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Regime de Sobreaviso e utilização de celular corporativo - Uma análise jurisprudencial, legal e doutrinária.


Autoria:

Patrícia Mendanha Dias


Estudante de direito da Faculdade Pitágoras de Belo Horizonte. Assistente jurídica.

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Texto enviado ao JurisWay em 08/04/2013.

Última edição/atualização em 11/04/2013.



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Resumo

O presente trabalho visa à explanação e confrontação dos entendimentos do Tribunal Superior do Trabalho, da jurisprudência esparsa e da legislação aplicável ao regime de sobreaviso, bem como sua aplicabilidade ao empregado que permanece à disposição da empresa por intermédio de telefone celular.

 

Intenta-se discutir o entendimento em voga mais acertado para a questão apresentada, face às hipóteses concretas postas em juízo.

 

Palavras-chave: Sobreaviso. Jurisprudência. Celular Coorporativo.

 

1.            INTRODUÇÃO

 

A complexidade das relações interpessoais com o advento do mundo globalizado e tecnológico acarreta importantes implicações na esfera do Direito do Trabalho, principalmente no que toca a subordinação do empregado ou empregador por tempo determinado, sendo vedada qualquer forma de exploração da mão de obra laboral.

 

Nesta situação, o regime de sobreaviso, originalmente aplicável aos empregados de estrada de ferro[1], atualmente recebe interpretação extensiva quanto à sua aplicabilidade em situações diversas àquelas a lei prefacialmente quis proteger.

 

Este trabalho pretende demonstrar as diversas faces do regime de sobreaviso, notadamente à luz das últimas decisões do Tribunal Superior do Trabalho e pela análise dos casos concretos postos em Juízo.

2.            CONTEXTO HISTÓRICO

 

A jornada de trabalho do empregador, atualmente e em regra, regulamentada em 8 horas diárias e 44 horas semanais, foi concebida após anos de história em que o trabalhador laborava em regimes exaustivos de trabalho.

 

Até a era industrial, indica-se tão somente uma lei esparsa que sistematizava a jornada de trabalho diária. Contudo, tal regulamentação somente se concretizou no Século XIX, notadamente na Inglaterra em 1847, na França em 1848 e nos Estados Unidos em 1868.

 

No Brasil, a primeira disposição normativa que versou sobre a limitação da jornada de trabalho, vigorou apenas no Distrito Federal, dispondo que a jornada dos meninos era de nove horas e das meninas, de 8 horas[2].

 

Posteriormente, no Período Getulista, com a edição dos Decretos 21.186 e 21.364, em 1932, a jornada foi limitada em oito horas para comerciários e industriários, estendendo a outros trabalhadores em 1933. A Constituição de 1988[3] manteve a jornada de oito horas, mas reduziu o número de horas semanais de quarenta e oito horas para quarenta e quatro horas e ainda majorou o adicional de horas extras para cinquenta por cento.

 

Com efeito, regulamentada a carga horária máxima de labor do empregado, todo o período trabalhado excedente à jornada de trabalho seria passível de remuneração adequada.

 

Conforme preleciona Maria Alice Monteiro de Barros (2011), p. 523:

 

Cumpre, de início, distinguir jornada e horário de trabalho. Jornada é o período, durante um dia, em que o empregado permanece á disposição do empregador, trabalhando ou aguardando ordens (art. 4º da CLT). Já o horário de trabalho abrange o período que vai do início ao término da jornada, como também os intervalos que existem durante o seu cumprimento.

No Brasil, a norma legal prevê uma jornada de oito horas para um módulo ou carga semanal de 44 horas. O que exceder a isso é tido como trabalho extraordinário (BARROS, 2011, p.523). (grifos nossos)

 

Após a consolidação da regulamentação da jornada de trabalho por meios dos Decretos Getulistas de 1932, uma nova realidade vigente no país gera a necessidade de normatizar as condições da jornada a que eram expostos determinados empregados.

 

Referida situação ocorria nas ferrovias, amplamente utilizadas no país em um período que os meios de comunicação se encontravam em um estágio embrionário de desenvolvimento.

 

Com isto, quando da promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas por intermédio do decreto-lei 5.452 de 1º de maio de 1943, consignou-se no seu art. 244, que as estradas de ferro poderiam ter empregados extranumerários, de sobreaviso e de prontidão, para executarem serviços imprevistos ou para substituições de outros empregados que faltassem à escala organizada. Referida disposição legal foi posteriormente revogada pela lei 3.970 de 13 de outubro de 1961 e restaurado pelo decreto lei 5 de 4 de abril de 1966.

 

Destarte, o §2º do referido artigo instituiu o sistema de sobreaviso, o qual observava que os empregados das redes ferroviárias deviam estar de prontidão para solucionar qualquer imprevisto, considerando que se tratava de transporte coletivo, e, por consequência, os reparos que se fizessem necessários deveriam ser feitos imediatamente.

 

Cada escala de “sobreaviso” seria no máximo de 24 horas, contadas à razão de um terço do salário normal, conforme previu a parte final do §2º do art. 244 da CLT.

 

Posteriormente, o regime foi estendido a outras categorias de trabalhadores, v.g, a Lei Federal 5.811 de 11 de outubro de 1972 que previu o regime de sobreaviso ao empregado com responsabilidade de supervisão das operações de exploração, perfuração, produção e refino de petróleo, bem como na industrialização do xisto, da indústria petroquímica e do transporte de petróleo e de seus derivados por meio de dutos; ou engajado em trabalhos de geologia de poço ou em trabalhos de apoio operacional às atividades de exploração, perfuração e transferência de petróleo do mar e de áreas terrestres distantes ou de difícil acesso.

 

Outrossim, for força da previsão do Súmula 229[4] do Tribunal Superior do Trabalho, determinou-se a aplicação analógica do art. 244, §2º da CLT aos eletricitários.

 

3.            DA NECESSIDADE DO REGIME DE SOBREAVISO NA ATUALIDADE

 

Diante do contexto histórico da legislação trabalhista referente à jornada de trabalho bem como do princípio da proteção do obreiro, atualmente, o regime de sobreaviso abarca toda a gama de trabalhadores tutelados pela CLT, e não mais tão somente àquela classe de obreiros pela a qual a lei inicialmente protegeu.

 

Visa garantir o exercício do encargo do empregado nos limites do horário estabelecido no contrato de trabalho, sendo certo que, em hipótese diversa, e que, permaneça de prontidão mesmo após o término da jornada de trabalho – ficando em casa aguardando para ser chamado ao serviço a qualquer momento -, deverá receber o período considerado de “sobreaviso”, conforme prevê o art. 244, §2º da CLT.

 

Art. 224. §2º. Considera-se de “sobreaviso” o empregado efetivo, que permanecer em sua própria casa, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço. Cada escala de “sobreaviso” será, no máximo, de 24 (vinte e quatro) horas. As horas de “sobreaviso” para todos os efeitos, serão contados à razão de 1/3 (um terço) do salário normal.

 

Aclarando a questão apresentada no referido artigo infraconstitucional, preleciona Sérgio Martins Pinto (2007, p. 523)

 

Permanece em estado de expectativa durante seu descanso, aguardando ser chamado a qualquer momento. Não tem o empregado condições de assumir compromissos, pois pode ser chamado de imediato comprometendo até seus afazeres familiares, pessoais ou até seu lazer.

[...]

Assim, se o empregado não estiver aguardando em sua casa o chamado do empregador, em princípio não seria hora de sobreaviso. É importante que o empregado seja cientificado de que está de sobreaviso.

(PINTO, 2007. p. 523)

 

De fato, a importância de se limitar a jornada de trabalho e remunerar devidamente as horas que o empregado, em casa, permanece à disposição do empregador, decorre da necessidade de proteção do obreiro, bem como da prescindibilidade de resguardar a saúde e a dignidade do empregador.

 

Nesta baila, os dados provenientes do estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), constante no endereço eletrônico do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região, em 22 de março de 2012:[5], destaca as seguintes informações:

 

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apresentou na quarta-feira 21 relatório a respeito da percepção e do uso dos trabalhadores quanto ao próprio tempo livre do Sistema de Percepção Social (SIPS). Quase a metade (45,4%) das 3.796 pessoas ouvidas afirmou ter dificuldade para se desligar totalmente do trabalho remunerado, mesmo após o término de sua jornada diária.


A dificuldade de se desligar deve-se ao fato de o trabalhador ter de ficar de prontidão para alguma atividade extraordinária (26%) e à necessidade de planejar ou desenvolver alguma atividade de trabalho, por internet, celular etc (8%), ou para aprender um conjunto de coisas sobre o próprio trabalho (7,2%). (destaque nosso)

 

No mesmo sentido, a Organização Mundial da Saúde indica como principais fatores de produção de stress no trabalho o cumprimento de jornadas imprevisíveis, fora do horário normal ou em turnos mal concebidos, dando ensejo a comportamentos disfuncionais e não habituais e, em situações de maior gravidade, causando problemas psíquicos irreversíveis e incapacitantes para o trabalho.

Existe, inclusive, na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde a descrição de inúmeras moléstias geradas por disfunções atinentes ao trabalho, por sua penosidade (Z56.3) e outras dificuldades físicas e mentais daí oriundas (Z56.6).[6]

 

Pelo exposto, a regulamentação do regime de sobreaviso apresenta como a medida mais acertada para resguardar o empregado de cargas exaustivas de trabalho. Tal medida, se correta quando regulamentada em 1943, atualmente, com o ritmo intenso da vida do empregado, mostra-se ainda mais necessária. Todavia, a controvérsia atual cinge-se na aplicabilidade do regime para as mais diversas situações postas em juízo, pelo que passa a demonstrar.

           

4.            DA UTILIZAÇÃO DE APARELHOS DE INTERCOMUNICAÇÃO E A APLICAÇÃO ANALÓGICA

 

Atualmente, a vasta utilização de aparelhos de intercomunicação surge como possível forma de subordinação do empregado ao empregador, ensejando situações que podem caracterizar sobrejornada.

 

De fato, com o desenvolvimento das tecnologias de aparelhos de comunicação portáteis, a facilidade de comunicação ampliou-se substancialmente, a ponto de proporcionar o contato de pessoas em qualquer parte do mundo e a qualquer momento. No que pese as relações de trabalho, possibilita a transmissão de informações e chamados instantaneamente e o contato do empregador com seu empregado mesmo após a saída do ambiente laboral.

 

Ora, é consabido que os aparelhos coorporativos possibilitam que o empregado seja intimado a resolver questões laborais a qualquer hora ou até mesmo se deslocar até o local de trabalho a fim de resolver pendências incidentes.

 

Com isto, a jurisprudência, com o objetivo de atualizar o direito positivo e adequar às situações concretas postas em juízo deve se atentar para as hipóteses em que o empregado pode ter cerceado sua liberdade de locomoção e gozo de seu horário de descanso. Pensamento diverso representaria retrocesso às garantias consagradas após anos de evolução do Direito do Trabalho, e admitiria, retrogradamente, a jornada de trabalho indeterminada.

 

Analisando a questão, valeram-se os Juristas para proferir seus precedentes judiciais, do instituto da analogia, que conforme Ferrara (Tratatto di dritto civile italiano, v. 1, p. 227), “um raciocínio que, de certas semelhanças obervadas, conclui para outras semelhanças ainda não observadas.”

 

Sendo assim, não possuindo legislação específica para os empregados que permanecem disposição por intermédio de celular coorporativo e, existindo disposição legal para situação correlata, torna-se plenamente admissível a aplicação de analogia para o caso em tela.

 

Tal medida apresenta-se como a mais acertada para o deslinde do caso em apreço, haja vista que o instituto da analogia, entendido como meio de integração da norma legal, permite a aplicação de solução prevista em lei para determinada matéria em assunto semelhante que não haja sido dada regulamentação legal.

 

Analisada a questão, não foi outro o posicionamento dos Tribunais Pátrios de forma uníssona, verbis:

 

SOBREAVISO. BIP. TEMPO À DISPOSIÇÃO. CARACTERIZAÇÃO. A aplicação analógica do artigo 244, parágrafo 2º, da CLT leva em conta a constatação efetiva de que o empregado sofria restrições de locomoção, tinha obrigação de informar os locais para os quais se deslocava e estava sujeito à chamada às desoras. O uso do BIP, por si só, é indiferente a essa situação, mas é um dos elementos que denotam a sujeição do empregado ao poder de controle do empregador nos períodos de descanso. TRT 2ª Região, Processo nº 01011-2002-044-02-00-0-RO, Relator Juiz Rovirso Aparecido Boldo, 8ª Turma, Publicado em 08.10.2004.


SOBREAVISO. BIP. ANALOGIA. É notório que o uso do BIP implica limitação da liberdade de locomoção, já que o empregado fica impedido de se afastar além do raio de alcance do aparelho. Trata-se, de qualquer forma, de uma vantagem para a empregadora, que pode acionar o empregado a qualquer momento, fora do horário normal do trabalho; a isso deve corresponder uma compensação pecuniária para o empregado, consistente no pagamento das horas de sobreaviso, sob pena de violação ao caráter comutativo e oneroso do contrato de trabalho. Aplicável, por analogia, a norma expressa atinente aos ferroviários. TRT 2ª Região, Processo nº 19990583504/RO, Relatora Juíza Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva, 8ª Turma, Publicado em 22.5.2001. (grifos nossos).



Ademais, como forma de corroborar a tese da aplicabilidade do regime de sobreaviso aos empregados portadores de meios de telecomunicação, salienta-se que a Lei 12.551 de 15 de dezembro 2011, que alterou o art. 6º da CLT, equiparou a subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos.

 

A lei regulamenta a situação dos profissionais que realizam trabalho em seu próprio domicílio, de forma a dispensar tratamento isonômico àqueles obreiros que realizam o trabalho no estabelecimento do empregador, verbis:

Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.

 

O referido dispositivo legal, não obstante não ser aplicável diretamente aos empregados de sobreaviso ora sob análise, demonstra a evolução do direito em regulamentar situações atuais no âmbito do Direito do Trabalho e, ainda, confirma o entendimento que os empregados à disposição por meio de aparelhos de comunicação estão sujeitos à mesma subordinação daquela existente no ambiente de trabalho, com a agravante que, naquele momento, deveriam gozar do período de descanso.

 

5.            DO RECENTE ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

 

O entendimento nos Tribunais acerca da aplicação da hora de sobreaviso, por muito tempo foi tema controversos enfrentado pela comunidade jurídica.

 

Contudo, após diversas decisões convergentes no mesmo entendimento, os Tribunais Pátrios firmaram juízo majoritário, consagrado com Orientação Jurisprudencial 49 da Subseção Especializada em dissídios individuais, que assim definiu:

Orientação Jurisprudencial 49 da Subseção Especializada em dissídios Individuais (SDI-1) Horas extras. Uso do BIP. Não caracterizado o “Sobreaviso”. O uso do aparelho BIP pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço. Redação dada pela Res. do TST no 129, de 5-4-2005 (DJU de 20-4-2005).

 

Por conseguinte, em 31 de maio de 2011, o Tribunal Superior do Trabalho proferiu a Súmula 428, que determinou que o uso de aparelho de intercomunicação, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço, verbis:

 

Súmula nº 428 - TST - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 - Conversão da Orientação Jurisprudencial n.º 49 da SBDI-1

Sobreaviso - Uso de Aparelho de Intercomunicação - Convocação para o Serviço

O uso de aparelho de intercomunicação, a exemplo de BIP, ‘pager’ ou aparelho celular, pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço.

 

Contudo, a decisão emblemática mais recente do TST foi proferida em 14 de setembro de 2012, pela qual confirmou o entendimento que ter acesso a telefone, e-mail ou pager corporativo fora do expediente de trabalho não dá ao funcionário direito a receber adicional de sobreaviso.

 

Entretanto, a exceção a tal regra, seria quando efetivamente o trabalhador estiver de sobreaviso, v.g., quando cumpre escala de plantão, aguardando o recebimento de ordem do empregador. Em contrapartida, se o empregado não tiver acordado com seus superiores que está de sobreaviso e não atender a uma chamada telefônica em seu aparelho corporativo, não responder uma mensagem no celular ou e-mail também não poderá ser cobrado por isso.

 

Sendo assim, o pagamento da hora excedente somente será devido quando combinado que o empregador estaria durante aquele período de sobreaviso, mesmo que não utilize estes equipamentos durante este ínterim. Todavia, quando efetivamente utilizar esses aparelhos ou serviços, deve ser remunerado com hora integral trabalhada.

 

O atual entendimento é simplificadamente explicado pelo Ministro João Orestes Dalazen, presidente do TST, cujo teor está disponível no endereço eletrônico da Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal:

 

Se o salário dele é R$ 60 por hora, ele vai receber R$ 20 para cada hora que ficar aguardando o sobreaviso, mesmo que ele não seja chamado para trabalhar. Enquanto ele se encontrar nesta situação de aguardar convocação, esse empregado tem direito a um terço do trabalho nestas horas. Quando for chamado ao serviço, tem direito ao pagamento integral da hora", explicou o presidente do TST, ministro João Orestes Dalazen.[7]

 

A decisão modificou ainda a redação da Súmula 428 do TST, que passou a conter a seguinte redação:

 

SOBREAVISO APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 244, § 2º DA CLT (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) -Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I – O uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso.

II – Considera-se em sobreaviso o empregado que, à distância e submetido a controle patronal por instrumentos telemáticos ou informatizados, permanecer em regime de plantão ou equivalente, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante o período de descanso.

 

Por todas as modificações constantes, o acórdão emblemático foi sobejamente discutido na comunidade jurídica, tendo em vista que reduz as hipóteses de aplicação do regime e cria critérios mais objetivos de caracterização da prontidão.

 

6.            DOS CASOS CONCRETOS POSTOS EM JUÍZO E A APLICAÇÃO DA EQUIDADE

Apresentado o mais recente entendimento do TST sobre a jornada de sobreaviso, ousa-se discordar do Juízo realizado pelos eméritos julgadores, considerando para isto a atual conjuntura social frente à atividade laboral.

 

Compreende-se ser até mesmo forçoso destacar os benefícios advindos com as inovações tecnológicas, bem como a facilidade de comunicação interpessoal. Todavia, é consabido, que, atualmente, os meios de comunicação exercem efetiva restrição na liberdade do obreiro, mormente se este exerce atividades de responsabilidade direta e direção sob determinado ramo da atividade do empregador.

 

Outrossim, seria completamente desarrazoado entender que o empregado somente atenderia a um chamado do empregador caso acordasse com o mesmo que estaria em regime de prontidão.

 

Com efeito, existem hipóteses que mesmo não estabelecido que o empregado deveria permanecer de sobreaviso, este, em decorrência de, por exemplo, ser responsável por atividade que seria desenvolvida por empregados a ele subordinados fora de sua jornada de trabalho cujos possíveis erros que necessitarem de resolução imediata somente seriam solucionados com a sua presença, é nítido que neste caso o obreiro teria sua liberdade de locomoção e gozo de descanso cerceados.

 

Analisa-se, por exemplo, a situação hipotética de João, empregado da indústria Carlos & Filhos, supervisor de linhas de produção de determinado componente dos carros da montadora Forg.

 

Com a mudança em certo padrão de fabricação, João, que é engenheiro de produção, aplica, durante uma semana, as modificações do projeto necessárias para a fabricação do componente com as novas especificações exigidas pela Forg. Devido ao tempo exíguo disponibilizado pela montadora, a implementação do projeto, testada em uma sexta-feira, aconteceria efetivamente durante o final de semana, sendo realizado pelos operadores de linha de produção, remunerados em hora-extra e banco de horas.

 

Entretanto, em decorrência de um período de crise que a Carlos & Filhos passava, o gerente geral, Sr. Joaquim, determinou que não seria necessário a permanência de João durante a execução do novo projeto, haja vista que estava confiante no trabalho do engenheiro, certo de que não haveria nenhum problema incidente e visando economizar no pagamento de horas extras.

 

Contudo, considerando que qualquer erro no projeto que ocasionasse sua inexecução acarretaria a perda do contrato com a Forg, João, mesmo não acordado com o Sr. Joaquim que estaria em regime de sobreaviso, atende a todos os telefonemas e e-mails de dúvidas que lhe enviam. Permanece em casa, porém de prontidão para solucionar os problemas tão logo lhe informados, ante ao receio de ser demitido, haja vista o período de crise econômica no país.

 

Neste caso, caso João ajuizasse ação trabalhista em desfavor de Carlos & Filhos requerendo horas extras e hora de sobreaviso, pela aplicação da Súmula 428, não teria direito ao recebimento deste período, não obstante a clara hipótese de que o empregado teve seu direito ao descanso restringido.

 

Neste sentido, urge na hipótese em comento a aplicabilidade da equidade às particularidades do caso concreto, tendo em vista que a equidade acode o aplicador do direito nos momentos em que a particularização do caráter geral da norma seja imperiosa, a fim de que se realize a justiça quando da aplicação da lei ao caso concreto.

 

Aplicar sem restrições o entendimento sufragado pelo Tribunal Superior do Trabalho, consagrado na Súmula 428, configura completo desrespeito aos princípios basilares do Direito do Trabalho, tais como a razoabilidade, proteção do obreiro e primazia da realidade.

 

7.            CONCLUSÃO

 

A aplicabilidade da norma ao caso concreto realizada pelo Poder Judiciário, principalmente na seara do Direito do Trabalho, em que os princípios que o regem dispõe acerca da hipossuficiência do empregado, deve ser cuidadosamente analisada, sob pena de, em benefício da celeridade, não aplicar à mais lídima justiça à hipótese posta sob o crivo judicial.

 


 

REFERÊNCIAS

 

BARROS. Maria Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 7. ed. São Paulo.  LTr 75. 2011

 

PINTO. Sergio Martins. Direito do Trabalho. 27.ed. São Paulo. Atlas. 2011

 

FERRARA. Tratatto di dritto civile italiano, v. I.

 

SINDICATO DOS BANCÁRIOS E FINANCIÁRIOS DE SÃO PAULO, OSASCO E REGIÃO. Trabalhador tem dificuldade em se desligar da rotina. Rede Brasil Atual, 22 de março de 2012. Disponível em , acesso em 10. out.2012

 

KROST. Oscar. A caracterização do regime de sobreaviso diante das inovações tecnológicas dos meios de comunicação. Disponível em < http://www.boletimjuridico.com.br/DOUTRINA/texto.asp?id=1842>, acesso em 10.out.2012

 

ASSOCIAÇÃO DO PESSOAL DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. TST decide que trabalhador em sobreaviso por celular deverá receber adicional. Disponível em , acesso em 24. out. 2012

 

FREITAS. Marcus Vinícius. Aula 6: Sistemas de Integração. 1ª Parte. Princípios Gerais do Direito e Analogia. Faculdade Pitágoras de Belo Horizonte. 2012.

 

 

FREITAS. Marcus Vinícius. Aula 7: Sistemas de Integração. 2ª Parte. Equidade. Faculdade Pitágoras de Belo Horizonte. 2012.

BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Senado, 1988, 168p.

BRASIL. Decreto 21.186, de 22 de março 1932. Rio de Janeiro. Diário Oficial da União, Seção 1, em 31 de março de 1932, página 5930.

BRASIL. Decreto 21364, de 04 de maio de 1932. Rio de Janeiro. Diário Oficial da União, Seção 1, 06 de maio de 1932, página 8691.

BRASIL. Lei 3.970, de 13 de outubro de 1961. Brasília. Diário Oficial da União, 14 de outubro de 1961.

BRASIL. Lei 5.811, de 11 de outubro de 1972. Brasília. Diário Oficial da União, 11 de outubro de 1972.

BRASIL. Decreto Lei 5, de 4 de abril de 1966, Brasília. Diário Oficial da União, 5 de abril de 1966.

BRASIL. Lei 12.551 de 15 de dezembro de 2011,que alterou o art. 6o da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, para equiparar os efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos.

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. In: Vade mecum universitário de direito RIDEEL. 3ª ed. São Paulo. RIDEEL. 2011. p 1303-1462.

 

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 229. Diário de Justiça, Brasília, 19 de setembro de 1985.

 

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 428. Diário de Justiça, Brasília, 31 de maio de 2011. e redação alterada pela sessão do tribunal pleno em 14 de setembro de 2011, publicado no Diário de Justiça em 25, 26 e 27 de setembro de 2012.

 

BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Orientação Jurisprudencial 49 da Subseção Especializada em dissídios Individuais (SDI-1).  Redação dada pela Res TST nº 129; Diário de Justiça da União em 20 de abril de 2005.

 

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Recurso Ordinário          n 01011-2002-044-02-00-0-RO, Relator Juiz Rovirso Aparecido Boldo, 8ª Turma, Publicado em 08 de outubro de 2004.

 

BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, Recurso Ordinário n 19990583504/RO, Relatora Juíza Wilma Nogueira de Araújo Vaz da Silva, 8ª Turma, Publicado em 22 de maio de 2001.

 

 

 



 Discente do 6º período de Direito pela Faculdade Pitágoras de Belo Horizonte. Estagiária da Advocacia Geral da União – Procuradoria da União.

[1] Art. 244. CLT. As estradas de ferro poderão ter empregados extranumerários, de sobreaviso e de prontidão, para executarem serviços imprevistos ou para substituições de outros empregados que faltem à escala organizada.

[2] BARROS. Maria Alice Monteiro (p. 522)

[3] CF/88. Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais, facultada a compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.

[4] TST Enunciado nº 229 - Res. 14/1985, DJ 19.09.1985 - Nova redação - Res. 121/2003, DJ 21.11.2003. Horas de Sobreaviso dos Eletricitários – Remuneração. Por aplicação analógica do art. 244, § 2º, da CLT, as horas de sobreaviso dos eletricitários são remuneradas à base de 1/3 sobre a totalidade das parcelas de natureza salarial.

 

[5] SINDICATO DOS BANCÁRIOS E FINANCIÁRIOS DE SÃO PAULO, OSASCO E REGIÃO. Trabalhador tem dificuldade em se desligar da rotina. Rede Brasil Atual, 22 de março de 2012. Disponível em , acesso em 10. out.2012

 

 

[6]KROST. Oscar. A caracterização do regime de sobreaviso diante das inovações tecnológicas dos meios de comunicação. Disponível em < http://www.boletimjuridico.com.br/DOUTRINA/texto.asp?id=1842>, acesso em 10.out.2012

 

[7] ASSOCIAÇÃO DO PESSOAL DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. TST decide que trabalhador em sobreaviso por celular deverá receber adicional. Disponível em , acesso em 24. out. 2012

 

 

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Comentários e Opiniões

1) Yuri (27/03/2014 às 01:01:21) IP: 177.35.29.152
Excelente artigo, irei apresentar meu tcc sobre a jornada de sobreaviso, e o presente artigo me ajudou bastante! Obrigado!!


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