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Resumo:
Abordagens:
1. Controle Estatal sobre as Organizações Sociais
2. Controle das Organizações Sociais pelo Ministério Público
3. O Controle pelo Poder Judiciário
4. Controle da Sociedade sobre as Organizações Sociais
Texto enviado ao JurisWay em 12/08/2013.
Última edição/atualização em 19/08/2013.
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A origem das Organizações Sociais está relacionada à reforma da Administração Pública brasileira promovida, nos meados da década de 90, pelo Ministro da Administração e da Reforma do Estado, Luiz Carlos Bresser Pereira, e sua equipe. Essa reforma ensejou mudanças na Administração Pública como a descentralização dos serviços sociais.
Três décadas antes dessa reforma, conforme Maria Lídia Calou de Araújo e Mendonça, por meio do Decreto-Lei nº 200, de 1967, o governo militar já tentava superar a rigidez da burocracia brasileira permitindo o crescimento das autarquias e das empresas públicas e criando as sociedades de economia mista e as fundações. Seria um meio de dar autonomia à administração indireta, descentralizando planejamento, orçamento e controle de resultados, além de se adotar o regime da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, regime de direito privado, nas empresas públicas e nas sociedades de economia mista (MENDONÇA, 2008, p. 58).
Porém, a globalização econômica do final dos anos 80, exigiu políticas de ajustes macroeconômicos mais profundas que só se viabilizariam pela reforma do Aparelho do Estado, objetivando atrair o capital internacional. A nova lógica baseava-se num Estado reducionista mais preocupado com o aspecto gerencial e menos com o atendimento dos interesses da sociedade (MENDONÇA, 2008, p. 64).
Nesse contexto, a proposta reformadora do Estado foi apresentada no primeiro mandato do governo de Fernando Henrique Cardoso, a partir de 1995, pelo ministro Bresser Pereira, comandante dos demais intelectuais da Reforma, que distinguiu quatro setores dentro do Estado Brasileiro: 1) Núcleo Estratégico: composto pelos Três Poderes e pelo Ministério Público que definem as leis e as políticas públicas, cobrando o seu cumprimento; 2) Atividades Exclusivas: serviços que só o Estado pode realizar, fiscalizar, fomentar e regulamentar; 3) Serviços não-exclusivos: neles o Estado atua simultaneamente com organizações privadas; 4) Produção de bens e serviços para o mercado: área de atuação das empresas que permanecem no aparelho do Estado, mas se dedicam às atividades econômicas voltadas para o lucro. A idéia era de: a) fortalecer o núcleo estratégico mediante capacitação técnica e plano de cargos; b) criar agências executivas e regulatórias para o setor de atividade exclusiva do Estado; c) privatizar o setor destinado às atividades de produção; d) tornar públicas as atividades não-exclusivas do Estado por meio da criação das Organizações Sociais, regidas por um contrato de gestão (MENDONÇA, 2008, p. 68).
Sendo assim, as organizações sociais foram implantadas nesse contexto de reforma institucional e de gestão e para elas seriam transferidos os serviços não-exclusivos do Estado juntamente com as competências dos órgãos e pessoas estatais para se obter maior autonomia e flexibilização, sem deixar de responsabilizar os seus dirigentes. O Estado continuaria a financiar as atividades públicas, mas elas seriam absorvidas pelas Organizações Sociais que seriam responsáveis pelos resultados pactuados no contrato de gestão (MENDONÇA, 2008, p. 70).
No raciocínio de Bresser Pereira, o espaço público é mais amplo que o estatal, uma vez que o público pode ser estatal e não-estatal. Pode-se dizer também que nem todas as atividades instituídas pelo Estado são públicas, porque dependem do regime jurídico adotado, se público ou privado. Dessa forma, as organizações sociais localizam-se na esfera pública não-estatal que, segundo Bresser, não significa a privatização das atividades do Estado, mas, ao contrário, tem o objetivo de ampliar o caráter democrático e participativo da esfera pública, subordinado a um direito público ampliado e renovado (MENDONÇA, 2008, p. 88)
Posteriormente, foi criada a Lei 9637, em 15/05/1998, resultado do projeto de conversão da Medida Provisória 1647, disciplinando as entidades denominadas de Organizações Sociais.
Essas entidades, de acordo como o Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, estão submetidas a três mecanismos de controle: o estatal, o realizado pelo mercado e o efetuado pela sociedade civil. O controle estatal é o mecanismo mais geral de controle e é exercido pelo fato de as organizações sociais estarem subordinadas ao sistema jurídico constituído por normas legais e à avaliação de desempenho de acordo com os critérios estabelecidos no contrato de gestão. Em relação ao controle realizado pelo mercado, conclui-se que está fundamentado na competição, ou seja, é através da concorrência que se obtém os melhores resultados, com menores custos. Na visão do Plano Diretor, os serviços serão mais eficientemente realizados se, mantendo-se o financiamento do Estado, forem realizados pelo setor público não-estatal. Já o controle exercido pela sociedade civil tem a ver com os grupos sociais que tendem a se organizar para defender interesses particulares, corporativos ou o interesse público. Além disso, outra maneira de controle seria por meio de participação no Conselhos de Administração da Organização Social, cujos membros são recrutados na comunidade à qual a organização serve (PLANO DIRETOR, 1995, pp. 54, 61 e 63).
No presente trabalho, em razão de sua vocação jurídica, não refletiremos sobre o controle exercido pelo mercado sobre as organizações sociais, sendo este conteúdo pertinente às ciências que se preocupam com a prática da gestão e a competitividade.
No presente estudo, enfocaremos as formas de controle exercidas sobre as Organizações Sociais, realizadas:
a) pelo Estado: por meio de órgãos supervisores da administração direta e de órgãos auxiliares como o Tribunal de Contas;
b) pelo Ministério Público: importante aliado do interesse público na fiscalização do seu interesse;
c) pelo Poder Judiciário: em relação aos atos administrativos que são passíveis de serem acionados na esféra judiciária;
d) pela Sociedade: quando o cidadão comum, no pleno gozo de seus direitos políticos, propõe ação popular.
Segundo França (2010, p.81), a máquina estatal, por determinação constitucional, está sujeita a um efetivo controle do Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas, do Ministério Público, da sociedade e do Judiciário, sem considerar o mister de zelar pela excelência de sua própria atuação, conforme o obrigatório exercício do autocontrole. Portanto, é essencial a existência de órgãos de controle legitimamente constituídos que atuem harmonicamente de maneira a vigiar, guiar e corrigir a conduta da Administração Pública.
Conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
“A finalidade do controle é a de assegurar que a Administração atue em consonância com os princípios que lhe são impostos pelo
ordenamento jurídico, como os da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação, impessoalidade; em determinadas circunstâncias,
abrange também o controle chamado de mérito e que diz respeito aos aspectos discricionários da atuação administrativa.”[1]
O controle da legalidade da administração não é, afinal, monopólio ou privilégio de ninguém. Dele compartilham os vários poderes do Estado. Dele se utiliza qualquer do povo quando ferido em seu direito ou em interesse legítimo. O culto à liberdade não se coaduna com a tolerância ao arbítrio ou o aceno à violência (FRANÇA, 2010, 82).
1. Controle Estatal sobre as Organizações Sociais
É determinação da Constituição Federal que o Congresso Nacional controle os atos da Administração Pública (artigo 49, X, CF/88).
Isto significa que a atividade executiva do Estado não tem a faculdade de operar à revelia do Congresso Nacional, devendo assim, a Administração prestar informações e esclarecimentos de sua atividade sempre e quando foi requerido.
Phillip Gil França arremata:
"Em respeito ao princípio da tripartição de poderes do Estado, não há uma relação hierarquizada entre os dois poderes, executivo e legislativo. O controle exercido é restrito à consonância do ato administrativo exarado com a sua respectiva norma legal provedora, sendo exercido basicamente de duas formas: a) controle direto de legalidade dos atos da Administração pelo Congresso Nacional – controle de legalidade; b) fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da Administração Pública, sendo exercido com o auxílio do Tribunal de Contas – controle financeiro.”[2]
Nessa linha de pensamento, o artigo 70 da Constituição Federal de 1988 estabelece que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação de subvenções e renúncia de receitas será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema interno de cada Poder. Desta forma, a Constituição Federal apresenta duas formas de controle: a) o interno: seja pelo próprio Poder, por meio do autocontrole ou, mais especificamente, pelo Congresso Nacional, no que tange ao controle da legalidade; b) o externo: também exercido pelo Congresso Nacional, mas com o auxílio do Tribunal de Contas.
O controle interno restringe-se, via de regra, a um controle de legalidade e tem índole preventiva. Desenvolve-se no âmbito da Administração direta, em razão da desconcentração e da subordinação hierárquica. Abrange também os concessionários e permissionários de serviços públicos por exercerem atividades delegadas pela Administração na forma da Constituição e das leis específicas (MENDONÇA, 2008, p. 148).
Já o controle externo está confiado ao Congresso Nacional com o auxilio do Tribunal de Contas (artigo 71, caput, CF/88). Os incisos I a XI do artigo 71, CF/88, elencam competências que são atribuídas exclusivamente ao Tribunal de Contas.
O Tribunal de Contas tem como mister a verificação técnica dos dispêndios e investimentos da Administração Pública. O Controle exercido pelo Tribunal de Contas deve ser acolhido como meio operacional voltado a afastar a análise subjetiva dos atos administrativos:
As contas, a adequação entre o recebido e o gasto; a correição do dinheiro público empregado de acordo com políticas de Estado factíveis, impessoais e com verdadeiras finalidades de atingir o maior bem comum possível devem ser feitas por um órgão técnico, como o Tribunal de Contas. Este possui atribuições que o caracteriza como ente controlador da Administração dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Deste modo, em que pese seu vínculo ao Poder Legislativo, não se observa qualquer hierarquia na relação com essa função do Estado, em virtude da natureza de fiscalização imparcial de suas atividades. Não ocorre imaginar a atuação global da Administração sem a segurança da fiscalização imparcial exercida pelo Tribunal de Contas (...) Sua performance é crucial para a manutenção da estabilidade do Estado. Sem o selo de regularidade concedido pelo Tribunal de Contas, o cenário econômico do país tornar-se-ia instável o suficiente para inviabilizar as relações obrigacionais essenciais para a manutenção de um Estado Democrático do Direito. ”[3]
O controle exercido pelo Legislativo é, portanto, auxiliado por relatórios técnicos do Tribunal de Contas. De acordo com Maria Lírida Calou:
“O constituinte de 1988 repartiu a competência para o controle contábil, financeiro, orçamentário, patrimonial e operacional da Administração Pública a dois órgãos estatais: o Poder Legislativo e o Tribunal de Contas. Quando o Poder Legislativo atua nessa área o faz com o auxílio do Tribunal de Contas que, por sua vez, recebeu do constituinte competências que lhe são próprias e exclusivas.”[4]
De acordo com o artigo 4º da Lei 9637/98, as organizações sociais estão sujeitas aos controles contábil-financeiro, legislativo e administrativo. O controle contábil-financeiro é realizado pelo Tribunal de Contas que o pratica da mesma forma que sobre as demais instituições que utilizam recursos públicos.
O principal instrumento de controle sobre as organizações sociais é, sem dúvida, o contrato de gestão. No contrato de gestão constam cláusulas necessárias por expressa disposição legal que versam sobre as metas, os indicadores de produtividade, os prazos para a execução das metas estabelecidas, os critérios para a avaliação de desempenho, as condições de revisão, suspensão e rescisão do contrato, as penalidades sobre os administradores que descumprem cláusulas contratuais, etc..
O controle sobre o contrato de gestão pode ser interno e externo.
O controle sobre o contrato de gestão pode ser interno por meio de supervisão, intervenção, procedimentos preventivos, auditorias, etc., conforme respalda o artigo 70 da CF/88.
O artigo 8º, caput, da Lei 9637/98, reforça a premissa de que há necessidade de controle a ser desempenhado pelas autoridades supervisoras da área de atuação das organizações sociais, com base no contrato de gestão. O §1º, do referido artigo, diz que a entidade qualificada apresentará ao órgão ou entidade do Poder Público, supervisora e signatária do contrato, ao término de cada exercício ou a qualquer momento, conforme recomende o interesse público, relatório pertinente à execução do contrato de gestão, contendo comparativo específico das metas propostas com os resultados alcançados, acompanhado da prestação de contas correspondente ao exercício financeiro. O §2º diz que os resultados atingidos com a execução do contrato de gestão devem ser analisados, periodicamente, por comissão de avaliação, indicada pela autoridade supervisora da área correspondente, composta por especialistas de notória capacidade e adequada qualificação.
Da mesma forma, o contrato de gestão feito com uma organização social também se sujeita a todas as formas de controle externo previstas constitucionalmente, incluindo as comissões parlamentares de inquérito, sustação de contrato, pedido de informação, convocação de autoridade, etc. (artigo 70, caput, e artigo 71, CF/88).
O artigo 9º, Lei 9637/98, determina que os responsáveis pela fiscalização da execução do contrato de gestão, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade na utilização de recursos ou bens de origem pública pela organização social, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.
Cabe lembrar que o Tribunal de Contas da União firmou o entendimento de que as contas anuais das organizações sociais serão nele julgadas. Nesse sentido, reivindica a decisão nº 592/1998, em sede de Mandado de Segurança, que estabelece que: “... as contas anuais das entidades qualificadas como organizações sociais, relativamente ao contrato de gestão, são submetidas a julgamento pelo Tribunal, nos termos do parágrafo único do artigo 70 da Constituição Federal.”
2. Controle das Organizações Sociais pelo Ministério Público
O Ministério Público, que é uma instituição imprescindível para a manutenção da ordem jurídica e para a proteção do interesse público, tem o dever de fiscalizar todos os atos administrativos (FRANÇA, 2010, p. 100).
Para cumprir o seu mister, o Ministério Público utiliza-se de ferramentas constitucionais que possui titularidade como a ação civil pública e o inquérito civil, utilizados para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (artigo 129, III, CF/88).
Segundo o artigo 127, caput, da CF/88, cabe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
A extensão da atividade de controle da Administração pelo Ministério Público pode ser retratada na redação do artigo 10º da Lei 7347/85 (Lei da ação civil pública): “Constitui crime, punido com pena de reclusão de um a três anos, mais multa de dez a mil obrigações reajustáveis do tesouro nacional – ORTNs, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério Público.”
França (2010, p. 102), afirma que, assim como a ação civil pública, a figura do inquérito civil público se apresenta como instrumento hábil para o levantamento de informações acerca da devida correlação da atuação da entidade pública com as respectivas finalidades e determinações legais.
Segundo o artigo 6º, VII, da LC 75/93 e artigo 8º, §1º, da Lei 7347/85, regulamentado no âmbito do Ministério Público Federal (Conselho Superior do MPF) pela Resolução 87/2006, o inquérito civil “é um procedimento investigatório, instaurado e presidido pelo Ministério Público, destinado a apurar a ocorrência de fatos que digam respeito ou acarretem danos efetivos ou potenciais a interesses que lhe incumba defender, servindo como preparação para o exercício das atribuições inerentes às suas funções institucionais. Contudo, não é condição de procedibilidade para o ajuizamento das ações em que o Ministério Público é titular.”
Cabe ressaltar que o Ministério Público não tem legitimidade para ingressar com ação popular, porém compete-lhe, nos termos da Lei nº 4717/65 (Lei da Ação Popular): 1) acompanhar a ação popular, cabendo apressar a produção da prova (artigo 6º, § 4º); 2) promover a responsabilidade civil ou criminal (artigo 6º, § 4º); 3) promover o prosseguimento da ação em caso de desistência (artigo 9º); 4) executar a sentença no caso de inércia do autor (artigo 16); 5) recorrer da sentença proferida contra o autor (artigo 19, § 2º).
Hugo Mazilli (1995, p. 95), também enaltece o papel do Ministério Público na defesa do patrimônio público, afirmando ser um munus previsto na Constituição Federal que confere iniciativa ao MP para acionar quando: a) houver necessidade de intervir na defesa do patrimônio público; b) o Estado não tomar a iniciativa de responsabilizar o administrador anterior ou em exercício que tenha causado danos ao patrimônio público; c) por razões de moralidade administrativa, seja necessário anular algum ato ou contrato administrativo.
Sendo assim, ao Ministério Público também cabe exercer controle sobre os contratos de gestão das organizações sociais. O inciso II, do artigo 129, da CF/88, diz que entre as funções institucionais do Ministério Público está a de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias para a sua garantia.
Esse posicionamento é o do artigo 10, caput, da lei 9637/98, que determina que quando assim exigir a gravidade dos fatos ou o interesse público, havendo indícios fundados de malversação de bens ou recursos de origem pública, os responsáveis pela fiscalização representarão ao Ministério Público, à Advocacia-Geral da União ou à Procuradoria da entidade para que requeira ao juízo competente a decretação da indisponibilidade dos bens da entidade e o seqüestro dos bens dos seus dirigentes, bem como de agente público ou terceiro, que possam ter enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público.
3. O Controle pelo Poder Judiciário
O poder de apreciação da legalidade de qualquer ato da Administração Pública pelo Judiciário é determinação constitucional. Logo, não se questiona a possibilidade de controle de tais atos.
Desta maneira, ao Judiciário cabe verificar a consonância do ato administrativo com a respectiva disposição legal que o embasa, ou seja, é de sua competência a análise de critérios objetivos do ato administrativo conforme a sua prescrição em lei (análise do ato administrativo vinculado à disposição legal).
Da mesma forma, é opinião da jurisprudência majoritária que o Judiciário pode interferir na análise de critérios subjetivos, critérios de conveniência e oportunidade, do ato emanado do ente do Poder Executivo, revisando o mérito motivador do ato administrativo (análise do ato discricionário).
Nos atos administrativos em que a Administração tem competência discricionária, o Poder Público pode escolher o caminho a seguir segundo critérios de conveniência e oportunidade. Em outros termos, nessa situação, a autoridade poderá optar por uma dentre várias soluções possíveis, todas válidas perante o Direito (DI PETRO, 2010, p. 212).
Em relação a esses atos, “o controle judicial é possível, mas terá que respeitar a discricionariedade administrativa nos limites em que ela é assegurada à Administração pública pela lei.”[5]
Conforme Rocha (2006, p. 127), nos atos discricionários existem elementos regrados (existência e extensão do poder, competência do órgão, forma e procedimento, finalidade, prazo, etc.) cujo exame permite um primeiro controle externo da regularidade do exercício da competência discricionária.
Pode-se dizer, portanto, que o Judiciário pode apreciar a legalidade dos atos discricionários verificando se a Administração ultrapassou os limites da discricionariedade estabelecida. Nesse espírito, algumas teorias têm surgido para ampliar a possibilidade de apreciação dos atos discricionários pelo Judiciário. Segundo Di Pietro (2010, p. 218), são elas:
a) teoria do desvio de poder: o desvio de poder ocorre quando a autoridade usa o poder discricionário para atingir uma finalidade diferente daquela que a lei fixou. Quando isso ocorre, o Poder Judiciário está autorizado a decretar a nulidade do ato;
b) teoria dos motivos determinantes: quando a Administração indica os motivos que a levaram a praticar o ato, este somente será válido se os motivos forem verdadeiros. Nesse caso, o Judiciário examinará a veracidade dos motivos para anulá-lo ou não.
Como se verifica, há uma tendência na doutrina de ampliar o alcance da apreciação do Poder Judiciário, não para invadir a discricionariedade administrativa, mas para colocá-la em seus devidos limites e impedir arbitrariedades (DI PIETRO, 2010, p. 219).
Agora, em relação aos atos administrativos vinculados, aqueles em que diante de determinados requisitos a lei não deixa opções e a Administração deve agir exatamente como expressa o dispositivo legal, cabe ao Judiciário examinar a conformidade do ato com a lei para anulá-lo, caso essa conformidade não tenha existido.
4. Controle da Sociedade sobre as Organizações Sociais
Na idéia de república, a res publica (coisa pública) deve ser verificada, valorizada e protegida pelo seu povo, pelo fato de ser o titular da coisa tutelada pelo Estado. A sociedade deve atuar nas primeiras trincheiras de defesa daquilo que é comum, da execução e gerenciamento das atividades estatais e de toda a ação do Estado que, de alguma forma, reflete em suas vidas. Destarte, o controle social da Administração desponta como a atividade proativa de quem é cidadão e é arma importante na luta contra o desvio de poder (FRANÇA, 2010, p. 104-105).
Adriana da Costa R. Schier diz que, por meio do direito de reclamação, o cidadão efetiva o princípio do Estado de Direito:
“O direito de reclamação, previsto no artigo 37,§3º, I, da Constituição Federal de 1988, apresenta-se como uma espécie de direito de participação, especificamente em relação à sua dimensão concretizadora do Estado de Direito e, através dele, os cidadãos são legitimados para exercer o controle da atividade administrativa na prestação dos serviços públicos.”[6]
Além disso, como forma de se antecipar ao direito de reclamação do cidadão, a Administração deveria instaurar a prática de consulta ao povo sobre os seus passos, por meio de audiências públicas, que é um importante instrumento para a concretização do ideário democrático estabelecido na Constituição de 1988. Phillip Gil França diz que:
“As audiências públicas, de origem anglo-saxônica, como processo de participação popular, proporcionam o aperfeiçoamento da legitimidade das decisões da Administração Pública, decorrente da exposição de tendências, preferências e opções por parte da população, as quais devem conduzir as decisões e atuação do Poder Público a uma maior aceitação social.”[7]
Independentemente da iniciativa da Administração, a Constituição de 1988, diante da violação ou ameaça a direitos e liberdades do cidadão, por ato ou inércia da atividade estatal, apresenta remédios fundamentais como habeas corpus, mandado de segurança individual ou coletivo, ação popular, ação civil pública, habeas data, mandado de injunção, etc..
Especificamente, em matéria de controle da sociedade sobre as organizações sociais, deve-se observar a possibilidade do cidadão comum utilizar-se do instituto da ação popular, cuja dicção está prevista no artigo 5º, LXXIII, da Constituição Federal, que estabelece que: “Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural ...”
Segundo Siqueira Jr. (2010, p.521), a ação popular é o instrumento colocado à disposição do cidadão como meio para a sua efetiva participação política, tendo por finalidade a defesa da cidadania. Em outro momento, afirma que a ação popular tem por finalidade implementar a participação política nos negócios do Estado por meio da fiscalização da administração pública.
Segundo Hely Lopes Meirelles:
“A ação popular é o meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos, ou a estes equiparados, ilegais e lesivos do patrimônio federal, estadual e municipal, ou de autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiro público.”[8]
A competência para processar e julgar a ação popular é determinada pela origem do ato a ser impugnado, ou seja, se o ato é praticado pela União, a competência é da Justiça Federal, se pelo Estado ou Distrito Federal, a competência é da Justiça Estadual e assim por diante. O artigo 5º, § 1º, da Lei n
º 4717/65 (Lei da Ação Popular), diz que “para fins de competência, equiparam-se a atos da União, do Distrito Federal, do Estado ou dos Municípios os atos das pessoas criadas ou mantidas por essas pessoas jurídicas de direito público, bem como os atos das sociedades de que elas sejam acionistas e os das pessoas ou entidades por elas subvencionadas ou em relação às quais tenham interesse patrimonial”.
Conforme o artigo citado, a legitimidade passiva da ação popular recai sobre qualquer entidade de que o Estado participe. A leitura do artigo 6º, da Lei 4717/65, revelará que a ação deve ser proposta em face da entidade lesada, os autores e participantes do ato administrativo e os beneficiários.
Interessante é que a Constituição estabelece que qualquer cidadão pode ingressar com ação popular, isto é, aquele que se encontrar no pleno gozo de seus direitos políticos.
A ação popular tem por objeto invalidar ato lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural. Os direitos requeridos na ação popular são de caráter cívico-administrativo, buscando trazer a Administração aos limites da legalidade e a restaurar o patrimônio público do desfalque sofrido (MEIRELLES, 1995, p. 95).
Bibliografia:
Livros:
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23 ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010.
FRANÇA, Phillip Gil. O Controle da Administração Pública. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2010.
MAZILLI, Hugo. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. 7 ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 1995.
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança. 16 ed. atual. São Paulo: Malheiros, 1995.
MENDONÇA, Maria Lírida Calou de Araújo e. As Organizações Sociais entre o Público e o Privado: Uma Análise de Direito Administrativo. Fortaleza: UNIFOR, 2008.
ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor, 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.
SHIER, Adriana da Costa R.. A participação popular na Administração Pública: o direito de reclamação. São Paulo: Renovar, 2002.
SIQUEIRA JR. Paulo Hamilton. Direito Processual Constitucional. 4 ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2010.
Documento:
Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado pela Câmara da Reforma do Estado, Brasília, 1995. Presidente da Republica: Fernando Henrique Cardoso.
[1]Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito Administrativo. 23 ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010, p. 729
[2] Phillip Gil França. O Controle da Administração Pública. 2ª ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2010, p. 89-90.
[4]Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça. As Organizações Sociais entre o Público e o Privado: Uma Análise de Direito Administrativo. Fortaleza: UNIFOR, 2008, p. 147.
[5] Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito Administrativo. 23 ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010, p. 217.
[6] Adriana da Costa R. Shier. A participação popular na Administração Pública: o direito de reclamação. São Paulo: Renovar, 2002, p. 251.
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