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O Nascituro como Sujeito de Direitos


Autoria:

Maicon Ambrosim


Atualmente estou cursando o 9º termo de Direito na Finan (Faculdades Integradas de Nova Andradina-MS, sou estagiário na Procuradoria de Justiça de Nova Andradina - MS.

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Resumo:

O presente trabalho visa abordar o tema relativo a possibilidade ou não de o nascituro ser titular de direitos em nosso sistema jurídico.

Texto enviado ao JurisWay em 12/06/2014.

Última edição/atualização em 13/06/2014.



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O NASCITURO COMO SUJEITO DE DIREITOS

 

AMBROSIM, Maicon Venicio de Souza*[1]

PARRON, Stênio Ferreira**[2]

 

 

 

Resumo: O presente trabalho visa abordar o tema relativo a possibilidade ou não de o nascituro ser titular de direitos em nosso sistema jurídico. A questão envolve inicialmente a definição do que deve ser entendido por nascituro e a definição do momento em que se inicia a vida. As teorias sobre o início da personalidade jurídica revelam-se importantíssimas para a compreensão do tema proposto. Posteriormente será analisado o tratamento jurídico dispensado ao nascituro, tanto no aspecto legal como no aspecto jurisprudencial. A maneira como o sistema jurídico trata o nascituro será determinante para a constatação de que o nascituro ostenta a condição de sujeito de direitos.

  

SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA; 3 CONCEITO; 4 O INÍCIO DA VIDA HUMANA. 5. TEORIAS SOBRE A PERSONALIDADE JURÍDICA DO NASCITURO NO DIREITO BRASILEIRO; 5.1. TEORIA NATALISTA; 5.2. TEORIA DA PERSONALIDADE CONDICIONAL; 5.3. TEORIA CONCEPCIONISTA 6 O TRATAMENTO JURÍDICO DISPENSADO AO NASCITURO 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS; 8 BIBLIOGRAFIA.

  

1 INTRODUÇÃO

 

A evolução dos estudos jurídicos acabou por colocar em destaque o ser humano. Tal constatação pode ser verificada pela importância que vem ganhando o estudo relativo aos direitos da personalidade, em especial, os direitos ligados a vida, a privacidade, a imagem, a honra e, até mesmo, ao direito de morrer.

Tal aspecto evolutivo de nosso direito levou os doutrinadores a repensarem antigos institutos jurídicos, dando contornos novos e sempre tendo como base o princípio da dignidade da pessoa humana.

Assim, dentro desta perspectiva, a situação jurídica do nascituro se releva um tema extremamente atual e relevante, despertando interesse não apenas aos operadores do direito, mas, também, a toda a sociedade. Portanto, será desenvolvido neste artigo a ideia sobre o nascituro como sujeito de direitos.

O tema proposto nesta pesquisa será desenvolvido da seguinte forma: inicialmente, será realizado uma análise histórica sobre o tema, posteriormente serão apontados alguns conceitos e as teorias que fundamentam a situação do nascituro; por fim, será analisado o tratamento jurídico dispensado pelo ordenamento jurídico ao nascituro. Assim, diante de tais elementos buscar-se-á demonstrar que, na atual realidade jurídica, o nascituro é titular de direito desde a sua concepção. 

O presente trabalho, inclusive pelos objetivos acima elencados, não tem a pretensão de esgotar o tema proposto, visto que tal objetivo não seria alcançado por intermédio de um artigo jurídico, mas apenas possibilitar a discussão de tão importante tema jurídico de uma maneira simples e objetiva.

 

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

As questões relativas a condição do nascituro, ou seja, de ser ele considerado ou não um ser humano e, em razão disso, ser titular de direitos, não é nova. É possível verificar que de uma forma ou de outra tal questão sempre ocupou espaço importante nos debates jurídicos.

Neste tópico será realizado um breve histórico dos pensamentos sobre o nascituro ao longo da história, com finalidade de avaliar a maneira como o ordenamento jurídico tem se comportado com o passar do tempo.

É possível encontrar estudos sobre o nascituro no século V a.c.. É que Hipócrates (chamado mais tarde de “pai da medicina”) foi quem realizou os primeiros estudos sobre o embrião humano e se comprometeu a não ministrar substância abortiva nas mulheres. (PUSSI, 2008, p. 52)

Platão, de seu turno, defendia a prática do aborto, fundamentando seu pensamento na preocupação do grande aumento da população. Já Aristóteles revelava a mesma preocupação, porém, considerava que o aborto apenas poderia ocorrer enquanto o feto não tivesse adquirido “alma”, vejamos esse interessante pensamento:

 

A filosofia de Aristóteles influenciou de forma crucial o pensamento filosófico ocidental, bem como o cristianismo, sendo que a distinção que ele fez sobre os fetos com alma e sem alma foi a mais significativa. Ele afirmou que o feto masculino receberia sua alma aos quarenta dias e o feminino aos oitenta. Com base nesse pensamento, concluiu que se um feto sem alma fosse abortado isso não seria considerado um assassinato. (SEMIÃO, 1998, p. 56)

 

Outro aspecto relevante da evolução histórica sobre o nascituro pode ser encontrado em um estudo sobre embriologia atribuída aos Hindus, chamado de Garbha Upanishad, escrito em 1.416 a.C., segundo o qual o embrião adquiriria vida apenas no sétimo mês de gestão:

 

Segundo aqueles escritos, seria da conjugação do sangue com o sêmem que o embrião passaria a existir. Ainda, afirma-se que durante o período favorável à concepção, após o contato sexual, ele torna-se um Kalada (embrião de um dia), porque após sete noites seria uma vesícula e após quinze dias seria uma massa esférica e após um mês já seria uma massa firme.

Ainda, seguindo a evolução natural, passados dois meses, a cabeça já estaria formada, e, no terceiro mês, já apareceriam as regiões dos membros. Entretanto, o ponto mais interessante estaria no fato de que, segundo tais escritos, o nascituro durante o sétimo mês se tornaria dotado de vida. (PUSSI, 2008, p. 55)

 

Como se vê, mesmo dotados de estudos pautados na observação e em experiências sem grande aprofundamento técnico, já era possível perceber que a sociedade daquela época já entendia que, em determinado momento, o feto adquiria vida e deveria ter ela protegida.

No direito romano o nascituro era considerado parte do corpo da mãe, razão pela qual a proteção que lhe era destinada era apenas reflexa, ou seja, protegia-se o corpo da mãe e não o nascituro. (NORBIM, 2006, p. 26)

Muito embora os estudos realizados sobre o Direito Romano revelem alguma contradição[3], a tendência foi no sentido de reconhecer uma paridade entre o nascido e o nascituro.

PUSSI (2008, p. 63) explica:

 

De tudo, o que se deve concluir é que, mesmo no Direito Romano, o nascituro dispunha de direitos que independiam do nascimento com vida e, como exemplo mais evidente a bonorum possessio ventris nomine que objetivava, fundamentalmente, o desenvolvimento intra-uterino e mesmo independentemente do nascimento que, por inúmeras razões, poderia não ocorrer.

 

É possível concluir que o Direito Romano evoluiu de um momento em que o nascituro era simplesmente considerado parte da mulher, razão pela qual poderia ela escolher entre ter ou não a criança, para um momento em que a vida intra-uterina passou a ser tutelada.

Tal avanço, atualmente, é questionado em nossa sociedade. Os estudos e a tecnologia evoluíram de forma assustadora, sendo possível hoje manipular material genético e até mesmo criar um clone.

No entanto, a ideia de ser realizado um abordo ainda desperta discursos inflamados e apaixonados. Neste sentido, fica claro o motivo pelo qual os romanos apresentaram diversos textos e leis contraditórios sobre o nascituro.

Apenas com a finalidade de estabelecer uma conclusão sobre esse tópico, o Estado brasileiro, por meio de seu legislador, estabeleceu que para ser sujeito de direitos e obrigações é necessário o nascimento com vida, muito embora coloque a salvo os direitos do nascituro.[4]

A legislação penal brasileira tutela o nascituro punindo como sendo crime a prática do aborto, sendo certo, porém, que existem exceções legais[5] e jurisprudenciais[6]. No entanto, a regra é a proibição do aborto.

De outro lado, a legislação civil brasileira não considera o nascituro um sujeito de direitos, mas apenas o titular de uma expectativa de direito, ou seja, caso venha a nascer com vida terá acesso aos direitos.

Tal análise sobre o nascituro ser ou não titular é o objeto desse estudo. A ideia central desse trabalho consiste em propor uma releitura da doutrina clássica sob o prisma da dignidade da pessoa humana[7].

 

3 CONCEITO

O vocábulo “nascituro” de forma geral indica exatamente o que está por nascer ou o que há de vir ao mundo já estando concebido (conceptus), mas cujo o nascimento ainda não se consumou, continuando em pars ventris ou nas estranhas maternas.

É importante frisar a diferença de conceitos entre nascituro e prole eventual, ambos protegidos pelo Código Civil/2002. O nascituro é um ente já concebido, mas não é pessoa porque ainda não nasceu com vida. Já prole eventual consiste no(s) ente(s) humano(s) que pode(m) vir a ser (em) concebido(s), ou seja, é a prole futura de determinada(s) pessoa(s). [8]

Pois bem, nascituro, portanto, seria o ser que está concebido e ainda não nasceu.

Contudo, hoje é possível vislumbrar situações extremamente comuns que poderiam criar dúvidas sobre a assertiva acima. Veja, na fertilização in vitro ocorre a junção do óvulo e do espermatozóide fora do útero; neste caso, no exato momento em que surge o zigoto, existiria um nascituro?

A resposta negativa se impõe! O nascituro apenas existirá quando tiver condições de se desenvolver, algo que apenas ocorrerá quando for inserido no útero materno.

Neste ponto, é importante um esclarecimento terminológico. A professora Tereza Helena Barboza, em artigo específico sobre o tema, esclarece:

 

Aponta-se, de início, um problema terminológico, na utilização indiscriminada do vocábulo “embrião”. Esclarece Herman Nys que, antes da implantação, o óvulo fecundado chama-se “zigoto”. O embrião é a entidade em desenvolvimento a partir da implantação no útero, até oito semanas após a fecundação; a partir da nona semana começa a ser denominado feto, tendo essa designação até nascer. (Barboza, 2006, p. 537)

 

Desta forma, considera-se nascituro o óvulo fecundado pelo espermatozóide que se encontra inserido no útero materno. Tal constatação mostra-se importante para a compreensão de que não pode haver confusão entre o tema ora proposto, que cuida do nascituro, com o estudo relativo a óvulos fecundados que se encontram in vitro e/ou congelados[9].

 

4 O INÍCIO DA VIDA HUMANA

Nos últimos anos, a medicina tem evoluído numa velocidade fantástica e vem respondendo uma série de dúvidas acerca do ser humano. Perguntas como: quando inicia-se a vida humana? Como surgimos? - são respondidas através de estudos da embriologia humana.

A embriologia define como marco inicial da vida humana a fecundação, fertilização ou concepção. Ocorre uma fusão entre o óvulo com o núcleo do espermatozoide, formando um zigoto, totalmente individualizado, composto de uma carga genética própria, ou seja, uma nova combinação cromossômica (sendo 46 cromossomos no total, divididos entre 23 cromossomos contidos no gameta masculino e 23 cromossomos contidos no gameta feminino).[10]

Após 72 horas da fecundação, a mórula, que é uma massa celular contendo de 12 a 16 blastômeros[11], penetra na cavidade do útero, ocasião em que certa quantidade de líquido é nela introduzida, formando-se uma cavidade no interior da mórula denominada de blastocisto, do qual surgirá o embrião. [12]

Este período é considerado como o mais importante para o pré-nato, pois trata-se das transformações com o desenvolvimento de suas principais estruturas internas e externas. Como exemplo, ocorre, nesse período, o desenvolvimento do tubo neural, do sistema cardiovascular primitivo e etc.[13]

Com relação à autonomia intrínseca do nascituro, esclarece o professor Diogo Leite de Campos que:

o nascituro não é um protoplasma, um ser humano parcial, mas uma vida humana completa, perfeita, existente, possuindo um genótipo DNA que determina o desenvolvimento físico e psíquico do ser daí por diante. O embrião já pode afirmar-se como início da cadeia espaço-temporal que é um corpo, um ser humano. A vida não poderia se tornar humana depois do nascimento se não fosse já antes e desde a concepção”. [14]

 

Assim a medicina, se preocupa em tutelar a vida humana desde o momento da concepção, ao aceitar o nascituro como ser vivo humano, autônomo e independente de sua genitora, com o intuito de garantir-lhe a vida, bem como assegurar-lhe que chegue a sua próxima fase de desenvolvimento (a de criança) com sucesso.[15]

 

5 TEORIAS SOBRE A PERSONALIDADE JURÍDICA DO NASCITURO NO DIREITO BRASILEIRO

 

As opiniões doutrinárias sobre o início da personalidade jurídica do nascituro são divergentes.

Inicialmente, a doutrina dividiu-se, pois, de um lado, ficaram aqueles que sustentam que o nascituro não seria dotado de personalidade jurídica; apenas adquiriria essa condição caso viesse a nascer com vida. Tal teoria foi denominada de Teoria Natalista.

De outro lado, os opositores à aludida teoria natalista, sustentam que nascituro é dotado de personalidade jurídica, devendo, portanto, receber desde logo toda a tutela que é destinada aos seres humanos. Essa teoria recebeu o nome de Teoria Concepcionista.

Posteriormente, surgiu uma terceira corrente doutrinária que buscava estabelecer uma visão intermediária entre os dois extremos. Assim, os defensores desta corrente afirmam que o nascituro é dotado de personalidade desde a concepção, no entanto, seu reconhecimento ficaria condicionado ao nascimento com vida. Tal teoria é conhecida como Teoria da Personalidade Condicionada.

Pois bem, neste tópico analisar-se-á cada uma das aludidas teorias.

Contudo, mostra-se importante neste momento, esclarecer, ainda que de forma superficial, o que seria personalidade jurídica. Isto porque as três teorias acima mencionadas tratam justamente do momento em que se inicia a personalidade jurídica.

Vale, neste ponto, trazer à baila o escólio de Limongi França que, com propriedade explica:

 

A personalidade é a qualidade do ente que se considera pessoa. A pessoa a possui desde o início até o fim de sua existência. Não assim a capacidade, que pode sofrer modificações profundas e em muitos casos deixar de existir. Essa modificação e essa falta entretanto não afetam a personalidade, que continua  a mesma. Com efeito, a capacidade é um dos atributos da personalidade. (FRANÇA, 1991, p. 52)

 

Assim sendo, é seguro afirmar que toda pessoa é dotada de personalidade jurídica, ou seja, é titular de direitos e obrigações. Contudo, nem sempre a pessoa pode, sozinha, pleitear ou defender tais direitos, dependendo nestes casos de ser representada ou assistida. Portanto, uma criança de 1 (um) mês de vida é dotada de personalidade, mas para manifestar seus direitos e obrigações dependerá de representação, pois não adquiriu, ainda, capacidade.

Em síntese, basta a condição de pessoa para que ela adquira personalidade.

As teorias acima mencionadas tratam de analisar se o nascituro deve ou não ser considerado uma pessoa e, portanto, ser dotado de personalidade jurídica.

Feitos tais esclarecimentos, analisar-se-á as três teorias que tratam do início da personalidade jurídica do nascituro.

 

5.1 TEORIA NATALISTA

Para essa escola de pensamento o nascituro não deve ser considerado uma pessoa, mas apenas uma mera expectativa de pessoa. Como consequência disso, não seria titular de direitos e sim mero detentor de expectativas de direito.

Assim, o nascituro não seria dotado de personalidade, fato que somente ocorreria caso nasça com vida.

Os defensores desta corrente de pensamentos afirmam que o nascituro não tem vida independente, estando ligado à mãe e dela dependendo para manter sua vida.

Roberto de Ruggiero, explica:

 

Antes do nascimento o produto do corpo humano não é ainda pessoa, mas uma parte das vísceras maternas. No entanto, com esperança de que nasça, o direito tem-no em consideração, dando-lhe uma proteção particular, reservando-lhe os seus direitos e fazendo retroagir a sua existência, se nascer, ao momento da concepção. A equiparação do concebido ao nascido (conceptus pro iam nato habetur) é feita pelo direito só no seu interesse, pelo que não aproveita a terceiros e exerce-se, por um lado, com instituto do curador ao ventre, com o fim de vigiar os direitos que competirão ao nascituro. (RUGGIERO, 1934, p. 341-342).

 

O Código Civil de 1916, em seu art. 4º, estabelecia: A personalidade civil do homem começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro.” Como se vê, o antigo Código Civil adotou a teoria natalista.

O atual Código Civil, embora tenha aperfeiçoado a redação do artigo acima mencionado, manteve a adoção da teoria natalista, senão vejamos: “Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

Na doutrina é possível encontrar adeptos desta corrente de pensamento, sendo possível mencionar, dentre outros: Silvio Rodrigues, Carlos Roberto Gonçalves, Caio Mário da Silva Pereira, Sergio Abdalla Semião (1998, p.45).

 

5.2 TEORIA DA PERSONALIDADE CONDICIONAL

A teoria da personalidade condicional entende que a personalidade jurídica é conferida no momento da concepção, com a condição de que haja o nascimento com vida.

Assim, apesar de a personalidade iniciar na concepção, estaria ela sujeita a uma condição suspensiva, com a característica de retroagir até a data da concepção. Veja o exemplo: se for dado de presentes para o nascituro um par de sapatinhos, a aquisição desse presente dependeria de seu nascimento com vida; se nascer com vida adquirirá a propriedade do sapatinho desde a data da doação e se nascer sem vida, nunca teve a propriedade dos sapatinhos.

Miguel Maria de Serpa Lopes leciona de forma incisiva:

De fato, a aquisição de tais direitos, segundo o nosso Código civil, fica subordinado à condição de que o feto venha a ter a existência; se tal se sucede, dá-se a aquisição; mas, ao contrário, se não houver o nascimento com vida, ou por ter ocorrido um aborto ou por ter o feto nascido morto, não há uma perda ou transmissão de direitos, como deverá se suceder, se ao nascituro fosse reconhecida uma ficta personalidade. Em casos tais, não se dá a aquisição de direitos. (LOPES, 1999, p. 288).

São filiados a essa corrente, dentre outros, os seguintes doutrinadores: Clóvis Bevilácqua, Miguel Maria de Serpa Lopes, Gastão Grossé Saraiva.

 

5.3 TEORIA CONCEPCIONISTA

A teoria concepcionista defende que a aquisição da personalidade jurídica ocorre no momento da concepção, de sorte que o nascituro tem aptidão para adquirir direitos e contrair deveres.

Limongi França adverte que a teoria da personalidade condicional é a que mais se aproxima da verdade, mas traz o inconveniente de levar a crer que a personalidade só existirá depois de cumprida a condição do nascimento, o que não representaria a verdade visto que a personalidade já existiria no momento da concepção. Ainda, afirma que do ponto de vista filosófico e jurídico, nascituro é pessoa com os seguintes argumentos:

Filosoficamente, sem que seja necessário o apoio de toda uma corrente respeitabilíssima do pensamento humano (aristotélico-tomista), o nascituro é pessoa porque já traz em si o germe de todas as características do ser racional. A sua imaturidade não é essencialmente diversa da dos recém nascidos, que nada sabem da vida e também não são capazes de se conduzir. O embrião está para a criança como a criança está para o adulto. Pertencem aos vários estágios do desenvolvimento de um mesmo e único ser: o Homem, a Pessoa. Juridicamente, entram em perplexidade total aqueles que tentam afirmar a impossibilidade de atribuir a capacidade ao nascituro “por este não ser pessoa”. A legislação de todos os povos civilizados é a primeira a desmenti-lo. Não há nação que se preze (até a China) onde não se reconheça a necessidade de proteger os direitos do nascituro (Código chinês, art. 1°). Ora, quem diz direitos afirma capacidade. Quem afirma capacidade reconhece personalidade. (FRANÇA apud PUSSI, 2008, p. 89)

 

Assim sendo, o não haveria diferença entre o nascido e o nascituro, sendo que ambos seriam titulares de direitos e obrigações.

A mencionada teoria não tem dúvida em afirmar que o nascituro é um ser humano e, por tanto, dotado de personalidade jurídica.

Dentre os vários autores que são adeptos dessa corrente de pensamentos, é possível destacar: André Franco Montoro, Limongi França, Teixeira de Freitas, Francisco do Santos Amaral, Silmara Chinelato.

 

6 O TRATAMENTO JURÍDICO DISPENSADO AO NASCITURO

O Código Civil, como visto, adotou a teoria natalista[16] em relação a personalidade jurídica do nascituro, ou seja, entendeu que o nascituro não é dotado de personalidade jurídica apenas adquirindo tal atributo caso venha a nascer com vida.

No entanto, tal visão mostra-se ultrapassada, não sendo razoável hodiernamente, negar que o nascitura seja considerado uma pessoa, dotado, portanto, de personalidade.

A assertiva acima lançada é respaldada pelo próprio Código Civil que reconhece uma série de direitos ao nascituro em flagrante contradição com o disposto em seu art. 2º.

É possível realizar uma doação para o nascituro, o art. 542 do Código Civil estabelece: “A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.”

O nascituro pode ter a paternidade reconhecida (art. 1.609, parágrafo único do Código Civil), veja: “O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.”

Assim sendo, a própria legislação que aparentemente teria adotado a teoria natalista acaba por reconhecer que, em determinadas situações, o nascituro é titular de direitos.

A Lei nº 11.804/2008 estabeleceu os alimentos gravídicos e conferiu legitimidade para o nascituro figurar no polo ativo da demanda.

Assim sendo, é possível afirmar que o ordenamento jurídico tem caminho no sentido de confirmar a teoria concepcionista como a mais adequada, visto que cada vez mais tem sido reconhecido o direito dos nascituros

A ideia de que o nascituro não seria titular de direitos foi também manifestada na jurisprudência pátria. O Extinto Tribunal de Alçada Cível do Estado de São Paulo já decidiu: “Seguro obrigatório – Indenização – Pretensão de motorista em relação à morte de esposa grávida em acidente de trânsito e de gêmeos natimortos – Ação procedente somente em relação ao óbito da esposa.”[17]

No entanto, assim como na legislação, verifica-se uma evolução na jurisprudência, sendo hoje fácil encontrar decisões reconhecendo direito aos nascituros:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO SECURITÁRIO. SEGURO DPVAT. ATROPELAMENTO DE MULHER GRÁVIDA. MORTE DO FETO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DA LEI Nº 6194/74.

1 - Atropelamento de mulher grávida, quando trafegava de bicicleta por via pública, acarretando a morte do feto quatro dias depois com trinta e cinco semanas de gestação.

2 - Reconhecimento do direito dos pais de receberem a indenização por danos pessoais, prevista na legislação regulamentadora do seguro DPVAT, em face da morte do feto.

3 - Proteção conferida pelo sistema jurídico à vida intra-uterina, desde a concepção, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana.

4 - Interpretação sistemático-teleológica do conceito de danos pessoais previsto na Lei nº 6.194/74 (arts. 3º e 4º).

5 - Recurso especial provido, vencido o relator, julgando-se procedente o pedido.[18]

 

Como se vê, diante da evolução legislativa e jurisprudencial e em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana, torna-se forçoso reconhecer que feto é titular de direitos.

É certo, no entanto, que a condição de nascituro não permite a aquisição de todo e qualquer direito. Os direitos da personalidade, certamente, são adquiridos na concepção, bem como o direito aos alimentos, porém, alguns direitos patrimoniais dependerão necessariamente do nascimento com vida, sendo tratados como direitos eventuais.

Sob o prisma do direito eventual, Maria Helena Diniz (2011, p. 45) explica:

 

Os direitos patrimoniais (herança, indenização, doação, por exemplo.) conferidos ao nascituro permanecem em estado potencial, sob a condição suspensiva de nascer com vida (por isso são chamados de direitos eventuais). Nascendo morto (natimorto), não chega a adquirir tais direitos, mas não perde os direitos da personalidade (vida, nome, imagem, etc.), pois, possui personalidade jurídica formal.

 

Importante lembrar que caso a criança tenha nascido, respirado e morrido, haverá incidência de toda a disciplina sucessória, caso contrário, o nascituro apenas foi titular dos direitos da personalidade, sem consequências no direito sucessório.

 

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Com o desenvolvimento deste artigo, se pode concluir que ao nascituro lhe é assegurado certos direitos mesmo não tendo capacidade para exercitá-los. A principal observação, é que o nascituro adquire tais direitos no ato da concepção, tornando-se desde momento sujeito de direitos.

A pesquisa revelou que a teoria natalista mostra-se superada, sendo extremamente difícil negar o fato de que o nascituro é titular de direitos, em especial, dos direitos da personalidade.

Assim sendo, a teoria mais adequada em relação ao início da personalidade jurídica do nascituro é a teoria concepcionista, ou seja, aquela que reconhece ter o nascituro personalidade jurídica desde a concepção.

Tal entendimento fica em simetria com o princípio da dignidade da pessoa humana, sendo certo que tal tratamento digno deve ter início desde a primeira possibilidade de existência, ou seja, a partir da concepção.

Portanto, o nascituro deve ser considerado titular de direitos desde a sua origem.

 

 

8 BIBLIOGRAFIA

 

ANDRADE, Márcio Accioly de. Dignidade da Pessoa Humana (Fundamentos e Critérios Interpretativos). Malheiros Editores.

BARBOZA, Heloisa Helena. O estatuto ético do embrião. In: SARMENTO. Daniel. 

CAMPOS, Diogo Leite de. O Estatuto Jurídico do Nascituro. Revista da Ordem dos Advogados. 1996. 

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das famílias. 4ª edição atualizada e ampliada. RT.  2007. São Paulo. 

DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3ª Edição. Editora Revista dos Tribunais. 2008. São Paulo.

 FRANÇA, Limongi. Instituições de Direito Civil. 2ª edição. São Paulo. Saraiva. 1991.

 GALDINO, Flávio (Coords). Direitos Fundamentais: Estudos em Homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar. 2006. 

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 5ª Edição. Editora Saraiva. 2007. São Paulo.

 JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante. 2ª edição. Revista dos Tribunais. 2002. São Paulo.

 MEIRELLES, Jussara Maria Leal de. A Vida Humana Embrionária e sua Proteção Jurídica. Rio de Janeiro. São Paulo. Renovar. 2000. 

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Parte Geral. São Paulo. Saraiva. 40° Edição. 2005.

 MOORE, Keith L., PERSAUD, T. V. N. Embriologia Clínica. 6º edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.

 NADER, Paulo. Curso de Direito Civil. Editora Forense. 2ª Edição. Rio de Janeiro. 2004.

 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Editora Forense. 21ª Edição. Rio de Janeiro. 2005.

 PUSSI, William Artur. Personalidade Jurídica do Nascituro. 2° Edição. Revista e Atualizada.  Curitiba. Juruá. 2008.

 RODRIGUES, Tatiana Antunes Valente. Da Ação de Petição de Herança. São Paulo. RT. 2008. (Coleção Direito Civil v. 8).

 SEMIÃO, Sérgio Abdalla. Os Direitos do Nascituro: aspectos cíveis, criminais e do biodireito. Belo Horizonte. Del Rey. 1998.

 SZANIAWSKI, Elimar. Direitos da Personalidade e Sua Tutela. Editora Revista dos Tribunais. 2ª Edição. São Paulo. 2005.

 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. São Paulo. Atlas. 6° Edição. 2006.

 * Acadêmico do 6º semestre do curso de Direito das Faculdades Integradas de Nova Andradina.

**  Professor do Curso de Graduação em Direito das Faculdades Integradas de Nova Andradina; Mestre em Ciências Jurídicas pelo Centro Universitário de Maringá. Endereço eletrônico: stenioparron@hotmail.com.br.

 

[3] ALMEIDA afirma: Ao comentar os textos do Direito Romano que cuidaram do nascituro, Savigny aponta-lhes a contrariedade, conforme já observado por Clóvis Beviláqua. (ALMEIDA, 2000, P. 21).

[4] Art. 1º e 2º do Código Civil.

[5] O art. 128 do Código Penal não pune o aborto necessário (aquele realizado para salvar a vida da mãe) e o aborto no caso de gravidez resultante de estupro. 

[6] EMENTA: AUTORIZAÇÃO JUDICIAL PARA INTERRUPÇÃO DE GRAVIDEZ - MÁ-FORMAÇÃO DO FETO - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - POSSIBILIDADE DO PEDIDO - EVOLUÇÃO NECESSÁRIA DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA - VOTO VENCIDO. Afigura-se admissível a postulação em juízo de pedido pretendendo a interrupção de gravidez, por aborto ou outro meio médico-cirúrgico, no caso de se constatar a má-formação do feto, diagnosticada a ausência de calota craniana ou anencefalia, com previsão de óbito intra-uterino ou no período neonatal. Apesar de a situação de fato não se achar prevista no ordenamento jurídico pátrio, a sua anomalia específica exige a adequação dos princípios contidos na lei que permite a interrupção da gravidez pela prática do aborto necessário, ao avanço tecnológico da medicina, que antecipa a situação do feto em formação, sem possibilidade de vida extra-uterina. (Apelação Cível n.º 0275864-9 / Tribunal de Alçada de Minas Gerais.)

[7] Tal tema será desenvolvido em item específico.

[8]Art. 1.799. Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder:

I - os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão;

 

[9] Os óvulos fecundados, mas não introduzidos em um útero, a nosso juízo, também são dignos de proteção jurídica, não pelos mesmos motivos que justificam a proteção do nascituro, mas pelo fato de consistirem em um “projeto” de ser humano.

[10] MOORE, Keith L., PERSAUD, T. V. N. Embriologia Clínica. 6º edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000, p. 30.

[11] Blastômero é a estrutura que resulta da divisão do ovo fertilizado durante o desenvolvimento embrionário.

[12] Idem, ibidem, págs. 34 e 35.

[13] Idem, ibidem, pág. 30.

[14] CAMPOS, Diogo Leite de, “O Estatuto Jurídico do Nascituro”, Revista da Ordem dos Advogados, 1996, pág. 882.

[15] ANDRADE, Márcio Accioly  de, Dignidade da Pessoa Humana (Fundamentos e Critérios Interpretativos), Malheiros Editores, pág. 140.

[16] Art. 2º do Código Civil.

[17] JTACSP, 41:67-68, apud Almeida, Silmara J. A. Chinelato e. Tutela civil do nascituro. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 301.

[18] Superior Tribunal de Justiça – 3ª Turma, Recurso Especial nº 1120676/SC, relator ministro Massami Uyeda, data do julgamento: 07.12.2010.

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