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Eutanásia é uma palavra de origem grega definida como ‘boa morte’. Representa a idéia de uma morte sem dor, tranqüila, pacífica.
É possível uma distinção da eutanásia em passiva, assim definida aquela em que se omite em depreender esforços terapêuticos para prolongamento da vida, ou ativa, em que se atua diretamente para ceifar a vida.
Difere também a eutanásia passiva, que compreende uma voluntariedade em não aplicar o tratamento terapêutico para prolongamento da vida, da recusa do paciente de se submeter ao tratamento, que pode até, indiretamente, levar a morte do mesmo, mas parte de uma iniciativa pessoal de insubmissão.
Para pacientes terminais a eutanásia passiva qualifica-se como ortotanásia.
A distinção entre a eutanásia passiva comum e a ortotanásia é relevante. A primeira deixa de evitar uma morte que, se houvesse a intervenção terapêutica, dar-se-ia em um futuro incerto, como para todos os mortais (a morte para todos chegará mas não há como prevê-la). Isto é, a intervenção terapêutica afasta o risco eminente de morte.
A segunda apenas prolonga a morte certa (possibilidade de estipular parâmetros de sobrevida - ex. três meses a um ano, de acordo com os relatos médicos de menor e maior expectativa de vida registrada em casos análogos). Ou seja, o processo natural de morte já está em curso e é irreversível, sendo as medidas apenas uma forma paliativa de estender sua conclusão.
É impossível limitarmos a discussão da questão da eutanásia a um prisma legalista, estritamente jurídico. Inevitavelmente terão que ser sopesadas as avaliações de diversos campos como a medicina, a ética, a psicologia, a sociologia, a teologia, a opinião pública, para podermos dar um tratamento adequado à questão.
A princípio, no que tange a ortotanásia, parece-me que deve ser autorizada, não podendo compreender em seu conceito conduta típica. Juridicamente não há que se falar em homicídio ou auxílio ou instigação ao suicídio, já que a morte decorre de causas naturais. Tampouco penso poder configurar omissão de socorro, pois neste conceito devemos compreender o esforço passível de êxito em salvar do perigo ou desamparo o próximo em situação de risco, o que não se coaduna como prolongamento ínfimo de resultado inevitável.
Por outro lado, sopesando a questão religiosa sob o prisma ocidental cristão, não parece que há uma intervenção na vontade de “Deus”, posto que, pelo contrário, esta decorreria da morte natural. A intervenção terapêutica é que constituiria intervenção na vontade divina com o prolongamento artificial da vida. Não por menos a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos) é a favor da ortotanásia por considerá-la ‘a aceitação da condição humana diante da morte’.
Eticamente, sopesando a dignidade da pessoa humana, não me parece razoável que, diante da morte inevitável, possa se impor que essa se dê em um período mais longo, sozinho em uma enfermaria, com dores atrozes,ao invés de em um período mais curto, porém com auxílio de paliativos para a dor, no seio da família e de seu amor, no lar.
A meu ver a ortotanásia não constitui, portanto, crime. Interessante seria a sua normatização, para que fosse adotado um padrão seguro de diagnóstico e padronização de medidas. Em boa hora viria a aprovação do anteprojeto de reforma do Código Penal que dispõe: Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos à morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, de cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão.
Quanto à eutanásia ativa ou passiva comum, face à vontade do paciente que não queira mais viver por considerar indigno suas condições de vida, ainda que a morte não seja eminente, posiciono-me de forma contrária.
Penso que a vida deve ser tutelada em sua diversidade e para além da vontade do indivíduo, posto que bem indisponível.
A questão, todavia, é tormentosa, e quando avaliamos casos como o de Ramon Sampedro, personagem real do drama mostrado no filme ‘Mar adentro’, torna-se altamente complexo fazermos um juízo de reprovação sobre Ramona Maneiro, que lhe auxiliou fornecendo o copo com cianureto, agindo por amor, e face às súplicas que lhe rogava Sampedro, tetraplégico a vinte oito anos.
Em que pese seja favorável a consideração da manutenção da eutanásia como injusto (fato típico e antijurídico), creio ser necessário muita cautela na aferição da culpabilidade (juízo de reprovação), que deverá ser caso a caso avaliada.
Pessoalmente, em muitas situações, creio configurar-se inexigibilidade de conduta diversa como excludente da culpabilidade, como no caso de Ramona Maneiro.
Diferente seria o caso de um médico, que livre e espontaneamente, resolve ignorar a disposição legal e proceder à eutanásia[1] ativa ou passiva a quem lhe requeira. Nesse caso, além do injusto configura-se a culpabilidade, devendo o indivíduo ser punido por seus atos.
Pelos argumentos esposados, cônscio de que a matéria pertence a campo de alta controvérsia, posiciono-me a favor da ortotanásia e contrário a eutanásia ativa e passiva comum.
BIBLIOGRAFIA:
COLUCCI, Cláudia. SILVEIRA, Julliane. Juiz obriga médicos a tentar prolongar a vida de doentes terminais. Da Acessoria de Comunucação do Cremepe. Folha de São Paulo de 27.11.2007.
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