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A Ordem dos Advogados do Brasil no Direito Administrativo


Autoria:

Tiago Damaceno Caxilé


Mestre em Direito pela Universidade de Fortaleza (2021). Pós-Graduado em Direito Público Latu Sensu (2012). Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho Latu Sensu (2010). Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Varginha (2008). Advogado e Professor Universitário.

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Resumo:

A Ordem dos Advogados do Brasil no Direito Administrativo tem por objetivo situar esta instituição de grande importância na administração da justiça dentro do ramo jurídico. O artigo tem por base analisar a instituição pelos olhos do STJ e STF.

Texto enviado ao JurisWay em 27/03/2014.



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Introdução

 

 

 

            A Administração Pública tem várias formas de procurar desempenhar sua função perante a sociedade. Para tanto ela precisa se organizar adequadamente e verificar quais atos deve tomar. É possível perseguir sua função constitucional e institucional diretamente ou com a criação de algumas entidades especializadas designadas para serviços específicos. A esta diferenciação é que se dá o nome de Administração Direta e Indireta.

 

            Assim, uma forma de definir Administração Pública seria o conjunto de órgãos (administração direta) e entidades (administração indireta) incumbidos de desempenhar sua função, através de seus agentes. Nos dizeres de Hely Lopes Meirelles:

 

"Em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade".[2]

 

            Podemos assim verificar que a Administração centralizada é a Administração Direta[3]. No que diz respeito a execução do serviço diretamente pelo Estado, não há qualquer forma de entrega da prerrogativa executória do serviço, muito menos de sua titularidade para terceiros, uma vez que a atividade é desempenhada por ele.

 

            A administração direta é composta dos entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), bem como suas Secretarias e Ministérios, havendo uma atuação direta e centralizada e hierarquizada. Nosso sistema jurídico até traz um conceito legal do que é a Administração Direta. Vejamos o que diz o Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967:

 

"Art. 4° A Administração Federal compreende:

 

I - A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios"[4].

 

            O Estado, devido aos poderes entregues pelo constituinte, tem capacidade de exercer a gestão dos serviços públicos existentes. Mas, tendo em vista a intenção do estado de perseguir o interesse público e sendo os serviços de caráter público, cria entidades públicas para com eficiência poder desempenhar tais serviços descentralizando-os. O processo de outorgando ou delegação é que nos leva a Administração Indireta.

 

            A Administração Indireta é o conjunto de pessoas vinculadas à administração direta que desempenham as atividades administrativas de forma descentralizada. Essa distribuição pode ser feito para pessoas de direito público especializadas como para pessoas privadas.A distribuição dos serviços é feita, como já dito, do centro para os entidades periféricos, quer pessoas públicas ou privadas. No Decreto-lei 200, ao qual já nos referimos anteriormente, que veio para cuidar das diretrizes para a reforma administrativa em 1967, também conceitua a Administração Indireta nos seguintes termos:

 

"Art. 4° A Administração Federal compreende: (…)[5]

 

II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:

 

a) Autarquias;

 

b) Empresas Públicas;

 

c) Sociedades de Economia Mista.

 

d) Fundações Públicas.".

 

            Para melhor especificar, o Estado outorga ou delega para terceiros os serviços que serão desempenhados. A outorga é quando o ente político transfere a titularidade que detém a uma entidade por ele criada por intermédio de lei, detendo tal entidade personalidade de direito pública. Tais entidades sofrem um controle pelo ente criador por meio do cotrole de suas finalidades. Se somente pode haver outorga por meio de lei, sua revogação também deve decorrer da lei.

 

            Já a delegação é a transferência da executoriedade do serviço a pessoa jurídica de direito privado, uma vez que o terceiro privado realiza o objetivo por seu risco, mas tendo o controle do Estado. Ela é feita por intermédio de concessão (através de contrato) ou por ato administrativo de permissão ou autorização, os quais sujeita o vencedor particular das licitações ou o contratado diretamente, nos termos da Lei 8.666/93, as normas aplicáveis aos contratos administrativos.

 

            O que é mais importante nesta distinção, que é muito relevante em nossa análise, é que a outorga tem um caráter mais definido e personalíssimo, não podendo ser transferido do outorgado a outros, e a delegação tem um aspecto temporário ou precário, uma vez que o Estado pode revogar o ato a qualquer momento.

 

            Dentro do conjunto administração indireta existem várias espécies, dentre elas encontra-se as autarquias, que tem suas especializações das mais variadas e com capacidade exclusivamente administrativa, de acordo com o foco a ser perseguido pelo Estado em sua criação. Esta criação é feita por lei, como diz o artigo 37, XIX da Constituição Federal[6]. As instituições autárquicas apesar de serem autônomas, estão sob a supervisão ou controle dos entes da Administração Direta. Ou seja, ainda que não pertencentes a um controle hierárquico, existe um controle político sobre as autarquias por parte do Estado que as criou.

 

            Existem inúmeras espécies de autarquias: Agências Reguladoras, Autarquias Territoriais, Autarquias Especiais, etc. Dentre as autarquias há a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. É incumbido a ela a gestão e a fiscalização do agente imprescindível à administração da justiça: o advogado.

 

            Devido a esta incumbência maior, vem o Supremo Tribunal Federal - STF e o Superior Tribunal de Justiça - STJ enunciando acórdãos nos mais variados sentidos, retirando esta entidade da categoria de autarquia profissional, inclusive do conjunto Administração Indireta, e tornando-a um monstro jurídico, no qual não se sabe como defini-la, um entidade civil com privilégios de autarquia. Esta designação "monstro jurídico" é doutrinariamente expressa como Pessoa Jurídica Impar.

 

            Assim, procederemos com a análise desta instituição, sua importância dentro do ordenamento brasileiro, seu papel constitucional e procuraremos classificá-la da maneira mais precisa, dentro dos institutos atualmente existentes no ordenamento.

 

 

 

Autarquias e suas Peculiaridades

 

 

 

            As autarquias são pessoas jurídicas de direito público criadas pelo Estado - Administração Pública - com o objetivo de assegurar serviços públicos de obrigação do próprio ente público, mas desempenhado com especialidade. O Estado criam estas entidades autárquicas para auxiliar na prestação de serviços públicos.

 

            De uma forma geral, as autarquias têm características comuns a todos as entidades da Administração Indireta, mas também tem peculiaridades só a ela inerentes. Podemos enumerar as características mais relevantes nas autarquias:

 

I. Possuem patrimônio próprio, diverso do da entidade criadora;

 

II. Imunidade de impostos sobre seu patrimônio, renda, bens e serviços (artigo 150, §2º, CF);

 

III. Prescrição quinquenal de suas dívidas passivas (Decreto-lei 4.597/42);

 

IV. Execução fiscal de seus créditos inscritos (artigo 578 do CPC);

 

V. Ação regressiva contra seus servidores culpados por danos a terceiros (artigo 37, §6º, CF);

 

VI. Impenhorabilidade de seus bens e rendas (artigo 100, CF);

 

VII. Imprescritibilidade de seus bens imóveis (artigo 200 do Decreto-lei 9.760/46);

 

VIII. Recurso de ofício nas sentenças que julgarem improcedentes a execução de seus créditos fiscais (artigo 475, III, CPC e Súmula 620, STF);

 

IX. Prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer (artigo 188, CPC e Decreto-lei 7.659/45);

 

X. Juízo privativo da entidade estatal a que pertencem (artigo 109, I, CF);

 

XI. Ampliação do prazo para desocupação de prédio locado para serviços, quando decretado o despejo (artigo 63, §3º, Lei 8.245/91);

 

XII. Dispensa de apresentação de instrumento de mandato em juízo pelos procuradores que a representam.

 

            As autarquias funcionam e operam na forma estabelecida na lei instituidora e nos termos de seu regulamento, todos editados pelo ente criador. Podem desempenhar atividades educacionais, previdenciárias e outras designadas pelo ente criador, mas sem qualquer subordinação hierárquica. Estão sujeitas apenas ao controle finalistico de sua administração e da conduta de seus dirigentes, ou seja, uma vinculação à entidade-matriz.

 

            De acordo com Hely Lopez Meirelles[7] são entidades autônomas (conceito administrativo), mas não autonomias (conceito político). O poder de polícia desempenhado por estas instituições públicas é uma função eminentemente pública. Tal característica evidencia ainda mais sua inclinação autárquica. Pode-se inferir a tais autarquias que são os fiscalizadores de profissões, de acordo com suas especificações, logo não se presta a comparação com as delegações a empresas privadas.

 

            As autarquias atuam no desempenho de seu serviço por sua própria conta e risco, havendo apenas responsabilidade subsidiária pelo ente público criador. Assim, não representam o Estado. Também não é qualquer serviço que são outorgados. Transferem-se apenas serviços públicos que são atividades próprias de Estado. Os serviços atípicos são passados a pessoas de direito privado, por isso não se transfere a autarquia a exploração econômica. Assim, diz Celso Antônio Bandeira de Mello:

 

"Sinteticamente, mas com precisão, as autarquias podem ser definidas como pessoas jurídicas de Direito Público de capacidade exclusivamente administrativa. (…) Exatamente por serem pessoas de Direito Público é que as autarquias podem ser titulares de interesse público, ao contrário de empresas públicas e sociedades de economia mista, as quais, sendo pessoas de Direito Privado, podem apenas receber qualificação para exercício de atividade pública; não, porém, para titularizar as atividades públicas[8]".

 

            Para a doutrina e jurisprudência preponderante, os conselhos fiscalizadores são as autarquias corporativas ou profissionais. Os conselhos tem toda a sua estrutura restrita a mesma forma que as autarquias, tendo todas suas características, principalmente quanto a sua autoadministração.

 

            O Estado intenta, por meio de uma autarquia, descentralizar a administração, através da personificação de um serviço retirado da Administração centralizada, ou seja, é outorgado um serviço público típico. Possuem privilégios administrativos do Estado, não os políticos, que se transmitem natural e institucionalmente as autarquias. Sua personalidade nasce com a lei criadora. Não agem por delegação, mas por direito próprio e com autoridade pública, na medida do jus imperii que lhe foi outorgado.

 

            Só podem ser criadas ou extintas por lei específica. Sofrem controle repressivo e preventivo, de legitimidade e de mérito, de tutela ordinária e tutela extraordinária. O controle que sofrem é o poder que assiste à Administração Central de influir para conformá-las ao objetivo público para o qual foram criadas. Na administração federal o controle tem por nome "supervisão ministerial". Os objetivos são: assegurar cumprimento de sua finalidade legal, harmonizá-la a política e programação do Governo, zelar pela eficiência administrativa e assegurar a autonomia administrativa, operacional e financeira.

 

            O ente criador designa os dirigentes da entidade, recebe relatórios sistematizados para o acompanhamento da atividade e sua programação financeira, aprova propostas de orçamento-programa e programação financeira, aprova balanços, balancetes e relatórios, fixa despesas com pessoal, fixa critérios de gastos com publicidade e divulgação, realiza auditoria e avaliação periódica e efetiva a intervenção.

 

            São fiscalizados e sujeitam-se ao controle do Tribunal de Contas. Também, qualquer cidadão é parte legítima para propositura de ação popular tendo em vista a anulação de ato lesivo ao patrimônio público (art. 5º, LXXIII, CF[9]).

 

            O Decreto-Lei 200/67[10], que trata da reforma administrativa federal, conceitua Autarquia da seguinte maneira, em seu artigo 5º, I:

 

"Autarquia - o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada".

 

            A conceituação legal tem o mérito de impedir que a União outorgue às suas autarquias serviços impróprios do Poder Público, ou seja, atividades econômicas industriais ou comerciais específicas da iniciativa privada, que só podem ser exploradas suplementarmente por empresas públicas e sociedades de economia mista.

 

            Assim, as autarquias podem ser titulares de interesses públicos, ao contrário de empresas governamentais (empresas públicas e sociedade de economia mista), que sendo pessoas de direito privado, podem apenas receber qualificação para o exercício de atividade pública.

 

            Seu regime jurídico é muito próximo ao da Administração direta. O vinculo entre a autarquia e seus servidores não é contratual, mas institucional ou "estatutário". Seus atos são administrativos, sujeita a licitação (tem cláusulas exorbitantes). Estão sujeitas a contabilidade pública (Lei 4.320/64) e a responsabilidade fiscal (Lei Complementa 101/2000). Os bens pertencentes a autarquia são públicos, inalienáveis, impenhoráveis, impossibilidade de oneração e imprescritíveis. O regime tributário ao qual está vinculado é o mesmo que os entes políticos (Imunidade Recíproca), ou seja, diz respeito apenas a impostos e a extensão é apenas as finalidades essenciais.

 

            Relativo a questões processuais, tem o mesmo tratamento que fazenda pública: prazo dilatado, reexame necessário, sujeitos a precatório. Sua responsabilidade civil é objetiva. Caso a autarquia não tenha patrimônio ou receita, cobra-se do Estado em segundo momento (Responsabilidade Subsidiária). Há uma ordem de preferência. Essa ideia serva para qualquer situação de prestação de serviço. Seu regime de pessoal é, em regra, de servidor público, não importa se estatutário ou celetista.

 

            Uma das formas de autarquia são os conselhos de classe. Estes são autarquias profissionais com o intuito de fiscalizar e controlar o seguimento ao qual foram designados. Exercem poder de polícia, que não podem ser dados e exercidos diretamente por particulares. São exemplos: CONFEA - Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, CFM - Conselho Federal de Medicina, COFECI - Conselho Federal dos Corretores de Imóveis, entre outros.

 

            Há doutrinadores que inseriam a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB neste contexto. Ocorre que decisões jurisprudenciais e entendimentos doutrinários diversos surgiram nos últimos tempos para dar novo norte sobre a sua natureza jurídica. Vejamos o histórico da instituição e, após, a analise de suas características e outros afins.

 

             

 

Histórico de Formação da OAB[11]

 

 

 

            Para melhor analise do que é a OAB e como enquadrá-la, devemos verificar como foi sua progressão histórica. Ou seja, a Ordem sempre foi uma corporação independente, sem qualquer vinculo com o Estado.

 

            Na Roma antiga, por meio dos collegium, os torgatorum, as ordo em que se reuniam os advogados em numeus clausus e definiam as regras de sua atuação.

 

            Posteriormente, vemos os advogados se reunirem em corporações de ofício, nas guildas, também de forma absolutamente independente do Estado, apesar que se dificultar a verificação do Estado na Idade Média. Esta foi a forma como a organização foi trazida para o nosso país – Brasil Colônia. Depois, com a independência do Brasil e a instituição do Império, o Ministro do Supremo Tribunal de Justiça, Conselheiro Francisco Alberto Teixeira de Aragão, propôs a fundação de uma entidade brasileira nos moldes da Associação dos Advogados de Lisboa, criada em 1838. A intenção era a criação de uma entidade que vislumbrasse a formação de uma Ordem.

 

            O próprio Ministro articulou junto a Gazeta dos Tribunais um periódico sobre o tema, em janeiro de 1843. Teve, então, início a discussão em torno da criação de uma corporação que reunisse e disciplinasse a classe dos advogados. Desta forma, surgiu o Instituto dos Advogados Brasileiros, em 07 de setembro de 1843, o precursor da Ordem, com o intuito de discutir e auxiliar o governo na organização legislativa e judiciária, como órgão de estudos e debates da legislação e jurisprudência. Sua relevância foi tanta que devido aos estudos do Instituto conseguiu-se fazer um anteprojeto da Constituição de 1891, já Republicana.

 

Em 1930, com a Revolução, nasceu um novo Estado Brasileiro. Em meio à ânsia de sair de um sistema tão medíocre, visando assegurar direito à todos que se deu a criação da Ordem dos Advogados do Brasil, que decorria de uma inclusão de dispositivo que visava a modernidade do Poder Judiciário (art. 17 do Decreto 19.408/30). Tal dispositivo dispunha que a Ordem seria regida pelos estatutos votados pelo IAB e aprovados pelo governo, ou seja, já havia uma certa independência da Ordem, uma vez que só merecia aprovação do Estado para vigorar.

 

Em 1931, Levi Carneiro fez o projeto do primeiro Regulamento da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto n.º 20.784/31, criando o Conselho Federal. Sob a condução de Levi Carneiro e Attílio Vivácqua, a Ordem dos Advogados foi consolidada em todo o território nacional.

 

Após o período de impaciência revolucionária, foram realizadas eleições para a Assembléia Constituinte. Em 15 de novembro de 1933, instalou-se, por convocação governamental, a segunda Assembléia Constituinte Republicana. O Conselho Federal da OAB e o Instituto dos Advogados Brasileiros – este de forma mais incisiva dada a incipiente organização da Ordem - encaminharam pareceres dos relatores das suas comissões de acompanhamento dos trabalhos legislativos da Assembléia Constituinte. A Ordem teve imensa participação na elaboração da Constituição de 1934.

 

Com os rumores de guerra pairando sob a Europa, os regimes totalitários cada vez mais fortes e a influência destes sobre a pátria, várias situações externas vieram a influenciar nosso país. Tais fatos levaram o Estado a tomar atitudes radicais quanto aos seus opositores, como a Criação de Tribunal de Segurança Nacional, fechamento da ANL, instituição do Estado de Sítio, prisões de diversas pessoas e políticos, etc. Tudo veio a ir de encontro aos ideais constitucionais recém implantados no país em 1934. A Ordem trilhou, portanto, o caminho da defesa das liberdades democráticas e dos direitos humanos com os acontecimentos políticos de 1935, marcados pelas primeiras medidas da execução do estado de sítio e da Lei de Segurança Nacional, que desembocariam no autoritário Estado Novo, em 1937.

 

Conforme apresentado no sítio do nobre conselho paracleto em comento[12], o episódio caracterizou um período de intensa repressão e arbítrio. Para exemplificar o que estamos tentando mostrar, o Conselho Federal da OAB indicou para defesa ex officio dos líderes comunistas Luís Carlos Prestes e Harry Berger o advogado Sobral Pinto, que travou duras batalhas em defesa da liberdade e contra a violência do regime, apelando, inclusive, para a lei de proteção dos animais, na tentativa de resguardar a integridade física dos presos políticos. Seus clientes, entretanto, só conseguiram a liberdade com a anistia promovida em 1945.

 

Com o golpe em 10 de novembro 1937, o regime abraçou o ideal da extrema direita, uma conduta nazi-fascista, adotando um Estado onde o cidadão não mais engendrava a pluralidade, mas de um projeto que cerceava sua condição humana e jurídica tutelada pela violência. A corporação policial, cuja finalidade normal era a segurança dos cidadãos, mudou para legitimar a preservação da ordem ditatorial e manter a integridade do Estado. Nesse período, as manifestações da OAB contra o Estado Novo e suas ações repressivas consagraram a entidade como árdua defensora da liberdade, cujas atas de reuniões publicadas no Jornal do Commercio foram censuradas.

 

No decurso da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a Ordem aprovou várias moções referentes ao conflito. O Conselho discutiu também o problema das inscrições na Ordem dos “Súditos do Eixo”, concluindo que deveriam ser mantidas, exceto em caso concreto de atentado à segurança nacional, acrescentando, entretanto, que não seria compreendido que os brasileiros utilizassem esses advogados. Apesar das dúvidas quanto a que lado atuar na guerra, que manteve um governo autoritário, mas juntou-se formalmente aos Aliados, o Conselho Federal posicionou-se em favor da defesa da democracia, principal objetivo da Ordem.

 

A Ordem se fez presente e sempre buscou defender os ideais democráticos e a soberania do nosso país. Como a profissão de advogado é desempenhada com independência, a qual por todo o contexto histórico foi desempenhado por sua representação nacional, o Conselho Federal da OAB. Independência, como diz José Olympio de Castro Filho[13], “gramatical e filosoficamente, liberdade, livre arbítrio, não sujeição a outros, nem a idéias de outros”. O mister do advogado é atuar a ninguém sujeito, de ninguém dependente, é livre de se determinar, seguindo suas próprias idéias, concepções, princípios que por ele foi eleito em sua consciência, restrito apenas a lei e a Constituição.

 

Em maio de 1954, o Conselho Federal da OAB dirigida ao ministro da Justiça documento contra os novos atentados à dignidade da pessoa humana, cometidos por autoridades policiais em vários pontos do País. Protestou-se contra a quebra da ordem jurídica em virtude dos acontecimentos políticos, como o atentado da Rua Toneleros.

 

Na década de 1950, a Ordem dos Advogados do Brasil se viu às voltas com a ameaça de perda de sua autonomia institucional. A instituição integra a própria estrutura do estado de direito, com atribuições que só podem ser exercidas, precisamente, sob a condição de não-sujeição e não-vinculação a qualquer dos Poderes. A independência e a autonomia da Ordem dos Advogados do Brasil são fundamentais para perseguir sua finalidade: defesa da Constituição, do estado democrático de direito, dos direitos humanos, da justiça social, da boa aplicação das leis e da rápida administração da Justiça, além do aperfeiçoamento da cultura e instituições jurídicas.

 

O Estado procurou por diversos meios o controle da instituição: entre 1940 e 1950, com a obrigatoriedade de prestar contas ao Tribunal de Contas da União; na década de 1970, com a tentativa de submissão da entidade ao Ministério do Trabalho; em 1998, com duas medidas provisórias que tratavam da vinculação do Conselho Federal e das Seccionais ao Poder Judiciário dos Estados; e no ano 2000, processo ainda em andamento, quando o Ministério Público enquadrou a Ordem novamente como uma autarquia obrigada a prestar contas ao TCU.

 

O parecer do ministro Rafael Mayer, reforçou essa posição, pois, segundo ele o tratamento diferenciado da OAB no universo das chamadas corporações ou entidades incumbidas da fiscalização do exercício das profissões liberais, tem razão de ser na eminência das atribuições que a ela são confiadas pelo ordenamento jurídico, excedentes do campo da simples disciplina e defesa da classe. Até o momento não houve decisão final sobre a natureza jurídica da Ordem dos Advogados do Brasil e, por conseguinte, sobre as obrigações tributárias da entidade para com os cofres públicos.

 

Analisemos, portanto, esta máxima.

 

 

 

A Ordem é Autarquia?

 

 

 

            Acerca de 10 anos atrás, não havia qualquer divergência quanto a inclusão da Ordem dos Advogados do Brasil como uma instituição autárquica especial, inserido na Administração Indireta Federal. Regida pela Lei 8.906 de 4 de julho de 1994, a OAB é um serviço público, dotado de personalidade jurídica e forma federativa (art. 44).

 

            Via-se a OAB como unicamente uma organização profissional autônoma e de finalidades corporativas, amoldada ao conceito do Decreto-Lei 200/67. Segundo André Borges[14], em artigo publicado virtualmente, diz que:

 

"(…), é uma autarquia, de vez que foi criada mediante lei federal, tem personalidade jurídica de direito público, é órgão autônomo da administração pública federal, realiza atividade de administração de interesses públicos específicos e tem receita e patrimônio próprios".

 

            Ocorre que, devido a recentes entendimentos por parte do Superior Tribunal de Justiça - STJ e pelo Pretório Excelso, a Ordem tornou-se uma entidade peculiar, não como uma autarquia. Era tida por autarquia uma vez que todos os conselhos profissionais estão inseridos neste conglomerado. Superficialmente falando, a Ordem não está sujeita a contabilidade pública, não sofre controle do Tribunal de Contas, suas anuidades não tem natureza tributária[15] (execução comum) e é incabível a aplicação de Concurso Público a ela (uma vez que seus cargos não são criados por meio de lei).

 

            Como pode uma "autarquia" ser tão contrária às características gerais inerentes a sua natureza. Na ADIn 3.026[16], consignou-se que a Ordem não é uma entidade da Administração Indireta, por ser um serviço público independente, que também não está incluída na categoria de "autarquia especial". Que tem uma função constitucionalmente privilegiada, nos termos do artigo 133 da Carta Maior, não havendo relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público. O principal, objeto do julgado, era que o regime estatutário não é compatível com a entidade, que é autônoma e independente.

 

            Assim, devido as suas características fugirem a normalidade, não pode a OAB ser tida como uma entidade congênere com os demais órgãos de fiscalização profissional. Ela não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas. Possui finalidade institucional. Apesar de sua criação ter sido por meio de lei não justifica sua designação como autarquia. O relator da ADIn 3.026, Ministro Eros Roberto Grau, deixou transparecer, em seu entendimento, que a Ordem tem uma característica de direito privado autorizada pelo Estado. Vejamos:

 

"(…) Não é isso que importa, mesmo porque a União cria e autoriza a criação de entidades dotadas de personalidade jurídica em direito privado (CB, art. 17, XIX e XX)".

 

            A OAB, para o exercício de seus poderes e realização de sua finalidade, não está subordinada senão a lei. O artigo 44, §1º da Lei 8.906/94 dispôs que a entidade não mantém com órgão algum vinculo funcional ou hierárquico. Também seus órgãos de direção são eleitos por seus pares e não nomeador por qualquer supervisor do poder executivo. As autarquias existentes tem finalidades econômicas, destinam-se (salvo raras exceções) ao desempenho de serviços de natureza industrial ou comercial, ou atender questões previdenciárias. Tem patrimônio público. Os servidores não são mantidos por com recursos do Tesouro Público. Nada disso ocorre com a Ordem. Não sofre qualquer controle. Não recebe auxilio ou subvenção do Tesouro. Custeia seus serviços exclusivamente com anuidades dos inscritos. Não tem qualquer objetivo econômico, industrial, comercial ou previdenciário.

 

            Orlando Gomes, figura impar em nossa história jurídica, escrever que a Ordem não é uma associação, uma sociedade ou um órgão da Administração. É uma instituição que tem como condição de existência a autonomia diante do Estado[17]. Portanto, é uma categoria sem igual em nosso ordenamento jurídico. Creio que sua complexidade é tamanha que muitos doutrinadores, inclusive os doutos Ministros do Supremo, a tem chamado de "Personalidade Jurídica Impar". Talvez a complexidade exista por não haver uma categoria no direito administrativo que possa incluir plenamente.

 

            A Ordem dos Advogados tem vários órgãos: O Conselho Federal, os Conselhos Seccionais e as Subseções. Há ainda a Caixa de Assistência dos Advogados. Cada um destes órgãos tem sua atuação definidas no Estatuto da Ordem (Lei 8.906/94) e no Regulamento Geral da Ordem. Além destas atribuições legalmente conferidas a instituição, há ainda o preceito constitucional outorgado ao Conselho Federal da OAB para a defesa da ordem jurídica e constitucional brasileira (art. 103, VII da CF, por exemplo).

 

            Podemos verificar que a OAB é uma entidade responsável pela defesa da ordem constitucional, jurídica, da democracia, dos direitos humanos e da justiça social, que conta com prerrogativas de autarquia, mas não submetida a qualquer órgão do Poder Executivo, podendo influir na Administração, no Legislativo e no Judiciário, com independência funcional para o bem da sociedade.

 

            Assim, o leque de atuações tanto diante do Estado como no meio social são grandes em detrimento aos demais Conselhos Profissionais. O advogado é o porta-voz do acesso a justiça, uma vez que para a postulação de qualquer pedido é preciso ter capacidade civil e postulatória. A postulatória só se adquire quando ingresso nos quadros da Ordem dos Advogados, com raríssimas exceções. O Conselho Federal não está unicamente vinculado a questões corporativas. Assim não poderia a Ordem ser enquadrada no gênero comum das autarquias.

 

            Nenhum outro conselho teve sua menção expressa pela Constituição da República. Por se enquadrarem no conceito geral de autarquia não necessitou de algo excepcional na Constituição. Por outro lado, a Ordem, além de citada expressamente, tem atribuições muito além daqueles conselhos. A função do advogado, da Ordem e, mais especificamente, do Conselho Federal são tamanhas que são citados pela Carta Maior em diversos artigos (art. 5º, LXIII; 93; 129, §3º; 132; 103; 103-B; 130-A, §4º; 52, II; 84, XVI e parágrafo único;  e outros mais).

 

            Além disso, vejamos o entendimento de outros tribunais, onde as normas da OAB não podem ser utilizadas por outros Conselhos Profissionais. Vejamos o entendimento do Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

 

“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE ATIVA DO SINDICATO IMPETRANTE. ANUIDADE. MAJORAÇÃO POR RESOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ARTS. 149 E 150, I, DA CF. EXTINÇÃO DA MVR. LEI 8.906/94. INAPLICABILIDADE. (...) 3. As normas contidas no Estatuto da OAB (Lei 8.906/94) não se estendem aos Conselhos Profissionais, em face da sua natureza autárquica especial, porque, apesar de zelar pelos interesses corporativos, possui finalidade institucional, a qual lhe dá autonomia e independência, distinguindo-se dos demais Conselhos Profissionais”.

 

            Ora, entendo quanto a utilização de normais gerais, as quais caberiam a todas as autarquias. Mas o Estatuto da Ordem é lei específica, não estão ao alcance de outras autarquias, pelo que não pertence ao mesmo grupo de autarquias e nem é vinculada a outras.

 

            A OAB tem delegação de atribuição estatal (como um cartório extrajudicial), influencia os três Poderes Estatais (como um partido político), tem total independência funcional (como o Ministério Público ou a Defensoria Pública), sem vinculo ou controle estatal (como uma instituição privada), apesar de a ADIn 1.717 ter considerado inconstitucional o caráter privados dos Conselhos de Fiscalização Profissional.

 

            A OAB é uma instituição da sociedade civil e não estatal. Esta instituição está sujeita a normas de direito público e, ao mesmo tempo, de direito privado. Por exemplo, quando exerce atividades de fiscalização profissional está a exercer um caráter público, um múnus outorgado pela Constituição e pelo Estado, vinculado as regras de direito público. Já quando contrata seus servidores está livre de concurso público, possuindo tais servidores um vinculo contratual (celetistas), manifestando normas de natureza privada. A entidade possui portanto uma “personalidade bifronte”.

 

            O Ministro Carlos Britto coloca, com total propriedade, a personalidade bifronte aplicada a OAB. Vejamos:

 

“(...) Quando o Ministro Sepúlveda Pertence falou da natureza bifronte dos partidos políticos, certamente ele pensou também na OAB. A OAB pode ser considerada entidade pública no plano do múnus, no plano do ofício – vamos chamar de função -, no plano da função, mas não é entidade pública no plano da composição dos seus quadros, da formação da sua diretoria, da forma da investidura da sua diretoria, na forma de recrutamento de seus servidores. Bifronte neste sentido. Ela é ambivalentemente pública e privada. O seu regime jurídico é necessariamente público e privado”.

 

            Ocorre, como já dissemos, a OAB não é uma entidade que participa da Administração Pública. Deriva disso o entendimento de que o Concurso Público, como já decidido no MS 21322/STF[18] de relatoria do Ministro Paulo Brossard, não alcança a OAB, apesar de alcançar toda a Administração Pública, só aceitando exceções caso a própria Carta Magna assim o diga.

 

            Também conforme entendimento de Maria Sylvia Zanella di Pietro[19]:

 

“Serviço Público é toda atividade que a administração pública executa direta ou indiretamente para satisfazer a necessidade coletiva, sob regime predominantemente público”.

 

            No voto do eminente Ministro Gilmar Mendes, na ADI 3.026, fez-se menção as “the public function cases”, onde a Corte Norte-Americana reconheceu que entes privados exercessem funções públicas. São casos em que os privados poderiam ser equiparados ao aparato estatal. Aqui no caso, não estamos colocando a Ordem como um ente paraestatal, mas mostrando que particulares podem exercer poderes estatais, desde que autorizados pelo Estado. Assim, uma instituição privada poderia conglomerar tanto ações privadas como públicas. A questão de ter limitações constitucionais e legais pelo exercício de poderes estatais autorizado e outorgados não significa que deva ter controle pelo próprio Estado.

 

            O que é desempenhado por esta instituição, chamado pela constituição como “serviço público”, não é necessariamente um serviço, mas uma utilidade, um múnus, uma função, um ofício público, decorrente do art. 44, I, Lei 8.906/94[20]. Ao designar a Ordem de serviço público independente, está se cogitando um uma categoria impar, uma função totalmente especial e relevante. Uma vez que não se trata necessariamente de um “serviço” público a sociedade, posto não está vinculado ou controlado por qualquer ente estatal. Não há hierarquia técnica ou administrativa. A Ordem tem características próprias diferentes dos outros serviços a disposição da comunidade. Ela não tem uma mera função de fiscalização profissional. Possui outras atribuições e funções. O Conselho dos Advogados deve pertencer a um terceiro gênero que não Administração Direta e Indireta. É uma entidade civil com forte perfil institucional.

 

            Este tertium genus podemos incluir também, por exemplo, as atividades notoriais e de registro. É uma atividade pública exercida em caráter privado.

 

            A lei preferiu chamar tal múnus, tal ofício, de “serviço” público. Como bem alude o Ministro Carlos Britto:

 

“Mas [OAB] é um serviço público não estatal, daí sua “sui-generidade” – permito-me o neologismo – da instituição. Se toda atividade estatal é atividade pública, nem toda atividade pública é rigorosamente atividade estatal”.

 

A OAB já foi alvo da tentativa do controle estatal por inúmeras vezes, como já visto. As matérias já havia sido julgada pelo Poder Judiciário em 12 de setembro de 1952. Na década de 1950, entendeu-se que a entidade não estaria sujeita à fiscalização do Tribunal de Contas da União, decisão que não deveria ser revista. A natureza jurídica da OAB é de uma autarquia sui generis, não sujeita a qualquer tipo de controle estatal e, portanto, livre de qualquer obrigação tributária para com o Estado. Apesar de exercer um ofício público, o Conselho Federal goza de ampla autonomia administrativa, é mantido com recursos próprios, não recebe subvenções e dispõe de legislação especifica, diferente da que trata do funcionamento das autarquias.

 

            Assim, vemos que a instituição paracleto é bem incomum. Tem com os Partidos Políticos características semelhantes, apesar de naturezas completamente divergentes. Não há no direito comparado uma entidade tão distinta como foi a formação da OAB no Brasil. É uma instituição que participa amplamente da formação do Estado, que possui um estatuto jurídico “sui generis”, única categoria que com direito constitucional de ingressar nas fileiras do Estado em situação completamente diferente das outras entidades estatais e goza de total imunidade tributária. Ou seja, é mais que uma entidade corporativa, ultrapassando os limites que o conceito autarquia profissional possa conter, ganhando uma função institucional.

 

            Ao nosso ver a ordem é enquadrada como uma Autarquia político-jurisdicional, ou seja, uma instituição que tem uma atuação política relativa a seu papel de defensor da Constituição, da ordem legal, dos acontecimentos sociais e políticos, não submetida a controle estatal, e que, por tal função institucional, influi nas três esferas do Estado (Legislativo, Executivo e Judiciário), judicial e extrajudicialmente, pela defesa dos direitos fundamentais, regulando os porta-vozes da sociedade. Essa instituição político-jurisdicional, corporativa, com personalidade bifronte, totalmente desvinculada ao Estado, damos o nome de Autarquia Brifronte ou "nullum vinculum".

 

            O nome Autarquia é para demonstrar que a instituição ainda tem um múnus público, um ofício dado pelo Estado para o desempenho de funções outorgadas por ele; O Bifronte ou “extra publicam” mostra seu lado privado, reservando-se ao fato de não ter vinculo ou controle do Estado, agindo com total independência e submissa apenas à Constituição e as Leis (Não sofre controle do Tribunal de Contas; não precisa fazer concurso público; não vinculada ou controlada a nenhum Ministério ou Secretaria; contribuições não fiscais; etc.).

 

 

 

Conclusão

 

 

 

            Conforme podemos ver claramente, durante todo o transcorrer do tempo, a atividade dos advogados sempre foi desempenhada desvinculada do Estado e fora de qualquer tipo de controle. Desde os primórdios da profissão, o advogado tem atuado como um ícone, como um porta-voz, como um facilitador da sociedade na proteção de seus direitos.

 

            Conforme se verificou, a Ordem dos Advogados do Brasil, durante toda a sua história e existência, sempre batalhou quanto a suas principais prerrogativas que são: a defesa da ordem constitucional e legal, os direitos humanos, pelo estado democrático, a justiça social, pugnando pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas (art. 44, I, Lei 8.906/94). Além disso cuida ainda, como uma entidade corporativa, dos direitos dos advogados e regulamentos para o exercício da profissão. Mesmo antes de sua criação, quando da instituição do Instituto dos Advogados do Brasil – IAB, que sempre lutou pela ordem jurídica e pelo empenho no estudo científico para melhor adequação do binômio lei-sociedade, buscou e busca tal alvo.

 

            Já uma autarquia, pessoas jurídicas de direito público criadas pelo Estado - Administração Pública - com o objetivo de assegurar, com especialidade, serviços públicos de obrigação do próprio ente criador, que tem características comuns a todos as entidades da administração indireta, estão sujeitas apenas ao controle finalístico de sua administração e da conduta de seus dirigentes, ou seja, uma vinculação à entidade-matriz.

 

            As autarquias possuem privilégios administrativos do Estado, não os políticos. Sua personalidade nasce com a lei criadora. Não agem por delegação, mas por direito próprio e com autoridade pública, na medida do jus imperii que lhe foi outorgado. Sofrem controle repressivo e preventivo, de legitimidade e de mérito, de tutela ordinária e tutela extraordinária. O controle que sofrem é o poder que assiste à Administração Central de influir para conformá-las ao objetivo público para o qual foram criadas. Os objetivos são os de assegurar cumprimento de sua finalidade legal, harmonizá-la a política e programação do Governo, zelar pela eficiência administrativa e assegurar a autonomia administrativa, operacional e financeira. Ainda designa os dirigentes da entidade, recebe relatórios sistematizados para o acompanhamento da atividade e sua programação financeira, aprova propostas de orçamento-programa e programação financeira, aprova balanços, balancetes e relatórios, fixa despesas com pessoal, fixa critérios de gastos com publicidade e divulgação, realiza auditoria, entre outras questões já analisadas.

 

            Não é o que ocorre com a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB. Como vem seguindo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ e do Supremo Tribunal Federal – STF. A Ordem é uma entidade peculiar, não como uma autarquia. Superficialmente falando, a Ordem não está sujeita a contabilidade pública, não sofre controle do Tribunal de Contas, suas anuidades não têm natureza tributária e é incabível a aplicação de Concurso Público a sua estrutura.

 

Não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas, já que possui finalidade institucional. Apesar de sua criação ter sido por meio de lei não justifica sua designação como autarquia. Também seus órgãos de direção são eleitos por seus pares. Nada disso ocorre com a Ordem. Não sofre qualquer controle. Não recebe auxilio ou subvenção do Tesouro. Custeia seus serviços exclusivamente com anuidades dos inscritos. Não tem qualquer objetivo econômico, industrial, comercial ou previdenciário.

 

É uma "Personalidade Jurídica Impar". Talvez a complexidade exista por não haver uma categoria no direito administrativo que possa incluir plenamente. Podemos verificar que a OAB é uma entidade responsável pela defesa da ordem constitucional, jurídica, da democracia, dos direitos humanos e da justiça social. Para conseguir uma atuação mais eficaz conta com tais prerrogativas de autarquia, mas não submetida a qualquer órgão do Poder Executivo. Assim é uma entidade que possui uma “personalidade bifronte”.

 

A Ordem não é um ente paraestatal, mas particular que pode exercer poderes estatais, desde que autorizados pelo Estado cercando-se de abusos, que podem ser questionados no Judiciário. Assim, uma instituição privada poderia conglomerar tanto ações privadas como públicas. A questão de ter limitações constitucionais e legais pelo exercício de poderes estatais autorizados e outorgados não significa que deva ter controle pelo próprio Estado.

 

A OAB já foi alvo da tentativa do controle estatal por inúmeras vezes, como já visto. As matérias já havia sido julgada pelo Poder Judiciário em 12 de setembro de 1952. Na década de 1950, entendeu-se que a entidade não estaria sujeita à fiscalização do Tribunal de Contas da União, decisão que não deveria ser revista. A natureza jurídica da OAB é de uma autarquia sui generis, não sujeita a qualquer tipo de controle estatal e, portanto, livre de qualquer obrigação tributária para com o Estado. Apesar de exercer um ofício público, o Conselho Federal goza de ampla autonomia administrativa, é mantido com recursos próprios, não recebe subvenções e dispõe de legislação especifica, diferente da que trata do funcionamento das autarquias. A esta instituição político-jurisdicional, corporativa, com personalidade bifronte, totalmente desvinculada ao Estado, nos leva ao entendimento de ser uma Autarquia Bifronte ou “nullum vinculum”.

 

 

 

Bibliografia

 

 

 

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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Mandado de Segurança nº. 21.322. Brasília.

 

 

 

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª Edição. São Paulo: Atlas, 2004.

 

 

 

BRASIL. Lei nº. 8.906 de 04 de Julho de 1994. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 05 de Julho de 1994.

 



[1]Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Varginha - FADIVA;

Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho Latu Sensu;

Pós-Graduado em Direito Público Latu Sensu;

Advogado e Consultor Jurídico de Damasceno Caxilé - Escritório de Advocacia.

[2] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2004.

[3]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª edição. São Paulo: Atlas, 2009.

[4]BRASIL. Decreto-Lei 200 de 25 de Fevereiro de 1967. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasilia, 27 de Fevereiro de 1967, retificado em 17 de Julho de 1967.

[5]BRASIL. Decreto-Lei 200 de 25 de Fevereiro de 1967. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasilia, 27 de Fevereiro de 1967, retificado em 17 de Julho de 1967.

[6] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasilia, 5 de Outubro de 1988.

[7] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2004.

[8] Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 27ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2010.

[9] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasilia, 5 de Outubro de 1988.

[10] BRASIL. Decreto-Lei 200 de 25 de Fevereiro de 1967. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasilia, 27 de Fevereiro de 1967, retificado em 17 de Julho de 1967.

[11] Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. História da Ordem dos Advogados do Brasil. Acendido em 15 de Dezembro de 2011, em http://www.oab.org.br/historiaoab/index_menu.htm.

[12] Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. História da Ordem dos Advogados do Brasil. Acendido em 15 de Dezembro de 2011, em http://www.oab.org.br/historiaoab/index_menu.htm.

[13] CASTRO FILHO, José Olympio de. Prática Forense – Vol. 1. 4ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 1991.

[14] BORGES, André. “Ordem dos Advogados do Brasil. Regime Jurídico. A Natureza da Anuidade por Ela Cobrada. A Imunidade Tributária de seu Patrimônio”. Acendido em 15 de Dezembro de 2011, em http://www.profpito.com/oabregjuranuidade.html.

[15]EMENTA: RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – OAB – ANUIDADE – NATUREZA JURÍDICA NÃO-TRIBUTÁRIA – EXECUÇÃO – RITO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

1. A OAB possui natureza de autarquia especial ou “sui generis”, pois, mesmo incumbida de realizar serviço público, nos termos da lei que a instituiu, não se inclui entre as demais autarquias federais típicas, já que não busca realizar os fins da Administração.

2. As contribuições pagas pelos filiados à OAB não têm natureza tributária.

3. As cobranças das anuidades da OAB, por não possuírem natureza tributária, seguem o rito do Código de Processo Civil, e não da Lei n. 6.830/80. Recurso especial provido. (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial nº. 915.753-RS. Relator Ministro Humberto Martins. Brasília).

[16] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3.026. Brasília.

[17] "A Vinculação da OAB ao Ministério do Trabalho", in As Razões da Autonomia da Ordem dos Advogados do Brasil, OAB, Rio de Janeiro, 1975, pp. 59-60.

[18] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Mandado de Segurança nº. 21.322. Brasília.

[19]DI PIETROMaria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª Edição. São Paulo: Atlas, 2004.

[20]BRASIL. Lei nº. 8.906 de 04 de Julho de 1994. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 05 de Julho de 1994.

 

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