange ao fator condicionante do espaço. Seja qual for o lugar em que o fato ocorra, dentro da latitude eficacial da norma, dão-se por propagados seus legítimos efeitos, não havendo falar-se de pontos particularmente determinados, ou de sub-regiões zelosamente delineadas. O critério espacial coincide, nessas hipóteses, com o âmbito de vigência territorial da lei... A despeito disso, porém, percebemos, com transparente nitidez, que critério espacial da hipótese e campo de eficácia da lei tributária são entidades ontologicamente distintas.”[47]

 

Tenha-se em referência que o ICMS é um tributo incidente sobre operações mercantis mediante a transferência da propriedade de mercadorias, ou decorrente da prestação de serviços de transportes interestaduais e municipais e de comunicação. Assim, quando o artigo 155, § 2º, XII, d, da Constituição Federal estipula que caberá à lei complementar fixar o “estabelecimento responsável” pelo pagamento do imposto, está se reportando àquele que realiza tais operações ou prestações.[48]

 

O Código Civil vigente preconiza uma definição de estabelecimento comercial como sendo “todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária” (art. 1.142), podendo “ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza” (art. 1.143).

 

Segundo a doutrina de Rubens Requião, “...o estabelecimento comercial constitui, em nosso sentir, um bem incorpóreo, formado por um complexo de bens que não se fundem, mas mantém unitariamente sua individualidade própria.”[49]

Elucubrando acerca da natureza jurídica do fundo de comércio ou estabelecimento comercial, o renomado comercialista acentua:

“Na doutrina, os autores versam sobre o estabelecimento comercial como instrumento do exercício da empresa, organizado pelo empresário. Na impossibilidade legal de conceitua-lo como universitas juris, pois esta depende de criação da lei, e mesmo como patrimônio separado, já que o direito brasileiro consagra o princípio da unidade patrimonial como objeto de direito, resta aos comercialistas a classificação compulsória como uma universalidade de fato.“[50]

E sublinha:

“Somos da opinião que o estabelecimento comercial pertence à categoria dos bens móveis, transcendendo às unidades de coisas que o compõem e são mantidas unidas pela destinação que lhes dá o empresário, formando em decorrência dessa unidade um patrimônio comercial, que deve ser classificado como incorpóreo...”[51]

 

Colacionadas estas lúcidas lições, importa ressaltar que a efetivação de uma operação mercantil ou de uma prestação de serviço por um dado complexo de bens, não significa erigir tal estabelecimento comercial à qualidade de sujeito passivo do ICMS. Contribuinte do imposto não será cada uma das unidades fabris, filiais ou sucursais de determinada empresa. Será a empresa como um todo.[52]

A esse respeito, extirpando quaisquer dúvidas acerca do critério para se determinar o principal estabelecimento integrante de uma empresa, Rubens Requião enuncia:

“...o domicílio fiscal da empresa, quando não for determinado pela sede estatutária, o será pelo estabelecimento centralizador das atividades da empresa, onde se situa a chefia, de onde emanam as ordens e onde se realizam as operações mais intensas da atividade organizada pelo empresário.”[53]

 

Em suma, o conteúdo do artigo 155, § 2º, XII, d, da Constituição Federal, ao dispor que caberá à lei complementar fixar o “estabelecimento responsável” pelo pagamento do imposto, autoriza a edição de lei para melhor controle sobre as atividades de cada estabelecimento. Contudo, a descrição contida no artigo 11, §3º, da Lei Complementar 87/1996, não possui qualquer utilidade, quando se trate de vários estabelecimentos do mesmo contribuinte localizados dentro de um mesmo Estado. Destarte, ainda que proprietária de vários estabelecimentos localizados no território estadual, o contribuinte – sujeito passivo – será unicamente a empresa.[54]

 

2.5. Sujeição Passiva do ICMS – Aspecto Pessoal

 

2.5.1. Contribuinte

 

Consoante ensina Paulo de Barros Carvalho, a regra-matriz de incidência contém no consequente da norma os aspectos pessoal e quantitativo. Uma vez ocorrido em concreto o fato jurídico descrito no antecedente da norma, deflagram-se as consequências nela previstas, completando integralmente o ciclo da relação jurídica tributária instalada. É dizer, pela ocorrência concreta do fato abstratamente descrito no antecedente da regra-matriz tributária, ilumina-se o consequente da norma, tornando-se manifestos os sujeitos – credor e devedor – da relação jurídica (obrigação tributária).[55]

José E. S. Melo elucida que no polo passivo da relação tributária insere-se a figura do contribuinte, o qual mantém relação pessoal e direta com a respectiva materialidade e que, voluntariamente, realiza o fato imponível.[56]

Assinala o autor:

“Normalmente, a Constituição não indica a pessoa que deve ser caracterizada como devedora do tributo, mas apenas contempla as materialidades suscetíveis de incidência, outorgando as respectivas competências às pessoas públicas. Nessa situação, competiria à lei complementar (art. 146) estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, no que disporia sobre os contribuintes (item III)... Numa fase pré-jurídica, o legislador colhe a pessoa intimamente vinculada à realização da materialidade do tributo, que, no caso do imposto, se traduz num mero índice de capacidade contributiva.“[57]

 

Com relação ao ICMS, constitui seu aspecto material a realização de operações das quais decorram a circulação de mercadorias, a prestação de serviços de transportes intermunicipais e interestaduais, e a prestação de serviços de comunicação. De fato, contribuinte do ICMS é aquele que realiza sua atividade de circulação de mercadorias, de prestação de serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e de comunicações habitualmente.[58]

A Lei Complementar 87/1996 - art. 4º - estabelece definição de contribuinte consentânea com a doutrina pátria, ressaltando, no parágrafo único, que “é também contribuinte a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade: I- importe mercadoria do exterior, ainda que as destine a consumo ou ativo permanente do estabelecimento; II- seja destinatária de serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior...”.

O Supremo Tribunal Federal consolidara jurisprudência, traduzida pela ementa a seguir: “Recurso Extraordinário. Constitucional. Tributário. Pessoa Física. Importação de Bem. Exigência de Pagamento do ICMS por Ocasião do Desembaraço Aduaneiro. Impossibilidade” (RE nº 203.075 – Pleno – Rel. Min. Carlos Velloso – j. 25.8.98).

Com base na assente posição jurisprudencial, editou-se a Súmula nº 660 do STF, dada a seguinte redação: “Não incide o ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto.”

José E. S. Melo pondera que:

“O requisito da habitualidade e do volume da importação constituem requisitos de difícil aferição, impregnados de considerável dose de subjetividade, que não se compadecem com a rigidez da tipicidade tributária. Por último, a dispensa da habitualidade, nas operações de importação, configurara tratamento que viola o postulado da isonomia, suscetível de decretação de inconstitucionalidade.“[59]

No entanto, consigna o autor:

“A Emenda Constitucional nº 33, de 11.12.2001, ampliou a incidência do ICMS na importação, ao abranger expressamente a pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto.

Assim, deverá ficar prejudicada a postura assumida pelo STF (não incidência do ICMS nas importações realizadas por pessoas físicas e sociedades civis), relativamente aos fatos geradores que venham a ser realizados após a edição da legislação ordinária competente, observado o princípio da anterioridade... Nesse sentido, a LC 114/02 passou a dispor (art. 4º, parágrafo único) que é também contribuinte a pessoa física ou jurídica que, mesmo sem habitualidade ou intuito comercial (inciso I) importe mercadorias ou bens do exterior, qualquer que seja sua finalidade; (inciso II) adquira em licitação mercadorias ou bens apreendidos ou abandonados.“[60]

 

Repise-se, oportunamente, que o legislador, ao apontar quem deterá a capacidade tributária passiva, deve permanecer fiel aos arquétipos constitucionais do tributo - ICMS. Ao eleger o sujeito passivo da obrigação tributária, deve o legislador obedecer a uma regra básica: só poderá onerar quem participou da ocorrência do fato típico, já que ninguém pode ser compelido a pagar tributo sem que tenha participado, de algum modo, da realização do fato imponível. Isto se aplica também quando o legislador tributário cria a figura da responsabilidade tributária – modalidade de sujeição passiva indireta, subdividida em diversas espécies, entre as quais a substituição tributária, conforme se verá a seguir.[61]  

 

2.5.2. Substituição Tributária

 

Nas palavras de José E. S. Melo, a substituição tributária consiste na “imputação de responsabilidade por obrigação tributária de terceiro, que não praticou o fato gerador, mas que tem vinculação indireta com o real contribuinte”[62]

Trata-se de uma das modalidades da responsabilidade tributária. Neste fenômeno, o substituto é posto pela lei na posição de verdadeiro sujeito passivo da obrigação tributária, se estiver de algum modo vinculado ao fato que realizou o tributo, embora não tenha efetivamente praticado o fato imponível.[63]

Enuncia a doutrina que o instituto da substituição tributária subdivide-se em substituição para trás e substituição para frente.

Roque Carrazza assinala que “só a substituição tributária para trás pode prosperar no Brasil... Na chamada substituição tributária para trás, a lei, tendo em vista comodidades arrecadatórias, estabelece que o tributo será recolhido, pelo substituto, na próxima operação jurídica (em nome do substituído)”.[64] 

Aduz, entretanto, que a substituição tributária para frente é totalmente inconstitucional. Nesta, parte-se do pressuposto de que o fato imponível ocorrerá no futuro, portanto tributa-se fato que ainda não aconteceu. À vista disso, argumenta o autor:

“Ora, a Constituição veda a tributação baseada em fatos de provável ocorrência. Para que o mecanismo da substituição venha adequadamente utilizado é preciso que se estribe em fatos concretamente ocorridos; nunca em fatos futuros, de ocorrência incerta. Esta é uma barreira constitucional inafastável, pois integra o conjunto de direitos e garantias que a Lei Maior confere ao contribuinte... Eis aqui um limite lógico: somente se pode substituir pessoa certa, perfeitamente identificada. Ora, se ainda não surgiu a obrigação tributária, seu sujeito passivo não existe e, deste modo, presumi-lo afronta os postulados constitucionais, mormente o da não confiscatoriedade“.[65]

A Emenda Constitucional 3/1993 acrescentou o §7º ao artigo 150 da Constituição Federal, com a seguinte redação: “A lei poderá atribuir a sujeito passivo da obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”.

Em que pese a positivação da referida norma pelo Poder Constituinte de Reforma, entende-se que o dispositivo em tela ofende a diversos princípios constitucionais tributários.

Há que se lembrar de que os princípios configuram regras estruturantes e balizadoras de todo o sistema normativo, mormente os princípios constitucionais ou fundamentais do ordenamento jurídico pátrio. Celso A. Bandeira de Melo com maestria observa que:

“Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma, a desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra“.[66]

Em suma, a doutrina é uníssona em afirmar a inconstitucionalidade da denominada substituição tributária para frente, tendo em vista a injuridicidade da tributação fundada em fatos inexistentes. Afigura-se inaceitável a presunção de que irá ocorrer o fato imponível, mesmo que assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, porque – nos termos empregados por Roque Carrazza - o primado da segurança jurídica resta irremediavelmente atropelado só com a tributação de fato imaginário.

 

2.6. Base de Cálculo e Alíquota do ICMS – Aspecto Quantitativo

 

O componente monetário do ICMS – base de cálculo e respectiva alíquota – constitui o último elemento da regra-matriz de incidência tributária. É o denominado aspecto quantitativo, e tal qual se dá nos demais aspectos da regra-matriz, o critério quantitativo tem suporte de validade apenas na Constituição Federal.

No caso específico do ICMS, visto que as suas hipóteses de incidência constituem contratos pelos quais ou se realizam operações mercantis, ou se prestam serviços de transporte interestadual/intermunicipal e de comunicação, a base de cálculo deve representar a quantificação compreendida nas devidas operação ou prestações de serviços, ou seja, o preço das mercadorias e dos serviços, respectivamente.[67]

Por sua vez, a alíquota refere-se à parte ou ao percentual incidente sobre a base de cálculo - valor da operação de circulação de mercadoria ou da prestação de serviço de transporte interestadual/intermunicipal ou de comunicação – propiciando a apuração da expressão monetária que deverá ser entregue ao Erário sob a forma de imposto.[68]

Registre-se que nos incisos IV a VIII do §2º, artigo 155, da Constituição Federal, instituiu-se um amplo regramento em torno da alíquota do ICMS. Atribuiu-se ao Senado Federal a responsabilidade pelo estabelecimento das alíquotas mínimas e máximas do imposto em comento. À vista disso, os Estados-membros e o Distrito Federal estão adstritos àqueles parâmetros, no que Roque Carrazza enuncia ser “um nítido caso de resolução reguladora de limitações constitucionais ao poder de tributar...”[69]

Em exposição sobre o tema - critério quantitativo da dívida tributária - Paulo de Barros Carvalho assinala:

“No direito tributário brasileiro, a alíquota é matéria submetida ao regime de reserva legal, integrando a estrutura da regra-modelo de incidência. Congregada à base de cálculo, dá a compostura numérica da dívida, produzindo o valor que pode ser exigido pelo sujeito ativo, em cumprimento da obrigação que nascera pelo acontecimento do fato típico...”[70]

Explicite-se que a Constituição apenas deu à União, representada pelo Senado, a possibilidade de definir as alíquotas mínimas e máximas do ICMS, com o fim de evitar abusos e impedir grandes disparidades na tributação entre os Estados-membros (ou entre entes e o Distrito Federal). A definição efetiva das alíquotas, não é demais ressaltar, cabe ao legislador ordinário dos citados entes federativos.[71]   

 

2.6.1 O ICMS na sua própria Base de Cálculo

 

A base de cálculo dos tributos deve guardar correlação lógica com a devida hipótese de incidência. Ao definir a base de cálculo, portanto, não pode o legislador manejar grandezas alheias ao aspecto material da hipótese de incidência, sob pena de irremissível inconstitucionalidade. Logo, visto que a base de cálculo do ICMS deve necessariamente ser uma medida ou da operação mercantil ou da prestação do serviço de transporte transmunicipal e de comunicação, a integração do ICMS na apuração da sua própria base de cálculo fere diversos princípios constitucionais.[72]

Roque Carrazza, com impecável argumentação, demonstra a referida inconstitucionalidade:

“...a lei complementar que vier a cuidar da base de cálculo dos impostos discriminados nesta Constituição (art. 146, III, “a”) só poderá explicitar o que está implícito, a respeito, na Constituição... Em razão de seu caráter declaratório, apenas pode tornar mais clara a base de cálculo possível dos impostos... com facilidade notamos que é inconstitucional o art. 13, §1º, I, da Lei Complementar 87/1996, quando estipula: §1º. Integra a base de cálculo do imposto: I – o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle... a lei complementar, ao estabelecer que a base de cálculo do ICMS corresponde ao valor da operação ou prestação, somado ao do próprio tributo, extrapolou os limites constitucionais... determinando a inclusão, na base de cálculo, do montante do próprio imposto, abriu espaço a que os Estados e o Distrito Federal criem (como, de fato, já haviam criado) uma figura híbrida e teratológica...”[73]

Diz mais o Professor Carrazza:

“...nem mesmo as conveniências arrecadatórias poderão levar tal lei complementar a agregar elementos estranhos à base de cálculo possível do ICMS, que, conforme demonstramos, está predefinida na Constituição... as conveniências arrecadatórias, conquanto digam de perto com o interesse público, só prevalecerão quando legítimas. Estamos com isso querendo significar que não podem fazer tábula rasa dos direitos constitucionais dos contribuintes... Isto é, por evidente, um despautério jurídico, que, se por mais não fosse, deixa de levar em conta a capacidade econômica dos contribuintes...”[74]

Assim, torna-se clara a conclusão no sentido de que a denominada integração do ICMS na sua própria base de cálculo afronta diversos princípios constitucionais tributários, em prejuízo dos direitos fundamentais dos contribuintes.

Ademais, em que pese o entendimento contrário do C. Supremo Tribunal Federal, registre-se que a integração do ICMS na apuração da sua própria base de cálculo fere, especialmente, os princípios constitucionais da capacidade econômica do contribuinte, da razoabilidade, da não-cumulatividade e da legalidade, nos termos esposados pelo Ministro Marco Aurélio (voto vencido em sede de Recurso Extraordinário - RE nº 212.209-RS j. 23.06.1999 – Informativo STF nº 154 de 21 a 25.06.1999).

 

2.6.2. A não-cumulatividade do ICMS

 

A Emenda Constitucional 18/1965, introduzida sob a égide da Constituição da República de 1946, configurou o surgimento de uma nova ordem tributária nacional, porque iniciou efetivamente uma definição sistemática acerca da tributação. Feita esta breve reminiscência, importa aqui destacar que dentre todas as modificações operadas por meio de tal Emenda Constitucional, foram definidos os impostos sujeitos ao princípio da não-cumulatividade.[75]

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a disposição sistêmica da ordem tributária nacional, contida na Emenda Constitucional 18/1965, foi retomada, tornando o denominado Sistema Tributário Nacional bastante amplo, complexo e rígido. Com efeito, a não-cumulatividade tributária foi alçada à categoria de princípio constitucional.[76]

A respeito do ICMS, a Carta Política vigente - artigo 155, §2º, I - dispõe expressamente que “será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.

Em lapidar exposição sobre a não-cumulatividade tributária, Luiz F. Lippo, ao lado de José E. S. Melo, demonstra a relação de congruência existente entre o princípio da não-cumulatividade e os demais princípios constitucionais tributários, especialmente que “...o princípio da não-cumulatividade é a própria legalidade (...)”.

Confiram-se as lúcidas palavras encetadas sobre o tema aqui em comento:

“...não há dúvida que em matéria tributária o princípio da igualdade vincula-se inexoravelmente ao princípio da capacidade contributiva... É dizer, todos os que pratiquem o fato qualificado como tributário, por presunção legal, estarão economicamente capacitados para arcar com a carga tributária correspondente... Os princípios da igualdade e da capacidade contributiva, por seu turno, como já se viu, são comandos constitucionais endereçados ao legislador ordinário... Assim, deverá o legislador impor aos agentes do ciclo de produção/comercialização/ prestação de serviços, uma única regra de conduta, para que a carga tributária incorporada ao preço das mercadorias seja uniforme. Sendo referidos tributos submetidos ao princípio da não-cumulatividade, não será possível que algumas pessoas sejam mais beneficiadas do que outras no transcorrer do ciclo produtivo/comercial “[77]

E sublinham adiante:

“...alinhando o princípio da proibição do efeito confiscatório dos tributos com o princípio da não-cumulatividade, podemos observar que os mesmos efetivamente se tocam e se complementam. Supondo-se que em algum momento ou em determinada operação o ente tributante venha a estabelecer a proibição total ou parcial do dever-poder do contribuinte de creditar-se do imposto incidente nas operações anteriores, estará ele, a um só tempo, provocando o efeito cumulativo... e também um efeito confiscatório, porque sobre o mesmo preço estará ocorrendo mais de uma incidência do mesmo imposto...”[78]

Outrossim, registre-se que o comando fundamental da igualdade tributária, por sua vez, é implementado pelo princípio da legalidade, ou estrita legalidade tributária, já que a não-cumulatividade encontra o seu suporte de validade diretamente na Constituição Federal, nada sobrando ao legislador ordinário. Como é cediço, o princípio da estrita legalidade em matéria tributária consubstancia o princípio da segurança jurídica, primado maior do Estado de Direito.

Tendo isto em apreço, Luiz F. Lippo e José E. S. Melo arrematam:

“...para a exata identificação do tipo tributário, não há dúvida que a sua configuração integral deve estar prevista na norma. No caso específico da não-cumulatividade, sendo ela característica intrínseca do ICMS, inevitavelmente a sua constituição e operacionalização integral deverão ser definidas. É a própria Constituição Federal que determina a necessidade da edição de norma específica para regular a não-cumulatividade... É nossa convicção, portanto, que o princípio da não-cumulatividade previsto no art. 155 da Constituição em vigor reclama a observação do princípio da estrita legalidade tributária, como forma de atingimento da segurança jurídica”.

 

 

 

 

 

 

 

 

3. Breves anotações sobre a COFINS

 

3.1. A natureza jurídica das Contribuições Sociais

 

Preliminarmente, mostra-se relevante tecermos breves considerações sobre a classificação das espécies tributárias, para em seguida enfatizarmos a natureza jurídico-tributária das ditas contribuições, das quais a COFINS é subespécie.

O Código Tributário Nacional tripartiu os tributos em impostos, taxas e contribuições de melhoria – artigo 5º - classificação esta que foi inserida no atual texto constitucional – artigo 145 da Constituição Federal de 1988. O Código pontificou também que a natureza jurídica específica de cada tributo seria dada pelo fato gerador da respectiva obrigação tributária, sendo irrelevantes, para determinar a espécie de tributo, o exame de sua denominação e demais características formais que a lei possa adotar, bem como a destinação legal dada ao produto da arrecadação do tributo – artigo 4º. O critério preconizado pelo Código Tributário Nacional levaria o intérprete a concluir que todas as contribuições (que não a de melhoria), bem como o empréstimo compulsório, teriam de enquadrar-se como impostos, taxas ou contribuições de melhoria.

No entanto, analisando a situação peculiar das contribuições, percebe-se que estas ostentam natureza diversa da contribuição de melhoria, porque não há obra pública valorizando imóvel particular. Verifica-se também que são espécies diferentes das taxasde serviço ou de polícia -  já que nesse caso o Estado não presta serviço público divisível, cuja fruição sirva de suporte fático para o tributo, e também não manifesta exercício regular do poder de polícia. Logo, não reunindo as características da contribuição de melhoria e das taxas, as contribuições teriam de revestir-se da roupagem dos impostos, porém estes são apenas aqueles nominados taxativamente no sistema tributário nacional. Sendo assim, as contribuições diversas das contribuições de melhoria não se afinariam a nenhuma das figuras tipificadas no Código Tributário Nacional.[79]

Com efeito, Luciano Amaro assinala:

“Admitida a natureza tributária das contribuições, ficaríamos diante de um dilema: ou elas, se não lograssem se enquadrar na tipologia codificada, teriam sido extintas, ou haveriam de ser catalogadas como espécies distintas, irredutíveis aos modelos tipificados nos arts. 16, 77 e 81 do Código Tributário Nacional. Percebido o problema, o Código sofreu um trabalho protético, mediante o acréscimo do art. 217, reconhecendo-se que suas disposições (inclusive o art. 17, nomeadamente citado) não excluíam as diversas contribuições, arroladas exemplificativamente por aquele artigo... chegar-se-ia, logicamente, à conclusão de que era insuficiente o critério preconizado pelo caput do referido art. 4º, desmentindo, em consequência, o caráter exaustivo do rol do art. 5º ”[80]

 

A seguir, analisando o problema da classificação das contribuições, diz mais o autor:

“...tendo em vista que os fatos geradores das contribuições sociais não são atuações do Estado (cf. art. 195), essas contribuições são irredutíveis à categoria de taxa, cujo fato gerador (arts. 145, II, da Constituição, e 77 do CTN) é configurado por uma atividade do Estado. Além disso, o tratamento jurídico-constitucional diferenciado que é dado a essas e às demais contribuições (destinação específica, a par de uma disciplina constitucional peculiar, no que respeita aos seus fatos geradores, bases de cálculo, contribuintes) também dificulta a afirmação singela de que essas contribuições são impostos, ou são taxas, ou ora são uma coisa, ora outra. Razões análogas tornam complexo o trabalho de determinar a natureza jurídica específica das contribuições de intervenção no domínio econômico e das contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas... A contribuição, instituível pelos Municípios e pelo Distrito Federal, para o custeio do serviço de iluminação pública (art. 149-A da Constituição, acrescido pela EC n. 39/2002) é outra figura que, como taxa, não se legitimaria, dado que se trata de serviço indivisível. Por isso, a Constituição não hesitou em acrescentar essa exação ao rol de tributos que atendem pelo elástico apelido de contribuição.”[81]

Em sintonia com a lapidar doutrina acima elencada, depreende-se que as contribuições não podem ser classificadas como impostos, já que a receita das contribuições tem vinculação específica, o que contraria o regramento previsto no artigo 167, IV, da Constituição Federal, que veda a vinculação da receita de impostos. E não podem ser classificadas como taxas ou contribuições de melhoria, pelas razões acima explicitadas. Assim, temos que as Contribuições Sociais, das quais a COFINS é subespécie, constituem uma espécie autônoma de tributos.

 

3.2 Competência tributária das Contribuições Sociais

 

Dispõe a Constituição da República que compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais – artigo 149. Ademais, compete à mesma entidade política legislar privativamente sobre a Seguridade Social, conforme dessume-se do artigo 22, XXIII, da Suprema Carta. Logo, a competência para instituir as contribuições sociais, que compreendem também o custeio da saúde, da previdência social e da assistência social – artigos 195 a 203 da mesma Carta – é exclusiva da União.

Dado o peculiar regime jurídico das contribuições sociais, tendo em vista a sua vinculação específica para custeio da Seguridade Social, e a previsão de orçamento próprio que não se confunde com o do Tesouro Nacional, nos termos do artigo 165, §5º, III, da Carta Política, vislumbra-se que o só fato de a União deter a competência para instituí-las não lhe confere o direito de arrecadar, cobrar e fiscalizar a respectiva receita, de modo a não transformar as contribuições em “impostos com destinação” manifestamente inconstitucionais.[82]

Nesse sentido a doutrina é uníssona, conforme esclarece José E. S. Melo:

“Do contexto doutrinário e jurisprudencial, e principalmente à luz da Constituição, constata-se que as questões financeiras inerentes à Seguridade Social receberam um tratamento peculiar e, sobretudo, privilegiado. A obrigação de ser elaborado um específico “orçamento da Seguridade Social” (art. 165, §5º, III) demonstra, inequivocamente, que a mens legis foi carrear para os cofres da entidade de Seguridade todas as receitas pertinentes, para que os serviços assistenciais que lhe são afetos possam ser desempenhados em toda sua plenitude e da forma mais eficiente... Em suma, o sujeito ativo das contribuições sociais destinadas à Seguridade Social só poderá ser a entidade destinatária de tais verbas (...)”[83]

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal decidiu a questão em sentido diametralmente oposto (Pleno, RE 146.733-9-SP, Rel. Ministro Moreira Alves, j. 29.6.1992). Examinando ainda a temática da arrecadação da COFINS pela Receita Federal, entendeu o Guardião da Constituição que a delegação não interfere na natureza jurídica da referida contribuição e não induz desvio em sua destinação (ADIn 1-1-DF, j. 1.12.1993).[84]

 

3.3. Aspecto material da COFINS

 

3.3.1 Breve Histórico das Contribuições Sociais

 

A Contribuição ao Financiamento da Seguridade Social - COFINS - foi instituída pela Lei Complementar 70/1991, em substituição ao FINSOCIAL, contribuição então prevista naLei 8.212/1991, de acordo com os dispositivos a seguir transcritos:

“... Art. 1° Sem prejuízo da cobrança das contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), fica instituída contribuição social para financiamento da Seguridade Social, nos termos do inciso I do art. 195 da Constituição Federal, devida pelas pessoas jurídicas inclusive as a elas equiparadas pela legislação do imposto de renda, destinadas exclusivamente às despesas com atividades-fins das áreas de saúde, previdência e assistência social (...) Art. 9° A contribuição social sobre o faturamento de que trata esta lei complementar não extingue as atuais fontes de custeio da Seguridade Social, salvo a prevista no art. 23, inciso I, da Lei n° 8.212, de 24 de julho de 1991, a qual deixará de ser cobrada a partir da data em que for exigível a contribuição ora instituída...” – (Lei Complementar 70/1991).

Cumpre observar que as regras estruturadoras da COFINS tiveram identidade com as normas do PIS/PASEP, de modo que se colocou em dúvida a juridicidade da contribuição social instituída pela aludida lei complementar. Não obstante, apreciando a questão, o Supremo Tribunal Federal declarou a improcedência das alegações de inconstitucionalidade (DJU 16.6.1995, p. 18.213 RDDT 1/79).[85]

Posteriormente, mediante diversas espécies normativas datadas de 1998, modificou-se substancialmente a sistemática de incidência da COFINS. A Medida Provisória 1.724, convertida na Lei 9.718 em 27 de novembro de 1998, ampliou a base de cálculo do tributo para a totalidade das receitas auferidas. Em seguida, aprovou-se a Emenda Constitucional 20/1998, que alterou a redação do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal, dentre outras providências, incluindo a incidência da exação também sobre a receita das empresas.

Afigura-se oportuna a citação das lições doutrinárias a respeito das modificações inauguradas com as referidas espécies normativas:

“Em realidade, a lei não decorreu da conversão integral da Medida Provisória 1.724/1998, uma vez que foram procedidas diversas alterações em sua substância... Além disso, é questionável a legitimidade do veículo normativo (lei ordinária), ao invés de lei complementar, tendo em vista que o art. 195 da CF estabelecera o seguinte: §4º. A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da Seguridade Social, obedecido o disposto no art. 154, I... Considerando que a lei em causa utilizou a totalidade da receita como base de cálculo – ao invés de faturamento (na forma então prevista no art. 195, I, da CF de 1988), ou mesmo receita bruta (total de vendas e serviços) -, acabou estabelecendo uma nova contribuição, com novo enquadramento constitucional (art. 195, §4º)“[86]

Com relação às alterações instauradas pela Emenda Constitucional 20/1998, assinalou-se que “...até que seja editada lei complementar, regulando o disposto no art. 195, I, da Constituição com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional 20/1998 a COFINS somente incidirá sobre o faturamento[87]. Nesse sentido, salienta a doutrina:

“O constituinte havia previsto (art. 195, I, redação original) as contribuições sociais dos empregadores, incidentes sobre o faturamento, tendo a Emenda 20, de 15.12.1998, ampliado esse quadro normativo, para abranger novas figuras de contribuintes (a empresa e a entidade a ela equiparada na forma da lei), base de cálculo (receita) e permitir a fixação de distintas bases de cálculo e alíquotas (atividade econômica diferenciada e mão-de-obra intensiva). Estas alterações evidenciam que desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 até o início de vigência da Emenda Constitucional 20/1998 não havia embasamento constitucional para possibilitar a exigência da COFINS de quaisquer empresários e entidades; bem como ser calculada sobre receitas de qualquer natureza (distintas da exclusiva receita de operações mercantis e prestação de serviços) e estabelecer excepcional tratamento ao princípio da isonomia (...) Em decorrência, para que os preceitos contidos na alteração constitucional (Emenda Constitucional 20/1998) pudessem produzir efeitos, tornava-se imprescindível a edição de nova lei, uma vez que a Constituição não cria tributos, mas apenas atribui competências e ordena as respectivas materialidades...”[88]

À vista disso, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do §1º, artigo 3º, da Lei 9.718/1998, na medida em que ampliou o conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida e da classificação contábil adotada (Nesse sentido: Plenário, RE 346.084-5-PR, relator para o acórdão Min. Marco Aurélio, j. 9.11.2005, DJe 1.9.2006).

Finalmente, a matéria passou a ser tratada na Medida Provisória 1.807/1999, seguida de dezenas de medidas provisórias (culminando com a Lei 10.833/2003), mantendo a diretriz básica totalidade das receitas auferidas, independentemente da atividade exercida pela pessoa jurídica e da classificação contábil adotada. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que se considera receita tudo quanto entra no caixa da empresa a título de preço pela venda de mercadorias, não tendo qualquer relevância, em termos jurídicos, a parte que vai ser destinada ao pagamento de tributos (REsp 152.736-SP, rel. Min. Ari Pargendler, DJU 16.2.1995).

Pondera-se, com efeito, que a receita bruta de uma empresa pode ser constituída de juros, alugueis, lucros, dividendos, royalties etc., porém não de ingressos que simplesmente transitam pelo caixa do contribuinte, sem implicar alteração do patrimônio líquido, tal como se dá com o ICMS e o IPI a serem repassados ao erário.[89]

Feita esta necessária reminiscência histórica, será analisado no tópico imediato o aspecto material da regra de incidência da COFINS.  

 

3.3.2. Incidência sobre o Faturamento

 

A Constituição Federal (artigo 195, I, “b”) instituiu a receita ou o faturamento como hipóteses de incidência das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada. A rigor, não obstante a fungibilidade conceitual que o dispositivo constitucional possa sugerir, convém ressaltar que receita e faturamento são institutos jurídicos distintos.

Trata-se, neste capítulo, da incidência da contribuição sobre o faturamento, na medida em que mais de perto nos interessa para o desenvolvimento do título seguinte, no qual se pretende demonstrar a inconstitucionalidade da exação que integra o ICMS na base de cálculo da COFINS.

Com o fim de solucionar a interpretação normativa que ora se apresenta, José E. S. Melo esclarece que a incidência tributária em referência recai sobre as operações mercantis ou negócios similares cuja quantificação possa expressar-se no faturamento, já que “o vocábulo em tela, por si só, não pode jamais ser representativo de materialidade de tributo, por ser, simplesmente, um elemento corpóreo (o papel fatura), ou significar conceitualmente a somatória de cobranças pelo empregador.”[90]

Confira-se a precisa elucidação do Professor:

“As operações constituem a pedra-de-toque, o elemento cardeal, para estabelecer o real significado de faturamento, porque a incidência tributária não recai sobre o documento (fatura) ou mero resultado quantitativo (faturamento), mas consubstancia e decorre de realização de negócios. Não é pelo fato de a Constituição mencionar esse vocábulo para alguns parcos impostos que ele não possa ser considerado para as demais espécies tributárias...”[91] 

Em seguida, cotejando o ensino de renomados doutrinadores, sublinha o autor:

“Geraldo Ataliba e Cléber Giardino analisaram o significado de operações, que, embora possam ser compreendidas num sentido econômico, num sentido físico, ou num sentido jurídico, para o intérprete do Direito só interessa o sentido jurídico. Mostram os autores que para haver faturamento é indispensável que se tenha realizado operações mercantis, ou vendido produtos, ou realizado operações similares. Sobre tais operações é que, no caso, recairá a incidência. Estas, teoricamente, as materialidades das hipóteses de incidência cuja quantificação pode expressar-se no faturamento [92]

E arremata:

“Argutamente, Geraldo Ataliba e Aires Barreto entenderam que o faturamento, em si mesmo, isoladamente considerado, não é critério confiável para fins tributários; uma vez que uma entidade pode converter em receita 100% do seu faturamento (exemplo: escritório de consultoria econômica) e outra pode só realizar como receita 0,5% do faturamento (exemplo: posto de gasolina) (...)”[93]

Citada essa precisa lição, depreende-se que a incidência tributária se dá sobre as operações mercantis ou negócios similares, expressos quantitativamente no faturamento. No caso, a Lei 10.833/2003 (com sucessivas alterações), dispôs que a COFINS, com a incidência não-cumulativa, tem como fato gerador o faturamento mensal.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

4. A (in)constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS

 

4.1. O cálculo do ICMS ´por dentro´ e seu impacto na COFINS

 

Conforme visto, em virtude da sistemática de incidência do ICMS, prevista no artigo 155 da Carta da República, o imposto deve ser incluído no preço de venda das mercadorias, produtos e serviços de transportes interestaduais e intermunicipais e de comunicação. A Emenda Constitucional 33/2001 acrescentou uma alínea ao dispositivo (art. 155, §2º, XII, “i”), autorizando a lei complementar a fixar a base de cálculo (do ICMS) de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior, de bem, mercadoria ou serviço. No entanto, avalia Roque Carrazza que “não é dado ao poder constituinte derivado alterar a regra-matriz constitucional de tributo algum, modificando-lhe arbitrariamente – como no caso em estudo – a base de cálculo possível”.[94]

Consignou-se que o artigo 13, §1º, I, da Lei Complementar 87/1996, com redação dada pela Lei Complementar 114/2002, apesar de conter inconsistências principiológicas advertidas pela mais autorizada doutrina, estipula a inclusão do imposto em sua própria base de cálculo, nos termos seguintes: “Integra a base de cálculo do imposto: I – o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle...”.  

O C. Supremo Tribunal Federal, não observando as censuras externadas no voto vencido do Ministro Relator (Recurso Extraordinário 212.209-RS), manifestou o entendimento no sentido de que a inclusão do montante do próprio imposto, na base de cálculo do ICMS, não ofende a Constituição, conforme a ementa que segue:

A Lei Complementar 87/96, ao estabelecer que integra a base de cálculo do ICMS o montante do próprio imposto, vale dizer, a base de cálculo do ICMS corresponderá ao valor da operação ou prestação somado ao próprio tributo, não ofende o princípio constitucional da não-cumulatividade. Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, manteve acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que afastara a pretensão da empresa-contribuinte de excluir da base de cálculo do ICMS o próprio valor do tributo devido, sob a alegação de que tal cobrança ofendia os artigos 5º, XXII, 145, § 1º, 150, IV, e 155, todos da CF. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, ao entendimento de que a Lei Complementar 87/96, ao exigir que o contribuinte pague imposto sobre imposto a pagar, violou os princípios constitucionais da capacidade econômica do contribuinte, da razoabilidade, da não-cumulatividade e da legalidade. 
(RE 212.209-RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ acórdão Min. Nelson Jobim, 23.6.99.)
”.

A par disso, igualmente por disposição constitucional, o valor resultante das operações de circulação de mercadorias, e prestação de serviços sujeitos à incidência do ICMS compõe o faturamento das empresas, sujeitando tais operações mercantis também à incidência das contribuições sociais, dentre as quais a COFINS, consoante o artigo 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal. O aspecto material e quantitativo da contribuição em referência encontra-se declarado no artigo 2º, caput, da Lei Complementar 70/1991: “A contribuição de que trata o artigo anterior será de 2% (dois por cento) e incidirá sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços...”.

Assim, em virtude da peculiar sistemática de cálculo do ICMS, e tendo em vista a regra constitucional-tributária imponível das contribuições sociais, as empresas que praticam operações de circulação de mercadorias ou prestações de serviços de transporte intermunicipal, interestadual e de comunicação (e por consequência realizam o faturamento destas operações mercantis ou similares), estariam destinadas a pagar tributos sobre impostos. Daí a controvérsia em torno da juridicidade da inclusão do ICMS na base de cálculo das contribuições sociais – aqui se cuida da COFINS – e do direito constitucional arguido pelas empresas contribuintes de recolherem as contribuições livres do imposto estadual.

Tenha-se presente, ainda, que o deslinde da questão, de um lado, tem alta repercussão aos cofres da Fazenda Nacional, dado que a modificação da sistemática de incidência das contribuições sociais, excluindo-se o imposto estadual da base de cálculo, implicará uma redução bilionária na arrecadação federal, sem contar a verba a ser repetida, consistente no indébito tributário pago nos últimos 05 (cinco) anos pelas empresas. De outro lado, a posição baseada tão somente no interesse arrecadatório do Estado, sem atentar devidamente aos princípios tributários constitucionais, que se afiguram verdadeiros sustentáculos do Sistema Tributário Nacional, bem assim direitos fundamentais inalteráveis dos contribuintes, poderá acarretar prejuízos muito maiores do que o suposto impacto financeiro da primeira hipótese, resultando em inestimável retrocesso no campo do Direito Tributário Constitucional.

Feita esta breve exposição, na tentativa de esclarecer a indiscutível relevância jurídica da matéria objeto central deste Trabalho de Curso, bem como a enorme insegurança, especialmente jurídica, mas também político-econômica que orbita em torno da controvérsia instaurada, sintetizaremos nos capítulos seguintes as teses conflitantes, para em seguida concluirmos, sem a pretensão de esgotarmos a verdade sobre o assunto, qual mais se coaduna com o espírito da Constituição da República.

 

4.2. Breve histórico da controvérsia judicial instaurada

 

O Presidente da República, por meio da Advocacia Geral da União, no final do ano de 2007, propôs a Ação Declaratória de Constitucionalidade, com pedido de Medida Cautelar (ADC 18-MC/DF), tendo por objeto o artigo 3º, §2º, inciso I, da Lei 9.718/1998. A fim de atender ao requisito exigido no inciso III, artigo 14, da Lei 9868/1999, demonstrou-se a existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação do dispositivo, no âmbito dos Tribunais Regionais Federais, concluindo-se ora pela validade ora pela injuridicidade da norma.

Em síntese, aduziu-se que a matéria estaria pacificada há muitos anos, destacando-se o entendimento sedimentado nas Súmulas 68 e 94 do C. Superior Tribunal de Justiça, as quais declaram incluírem-se as parcelas relativas ao ICM/ICMS nas bases de cálculo do PIS e do FINSOCIAL (COFINS). Com base no entendimento assentado nas referidas súmulas jurisprudenciais, sobrevieram diversos e sucessivos acórdãos dos Tribunais Regionais Federais no sentido de que os valores devidos à conta do ICMS integram a base de cálculo da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social, depreendendo-se da leitura do inciso I, §2º, artigo 3º, da Lei 9178/1998, a faculdade de se efetuar o desconto apenas nos casos em que há substituição tributária do ICMS. Em suma, uma vez que se cuida de imposto indireto, embutido no preço da mercadoria, deve integrar a receita bruta e deve constar na base de cálculo das contribuições sociais incidentes sobre o faturamento. (Colacionaram-se, dentre outros, os seguintes acórdãos representativos da tese da validade do dispositivo atacado: TRF1 AMS 2001.34.00.028918-1DF, Rel. Des. Fed. Carlos Olavo, DJ de 21.3.2003; TRF2 AC 2002.51.04.000411-4/RJ, Rel. Des. Fed. Alberto Nogueira, DJ de 6.10.2005; TRF4 AMS 2000.7.001506-1/RS, DJ de 29.8.2001; TRF4 AMS 2006.71.02.006407-5/RS, Rel. Juíza Fed. Taís Schilling Ferraz, Acórdão de 25.7.2007).

Ocorreu, porém, especialmente no julgamento do Recurso Extraordinário 240.785/MG, pendente desde 1999, de Relatoria do Eminente Ministro Marco Aurélio, que prevaleceram os votos favoráveis aos contribuintes - Marco Aurélio, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso - embasando e inaugurando a controvérsia no âmbito dos Tribunais Regionais Federais. (Elencaram-se os seguintes acórdãos representativos da divergência inaugurada: TRF1 AG 2006.01.00.046648-2/AM, Rel. Des. Fed. Maria do Carmo Cardoso, DJ de 22.6.2007; TRF1 AGI 2007.01.00.024248-9/DF, Decisão de 24.7.2007, dentre outras inúmeras decisões provenientes de Varas Federais).

Apreciando liminarmente o caso, em 14 de maio de 2008, o C. Supremo Tribunal Federal deliberou por maioria, em sede de questão de ordem, pela precedência do julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade 18-MC/DF, em detrimento do Recurso Especial 240.785/MG. Salienta-se, também, que por decisão da maioria absoluta de seus membros, o Pretório Constitucional deferiu o pedido de medida cautelar do Presidente da República, medida prorrogada sucessivas vezes, determinando aos Juízes e Tribunais do País que suspendessem o julgamento dos processos compreendidos na questão objeto da ação constitucional, até seu julgamento definitivo.

 

4.2.1 A tese da Advocacia Geral da União

 

Sustenta a Advocacia Geral da União, em síntese, que se a Lei Complementar instituidora da COFINS (LC 70/1991), em seu artigo 2º, parágrafo único, “a”, determinou a exclusão do IPI (imposto indireto), da base de cálculo da COFINS, infere-se, a contrario sensu, que o tributo estaria naturalmente incluído por força do caput, não fosse a determinação legal expressa. Por seu turno, uma vez que o ICMS não foi excepcionado, despontaria o inexorável entendimento de que estaria compreendido na base imponível da contribuição sobre o faturamento.

Ressalta que a metódica passou a ter supedâneo legal, igualmente, no artigo 3º, §2º, I, da Lei 9718/1998, também entendido a contrario sensu, uma vez que se determinou expressamente a exclusão do ICMS da base imponível das contribuições sociais, quando pago em regime de substituição tributária. Logo, visto ser a substituição tributária um regime excepcional, dependente de expressa previsão legal, nos termos do §7º, acrescentado ao artigo 150 da Constituição Federal, sugere que por regra geral, o montante do ICMS não deve ser deduzido da base de cálculo da COFINS.

A norma encontraria fundamento no artigo 195, I, “b”, da Constituição Federal, não obstante a alteração do texto pela Emenda Constitucional 20/1998, visto constar a previsão da cobrança de contribuições sociais incidentes sobre o faturamento desde a redação originária. Destaca, ainda, que a Lei 10833/2003 reafirma ser o faturamento a base de cálculo da COFINS, e que não houve revogação expressa ou tácita do dispositivo, que excepciona a dedução do ICMS apenas quando cobrado em regime de substituição tributária.  

Em relação à inclusão do custo dos tributos indiretos – no caso, o ICMS - no preço das mercadorias, produtos ou serviços com reflexo no cálculo das exações que tem suas bases de cálculo compostas total ou parcialmente pelos respectivos preços, afirma que a prática tem guarida na história jurídica brasileira. Alega, em síntese, que o entendimento de que o ICMS compõe a sua própria base de cálculo impõe a outro, a saber, o de que o valor desse imposto corresponde a custos a cargo da empresa, que são levados em conta na formação do preço. E mais:

“Entende-se por custo do produto todos os gastos idealmente calculados como necessários especificamente para sua produção ou aquisição. Justamente por compor o custo do produto, o ICMS acaba sendo agregado em seu preço. Esse é o método que permite o trespasse do ônus econômico ao consumidor final”.[95]

A seu turno, na esteira do tratamento constitucional dado ao Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, aduz que a lógica de apuração diversa do ICMS (cálculo ´por fora´ do IPI), foi levada em conta pelo legislador, no momento da edição da Lei Complementar 70/1991, seguida da Lei 9718/1998, com o propósito de evitar controvérsias futuras, já que ambos são impostos indiretos, mas apenas o ICMS integra o preço da operação.  

Nessa vertente, uma vez reconhecida a constitucionalidade da incidência do ICMS ´por dentro´ em sua própria base de cálculo, a Advocacia Geral da União repisa o entendimento do Ministro Eros Grau, autor do único voto favorável à Fazenda Nacional no julgamento do ora pendente Recurso Extraordinário 240.785/MG, a esse respeito, nos seguintes termos: “(O ICMS) É custo, tal como o salário, a energia elétrica, sendo irrelevante a atividade e a classificação contábil para tais receitas”.

Ante as considerações acima expostas, sob o prisma da significação do termo custo dada pelo Instituto Brasileiro de Contadores - (custo) é, pois, tanto o preço pelo qual é adquirido um bem ou serviço, como o incorrido no processo interno da empresa para a prestação de serviços ou obtenção de bens, para venda ou uso interno – propõe a conclusão de que o ICMS torna-se parte do faturamento da empresa: “...uma vez que o ICMS incide sobre a operação, sua inclusão na base de cálculo há de ser considerada custo na formação do preço pelo alienante, representando faturamento da empresa”.[96]  

Por fim, argumenta o interesse político-financeiro existente na questão, visto que a dedução do custo-ICMS da base de cálculo da COFINS produziria efeitos perversos nas contas públicas da União, gerando crise na execução orçamentária federal. Nas seguintes palavras ressalta o interesse metajurídico envolvido:

“Segundo dados passados pela Receita Federal do Brasil, o impacto econômico nos cofres públicos estará em torno de R$ 12.000.000.000,00 (doze bilhões de reais) por ano. Se pensarmos em indébitos tributários, repetidos ou compensados, dos últimos cinco anos, chegamos à assustadora cifra de R$ 60.000.000.000,00 (sessenta bilhões de reais). E o mais grave é que a perda de receita da União estará vinculada ao orçamento da Seguridade Social, o que prejudicará inevitavelmente o financiamento dos serviços de saúde e da assistência social...”[97]

 

 

 

 

4.2.2 A tese de Roque Antonio Carrazza

 

Roque Antonio Carrazza atuou como Procurador da empresa contribuinte, em sede do Recurso Extraordinário 240.785-MG. Naquela instância, sustentou perante a Egrégia Corte a tese que aqui se pretende sintetizar.

O renomado jurista assim enuncia a síntese de seu pensamento: “O punctum saliens é que a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS leva ao inaceitável entendimento de que os sujeitos passivos destes tributos ´faturam ICMS´. A toda evidência, eles não fazem isto...”.[98]

São oportunas as palavras introdutórias da discussão:

“...procuraremos demonstrar que, nos termos da Constituição e, independentemente de qualquer lei ou entendimento fazendário, o ICMS não integra – e nem pode integrar – a base de cálculo de nenhum destes dois tributos (PIS e COFINS), que é a mesma: o faturamento da empresa.

Como se sabe, a Constituição Federal não criou nenhum tributo, mas deu competências para que as pessoas políticas, querendo, venham a fazê-lo... traçou a regra-matriz (a norma-padrão de incidência, o arquétipo genérico) de todas as exações, apontando-lhes, direta ou indiretamente, a hipótese de incidência possível, o sujeito ativo possível e a alíquota possível.

(...) podemos dizer que os contribuintes têm o direito constitucional subjetivo de só serem tributados de acordo com estas regras-matrizes.

A assertiva aplica-se, evidentemente, também às contribuições sociais para a seguridade social patronais, tributos previstos e estruturados no art. 195, I, da CF, que lhes aponta, inclusive, as bases de cálculo possíveis. Uma delas é o faturamento da pessoa jurídica, justamente a base de cálculo escolhida pelo legislador ao criar seja a contribuição para o PIS, seja a COFINS.”[99]

 

Dado o prefácio da temática, visto que a COFINS tem por base de cálculo o faturamento da empresa, o autor passa a exprimir o seu raciocínio:

 

Faturamento não é um simples ´rótulo´. Tampouco, venia concessa, é uma ´caixa vazia´, dentro da qual o legislador, o intérprete ou o aplicador podem colocar o que bem lhes aprouver (...) De fato, desde as clássicas lições de Gian Antonio Micheli[100] (ex-Catedrático da Universidade de Roma), aceita-se que o direito tributário é um ´direito de superposição´, na medida em que encampa conceitos que lhes são fornecidos pelo direito privado (direito civil, comercial, do trabalho etc.) (...) quando a Constituição, em matéria de contribuições sociais para a seguridade social, alude a faturamento, é preciso buscar no direito comercial (art. 187, I, da Lei 6.404/1976, que se encontrava em vigor quando da promulgação da Constituição Federal) este conceito. Depois, é certo que quando o texto constitucional alude, sem reservas ou restrições, a um instituto ou a um vocábulo jurídico, endossa o sentido próprio que possuem, na doutrina e na jurisprudência.[101]

 

Dito que o direito tributário é um ´direito de superposição´, em sintonia com o artigo 110, do Código Tributário Nacional (A lei tributária não pode alterar a definição, o conceito e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal...), passa a discorrer sobre o conceito de faturamento, assim entendido na doutrina e na jurisprudência, como sendo a base de cálculo possível, no contexto da norma-padrão traçada na Carta Magna:

 

“Ora, faturamento, para o direito comercial, para a doutrina e para a jurisprudência, nada mais é que a expressão econômica de operações mercantis ou similares, realizadas, no caso em estudo, por empresas que, por imposição legal, sujeitam-se ao recolhimento do PIS e da COFINS (...). Conquanto nesta contrapartida possa existir um componente que corresponde ao ICMS devido, ele não integra nem adere ao conceito de que ora estamos cuidando.

Indo ao encontro desta linha de raciocínio, a Suprema Corte pacificou e reafirmou, no julgamento dos RE 346.084, 358.273, 357.950 e 390.840, em sessão do dia 9.11.2005, a distinção entre faturamento e receita. Mais: deixou claro que faturamento é espécie de receita, podendo ser conceituado como o produto da venda de mercadorias e/ou da prestação de serviços – idéia que se ajusta, à perfeição, ao disposto no precitado art. 187, I, da Lei 6.404/1976 (Lei das S/A)”[102]  

 

Na esteira do citado entendimento doutrinário e jurisprudencial, passa o jurista a demonstrar a impossibilidade jurídica de o valor do ICMS figurar na base de cálculo da COFINS. Nesta seara, enuncia que já na década de 80 do século passado Geraldo Ataliba e Cléber Giardino deixaram consignado que a inclusão do próprio valor do ICM/ICMS, por imposição legal, na sua base, introduz-se mecânica especial que só pode produzir eficácia no plano específico e restrito da base de cálculo do imposto estadual. Por isso, realça o autor: 

 

“...Desdobrar ilações a partir desta disposição, projetando-se para outros campos, portanto, implicará alargamento do regime nitidamente excepcional, facultando a irradiação dos efeitos deste `anormal´ comando em esferas não visadas pelo seu sentido específico (...) Em consequência, o ICM não integra o valor da operação, a não ser para os específicos efeitos de cálculo dele próprio (...) Isto tudo conduz a conclusão que parece inexorável: o nível do `faturamento das empresas´ não pode ser afetado – isto é, reconhecer-se manipulado, subvertido – por efeito desta mecânica ‘exclusivamente fiscal’, cujos conteúdo e finalidades se esgotam só na distensão, até mesmo inconstitucional, da base de cálculo do ICM e do IPI.”[103]

 

Reforçando a ideia, em paralelo com a lição de Aliomar Baleeiro acerca das ‘finanças públicas’, assevera o Professor Carrazza que os clássicos ensinamentos de Baleeiro, com as devidas adaptações, são perfeitamente aplicáveis ao assunto em análise. No âmbito das empresas privadas, os valores monetários que transitam em seus patrimônios, sem a eles se incorporarem, por terem destinação predeterminada, não podem ser considerados ‘faturamento’ ou ‘receita’, mas simples ‘ingresso’ de caixa. Tal é o caso dos valores correspondentes ao ICMS, que, por injunção constitucional, as empresas devem encaminhar aos cofres públicos. Diz o autor:

 

“...a integração do valor do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS traz como inaceitável consequência que contribuintes passem a calcular as exações sobre receitas que não lhes pertencem, mas ao Estado-membro (ou ao Distrito Federal) onde se deu a operação mercantil e que tem competência para instituí-lo (cf. art. 155, II, da CF). A parcela correspondente ao ICMS pago não tem, pois, natureza de faturamento, (e nem mesmo de receita), mas de simples ingresso de caixa (na acepção supra)...”[104]

 

Rechaçando, pois, a interpretação sugerida pela Fazenda Nacional, acerca do tratamento dispensado na Lei Complementar 70/1991 (art. 2º, parágrafo único, “a”), que determinou a exclusão do IPI da base de cálculo da COFINS, não contemplando a exclusão do ICMS, embora se tratem de impostos de estrutura semelhante (‘impostos indiretos’), adverte o eminente doutrinador:  

 

“A nosso ver, a única interpretação, para este parágrafo único, que se coaduna com o caput do art. 2º da Lei Complementar 70/1991 – e com o próprio conceito constitucional de faturamento – é a que leva a admitir que tal relação é exemplificativa, e não taxativa, de modo que a ausência de previsão específica no tocante à exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS não pode ser havida como a admissão, a contrario sensu, de que o ICMS se inclui na referida base de cálculo.

Do contrário todos e quaisquer elementos que não aqueles expressamente excluídos pela lei poderiam compor a base de cálculo da contribuição em tela (...). Depois – como vimos e revimos ao longo deste livro -, a base de cálculo de todo e qualquer tributo deve confirmar sua hipótese de incidência... Irrelevante, portanto, que o parágrafo único do art. 2º da Lei Complementar 70/1991 não tenha se referido expressamente ao ICMS como passível de exclusão da base de cálculo da COFINS, já que tal exclusão é consequência inexorável da definição da base de cálculo contida no caput, além de consagrada pelo art. 195, I, da CF”.[105]

 

E, ainda, rebatendo a interpretação da União, no tocante aos dispositivos da Lei 9718/1998, visto que o artigo 3º, §2º, I, da lei manda excluir da base de cálculo da contribuição social o ICMS, apenas quando cobrado na condição de substituto tributário, observa o autor:

 

“Antes de mais nada, observamos que a legislação começa a caminhar no sentido que reputamos o mais correto e adequado... Menos mal. Sinal de que os postulados constitucionais começam a ser levados em conta. Todavia, absolutamente não podemos inferir que, tirante esta restrita hipótese, o ICMS não pode ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS.

É que o art. 3º, §2º, I, in fine, da Lei 9718/1998 tem caráter meramente declaratório, isto é, explicitou o que estava implícito em nosso sistema constitucional (...) É que as situações de não incidência de qualquer tributo – aí incluídos o PIS e a COFINS – independem de lei para serem reconhecidas. Decorrem da própria natureza das coisas, podendo – e devendo – ser deduzidas pelo labor exegético...”.[106]

 

Além disso, contrapondo os mais recentes argumentos invocados pela Fazenda Nacional, no sentido de que, a predominar a tese já sufragada pela maioria da Corte Suprema, o Erário teria que suportar um “rombo” de 20 bilhões de Reais por ano, isso sem falar nas repetições e compensações, que, somadas, causariam um impacto prejudicial bilionário nas contas públicas federais, observa o autor que a pretensa perda de arrecadação representaria parcela ínfima (menos de 1%) da receita líquida anual da União. No mais, a devolução dos indébitos tributários e as compensações tributárias dependeriam, respectivamente, da ordem cronológica de apresentação dos precatórios e do trânsito em julgado dos processos, sem contar os contribuintes que ainda não bateram às portas do Poder Judiciário, sinalizando demora, idônea a reduzir o temido ‘impacto’ nas contas públicas.[107]  

 

Com isso, adverte o autor:

 

“... com ser catastrofista, é errôneo o entendimento no sentido de que a Fazenda Nacional sofrerá assinalados prejuízos financeiros caso a decisão da Corte Constitucional lhe vier a ser desfavorável. Mas, deixando de lado os números cabalísticos – sempre invocados quando o Poder Judiciário está para corrigir inconstitucionalidades tributárias perpetradas pela União -, o fato é que o argumento, ainda que verdadeiro fosse (o que só admitimos ad argumentandum tantum), absolutamente não pode prevalecer quando está em jogo, como no caso em tela, a supremacia da Constituição Federal.”[108]

 

Aduzindo ser também falacioso o argumento de que o ICMS não deve ser excluído da base de cálculo da COFINS, porque nela se integram os demais ‘custos’ da empresa (salários de empregados, FGTS, tarifa de luz, água etc.), sem que isto provoque qualquer inconformismo por parte dos contribuintes, registra que:

 

“...os demais custos suportados pela empresa deveriam ser excluídos da base de cálculo da COFINS caso o regime jurídico-constitucional a eles aplicável fosse idêntico ao do ICMS. A inexistência de tal identidade é a singela razão pela qual os contribuintes questionam a inclusão, na base de cálculo da COFINS, do valor do ICMS, e não dos demais custos da empresa (...) A CF, em seu art. 155, § 2º, I, submete o ICMS ao princípio da não cumulatividade, que se operacionaliza por meio do instituto da compensação... este regime jurídico faz do contribuinte de ICMS (tributo indireto) mero agente arrecadador.”[109] 

 

Ressalta, ainda, que a preponderar a tese contrária, restaria ferido o princípio da não confiscatoriedade, consagrado no artigo 150, IV, da Constituição Federal, uma vez que  a inclusão de ônus fiscal atinente ao ICMS, na base de cálculo da COFINS, distorce a efetiva aptidão para contribuir, e implica a tributação de um ônus fiscal do sujeito passivo, acarretando aumento indevido e inconstitucional da carga tributária.

Finalmente, alega ser improcede a recentíssima tese fazendária no que sendo ‘imposto indireto’, o montante do ICMS é ‘recuperado’ pela empresa, que o repassa ao preço final da mercadoria. Diz que:

“...também a carga econômica dos tributos diretos que as empresas recolhem é suportada pelos consumidores finais das mercadorias. E nem por isso algum doutrinador até hoje sustentou que, mesmo quando indevidos, os tributos diretos devem ser suportados pelas pessoas jurídicas, já que os valores que eles envolvem acabam ‘acrescidos’ aos preços finais das mercadorias... é de todo em todo irrazoável pretender que o Pretório Excelso, guardião supremo da constitucionalidade dos atos normativos, passe ao largo do Direito, para intentar-se em searas puramente econômicas. Além de tudo, o novel argumento da Fazenda Nacional navega ao sabor da álea... amiúde acontece de o comerciante – seja para fazer frente à concorrência, seja para alavancar seus negócios, seja, ainda, para aumentar o capital de giro da empresa – vender a mercadoria com lucro incipiente, pelo preço de custo ou, até, com prejuízo, hipóteses em que, por óbvio, inexistirá a ‘recuperação’ candidamente acenada pelo Fisco.”[110]

Logo, completa o autor, “...a eventual circunstância de o ICMS ser ‘recuperado’ pela empresa no momento da venda mercantil absolutamente não ilide a inconstitucionalidade da inclusão de seu montante na base de cálculo da COFINS.”[111] 

 

4.2.3 O entendimento que exsurge do Recurso Extraordinário 240.785-2/MG

 

De acordo com o relatado nos capítulos precedentes, embora a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tivesse consolidando o entendimento formalizado nas citadas súmulas 68 e 94, segundo o qual as parcelas relativas ao ICM/ICMS incluir-se-iam nas bases de cálculo do PIS e do FINSOCIAL (COFINS), quando do julgamento do ora pendente Recurso Extraordinário 240.785-2/MG pela Suprema Corte Federal, a matéria encontrou guarida na tese favorável aos contribuintes.

A nova interpretação inaugurou relevante controvérsia judicial no âmbito dos Tribunais Regionais Federais. Desse modo, considerando a insegurança jurídica que poderia advir das decisões conflitantes, e sem perder de vista o interesse arrecadatório envolvido na discussão, em jogada tática, o Presidente da República propôs Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC18), com pedido de Medida Cautelar para o fim de suspender todos os julgamentos semelhantes, em andamento no País. À vista disso, em 14 de maio de 2008, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, determinou a tramitação da ação constitucional, em detrimento do recurso processual difuso.

É de se ressaltar, porém, que o Recurso Extraordinário 240.785-2/MG, de Relatoria do Eminente Ministro Marco Aurélio, expressou a maioria da Egrégia Corte Constitucional. Na retomada do apontado julgamento, o Ministro Relator deu provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelos Ministros Ricardo Lewandowski, Carlos Britto, Cezar Peluso, Cármen Lúcia e Sepúlveda Pertence.

Em síntese, eis o posicionamento do Ilustre Ministro Marco Aurélio:

“... A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida como operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de que procede à venda de mercadorias ou à prestação de serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem competência para cobrá-lo. A conclusão a que chegou a Corte de origem, a partir de premissa errônea, importa na incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade da Federação. No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI. Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem natureza de faturamento. Não pode então, servir à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ´b´ do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal...”.

A par disso, é bem verdade que a nova perspectiva interpretativa que despontou do voto do Ministro Relator traduz concreta expectativa de que será adotado o entendimento mais consentâneo à tese dos contribuintes. Nesse sentido, representativa a decisão proferida nos autos dos Embargos de Declaração em Apelação Cível 0022437-05.2007.403.6100/SP, pelo Desembargador Márcio Moraes, do E. Tribunal Regional Federal da Terceira Região:

”Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que, em mandado de segurança no qual a impetrante pleiteia a exclusão do ICMS da base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS, indeferiu a medida liminar.

Em síntese, sustenta a parte agravante seu pedido nas manifestações de votos de Ministros do Supremo Tribunal Federal, exarados nos autos do Recurso Extraordinário 240.785-2, expressando maioria daquela Excelsa Corte no sentido da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS (...) Verifico a presença de relevância na fundamentação do direito invocado em favor da parte agravante... Isso porque, na retomada do apontado julgamento (RE 240.785-2), o Ministro Marco Aurélio, Relator, deu provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelos Ministros Ricardo Lewandowski, Carlos Britto, Cezar Peluso, Cármen Lúcia e Sepúlveda Pertence.

Entendeu o Ministro Relator estar configurada a violação ao art. 195, I, da CF, ao fundamento de que a base de cálculo da COFINS somente pode incidir sobre a soma dos valores obtidos nas operações de venda ou de prestação de serviços, ou seja, sobre a riqueza obtida com a realização da operação, e não sobre o ICMS, que constitui ônus fiscal e não faturamento. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Ministro Gilmar Mendes (Informativo do STF n. 437, de 24/8/2006). g.n.

Embora o referido julgamento ainda não tenha se encerrado, não há como negar que traduz concreta expectativa de que será adotado o entendimento de que o ICMS deve ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS, o que aponta o caminho para evitar que o contribuinte se sujeite ao ônus decorrente do inadimplemento ou à árdua via do solve et repete, que representa, também, o perigo de dano de difícil reparação... (São Paulo, 10 de outubro de 2007. MÁRCIO MORAES Desembargador Federal Relator)”. g.n.

                   Na mesma vereda, elenca-se a decisão unânime, proferida em 14 de agosto de 2007 pela Colenda Oitava Turma do E. Tribunal Regional Federal da Primeira Região, nos autos da Apelação em Mandado de Segurança 2007.38.03.002873-3/MG, em que foi relator o Juiz Federal Convocado, Dr. Osmane Antonio dos Santos:

“...a presente discussão cinge-se à legalidade da inclusão dos valores arrecadados a título de ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, conforme entendimento outrora pacificado nos enunciados de súmulas nº 68 e 94, editados pelo STJ (...) Decidindo a mesma questão ora posta em debate, enfatizou o eminente Ministro Marco Aurélio, nos autos do RE 240.785/MG que faturamento ‘... decorre, em si, de um negócio jurídico, de uma operação, importando, por algum motivo, o que perc

ebido por aquele que a realiza, considerada a venda de mercadorias ou mesmo a prestação de serviços. A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela recebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou a prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso à entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo...’ Assim, se o ICMS é despesa do sujeito passivo da COFINS e receita do Erário Estadual, é injurídico tentar englobá-lo na hipótese de incidência desta exação. A inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS e do PIS resulta em tributação de riqueza que não pertence ao contribuinte. Este, ao arcar com obrigação de tal ordem, suporta carga tributária além do que legalmente definido para o regular exercício da sua atividade econômica e além do que permite a Constituição Federal.  (g.n.)

Sobre a matéria, segundo acima já ressaltado, continua o Ministro Marco Aurélio, em voto até o momento acompanhado por 6 dos 11 Ministros que compõem a Suprema Corte, sustentando que, entender de forma contrária, seria admitir ‘... a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI’. Ressalta, também, o eminente Ministro, cujo voto, nesse particular, também adoto como razões de decidir, ‘... difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Cofins, pois não revela a medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea “b” do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal. Cumpre ter presente a advertência do Ministro Luiz Gallotti, em voto proferido o Recurso Extraordinário n. 71.758: ‘se a lei pudesse chamar de compra e venda ou que não é compra, de exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema tributário inscrito na Constituição - RTJ 66/165. Conforme salientado pela melhor doutrina, ‘a Cofins só pode incidir sobre o faturamento que, conforme visto, é o somatório dos valores das operações negociais realizadas’. A ‘contrário sensu’, qualquer valor diverso deste não pode ser inserido na base de cálculo da Cofins. Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto constitucional mostra-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado pela doutrina e pela jurisprudência. (...) Com essas considerações, data venia dos entendimentos manifestados nos enunciados ns. 68 e 94 das súmulas do STJ, se os contribuintes do PIS e da COFINS não faturam o ICMS, que se constitui num ônus fiscal cujo beneficiário é a entidade de direito público a quem compete cobrá-lo, os valores que ingressam nos cofres das autoras ‘... não revelam medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea “b” do inciso I do art. 195 da Constituição federal.’ Definida, assim, a exclusão do ICMS da base de calculo do PIS e da COFINS, cabe analisar os limites temporais desse direito, nos termos do pedido... (APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2007.38.03.002873-3/MG, Juiz Federal Osmane Antonio dos Santos. Relator Convocado. Decisão de 14.8.2007)”. g.n.

 

Em suma, nos termos das representativas decisões elencadas, observa-se que a maioria então alcançada no julgamento do Recurso Extraordinário 240.785-2MG traduz concreta expectativa de que a Suprema Corte Constitucional decidirá pela exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS.

 

 

 

 

5. Conclusão

 

Discorremos nas páginas anteriores sobre os aspectos elementares do ICMS, com destaque para a sua regra-matriz de incidência, e o peculiar regime jurídico da não-cumulatividade a que está sujeito, mediante o qual a Constituição de 1988 (art. 155, §2, I) determina a ‘compensação’ do que for devido em cada operação, relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. 

Ato contínuo, abordamos os principais traços da COFINS, notadamente a sua incidência sobre o faturamento das pessoas jurídicas (art. 195, I, “b” da CF; art. 2º da LC 70/1991 e art. 3º da Lei 9718/1998), visto ainda o conceito deste instituto de direito comercial à luz do artigo 187, I, da Lei 6404/1976, em vigor quando da promulgação da Constituição – a receita bruta das vendas e serviços.

Em seguida, confrontamos as principais teses a respeito da (in)constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da COFINS, e tecidos breves comentários sobre o julgamento do não encerrado Recurso Extraordinário 240.785-2-MG, ressaltando-se, ainda, a concreta expectativa que exsurge do entendimento expresso naquela ocasião pela maioria da Suprema Corte Federal.

Assim, na presente oportunidade, sem qualquer pretensão de esgotarmos a verdade sobre tão controvertida matéria, que constitui o objeto central deste Trabalho de Curso, manifestamos nossa conclusão em torno do tema:

A nosso ver, a tese defendida pela Advocacia Geral da União, manifestamente, invoca os (pretensos) mais elevados interesses metajurídicos da questão. Evidentemente, a correção de inconstitucionalidades na interpretação de leis ou atos normativos tributários, a rigor vem acompanhada de momentâneos prejuízos arrecadatórios para o Estado. No entanto, é inaceitável, sob a ótica do Direito, que inconstitucionalidades sejam ignoradas tão somente em prol das conveniências político-financeiras daí advindas. Em uma República Constitucional, na qual o Sistema Tributário Nacional e os limites do poder tributante estão bem definidos na Carta Fundamental, permitir a continuidade de uma sistemática de tributação inconstitucional, significaria desprezar a Constituição e a supremacia das suas determinações.

Nesse sentido, revela-se mais condizente com os ditames da Constituição da República, a declaração da inconstitucionalidade da tributação do ICMS na base de cálculo da COFINS, conforme pretenderemos analisar.

O artigo 150 da Constituição Federal, ao estabelecer limitações ao poder de tributar, orienta o exercício da competência tributária pelo legislador ordinário de todas as esferas de Governo, relativamente à sua função de instituir os tributos previstos nos seus artigos 145, 148 e 149. Trata-se de limites que devem ser observados e respeitados incondicionalmente, porquanto erigidos à categoria de princípios constitucionais tributários, que salvaguardam os contribuintes contra exações espúrias. O objetivo desses princípios fundamentais, consoante o artigo 146, III, “a”, da Carta Fundamental, é viabilizar a exata instituição dos tributos, mediante a definição precisa dos seus fatos geradores e de suas respectivas bases de cálculo. 

O fato gerador do tributo, entendido como hipótese normativa, tal e qual o tipo penal, de acordo com a sempre presente lição de Paulo de Barros Carvalho, deve conter a descrição de uma situação de incidência tributária perfeitamente definida em lei, sem possibilidade de dúvida quanto ao seu preciso sentido, alcance e conteúdo.[112]

A base de cálculo, por sua vez, segundo o ensino de Luciano Amaro, deve representar a medida do fato gerador. Em outros dizeres, a base de cálculo deve revelar a expressão monetária da hipótese de incidência tributária, ou seja, exprimir a riqueza sujeita a tributação.[113]

Dito isto, como estabelece o artigo 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal, a realização de faturamento constitui fato gerador da COFINS, sendo o seu montante a base de cálculo das respectivas contribuições.

O conceito de faturamento remonta ao Código Comercial, editado em 1850. Trata-se de concepção arraigada no ordenamento jurídico pátrio, que tanto a doutrina quanto a jurisprudência já cuidaram de sedimentar.  

O Vocabulário Jurídico De Plácido e Silva, assim define o mencionado instituto de Direito Comercial:

“FATURAR. Derivado da fatura, quer significar o ato de se proceder à extração ou formação da fatura, a que se diz propriamente faturamento... Na técnica jurídico-comercial, é especialmente empregado para indicar a relação de mercadorias ou artigos vendidos, com os respectivos preços de venda, quantidade, e demonstrações acerca de sua qualidade e espécie, extraída pelo vendedor e remetida por ele ao comprador.”[114]

Corroborando o mesmo entendimento, o Ministro José Delgado, Relator do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 746.135/SP, julgado em 14/06/2006 pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, manifestou-se sobre o conceito de faturamento, nos seguintes termos: “...As jurisprudências desta Corte Superior e do colendo STF caminham no sentido de que faturamento equivale à receita bruta, resultado da venda de bens e serviços pela empresa.” (g.n.)

Este também o conceito expresso no artigo 187, I, da Lei 6404/1976, em vigor quando da promulgação da Constituição. Destarte, entende-se por ‘faturamento’ a receita bruta das vendas e serviços pela empresa.

Pois bem, definido o conteúdo da figura jurídica denominada faturamento, impõe-se observar que nenhum outro poderá ser utilizado para caracterizar o fato gerador e a base de cálculo das contribuições destinadas ao custeio da COFINS. Isto porque, como é cediço, “A lei não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal...” a teor do que dispõe o artigo 110 do Código Tributário Nacional.

Segundo o ensino do Professor Luciano Amaro, embora o comando em destaque esteja inserto em capítulo destinado à interpretação e integração da legislação tributária, trata-se não de regra de interpretação ou integração da legislação tributária, mas de preceito que sublinha as fronteiras da competência tributária. É, pois, dispositivo dirigido ao legislador, e não preceito de intepretação.[115]

A lição de Paulo de Barros Carvalho a respeito do tema, não deixa margem para dúvida:

“Pondere-se, todavia, que na própria idealização das conse­quências tributárias o legislador muitas vezes lança mão de fi­guras de direito privado. Sempre que isso acontecer, não ha­vendo tratamento jurídico-tributário explicitamente previsto, é evidente que prevalecerão os institutos, categorias e formas do direito privado (...) O imperativo não vem, diretamente, do preceito exarado no art. 110. É uma imposição lógica da hierarquia de nosso sistema jurídico. O empenho do constituinte cairia em solo estéril se a lei infra-constitucional pudesse ampliar, modificar ou restringir os conceitos utilizados naqueles diplomas para desenhar as faixas de competências oferecidas às pessoas políticas. A rígida discri­minação de campos materiais para o exercício da atividade legislativa dos entes tributantes, tendo estatura constitucional, por si só já determina essa inalterabilidade. Em todo caso, não deixa de ser oportuna a lembrança que o art. 110 aviva.”[116] g.n.

 

Em consequência, nos exatos contornos do disposto no artigo 146, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, tem-se que o fato gerador da COFINS, invariavelmente, há de ser a composição das vendas de mercadorias e produtos ou a prestação de serviços (faturamento). O valor do faturamento, por sua vez, constitui a base de cálculo das contribuições sociais.

Como bem se esclareceu acima, no conceito de faturamento deve ser incluído exclusivamente o montante representativo das vendas de mercadorias ou das prestações de serviços. Nesta medida, afigura-se inimaginável a possibilidade de manutenção do ICMS, que vai incluído no preço das mercadorias e produtos vendidos, e tem como prévia destinação os cofres dos Estados-membros ou Distrito Federal, competentes para sua instituição. Tratando-se, pois, de receita tributária, o montante correspondente ao ICMS não constitui faturamento.

Nas palavras de Roque Carraza “...não é possível inserir na base de cálculo do PIS e da COFINS algo que ‘faturamento’ não é. Fazê-lo enseja a cobrança de novo tributo, que refoge à competência tributária federal.”[117]

Além disso, sobre violar o artigo 146, inciso III, da Constituição Federal e o artigo 110 do Código Tributário Nacional, a manutenção do ICMS na base cálculo da COFINS afronta o princípio constitucional que veda a utilização de tributos com efeito de confisco, insculpido no artigo 150, inciso IV, da Carta Fundamental.

É dizer, o tributo instituído ou majorado deve ater-se à sua finalidade fiscal. A tributação não pode constituir um perecimento arbitrário e injustificado do patrimônio do contribuinte.

Repisando, mais uma vez, o erudito voto do Ministro Marco Aurélio:

“... A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida como operação mercantil ou similar (...) Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS.  O valor correspondente a este último não tem natureza de faturamento. Não pode então, servir à incidência da Cofins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ´b´ do inciso I do artigo 195 da Constituição Federal. ...” (trecho do voto do Ministro Relator no RE 240.785-2/MG). g.n.

 

Ora, se o montante correspondente ao imposto estadual não revela medida de riqueza, muito ao contrário, se trata de um ônus fiscal a ser repassado aos cofres públicos estaduais ou distritais, não tem e não pode ter natureza de faturamento. Logo, a manutenção da incidência tem nítido efeito confiscatório.

Em síntese, os tributos, especialmente os impostos e as contribuições, devem ser instituídos para incidir sobre hipóteses sugestivas de riqueza. Isto porque, a capacidade contributiva (artigo 145, § 1º, da Constituição Federal), intimamente vinculada à riqueza do contribuinte, é que determina a aptidão deste para arcar com o ônus tributário. O desrespeito a essa regra de ouro do Direito Constitucional Tributário, torna o tributo instrumento de confisco pelo Estado.

Nesta medida, reiterando-se tudo quanto se disse nos itens precedentes, resta inquestionável que, também por força do artigo 150, inciso IV, da Constituição Federal, o ICMS não pode ser mantido na base de cálculo da COFINS

Por fim, a par da relevante expectativa de que será adotado o entendimento mais consentâneo aos contribuintes, perspectiva esta que desponta do julgamento (não encerrado) do Recurso Extraordinário 240.785-2/MG, mais recentemente o Plenário da E. Suprema Corte Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário 559.937, afastou, por unanimidade, a possibilidade de incidência de ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS em operações de importação.

Veja-se, nesses termos, o informativo do dia 20 de março de 2013, extraído da página virtual do Supremo Tribunal Federal:

“...A decisão ocorreu no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 559937, que foi retomado hoje com o voto-vista do ministro Dias Toffoli. Tanto ele quanto os demais integrantes da Corte acompanharam o voto da relatora, ministra Ellen Gracie (aposentada) e, dessa forma, a decisão se deu por unanimidade (...) Na sessão de hoje, o ministro Dias Toffoli acompanhou integralmente o voto da relatora. Segundo ele, as bases tributárias mencionadas no artigo 149 da Constituição Federal, não podem ser tomadas como pontos de partida, pois ao outorgar as competências tributárias, o legislador delineou seus limites. ‘A simples leitura das normas contidas no art. 7º da Lei nº 10.865/04 já permite constatar que a base de cálculo das contribuições sociais sobre a importação de bens e serviços extrapolou o aspecto quantitativo da incidência delimitado na Constituição Federal, ao acrescer ao valor aduaneiro o valor dos tributos incidentes, inclusive o das próprias contribuições’, ressaltou. Em seguida, o ministro Teori Zavascki votou no mesmo sentido da relatora... Também acompanharam a relatora os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e o presidente da Corte, Joaquim Barbosa.”[118]

 

Para melhor explicitar o mais novo precedente inaugurado na Suprema Corte Federal a respeito do tema aqui em estudo, traga-se à colação excertos do voto-vista do Exmo. Ministro Dias Toffoli, proferido em sede do citado Recurso Extraordinário 559.937:

 

“...No tocante à questão trazida ao crivo desta Corte, observo que essa diz respeito, exclusivamente, à constitucionalidade ou não do art. 7º, inciso I, da Lei nº 10.865/04, que dispõe integrar a base de cálculo das contribuições PIS/PASEP-Importação e COFINS-Importação o valor aduaneiro acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre a Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições (...) Ao analisar o comando constitucional, não vejo como interpretar as bases econômicas ali mencionadas como meros pontos de partida para a tributação, porquanto a Constituição, ao outorgar competências tributárias, o faz delineando os seus limites. Ao dispor que as contribuições sociais e interventivas poderão ter alíquotas ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o ‘valor aduaneiro’, o art. 149, § 2º, III, “a”, CF utilizou termos técnicos inequívocos, circunscrevendo a tais bases a respectiva competência tributária.

Portanto, a meu ver, não se sustenta o argumento de que tal dispositivo estaria estabelecendo o valor aduaneiro tão somente como uma base mínima para a tributação. Na verdade, essa norma delimita, por inteiro, a base de cálculo das contribuições sociais a ser adotada nos casos de importação. Trata-se, assim, de comando dirigido ao legislador ordinário que revela a grandeza econômica que pode ser onerada – o valor aduaneiro - quando se verifica o fato jurídico realizar operações de importação de bens... o referido conceito já estava definido no art. 2º do Decreto-Lei nº 37/66, que dispõe sobre a base de cálculo do imposto de importação e remete, nos casos de alíquota ad valorem (inciso II), ao conceito de ‘valor aduaneiro’ apurado segundo as normas do art. 7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT (...) Tal norma vem igualmente prevista no art. 75, inciso I do Decreto nº 6.759, de 5/2/09 que atualmente regulamenta a administração das atividades aduaneiras e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior, que igualmente dispõe que a base de cálculo do imposto quando a alíquota for ad valorem, o valor aduaneiro apurado segundo as normas do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994. Portanto, na ausência de estipulação expressa do conteúdo semântico da expressão ‘valor aduaneiro’ pela EC nº 42/03, há de se concluir que o sentido pressuposto, e incorporado pela Constituição Federal, quando da utilização do termo para conferir competência legislativa tributária à União, remete àquele já praticado no discurso jurídico-positivo preexistente à sua edição.

Nessa linha, a simples leitura das normas contidas no art. 7º da Lei nº 10.865/04, objeto de questionamento, já permite constatar que a base de cálculo das contribuições sociais sobre a importação de bens e serviços extrapolou o aspecto quantitativo da incidência delimitado na Constituição Federal, ao acrescer ao valor aduaneiro o valor dos tributos incidentes, inclusive o das próprias contribuições (...) A postura deste Supremo Tribunal Federal, em que pesem as reiteradas tentativas no sentido de expandir, via lei ordinária, o conteúdo e o alcance de conceitos utilizados pela Constituição Federal para atribuir competências legislativas, é a de que se deve preservar o sentido empregado no sistema de Direito positivo ao tempo da outorga constitucional. Vários são os exemplos nesse sentido, valendo citar o RE nº 166.722/RS, em que se declarou a inconstitucionalidade do art. 3º, I, da Lei nº 7.787/89, que, a pretexto de atribuir competência para instituir contribuições sociais incidentes sobre a “folha de salários” (art. 195, I, “a”, CF), incluiu no âmbito de incidência os valores pagos a autônomos e administradores (...) Ante o exposto, reconhecendo a inconstitucionalidade da parte do art. 7º, inciso I, da Lei nº 10.865/04 que acresce à base de cálculo da denominada PIS/COFINS-Importação o valor do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e o das próprias contribuições, acompanho a Ilustre Relatora, negando provimento ao recurso extraordinário.” (voto do Ministro Revisor, no RE 559.937, Decisão de 20.3.2013). g.n.

Na mesma esteira do não encerrado Recurso Extraordinário 240.785-2/MG, no qual oficiou como Relator o Exmo. Ministro Marco Aurélio, o entendimento consagrado, por unanimidade, no julgamento do Recurso Extraordinário 559.937, justifica com maior razão a crença de que o C. Supremo Tribunal Federal decidirá pela exclusão do ICMS do cômputo material da COFINS.

É bem verdade que a questão decidida no Recurso Extraordinário 559.937, com especial atenção para o voto-vista do Ministro Revisor, tem peculiaridades distintas da matéria objeto deste trabalho, tendo em vista que a exclusão do ICMS do valor aduaneiro no qual incide a COFINS-Importação atende a mesma diretriz da político-econômica do Governo Federal de desoneração das operações de importação.

No entanto, nos dizeres de Roque Carrazza “...é de todo irrazoável pretender que o Pretório Excelso, guardião supremo da constitucionalidade dos atos normativos, passe ao largo do Direito, para internar-se em searas puramente econômicas” e sem diminuir a importância dos interesses metajurídicos sempre presentes nas discussões tributárias travadas na Corte Constitucional, até mesmo porque as controvérsias submetidas ao crivo do Pretório Excelso têm necessariamente de manifestar relevância do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa, nos termos do preceito do artigo 543-A, §1º, do Código de Processo Civil, não há que se contestar que a lógica jurídica adotada no citado julgamento, repita-se, por unanimidade de votos, é a mesma que desponta do erudito voto do Ministro Marco Aurélio (ref. acima).

Com efeito, as mesmas razões que impedem as leis infraconstitucionais de ampliarem o alcance do instituto jurídico denominado valor aduaneiro - já delimitado pelo ordenamento pátrio, nos termos do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT - para extrapolar o aspecto quantitativo da incidência da COFINS-importação, consoante os fundamentos jurídicos invocados ao longo deste trabalho, também exigem a exclusão do imposto estadual da base de cálculo das contribuições sociais incidentes sobre as operações internas de circulação de mercadorias e prestação de serviços, das quais resulta faturamento.

Destarte, à vista de tudo quanto analisado no presente trabalho, constatamos que a inclusão do ICMS na base de cálculo da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social, além de desvirtuar conceito de instituto de direito privado arraigado na doutrina e na jurisprudência pátrias – faturamento – contraria a hipótese de incidência – fato imponível e base de cálculo possíveis – da COFINS e afronta irremediavelmente o Sistema Tributário Nacional, sobretudo o princípio que veda a tributação com efeito de confisco, insculpido no artigo 150, IV, da Constituição Federal.

 

   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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MELO, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário. 6 ed., São Paulo : Malheiros, 2010.

 

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ONO, Juliana M. O.; OLIVEIRA, Fábio Rodrigues de; OLIVEIRA, Jonathan José F. de. Manual do PIS e da COFINS. 3 ed., São Paulo : FISCOSoft Editora, 2011.

 

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. vol. 1, 25 ed., São Paulo : Saraiva, 2003.

 

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6.1. Páginas consultas na rede mundial de computadores – Internet

 

Página do Supremo Tribunal Federal. Pesquisa de Inteiro Teor de Acódãos – www.stf.jus.br/portal/inteiroTeor/pesquisarInteiroTeor - Informativos/Notícias STF - www.stf.jus/portal/cms/listarNoticiaUltima

 

Página do Tribunal Regional Federal da Primeira Região. Pesquisa de Jurisprudência/Inteiro Teor de Acórdãos – arquivo.trf1.jus.br

 

Página do Tribunal Regional Federal da Terceira Região. Consultas Acórdãos – www.trf3.jus.br

 

 

 

 

 

 



[1] Não desprezamos a divergência existente na doutrina neste ponto.

[2] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[3] Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro – 18. ed. – São Paulo :  Saraiva, 2012, p. 115.

[4] Sabbag, Eduardo. Manual de direito tributário – 3. ed. São Paulo : Saraiva, 2011, p. 381.

[5] Carrazza, Roque Antonio. ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012.

[6] Sabbag, Eduardo. et. al, 2011.

[7] Amaro, Luciano. et. al, 2012.

[8] Carrazza, Roque Antonio. et. al, 2012.

[9] Em regra, admite-se que o titular da competência tributária deixe de exercitá-la ou que a exercite apenas em parte. No entanto, conforme demonstrado por Roque Antonio Carrazza (ICMS. et. al, 2012), a fim de evitar a denominada guerra fiscal, a competência para criar o ICMS é de exercício obrigatório.

  

[10] Regra Matriz do ICM, tese apresentada para a obtenção do Título de Livre-Docente da Faculdade de Direito da PUC/SP, 1981, p. 170 – inédito – apud Melo, José Eduardo Soares de et al., 2012, p. 14.

[11] “ICMS. Incorporação ao Ativo – Empresa que loca, oferece em `Leasing´ seus Produtos – Descabimento do ICMS”, Revista de Direito Tributário vol. 52, p.74 apud Melo, José Eduardo Soares de et al., 2012, p. 14 .

[12] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 40/41.

[13] A Regra Matriz do ICM, pp. 213/214 apud Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, p 32.

[14] Baleeiro, Aliomar, “ICM sobre Importação de Bens de Capital para Uso do Importador”, Revista Forense vol. 250, p. 143 apud Melo, José Eduardo Soares de et al., 2012, p 17.

[15] Tratado de Direito Comercial Brasileiro, vol. V, 3ª ed., Freitas Bastos, Rio de Janeiro, nº 14, parte I, p. 18 apud Melo, José Eduardo Soares de et al., 2012, p. 18.

[16] A Regra Matriz do ICM, pp. 213/214 apud Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, pp. 37/38.

[17] A Regra Matriz do ICM, pp. 206/207 apud Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, pp. 37/38.

[18] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, p. 38.

[19] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012.

[20] ICMS et al., Malheiros, 2012.

[21] ICMS et al., Malheiros, 2012.

[22] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, pp. 134/135.

[23] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012, p. 219.

[24] Melo, José Eduardo Soares de. et. al, Dialética, 2012, p. 136.

[25] Melo, José Eduardo Soares de. et. al, Dialética, 2012, p. 138.

[26] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 142.

[27] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 143.

[28] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012.

[29] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 226/227.

[30] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 227/228.

[31] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012.

[32] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012, p. 236.

[33] ICMS – 16. ed. – São Paulo : Malheiros, 2012.

[34] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, pp. 154/155.

[35] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 155.

[36] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012. P. 164.

[37] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 165.

[38] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012.

[39] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 22.

[40] Curso de Direito Tributário, 24ª ed., São Paulo : Saraiva, 2012, p. 331.

[41] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, pp. 22/23.

[42] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, nota de rodapé 22.

[43] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 53/54.

[44] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, p. 51.

[45] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, p. 52.

[46] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 24.

[47] Curso de Direito Tributário, 24ª ed., São Paulo : Saraiva, 2012, pp. 328/329.

[48] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[49] Curso de Direito Comercial, 1º vol., 25ª ed., São Paulo : Saraiva, 2003, p. 276.

[50] Curso de Direito Comercial, 1º vol., 25ª ed., São Paulo : Saraiva, 2003, p. 276.

[51] Curso de Direito Comercial, 1º vol., 25ª ed., São Paulo : Saraiva, 2003, p. 276.

[52] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[53] Curso de Direito Comercial, 1º vol., 25ª ed., São Paulo : Saraiva, 2003, p. 277.

[54] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[55] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[56] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012.

[57] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 187.

[58] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[59] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 192.

[60] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 192.

[61] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012.

[62] Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, 12. ed. – São Paulo : Dialética, 2012, p. 207.

[63] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012.

[64] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 372.

[65] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 373.

 

[66] Elementos de Direito Administrativo, 1ª ed., RT, São Paulo, 1980, p. 230 - apud Melo, José Eduardo Soares de. ICMS: teoria e prática, et. al.

[67] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[68] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária, et., al.

[69] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 100.

[70] Curso de Direito Tributário, 24ª ed., São Paulo : Saraiva, 2012, p. 410.

[71] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012.

[72] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012.

[73] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 351/360.

[74] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 359/361.

[75] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008.

[76] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária, et., al.

 

[77] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária (ICMS, IPI, ISS, PIS e COFINS), 3. ed. – São Paulo : Dialética, 2008, pp. 114/116.

[78] Melo, José Eduardo Soares de / Lippo, Luiz Francisco, A não cumulatividade tributária, et., al, p. 119.

[79] Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro – 18. ed. – São Paulo :  Saraiva, 2012.

[80] Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro – 18. ed. – São Paulo :  Saraiva, 2012, pp. 80/81.

[81] Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro – 18. ed. – São Paulo :  Saraiva, 2012, pp. 85/87.

[82] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário – 6 ed. – São Paulo :  Malheiros, 2010.

[83] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al., p. 170.

[84] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al.

[85] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al.

[86] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al., pp. 198/200.

[87] Hugo de Brito Machado, COFINS. Ampliação da base de cálculo e compensação do aumento de alíquota, in Contribuições Sociais – problemas Jurídicos, pp. 112-113 apud Melo, José Eduardo Soares de. et. al., p. 200.

[88] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al., p. 201/202.

[89] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al.

[90] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al., p. 191.

[91] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al., p. 192.

[92] Melo, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário et. al., p. 193.

[93] Idem, pp. 195/196.

[94] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 370.

[95] ADC18 – Medida Cautelar – DF, Relatório do EXMO. MINISTRO MENEZES DIREITO, p. 29.

[96] Idem, p. 31.

[97] ADC18 – Medida Cautelar – DF, Relatório do EXMO. MINISTRO MENEZES DIREITO, pp. 33/34.

[98] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 666.

[99] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 662/663.

[100] Corso di Diritto Tributario, 1ª ed., Turim, UTET, 1972, pp. 26 e ss. apud ICMS, et. al., p. 664.

[101] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 664.

[102] Idem, pp. 664/665.

[103] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 665.

[104] Idem, p. 667.

[105] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, pp. 668/669.

[106] Idem, p. 671.

[107] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012.

[108] Idem, p. 675.

[109] Idem, pp. 675/676.

[110] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 677.

[111] Idem, p. 677.

[112] Curso de Direito Tributário, 24ª ed., São Paulo : Saraiva, 2012.

[113] Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro – 18. ed. – São Paulo :  Saraiva, 2012.

[114] Ob. cit., Forense, 1982, p. 277.

[115] Amaro, Luciano. Direito tributário brasileiro – 18. ed. – São Paulo :  Saraiva, 2012.

[116] Curso de Direito Tributário, 24ª ed., São Paulo : Saraiva, 2012, p. 138.

 

[117] ICMS, 16ª ed., São Paulo : Malheiros, 2012, p. 669.

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