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Análise de Obra Filosófica: O Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, de Jean-Jacques Rousseau.


Autoria:

Helen Cristina Dibout Da Silva Perdiza


Formada em Direito pela FAAT Faculdades Atibaia, graduanda em Filosofia pela USP e pós graduanda em Direito Constitucional pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus. Advogada.

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Texto enviado ao JurisWay em 19/08/2013.



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Jean-Jacques Rousseau escreveu o Discurso Sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens após decidir concorrer ao prêmio da Academia de Dijon, que propôs a seguinte questão: "Qual a origem da desigualdade entre os homens e será ela permitida pela lei natural?". Para tanto, Rousseau deixou Paris e foi para perto de uma floresta em Saint-Germain.

 

Na dedicatória do Discurso, que é dirigida à República de Genebra, Rousseau expõe os motivos que o levaram a dedicar a obra. A República de Genebra é o Estado mais perfeito que existe, como podemos verificar a seguir:

 

" Procurando as melhores máximas que o bom senso possa ditar acerca da constituição de um Governo, fiquei tão impressionado de vê-las todas em execução no vosso, que, mesmo sem ter nascido dentro de vossos muros, teria acreditado não poder isentar-me de oferecer este quadro da sociedade humana àquele, dentre todos os povos, que me parece possuir as suas maiores vantagens e melhor ter prevenido os seus abusos". (ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Tradução de Lourdes Santos Machado. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p.33).

 

O Discurso é dividido em primeira e segunda parte, contendo algumas páginas preliminares. nestas páginas que antecedem a primeira parte, Rousseau expõe o tema de que irá escrever. Faz distinção entre desigualdade natural ou física da desigualdade moral e política. Procura evidenciar que o Discurso é o estudo de como se deu o desenvolvimento do homem desde seu estado natural até a vida em sociedade. No último parágrafo, dirige-se diretamente ao homem, dizendo que contará sua história de acordo com a natureza, porque tudo o que está nela é verdadeiro. Evidencia que o homem do estado natural está distante do homem que conhecemos (o homem que convive em sociedade). Expressa ainda o descontentamento diante do estado em que o homem se encontra e afirma que em certo momento desejaria o homem ter parado ou quem sabe retroagir.

 

Na primeira parte do Discurso, Rousseau faz a descrição do homem e do ambiente em que vive no estado natural. Descreve seu aspecto físico, dizendo que o homem do estado natural é robusto, seu corpo é o único instrumento que tem para lutar por sua sobrevivência. Destaca as necessidades deste homem selvagem, quais sejam, "alimentação, uma fêmea e o repouso; os únicos males que teme, a dor e a fome".( Idem, p.66).

 

O corpo é o único instrumento que o homem do estado natural possui porque, para Rousseau, neste estágio tão primitivo, o homem apanhava os frutos que estavam ao alcance das mãos; no estado natural não era preciso que o homem se utilizasse de um galho ou qualquer outro instrumento para alimentar-se ou defender-se, pois se assim o fizesse, não estaria mais no estado natural. 

 

A necessidade da fêmea advém daquilo que, páginas adiante, Rousseau chamará de "paixão perigosa”: "Entre as paixões que agitam o coração do homem, há uma ardente, impetuosa, que torna um sexo necessário ao outro, paixão tremenda que enfrenta perigos, anula todos os obstáculos e que, nos seus furores, parece capaz de destruir o gênero humano, a cuja conservação se destina". (Idem, p.79).

 

Na página 69, Rousseau descreve a sexualidade do homem no estado natural: "(...) os machos e as fêmeas uniam-se fortuitamente segundo o acaso, a ocasião e o desejo, sem que a palavra fosse um intérprete necessário das coisas que tinham a dizer-se, e separavam-se com a mesma facilidade".

 

Mais adiante, Rousseau distingue o amor do desejo físico: o amor é um sentimento moral, uma convenção da sociedade utilizada muito bem pelas mulheres, “que visam estabelecer seu império e tornar dominante o sexo a que deviam obedecer”. (Idem, p.80). Afirma que o homem selvagem é in capaz de ter tal sentimento por causa de sua condição de pouco desenvolvimento, não sendo capaz de “engendrar ideias abstratas de regularidade e de proporção” (Idem, p.80), que não é capaz de ter sentimentos de admiração e amor, apenas obedece aos desejos e suas necessidades físicas, ou seja, “qualquer mulher lhe convém”. (Idem, p.80)

 

Descreve ainda o ambiente em que o homem do estado natural vive: natureza abundante, muitos frutos, muita água. Afirma que o homem não se assusta diante da abundância da natureza. Descreve a vida cotidiana, que consistia em alimentar-se, fugir ou lutar com bestas ferozes, cuidar da prole e dormir. Aliás, para Rousseau o homem selvagem passava a maior parte do tempo dormindo e que teria sono leve, isso porque como o homem pensava pouco “dormia todo o tempo em que não estava pensando”. (Idem, p.63).

 

Em algumas partes da primeira parte do Discurso, Rousseau observa como a mãe cuidava de seus filhos. Destaca que o corpo da mãe lhe dava mais facilidade para alimentar e proteger sua prole se comparada às fêmeas de outras espécies. Que cuidavam de seus filhos até que estes pudessem ser capazes de garantir sua própria subsistência.

 

Outro ponto importante consiste em descobrir a origem das línguas, como teria surgido a comunicação entre os homens no estado natural. Observa que o primeiro sinal de comunicação era o que chamou de “grito da natureza”, que consistia em um grito produzido pelo homem por uma espécie de instinto, em situações excepcionais como para pedir socorro ou quando sentia dores, não sendo muito comum seu uso durante a vida. Logo após, os homens começaram a utilizar-se das inflexões de voz e gestos para designar objetos. Acreditava que, no início, as palavras tinham uma extensa significação: “(...) ignorando a divisão do discurso em suas partes constitutivas, os homens, a princípio, deram a cada palavra o sentido de uma proposição inteira”. (Idem, p. 71). Depois vieram os substantivos, que Rousseau supõe que os primeiros a terem surgido sejam os nomes próprios, e que os verbos eram utilizados no presente do infinitivo; por último, teriam surgido os adjetivos por causa da dificuldade de se conceber uma ideia abstrata (já que adjetivos são ideias abstratas).

 

Rousseau argumenta sobre a impossibilidade das línguas terem surgido das relações familiares, em especial da relação entre mãe e filho. Considera que o filho tinha mais necessidade de se expressar  do que a mãe para com o filho. Logo imaginou que se o filho expressava algum som ou gesto, estes eram entendidos pela mãe, o que só aumenta o problema visto que existiriam tantas línguas quanto indivíduos. Além do mais, o fato do filho se separar da mãe após aprender a sobreviver sozinho torna impossível a transmissão desta língua à outros de sua espécie.

 

Percebendo o nível de complexidade do tema, Rousseau encerra a argumentação sobre a origem das línguas, deixando para outros (quem sabe o leitor) “(...) a discussão desse problema difícil de saber o que foi mais necessário - a sociedade organizada quando se instituíram as línguas, ou as línguas já inventadas quando se estabeleceu a sociedade”. (Idem, p. 74)

 

Quando Rousseau descreve o homem do estado natural do ponto de vista moral, destaca dois princípios: o instinto de conservação de si mesmo (o amor próprio ou o amor de si) e a piedade natural.

 

O princípio de conservação natural é o que leva o homem a se conservar. É o desejo simples de viver. É este princípio que mantém o estado de natureza. Rousseau faz um paralelo com a teoria de Hobbes que afirma que o comportamento das crianças é o mesmo do homem no estado natural. Rousseau se recusa a acreditar que na criança há o estado natural por causa da ausência da razão. Também explica que não há relação moral entre os homens, nem vícios, nem virtudes e afirma que a regra do bem e do mal só existe no estado civil e não no estado de natureza.

 

Já o princípio de piedade natural é a capacidade do homem que o leva a experimentar a repugnância diante da dor de outro ser sensível. Declara que tal princípio encontra-se no instinto materno e em outros animais. A piedade natural é um sentimento de repugnância ao ver a dor de outro ser e não a capacidade de se colocar no lugar do outro; isso não é possível porque o homem natural não tem essa racionalidade. O texto de Rousseau tende a escapar desta crítica.

 

Segundo Rousseau, o que distingue o homem do animal é sua perfectibilidade: apenas o home é capaz de aperfeiçoar-se com a ajuda das circunstâncias e assim desenvolver-se sucessivamente; já o animal aprende nos primeiros meses de sua existência aquilo que será por toda a vida. Rousseau utiliza o argumento da perfectibilidade no início da primeira parte e no final, tratando de fazer uma espécie de anúncio do que vai ser tratado na segunda parte:

 

“Depois de ter mostrado que a perfectibilidade, as virtudes sociais e as outras faculdades que o homem natural recebera potencialmente jamais poderão desenvolver-se por si próprias, (...) resta-me considerar e aproximar os vários acasos que puderam aperfeiçoar a razão humana, deteriorando a espécie, tornar mau um ser ao transformá-lo em um ser social e, partindo de tão longe, trazer enfim o homem e o mundo ao ponto em que o conhecemos”. (Idem, p. 84).

 

Na segunda parte do discurso, afirma que o fundador da sociedade civil foi aquele que primeiro cercou a terra e disse “Isto é meu.” Aponta o surgimento da propriedade como a principal causa de desigualdade entre os homens. Após fazer esta primeira consideração, relembra a primeira parte em seus principais aspectos: começa a introduzir no contexto da vida do homem do estado natural os primeiros progressos, que para Rousseau, nasceram das dificuldades do meio natural, em especial por causa dos animais. Tais progressos consistiam em exercícios do corpo, na descoberta de armas, como pedras e galhos, e nas primeiras disputas entre homens para proverem a subsistência.

 

Os progressos foram reforçados pela rápida multiplicação dos homens que agora viviam em várias partes da terra. O homem que teve de se adaptar às estações do ano, o que o levou a descobrir a pesca, a caça e o fogo. Essas descobertas advinham das novas percepções pelas quais o homem estava submetido. Também destaca que o homem tinha consciência de sua superioridade em relação aos outros animais surgindo o sentimento de orgulho, e que agora era claro para o homem que os outros de sua espécie pensavam e agiam como ele.

 

Percebendo haver reciprocidade uns com os outros, o homem passou a estabelecer os primeiros compromissos mútuos, advindos do interesse comum. Foi desta maneira também que o homem passou a comunicar-se com os outros homens de forma mais contínua, com gritos, gestos e sons imitativos, obtendo línguas particulares, porém imperfeitas.

 

Neste ponto, Rousseau decide dar um “salto nos séculos” (Idem, p. 90) para explicar o estabelecimento das famílias. Para tanto, temos a idade do ouro, no qual os primeiros progressos trouxeram a habitação que teve três consequências: a constituição das famílias, a constituição de uma primeira forma de propriedade e o desenvolvimento psicológico do homem com o aparecimento de sentimentos como o amor entre família.

 

Agora os homens estavam preocupados em utilizar seu tempo para aperfeiçoar a linguagem, estabelecer relações com outros homens e com pequenas relações de vizinhança. Neste ponto temos a juventude do mundo: uma espécie de meio termo entre o estado natural e a sociedade. Também é neste ponto que temos a moralidade como policiamento dos costumes e punição dos contraventores.

 

Após vários homens terem cercado suas terras, há a existência da primeira grande desigualdade: aqueles que tinham terras eram os ricos e os que não tinham os pobres. Essa desigualdade trouxe muitos conflitos, pois os pobres também necessitavam de alimento e os que tinham terras não permitiam a retirada de seus frutos. Como outra forma de sobrevivência, apareceram os primeiros trabalhadores com o desenvolvimento da metalurgia e da agricultura. Tais atividade ofereciam instrumentos que eram trocados  por outros objetos ou alimentos. Desta forma, a igualdade desapareceu, o trabalho tornou-se obrigatório e necessário à sobrevivência.

 

Com o desaparecimento da igualde, e a divisão entre ricos e pobres, os homens começaram a ter outros sentimentos como a ambição, a rivalidade de interesses e a dominação universal.

 

Os ricos, que logicamente não queriam perder suas propriedades e percebendo que a força já não bastava para legitimar sua posse, criaram, segundo Rousseau, as primeiras regras de justiça, as leis, para a proteção do patrimônio. Tais regras eram muito mais vantajosas aos ricos do que aos pobres, pois estes não tinham nada a perder. Aliás, para Rousseau a riqueza é, dentre as distinções civis entre os particulares, a que mais gera desigualdade porque com o dinheiro pode-se comprar todas as outras coisas que farão deste homem diferente dos demais: mérito, os títulos de nobreza, o reconhecimento, as propriedades, etc.

 

Após as regras vieram os magistrados, criando agora a desigualdade entre os poderosos e os fracos. Os magistrados surgiram como um segundo pacto por causa da insuficiência do primeiro pacto, que era a sociedade, criando então o governo. O governo foi formado por escolha dos homens que elegeram pessoas que eram respeitadas, provavelmente os mais velhos e experientes. Mas no governo as desigualdades continuam: quando apenas um domina temos a monarquia; quando são alguns, a aristocracia; e quando prevalece a maioria, a democracia. Tais governos são suscetíveis de corrupção, que nos leva ao despotismo.

 

Rousseau descreve como se deu o declínio das formas de governo, exemplifica com o Senado de Roma que era composto por aristocratas (governo dos melhores, governo de poucos).

 

O autor ainda afirma que o déspota só é senhor enquanto for o mais forte, assim a própria força pode derrubá-lo.

 

Com o despotismo fecha-se o círculo da evolução, e temos a sociedade do ponto de vista de Rousseau: “(...) o direito do mais forte vence; a moralidade reduz-se a uma obediência cega; não existe mais virtude de costumes, nem noção do bem. Um tal estado legitima todas as revoluções”. (Idem, p. 25).

 

 

 

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